Desmistificando a Maternidade
Desmistificando a maternidade - Um alerta para o cuidado psicológico
* Jéssica Amanda Morais Rodrigues
CRP 15/3944
Existe uma idealização em torno da maternidade. Ser mãe é visto apenas pela perspectiva de benção, grandes emoções positivas, realização, alegria. As expectativas são as melhores, não só para futura mãe, mais também para toda a família e parentes que acompanham este momento.
No entanto, a gestação é um momento muito peculiar tanto para o corpo como para mente da mulher, acarretando mudança de humor, física e hormonal. É uma explosão de sensações que acontecem ao mesmo tempo, dia após dia uma nova experiência, de sensações e emoções intensas. Essas mudanças acontecem de forma gradativa no corpo e ainda aflora as emoções. Nessa fase, ela também está suscetível à transtornos depressivos, de ansiedade, dentre tantas disfunções mentais. Algumas condições psicológicas já são bastante conhecidas, como as supracitadas. Porém, ainda temos alguns outros transtornos que são pouco conhecidos, como é o caso do blues puerperal.
No pós-parto temos um período que é comparado a uma leve depressão, chamado de blues puerperal ou baby puerperal. Puerpério aqui é a fase de até 45 dias após o parto. O blues puerperal vai atingir cerca de 60% das mães e costuma durar de uma a duas semanas. As principais características são: tristeza, baixa auto-estima, falta de interesse em cuidar de seu filho, um excesso de cansaço e um sentimento pertinente incompreensão, levando a puerpera a acreditar que seus sentimentos não são validos ou ainda que ela seria uma mãe menos forte que as demais, no sentido de reconhecerem que estão no seu limite, onde a grande maioria não relata, muitas até com uma questão corriqueira de ser uma péssima mãe, por não aguentar dar o suporte adequado a sua cria. O que difere da depressão seria a intensidade e a duração que é mais curta.
A depressão pós-parto é acometido pelas recém mamães mais de 10%, segundo uma pesquisa feita pelo PNS – IBGE 2019, os sintomas relatados são: tristeza profunda sem causa aparente, alteração brusca do sono, alteração do apetite, diminuição e apatia para realizar tarefas corriqueiras, principalmente cuidar de seu filho. Sem o devido acompanhamento psicológico e psiquiátrico pode levar ao suicídio.
E por último, considerado também o mais grave, é a Psicose puerperal, tal doença é desencadeada pelo processo do parto, assemelhando-se a psicose de curta duração.
É o mais grave porque tem dois sintomas distintos: o delírio e a alucinação. O delírio seria alterações do pensamento onde o indivíduo passa a ter o entendimento errôneo da realidade, mesmo tendo pouca consciência que são criações de sua mente. Já as alucinações são alterações do senso perceptivo, onde o sujeito pode ver imagens, ouvir sons, ver pessoas ou objetos que outros acompanhantes não veem, ou seja, são criações de sua mente. O seu comportamento ficará desorganizado, assim como seu discurso. Nesse caso, a mãe não teria a noção que é algo apenas de sua mente, mas enxerga como real. Ambos sintomas da psicose requer um afastamento da mãe para com seu filho. O que a torna um perigo para o mesmo, muitas chegam a cometer infanticídio, que seria matar seu próprio filho num momento de crise.
Tal Transtorno vai se enquadrar no CID 10 F 53.1 – Transtornos mentais e comportamentais graves associados ao puerpério não classificados em outra parte.
Esses transtornos são poucos divulgados e existe um preconceito, como muitos dos transtornos mentais, pois as pessoas não conseguem cogitar que uma mãe venha a adoecer mentalmente ao ter um filho. Lembrando que quem mais sofre as consequências são as mães. Sem contar que a relação mãe e filho também sofre um forte afastamento, pela inadequação da mulher com sua cria.
Os estudos ainda não têm um motivo conclusivo da existência de tais transtornos, mas temos algumas variáveis que levamos em consideração. Como: gravidez não desejada, problemas relacionais durante a gravidez, expectativa de carregar um filho indesejado ou que não seja o sexo que desejaria, traumas durante outras gestações, predisposição genética. Esse são fatores possíveis, no entanto, não são decisivos para o desencadeamento.
Vale realçar que a mãe não é a culpada por ter o transtorno, ou não tem coração pelo fato de rejeitar seu filho, ou que é irresponsável. É uma doença como qualquer outra. E necessita de atenção e tratamento. A maternidade é um sonho, mais que pode ter seus obstáculos. Para isso, vale lembrar da importância de se fazer um pré natal também psicológico, para resgatar essas mães em conflito consigo e suas crias. O não acompanhamento dessas mães pode acarretar rejeição por um longo período ou até uma vida toda, nessa relação com seus filhos. Não sendo determinista, mas a probabilidade desse rompimento gerar filhos infelizes ou com complicações, pode se perdurar. Dessa forma, não é afetada apenas a mãe e filho, mas uma família, o futuro de uma pessoa que foi exposta no mundo. Esse texto, não tem a intenção de apenas deixar em alerta aquelas tentantes, mas para que se sensibilizem para necessidade de se cuidar psicologicamente assim como um pré-natal físico.
As mães que já tiveram tais sintomas, ao engravidar em outra ocasião, mesmo já tratada e curada, precisa de um acompanhamento mais incisivo. Os acompanhantes devem ter cuidado e não culpar a mãe apenas, mas ajudar a se cuidar, lembrando que a gestação não é apenas da mulher, mais do casal.
A saúde mental é a chave para o bem estar em todas as etapas de nossa vida, inclusive na gravidez.
Referências Bibliográficas e sugestões de leituras para aprofundamento do tema
CID 10. Brasília: DATASUS, 2021. Disponível em: http://datasus1.saude.gov.br/sistemas-e-aplicativos/cadastros-nacionais/cid-10.
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) [Internet}. PNS – Pesquisa Nacional de Saúde. Acesso em 15 de Agosto de 2023. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/saude/9160-pesquisa-nacional-desaude.html?edicao=29270&t=resultados
LUCAS, Maíra Gonçalves de Oliveira. Saúde Mental da Gestante no Brasil de Acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde 2019. Dissertação 2022.
O acompanhamento integral da gestante é imprescidível para o bem estar do bebê e todo ciclo familiar.