O Verdugo

O livro é uma peça de teatro que narra a história de um carrasco que se recusa a executar um homem condenado por incitar a revolta e a mudança na sociedade. O carrasco enfrenta a pressão do juiz, da sua família e dos seus próprios conflitos morais. A peça é uma crítica à opressão, à violência e à injustiça social.1 2 3 


RESENHAS

Resenha por Nathalia Rios Moreira - @nriosm

Você tem a chance de mudar a vida financeira de sua família, mas para isso teria de matar alguém que possa ser um inocente. Você completaria essa tarefa?

“O Verdugo” é uma peça escrita por Hilda Hilst, uma poeta, ficcionista, cronista e dramaturga brasileira. Hilda conta nesse drama a situação de um homem, o Verdugo, que é contratado para matar alguém, mas que, por emoção, acaba por decidir que não deveria cumprir essa tarefa. Sua esposa, que não concorda com seus pensamentos, decide por ela mesma que deve assumir seu papel como verdugo para ser paga pelo governo e mudar a vida de sua família com o dinheiro recebido.

É muito comum aprendermos que o homem é o encarregado por trazer o dinheiro para casa, fazer o trabalho duro lá fora e ser o cabeça da família, ser aquele que é racional. Mas o Verdugo é tocado pelas palavras de amor do homem condenado, aquele que é obrigado a matar. Entre trazer o dinheiro para sua família e fazer o que se parece certo para si mesmo, Verdugo é levado por suas emoções e determina que o Homem é bom e não merece a morte. Ele que deveria ser a figura masculina maioral de sua casa, não consegue deixar suas emoções de lado, enquanto sua mulher – aquela que deveria ser a imagem suave e delicada – decide que ela mesma é quem matará o condenado.

A esposa e a filha são as pessoas mais determinadas para ganhar este dinheiro que qualquer um na família. As mulheres, que por Lei não poderiam se ser verdugo (quem executa a morte de um condenado), são as que deixam qualquer emoção de lado para que possam mudar a vida de sua família e também para que a filha possa finalmente se casar. Elas se veem em situação difícil e se sentem frustradas por não poderem ganhar essa tal enorme comissão que pode mudar suas vidas e se sentem obrigadas a assumir o papel masculino do pai e marido.

“O Verdugo” conta com críticas sociais que te fazem pensar. O que é certo, de fato, o que a Lei impõe ou a ética? O que vale mais, a vida de um homem inocente na Lei ou o dinheiro que se ganha com sua morte? E quais os papéis do homem e mulher na sociedade, quando um homem pode ser tão emotivo quanto uma mulher? Até onde você iria pelo dinheiro?

O advogado Rafael Matsuda Suzuki comenta sobre a peça: “Quando o homem fala sobre amor e que os cidadãos devem deixar de ficar amoitados, mostrando suas caras de lobo, não se pode negar, portanto, uma interpretação da peça de que o homem, na realidade, falava que os cidadãos deveriam ocupar as instituições, disputar por si mesmos os discursos sem que algum agente estatal estabeleça um paradigma, nunca esquecendo, é claro, do amor (palavra incompreendida na peça e descartada pela forma como o processo penal é conduzido: a desconsiderar a conciliação em prol da punição), do caráter humanístico que é o diálogo para melhor compreender um problema social complexo como o crime que não apenas exige uma atitude vingativa, mas restaurativa, compositiva.”. Para entender melhor sua fala, podemos dizer que o condenado queria que o povo saísse de sua toca, questionasse seu governo e sua Lei, suas regras e padrões, mas sem deixar de lado o amor, a ética e o caráter humano.

Hilda Hilst faz a gente pensar em como nos comportamos como cidadãos, em quem confiamos para tomar conta de nosso lar (país, cidade, Estado), se nos preocupamos o suficiente com isso; além de que também nos questiona sobre como somos como pessoas, sobre nossa ética. Hilda não deixa a desejar nessa obra quando o quesito é repensar nossas ações, assim como nossas opiniões sobre certos assuntos citados em sua peça. Não é à toa que ela foi considerada uma das maiores escritoras da língua português no século vinte pela crítica especializada. Hilda nos pega de jeito nessa peça e essa vale muito a pena ser lida.


Resenha por Nathália Dias Maciel Campos

Hilda Hilst publica sua obra “O verdugo” pela primeira vez em 1970, período de intensa mudança no cenário político brasileiro. A narrativa apresenta um retrato lúgubre da sociedade brasileira, marcada pela desigualdade social, pela violência e pela corrupção. A autora utiliza a história do Verdugo para questionar as práticas de violência e opressão do Estado, bem como para refletir sobre a natureza da justiça.

O Verdugo, personagem central da obra, é responsável por executar a pena de morte; neste texto, encontramos uma narrativa perturbadora, envolvente e surpreendente da literatura brasileira.

A questão central e conflituosa vista na peça é a relação de poder entre os personagens e a decisão do Verdugo de não querer cumprir seu papel como executor de um homem. São essas relações que dão a sequência da narrativa e constroem a reflexão sobre os motivos que levaram esse personagem central à negativa do comprimento da função.

Nas peças em questão a ideia de poder passa pela enunciação que as
personagens fazem sobre si e o problema central a envolver todos.
Especificamente, no caso de O Verdugo, temos uma personagem que
declina do seu trabalho, por entender que o Homem, que os juízes – braços
do Estado – querem ver executado para todos os cidadãos da vila, é um
homem inocente; nesta peça o jogo de forças construído estabelece-se
entre o Verdugo e juízes, analíticos em suas afirmações a convencer o
carrasco da necessidade de matar, este homem em especial. (GOMES,
2013, página 27.)


As relações de ordem são postas a prova por meio da sociedade que divagam sobre o dever e o não dever da morte do homem. As figuras dos juízes dão força as leis e a simbologia da imagem de força superior que o Estado mantém sobre os cidadãos.

Outro ponto é que o Verdugo se depara com sentimentos alheios a ele até então, ao cruzar com os olhos do homem. O que faz a narrativa encontrar espaço para descrever que ainda há sentimentos em uma pessoa contratada para executar a  serviço de outras. E são esses sentimentos e sua capacidade de escolha e ética que o fazem declinar a ordem de excussão do homem. 

Outro fator importante é a mulher, chefe da família, que se preocupa com o bem-estar de todos de seu lar. Ela sabe que se seu marido não cumprir com seu trabalho é a sua família que estará vulnerável financeiramente e socialmente. Por isso, ela prefere até mesmo fazer o trabalho do marido, temendo a represália social e do Estado. Vemos uma personagem que cumpre um papel social e que luta para que os seus estejam sob proteção.

E nesse jogo, através do embate entre a Mulher e o Verdugo, torna-se clara
a indefinição dos papeis sociais dentro de casa. Muitas vezes é a
personagem que pensa os problemas da vida social do marido, propõe
soluções, modos de comportamento, isto é, a Mulher tenta encaixar todos
num modus operandi que não vá contra o sistema. (GOMES, 2013, página 53)


"O Verdugo"; é uma obra que também apresenta diversas questões filosóficas que permeiam a narrativa e convidam o leitor à reflexão sobre temas importantes como a justiça, a religião, o mal, a solidão e a finitude da vida. É possível identificar questões como a natureza do mal, a ética da pena de morte e a busca por significado em uma vida aparentemente sem sentido. A prosa da autora é densa e evocativa, criando uma atmosfera sombria e opressiva que reflete o estado mental do protagonista.

A questão da solidão pode ser vista como a dificuldade dos seres humanos em encontrar conexão e significado em suas vidas. Os personagens são retratados como seres solitários e desesperançados, que buscam encontrar algum sentido em meio à opressão e à violência que os cercam.

A obra apresenta uma reflexão sobre a finitude da vida e a inevitabilidade da morte. O personagem do Verdugo é responsável por executar a pena de morte, mas ele próprio questiona a validade desse tipo de punição e a inevitabilidade da morte como parte da condição humana. Essa questão pode ser vista na obra "O ser e o nada", de Jean-Paul Sartre. Neste livro, o autor apresenta uma reflexão sobre a natureza da existência humana e a liberdade do indivíduo. Ele discute como a consciência humana é capaz de criar significado e sentido em meio à contingência e à finitude da vida.

Na obra “O ser e o nada”, Sartre diz que a existência humana é marcada pela contingência e pela finitude. A liberdade do indivíduo consiste em criar significado e sentido em meio à sua condição de ser-no-mundo. (SARTRE, Jean-Paul. "O ser e o nada"). O que dialoga com a questão que permeia os diálogos do Verdugo e da Mulher quando precisam decidir sobre a execução do Homem.

Assim, "O Verdugo" é uma obra que apresenta diversas questões filosóficas que permeiam a narrativa e convidam o leitor à reflexão sobre temas importantes como a justiça, a religião, o mal, a solidão e a finitude da vida.

Outra questão importante vista na obra de Hilst é a inovação estilística. Esse elemento é visto pela narrativa fragmentada e não-linear. Hilda Hilst apresenta a história por meio de uma série de fragmentos, que não seguem uma ordem cronológica linear, e que são compostos por diálogos, monólogos interiores e sensoriais. Essa estrutura narrativa exige do leitor um esforço extra para compreender e interpretar a história, tornando a leitura mais desafiadora e instigante.

Outra técnica inovadora utilizada pela autora é a metalinguagem, que consiste em fazer referência ao próprio ato de narrar. Hilst utiliza essa técnica para questionar a natureza da arte literária e da escrita, bem como para explorar as fronteiras entre a realidade e a ficção.

"O Verdugo'"  é uma leitura desafiadora e perturbadora, mas também extremamente significativa e importante. Hilda Hilst foi uma das escritoras mais importantes e influentes da literatura brasileira do século XX, e esta obra é uma prova de sua habilidade em explorar temas difíceis e complexos de maneira brilhante e poderosa.


Referências

GOMES, Francisco Alves. “Hilda Hilst: da dramaturgia ao poder e à cena: Leituras das peças O Verdugo (1969) e o Rato no Muro (1967)” /– Brasília, 2013. 170 páginas. 

SARTRE, Jean-Paul. O ser e o nada.

Resenha por Sávio Lima Lopes

A Mulher e o Verdugo em “O Verdugo” de Hilda Hilst: imanência e transcendência.

A obra dramatúrgica de Hilda Hilst, é produzida toda de uma só vez. Escrita entre os anos de 1967-1969, período do endurecimento da ditadura militar no Brasil – sob o governo Costa e Silva – conhecido como “Anos de Chumbo” – incluindo a promulgação do AI-5 (em 13 de Dezembro de 1968), sua obra para o palco, foi considerada à época – e ainda o é hoje -,subversiva.

Hilda escreveu ao todo, oito dramaturgias (tornam-se peças quando montadas). São elas, conforme lista Pallottini (2013, p. 206): “A Possessa”; “O Visitante”; “O Auto da barca”; “As Aves da Noite”; “O Novo Sistema”; “O Verdugo”;  “A Morte do Patriarca”. Esta resenha se deterá sobre a dramaturgia “O Verdugo”, escrita em 1969 e, montada pela primeira vez em Londrina/PR em 1972 e, no ano seguinte, em São Paulo/SP, e premiada pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo em 1969, sendo publicada no ano seguinte.

O que chama atenção à Renata Pallotini (2013, p. 216-217) é também o que destaco primeiramente. Todos os personagens arrolados, são nomeados por suas funções, papeis sociais. Diferente do que caracteriza os grandes dramas burgueses (como em “Um Bonde Chamado Desejo”, de Tennessee Williams, por exemplo); em que os nomes próprios são usados para destacar os personagens principais dos secundários; Hilda, aqui, iguala todos os personagens, não havendo distinção neste sentido. Parece, neste rol, que Hilda flerta com o Teatro Épico. Isto, apesar de o grande conflito, ser intrinsecamente dramático, subjetivo; especialmente no primeiro ato, com a ação sendo desenvolvida na sala da casa do Verdugo, um ambiente privado. Além disso, deve-se destacar que, segundo Rosenfeld (2002, p. 16), “não existe pureza de gêneros em sentido absoluto”. Ou seja: não existe um drama “puro” ou um épico puro. Um contém traços do outro. Pode-se dizer que há uma predominância épica ou, uma predominância dramática. No segundo ato, a ação passa-se no patíbulo (prefiro cadafalso, pela ambiguidade inerente), ou seja, em um espaço aberto, público, mais característico do Teatro Épico.

Levando-se em conta a construção dos personagens, percebe-se que não há ambiguidade em suas definições. É um texto claro, objetivo. O Verdugo, apesar de titubear de início, aprofunda-se em sua decisão, bem como os outros personagens: Mulher, Filha, Filho, Noivo, Juízes, entre outros. O Verdugo, claramente o protagonista do texto, é ladeado pela Mulher, que assume um protagonismo agônico. Esclareço. Arrisco em definir que protagonista e antagonista estão subsumidos em entre o Verdugo e a Mulher. Representam, respectivamente a transcendência e a imanência. O abstrato e o concreto. O ideal e o real. Longe de dar conta de todas as questões levantadas na dramaturgia, quero recortar minha análise sob essa perspectiva: o conflito entre o Vedugo e a Mulher e breves implicações éticas.

Considerando a Mulher e o Verdugo como, respectivamente, protagonista e antagonista, levanto a hipótese de que, a Mulher defende a imanência, o corpo, a necessidade material, o agora. Em oposição a isso, o Verdugo tem um viés moral que se fortalece ao longo do texto. Nesse sentido, é alguém que resiste a cumprir a função para a qual é pago. Mais: recusa-se a cumprir sua função mesmo que se adicione dinheiro. 

Em termos de ação, o Verdugo de Hilda, aproxima-se do Bartlebly, de Herman Melville. Ainda que Bartleby e Verdugo estejam distantes geográfica e temporalmente (mais de cem anos), há paralelos possíveis. Ambos são conhecidos pela sua recusa levadas às últimas consequências, este que recusa mas age e aquele, que recusa pela insistente inação. “Não vou matar o Homem”, diz o Verdugo. “Acho melhor não”, diz o escrivão.

Hardt e Negri (2001, p. 222-224), analisam a obra de Melville sob a perspectiva da recusa ao trabalho. Leem em Bartleby um símbolo revolucionário, de uma política libertadora. É uma perspectiva interessante para ler a dramaturgia de Hilda e enxergar no Verdugo um “revolucionário”. O problema, me parece, é a partir disso, há uma planificação das contradições. Além disso, o Verdugo, parece ver no Homem, uma transcendência, um símile do Jesus cristão e, por isso, transcendente.

Aqui, retomo a Mulher. Lê-la como gananciosa, é, talvez, fazer uma leitura equivocada. Antagonizando com o Verdugo, a Mulher lidera em defesa da imanência. Há condições precárias no agora. Há necessidade agora. Não depois, não ao mundo idealizado. Sim ao mundo material, pragmático. A Mulher se veste de Verdugo, oferece-se para fazer o serviço e a receber o dinheiro adicional oferecido pelos juízes. Quem está fazendo a revolução aqui?

Alternando a análise do conteúdo para a forma: se o protagonista é o Verdugo, mas quem  puxa a ação é a Mulher, a forma não é revolucionária? Considerando o período em que Hilda escreveu suas dramaturgias (1967-1969), uma mulher tomando a frente da ação dramática, o que isso significa? Que não foram os militares que fizeram “revolução” em 1964. Quem fez parte de uma revolução foi Hilda Hilst.

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Referências

HARDT, Michael; NEGRI, Antonio. Parte 2: Transições de Soberania: Soberania Imperial.In: Império. Tradução de Berilo Vargas. Rio de Janeiro: Record, 2001;

HILST, Hilda. Teatro Completo: Volume 2: O Verdugo seguido de A Morte do Patriaca. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2018;

PALLOTTINI, Renata. Do Teatro de Hilda Hilst. In: Dramaturgia: a construção da personagem. São Paulo: Perspectiva, 2013;

ROSENFELD, Anatol. Parte 1 – A Teoria dos Gêneros: Gêneros e Traços Estilísticos. In: O Teatro Épico. São Paulo: Perspectiva, 2002.



Resenha por Josilene Nery

A peça o verdugo foi publicada em 1969, a trama gira em torno de um carrasco que se recusa a executar uma sentença - enforcar um homem que professava discursos revolucionários e inflamava o povo - por quem era respeitado e amado.

   Nas linhas acima traçamos um breve resumo da  trama hilstiana que em apenas dois atos tece uma narrativa envolvente e através de diálogos  secos  e muitas imagens nos apresenta as personagens e suas camadas.

O verdugo, o carrasco que vive um dilema ético e é apoiado pelo filho, a esposa que prioriza as necessidades imediatas em detrimento de padrões morais e éticos e é seguida pela filha, os juízes que se colocam à disposição para fazer o que for preciso para que se execute a lei e o povo que demonstra uma volatilidade de acordo com o discurso.

  Por meio dessas personagens e suas respectivas alegorias a escritora, dramaturga e poeta Hilda Hilst traz à baila dilemas morais e entraves políticos que permeiam a sociedade em diversos momentos de sua história. 

O que nos permite dizer que trata-se de um texto atemporal, mesmo porque em momento algum  há marcas temporais que nos indiquem quando e onde se passa a narrativa. Podendo assim, ser em qualquer tempo e qualquer lugar.

Porém, sabendo do contexto histórico brasileiro da época  em que o texto foi escrito (1969), e da firme opinião política da escritora frente às ações antidemocráticas do governo ditatorial brasileiro e a perseguição feita aos que contestavam o regime, a leitura ganha outros contornos.

Visto que, na nossa história recente, foram muitos os verdugos que torturaram e mataram nos porões da ditadura, no entanto, sem um resquício de dilema moral,  muitos rostos foram encapuzado, tal qual o “homem” sem nome citado na peça,  retirados de  casa sem jamais retornar.

Trata-se de uma peça altamente crítica, em que as mazelas do estado são escancaradas, assim como a parcialidade da justiça que faz valer a máxima maquiavélica “ os fins justificam os meios”, seguida tanto no Brasil ditatorial, como no país imaginário em que se passa a história do verdugo.

O personagem do verdugo representa o despertar do cidadão e seu processo de desalienação, na peça, promovido pelas palavras proferidas pelo homem, cujo nome não nos é apresentado, mas sua fala  “incendiava as pessoas” e faziam elas acreditarem com novo modelo de sociedade. 

A presença dessa figura que debate a realidade denota que o teatro hisltiano flerta com o teatro dialético de Brecht, pois os dilemas do palco são análogos aos vividos no Brasil daquele tempo. Já o personagem do verdugo simboliza  o despertar do cidadão e seu processo de desalienação promovido pelas palavras proferidas pelo homem, cujo nome não nos é apresentado, mas que com seu discurso messiânico prega o amor  e a revolução.

  Para Alcyr Pécora essas representações dão a  obra teatral de Hilda um viés didático político declarado:

Trata-se de um teatro alegorizante , de feitio genericamente didático ou doutrinário, cujo assunto básico gira em torno de uma situação de opressão institucional [...] Acontece que Hilda, sem deixar de construir suas peças  próximo a esses lugares  comuns da época, também introduzia variantes notáveis no desenvolvimento deles. ( PECORA, 2015)


Em O Verdugo, Hilda  condensa a realidade brasileira durante a ditadura militar que condenava cidadãos ao desaparecimento apenas por se posicionar politicamente, e usava a aparelhagem do poder para blindar as ações e parecer que estava tudo dentro da legalidade, já que eram eles mesmo quem conduziam as leis e as narrativas.

O teatro de Hilda é uma alegoria do Brasil do passado, mas se observarmos mais atentamente o cenário político brasileiro, constataremos que algumas práticas não foram abandonadas.


Resenha por Wiliam Siqueira

Resenha: O verdugo de Hilda Hilst


Algumas vezes na vida nos vemos em uma situação que nossa razão sabe o que deve ser feito mas nossa emoção nos impede. Já passou por isso? E quem falou mais alto, a razão ou a emoção?

Este dilema está na peça de Hilda Hislt, O verdugo, peça escrita entre 1967 e 1969 e publicada neste ano. Trata da questão da violência em plena endurecimento da ditatura militar no Brasil. 

Segundo o dicionário: Verdugo é o indivíduo responsável pela execução da pena de morte ou de outros castigos corporais, carrasco, algoz, indivíduo cruel que inflige maus-tratos a alguém.

Na história, o verdugo recebe a incumbência de matar uma pessoa condenada à morte, porém ele por questões e reflexões pessoais decide desobedecer a ordem. O que desencadeia uma séria de situações no desenrolar da dramaturgia.

No texto de Hilda todos os personagens não tem nomes próprios e sim são chamados pelos nomes de suas funções sociais como: verdugo, mulher, filho, juiz, noivo da filha e assim por diante. Observamos aqui que muitas vezes somos vistos pelos demais apenas para o que servimos, o que demonstra apenas nossa utilidade para a sociedade. 

CENÁRIO: Casa modesta, mas decente. Sala pequena. Mesa rústica. Dois bancos compridos junto à mesa. Um velho sofá. Uma velha poltrona. Uma porta de entrada. Outra porta dando para o quarto. Paredes brancas. Dois pequenos lampiões. Aspecto geral muito limpo. Nessa sala não deve haver mais nada, nada que identifique essa família particularmente. Morem numa vila do interior, em algum lugar triste do mundo. Mesa posta. O verdugo, a mulher, a filha e o filho estão sentados à mesma. A mulher deve estar servindo sopa ao marido. É noite.

Na descrição do cenário inicial acima, temos um trecho importante que indica que esta pode ser qualquer família, qualquer pessoa, “. Nessa sala não deve haver mais nada, nada que identifique essa família particularmente. Morem numa vila do interior, em algum lugar triste do mundo.”, ou seja, aqui temos mais um indicio que somos vistos apenas pelo que podemos gerar para o bem comum ou o bem daqueles que comandam, estão no poder e nas tomadas de decisões.

Sendo assim, você acha que sua opinião e seus sentimentos são importantes para os demais? Algumas vezes por imposição de outros ou medo do julgamento alheio simplesmente agimos sem refletir, agimos pelo que dizem que devemos fazer e não como gostaríamos. 

A personagem principal da história ao agir diferente nos mostra que algumas vezes as consequências de nossas decisões fora do padrão esperado pode nos atrapalhar muito e ainda gerar ações e reações dos demais que nunca se quer imaginamos, como no caso de sua esposa que decide fazer o trabalho em seu lugar, mesmo porque há finanças envolvidas na situação e muitas vezes o dinheiro é fator decisivo, ainda mais num mundo cheio de injustiças sociais como o nosso, com tantos desníveis econômicos entre países, cidades, famílias e pessoas.

A autora que também é poetisa nos leva a refletir também sobre aquilo que matamos ou deixamos viver dentro de nós e ao nosso redor. 

Wiliam Siqueira

Ator, DRT 55251

Jornalista, MTB 47981







Bibliografia:

Teatro reunido, Hilda Hilst

Clube de leituras dramatúrgicas Cia Nós de teatro, resenhas de: Nathalia Rios Moreira, Natália Dias Maciel Campos, Sávio Lima Lopes e Josilene Nery

O verdugo e a revolta como princípio ético, Rubens da Cunha