CAPÍTULO 7

A PERCEPÇÃO DOS DOCENTES DE INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR DO PARANÁ SOBRE ALTAS HABILIDADES/SUPERDOTAÇÃO


CAROLINA MOSER PARAÍSO¹

VÂNIA CARLA CANTO²

RESUMO

O objetivo deste estudo foi investigar a percepção dos docentes de instituições de ensino superior do Paraná sobre altas habilidades/ superdotação. Foi realizado um questionário on-line com docentes de diferentes áreas de atuação de ensino superior do Paraná composto por perguntas objetivas que abordou o perfil dos entrevistados e a percepção dos docentes sobre altas habilidades/ superdotação. Após a coleta dos dados, foi realizada a análise e interpretação dos resultados por meio de gráficos. Os resultados indicaram que a maioria dos docentes (96%) nunca foi informada pela instituição ou coordenação do curso de que, em sua sala de aula, havia algum aluno com altas habilidades/superdotação. Além disso, a maioria dos docentes (90%) nunca participou de algum curso ou na sua formação (graduação/ pós graduação) teve disciplinas com foco na inclusão de alunos com altas habilidades/superdotação, além disso, na instituição em que os docentes lecionam, nunca ofereceram um curso, programa ou projeto para atender às necessidades educacionais especiais de alunos com altas habilidades / superdotação que possa contribuir com a formação do aluno (88%). No entanto, 80% dos docentes têm interesse em participar de cursos sobre atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com altas habilidades/superdotação. Assim, conclui-se que há uma escassez de docentes capacitados para trabalhar com estudantes com perfil de superdotação e é necessário que sejam ofertadas formações para os docentes sobre educação inclusiva nas universidades.

PALAVRAS-CHAVE:

Educação inclusiva. Universidade. Professor.

¹ Pós-graduanda em Docência no Ensino Superior pelo Centro Universitário Cesumar-Unicesumar. Doutoranda em Ciência de Alimentos pela Universidade Estadual de Maringá-UEM. Mestre em Ciência de Alimentos pela Universidade Estadual de Maringá-UEM. Graduada em Engenharia de Alimentos pela Universidade Estadual de Maringá-UEM.

² Pós-Graduada em nível de Especialização em Tutoria em Educação à Distância, em Metodologia do Ensino da Filosofia, Sociologia e Religião e em Metodologia e Docência no Ensino Superior pela Faculdade Eficaz. Graduada em Licenciatura Plena em Filosofia pela Universidade Estadual de Maringá, Segunda Licenciatura em Letras com Habilitação em Português e Inglês pela Fiar e Cursando Licenciatura Plena em Pedagogia pela Universidade Dinâmica das Cataratas - UDC.

INTRODUÇÃO

A legislação educacional brasileira aborda a necessidade de identificação e atendimento de estudantes com altas habilidades/superdotação, no entanto, há diversas pesquisas mostrando que as políticas públicas na área da educação inclusiva pouco consolidaram as estratégias para o atendimento desses estudantes. Para que o direito da educação inclusiva seja garantido, não é preciso que somente se cumpra a legislação, mas que também se avance na concepção desse sistema de ensino.

A investigação da percepção dos docentes sobre altas habilidades/ superdotação contribui para descrever o atual cenário em relação ao tema de inclusão nas universidades e pode refletir nas metodologias de ensino e currículos dos docentes, capazes de atender os estudantes de forma adequada e, assim, auxiliar no desenvolvimento, aprendizagem e formação acadêmica destes.

O professor é considerado fundamental para a identificação e atendimento adequado dos estudantes com perfil de superdotação. Sendo assim, é imprescindível a formação continuada dos docentes sobre a educação inclusiva. Com isso, o professor adquire maior conhecimento sobre o assunto e consegue encontrar diferentes alternativas e estratégias para adequar a metodologia de ensino para atender os alunos com altas habilidades/superdotação.

Considerando esse contexto, o objetivo deste estudo foi investigar a percepção dos docentes de instituições de ensino superior do Paraná sobre altas habilidades/superdotação. Este artigo está subdividido em dois tópicos, no primeiro, apresenta-se uma revisão sobre a relevância do tema abordado para a sociedade atual, no segundo, será apresentado o questionário que foi respondido pelos docentes, encerrando com as considerações finais.

PANORAMA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO BRASIL

Nos últimos anos, o debate sobre a educação inclusiva abrange todas as etapas educacionais, ou seja, desde a educação infantil até o ensino superior. Os alunos considerados como público-alvo da educação especial são aqueles que apresentam transtornos globais do desenvolvimento, deficiências e altas habilidades/superdotação (RECH; NEGRINI, 2019).

Atualmente, estima-se que de 3 a 5% da população apresenta potencial acima da média (REIS; REMOLI; CAPELLINI, 2016). Segundo a base normativa Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, alunos com altas habilidades/superdotação

Demonstram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes. Também apresentam elevada criatividade, grande envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse (BRASIL, 2008, p.15).

A partir dessa definição, ao se considerar as características sociais, emocionais e cognitivas comuns aos estudantes com perfil de superdotação, é previsível que sua expectativa seja a de encontrar uma instituição de ensino superior com um ensino desafiador e criativo que supra suas necessidades de aprendizagem. No entanto, isto exige uma equipe multidisciplinar de profissionais, definição de currículo, estratégias e múltiplos espaços para o atendimento dos estudantes. Esses fatores colaboram para uma universidade democrática, apta a compreender as diversidades que constituem os seres humanos (TITON, 2019).

O professor é considerado uma variável determinante para que o processo da educação inclusiva seja possível. Para isso ocorrer, é necessário a qualificação dos professores (VERSOZA-CARVALHAL; MELO; SILVA, 2017). No entanto, diversas pesquisas constataram que os docentes de universidades não estão aptos para trabalhar com a educação inclusiva. Lima (2011) realizou um estudo sobre como os professores universitários identificam estudantes com altas habilidades/superdotação e quais estratégias metodológicas adotam para a inclusão educacional destes na universidade. Foram entrevistados nove professores universitários que possuem entre cinco e quarenta anos de docência; com formação diversificada. Os resultados indicaram que a concepção dos professores sobre altas habilidades/superdotação é constituída a partir de informações do senso comum, o que dificulta a aplicação de metodologias pedagógicas que atendam aos critérios necessários para o enriquecimento curricular. Os professores que aplicam diferentes estratégias pedagógicas acabam identificando os estudantes com perfil superdotado de forma empírica e informal.

Cianca e Marquezine (2014) investigaram a percepção dos coordenadores dos colegiados dos cursos da Universidade Estadual de Londrina a respeito de altas habilidades/superdotação. Foi realizada uma entrevista semiestruturada com 14 coordenadores dos colegiados das licenciaturas. Os autores observaram que a percepção dos docentes sobre altas habilidades/superdotação era ainda elementar, estes utilizaram o senso comum para tratar sobre a superdotação. Além disso, os docentes não reconheciam seus alunos com perfil de superdotação, entretanto, apontavam diversos indicadores em estudantes condizentes com a literatura sobre essa temática.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

DELIMITAÇÃO DA PESQUISA

Os sujeitos da investigação foram docentes de uma instituição de ensino superior do Paraná. Foi aplicado um questionário on-line em agosto de 2020, com 195 docentes, elaborado através da plataforma Google Forms e enviado para o e-mail de cada entrevistado.

TÉCNICA UTILIZADA

O questionário foi composto por 11 perguntas objetivas que abordaram o perfil dos entrevistados e a percepção dos docentes sobre as altas habilidades/ superdotação. Após a coleta dos dados, foi realizada a análise de dados obtidos e interpretação dos resultados por meio de gráficos.

ANÁLISE DOS DADOS E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS

Referente ao perfil dos entrevistados, notou-se que foi este foi composto por 51,3% do gênero masculino e 48,7% do gênero feminino, com a maioria dos entrevistados na faixa etária com mais de 50 anos (34,2%), seguido de 31 a 40 anos (32,6%), 41 a 50 anos (21,6%) e 20 a 30 anos (11,6%). O tempo médio em que os docentes lecionam foi 25,3% acima de 25 anos; 21,6% de 1 a 5 anos; 18,4% de 6 a 10 anos; 15,3% de 11 a 15 anos; 10,5% de 16 a 20 anos e 8,9% de 21 a 25 anos, sendo que 74,4% lecionam em instituição do ensino superior pública e 25,6% em privada. Em relação ao nível de escolaridade, 75,1% dos docentes têm Pós-Graduação Stricto sensu, nível doutorado, completa; 16,3% Pós-Graduação Stricto sensu, nível mestrado, Completa; 4,5% Pós-Graduação Stricto sensu, nível mestrado, Incompleta; 2,9% Pós-Graduação Lato sensu completa e 1,2% Ensino Superior. A área de conhecimento em que os docentes entrevistados lecionam atualmente correspondeu a 12,4% em Ciências Humanas, Letras e Artes; 15,8% a Ciências Sociais Aplicadas; 18,9% Ciências Exatas; 23,0% Ciências da Saúde e Biológicas; 18,7% Ciências Agrárias e 11,2% Ciências Tecnológicas.

Dentre os entrevistados, 55% dos docentes responderam que, nas turmas em que lecionaram e/ou lecionam, consideram que havia e/ou há alunos com altas habilidades/superdotação (Figura 1A) e 96% dos docentes responderam que nunca foram informados pela instituição ou coordenação do curso a respeito do fato de que em sua sala de aula havia aluno com altas habilidades/superdotação (Figura 1B). De acordo com Cianca e Marquezine (2014), o conhecimento sobre a temática de inclusão pelos profissionais do ensino superior é insuficiente, principalmente em relação à inclusão de estudantes com altas habilidades/superdotação. Assim, o reconhecimento desses estudantes em cursos de nível superior ainda é uma realidade distante. Além disso, segundo Falcade-Pereira e Piske (2011), para o atendimento adequado dos estudantes com altas habilidades/ superdotação, a identificação realizada de forma correta é de extrema importância. O professor poderá perceber características de superdotação em seus estudantes e contar com o apoio da coordenação, da família e do próprio estudante para as adaptações necessárias em suas aulas.

A maioria dos docentes (84%) respondeu que considera importante a adaptação das estratégias pedagógicas se tivessem algum aluno com altas habilidades/ superdotação na turma (Figura 1C). Segundo Reis et al. (2016), o uso de diferentes estratégias pedagógicas é exigência mínima para os alunos com altas habilidades/superdotação. O professor deve avaliar e planejar atividades diversificadas, criativas, motivadoras, desafiadoras e instigantes, condizentes com as habilidades de cada aluno. Além disso, de acordo com Falcade-Pereira e Piske (2011), é preciso que haja mais estratégias de ensino que valorizem o potencial do aluno e uma prática pedagógica que possibilite novas descobertas, tanto por parte do professor quanto por parte de seus alunos.

Observou-se que a maioria dos docentes (90%) nunca participou de algum curso ou em sua formação (graduação/ pós graduação) teve disciplinas com foco na inclusão de alunos com altas habilidades/superdotação (Figura 1D) e 88% dos docentes responderam que, em sua instituição, nunca ofereceram um curso, programa ou projeto para os docentes sobre atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com altas habilidades/superdotação que possa contribuir para a formação do aluno (Figura 1E). No entanto, 80% dos docentes têm interesse em participar de um curso sobre atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com altas habilidades/superdotação (Figura 1F).

De acordo com Versoza-Carvalhal et al. (2017), o professor é uma variável determinante para que a educação inclusiva seja possível, portanto, a qualificação dos professores é imprescindível e necessária. Ademais, segundo Martins e Alencar (2011), além de o professor não possuir o conhecimento sobre a legislação brasileira que oferece respaldo e obrigatoriedade de atendimento para os alunos com altas habilidades e superdotação, não tem sido preparado para atender de forma adequada esses alunos. No entanto, não somente a formação do professor é necessária, mas também definir estratégias adequadas para realizar essa formação. Na sequência, têm-se os gráficos elaborados com base nas respostas dos entrevistados.

Figura 1- Perguntas realizadas no questionário para os docentes: (A) Nas turmas em que você lecionou e/ou leciona, considera que havia e/ou há alunos com altas habilidades/superdotação? (B) Já foi informado(a) pela instituição ou coordenação do curso de que em sua sala de aula havia algum aluno com altas habilidades/superdotação? (C) Se tivesse algum aluno com altas habilidades/superdotação na turma, você considera importante adaptar as estratégias pedagógicas? (D) Já participou de algum curso ou em sua formação (graduação/ pós graduação) teve disciplinas com foco de inclusão de alunos com altas habilidades / superdotação? (E) Na instituição que leciona, já ofereceram algum curso, programa ou projeto para os docentes sobre atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com altas habilidades/superdotação que possa contribuir para a formação do aluno? (F) Se em sua instituição fosse oferecido um curso sobre atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com altas habilidades/superdotação, você teria o interesse em participar?

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da pesquisa realizada, conseguiu-se avaliar diversos pontos a respeito da percepção dos docentes de instituições de ensino superior do Paraná sobre altas habilidades/ superdotação. Conclui-se, a partir do questionário, que a maioria dos docentes nunca participou de algum curso com foco de inclusão de alunos com altas habilidades/superdotação e, na instituição em que lecionam, nunca ofereceram um curso, programa ou projeto para os docentes sobre atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos com altas habilidades/ superdotação que possa contribuir para a formação do aluno. Assim, é necessário que haja maior engajamento de políticas públicas na área da educação inclusiva nas universidades com estratégias para o atendimento adequado e que valorizem o potencial desses estudantes.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 . Estabelece a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Conselho Nacional de Educação.


CIANCA, Fabiane Silva Chueire; MARQUEZINE, Maria Cristina. A Percepção dos Coordenadores de Licenciaturas da UEL sobre Altas Habilidades/Superdotação. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 20, n. 4, 2014. Disponível: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-65382014000400010&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso: 03 ago. 2020.


FALCADE-PEREIRA, Ires Aparecida, PISKE, Fernanda Hellen Ribeiro. A prática pedagógica com estudantes superdotados (as) – desafios e possibilidades. X Congresso Nacional de Educação-Educere. I Seminário Internacional de Representações Sociais, Subjetividade e Educação-SIRSSE. Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2011.


LIMA, Denise Maria de Matos Pereira. O professor universitário frente às estratégias de identificação e atendimento ao aluno com altas habilidades/superdotação. 127f. Dissertação (Educação, Diversidade, Diferença e Desigualdade Social do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná)- Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2011.


MARTINS, Alexandra da Costa Souza; ALENCAR, Eunice Soriano de. Características desejáveis em professores de alunos com altas habilidades/superdotação. Revista Educação Especial, Santa Maria, v. 24, n. 39, 2011. Disponível: https://periodicos.ufsm.br/educacaoespecial/article/view/1881. Acesso em: 20 set. 2020


RECH, Andréia Jaqueline Devalle; NEGRINI, Tatiane. Formação de professores e altas habilidades/superdotação: um caminho ainda em construção. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 14, n. 2, 2019. Disponível em: http://periódicos.fclar.unesp.br. Acesso em: 05 ago. 2020.


REIS, Verônica Limas dos; REMOLI, Taís Crema; CAPELLINI, Vera Lucia Messias Fialho . Estratégias pedagógicas para estudantes com altas habilidades/superdotação: opinião de educadores. Revista Educação e Políticas em Debate, v. 5, n. 2, 2016. Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/revistaeducaopoliticas/article/view/45387. Acesso em: 01 ago. 2020.


TITON, Eliane Regina. Estudantes com altas habilidades/superdotação na universidade: análise de itinerários pedagógicos. 210 f. Dissertação (Educação, Diversidade, Diferença e Desigualdade Social do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná)- Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2019.


VERSOZA-CARVALHAL, Cassiana Stersa; MELO, Camila Muchon de; SILVA, Silvia Aparecida Fornazari da. Formação de professores para inclusão: histórias pessoal, profissional e acadêmica. Revista Perspectivas, v. 8, n. 2, 2017. Disponível: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/pac/v8n2/v8n2a07.pdf. Acesso em: 01 ago. 2020.