Caburé

Resenhas

Experiência de leitor a expectador  por Wiliam Siqueira

Muito prazer, me chamo Wiliam Siqueira, sou jornalista por formação, professor de idiomas e ator. Nas últimas semanas venho participando do Clube de Leitura Dramatúrgica da Cia. NÓS de Teatro.

Em um dos encontros lemos a peça Caburé de Nieve Matos, dramaturga capixaba de Vitória-ES, a peça tem composição musical e letra de Elinho Guimarães. A leitura foi deliciosa e logo após debatemos um pouco sobre o texto. No encontro seguinte tivemos a oportunidade de conversar com a autora do texto, o que foi sensacional, pois pudemos entender e descobrir coisas por trás do texto, pois sempre há e às vezes são interessantíssimos, como neste caso e também expomos nossas questões e comentários direto a autora, o que foi magnífico.

No dia seguinte pude assistir uma apresentação da dramaturgia e aí é que vem o mágico, pois quando lemos um livro, texto teatral e etc. sempre criamos imagens não é mesmo? No meu caso que sou ator, quando leio um texto dramatúrgico já imagino figurinos e cenários por exemplo. E ao ver o texto no palco, percebi que algumas coisas que visualizei eram muito parecidas com o realizado. Outras foram completamente diferente da minha cabeça, e tudo bem, pois é o momento que podemos perceber as infinitas leituras de um artista e do expectador.


Wiliam Siqueira

Ator, DRT 55 251 SP

Jornalista MTB 47981 SP

Resenha por Josilene Nery

A dramaturgia Caburé é fruto de uma pesquisa realizada pelo Instituto Tambor de Raiz,  sediado em Conceição da Barra,  junto às comunidades quilombolas da região do Sapê do Norte, no Espírito Santo.

A região citada foi uma das principais portas de entrada dos negros escravizados no estado, mas também foi um dos principais  focos de resistência, haja vista para a quantidade de comunidades quilombolas que se formaram no entorno.

O texto é assinado pela dramaturga e encenadora capixaba Nieve Matos, que foi convidada pelo instituto para escrever a dramaturgia, porém, como ela mesmo diz, “não se trata de um texto de gabinete, a peça foi construída de forma colaborativa em sala de ensaio”. 

Logo, o processo de politização começa se dá também no âmbito da criação, visto que esse método rompe a hierarquização do trabalho e insere o ator/compositor ativamente na construção.

A trama tecida em Caburé é polifônica, é a voz da dramaturga, somada a voz dos atores, a dos entrevistados na pesquisa e a todos que os antecederam.

E essas vozes, juntas, recuperam passagens da vida de personagens históricas,  lideranças quilombolas como o Negro Rugério, Constância de Angola, Silvestre Nagô e Benedito Meia-Légua, ícones da resistência à escravidão no Sapê do Norte negros alforriados e outros que mesmo sob o julgo dos seus senhores se articularam para organizar um levante em prol da libertação de outros negros escravizados.

Homens e mulheres que lutaram com as armas que dispunham para por fim a tirania e desumanização de seus corpos.

Caburé reconta a história utilizando diversos recursos do teatro épico como o song, todas as cenas são costuradas por músicas que auxiliam na construção da narrativa, introduz fatos novos e situa o público no espaço tempo.

A peça tem um jogo de cena muito dinâmico, são 4 atores interpretando quase o dobro de personagens, porém as marcações são bem definidas o que  faz com que não percamos o fio da narrativa e saibamos identificar as mudanças de personagens.

Um dos elementos que ajudam nessa marcação é a movimentação corporal, que também está associado ao orixá de proteção de cada personagem.

Nada em Caburé é por acaso. Todos os elementos cênicos e as escolhas estéticas fazem parte do contexto, haja vista para o nome da peça, Caburé é o nome de uma ave comum na região.

Segundo os relatos recolhidos, os negros escravizados imitavam o som da ave para se comunicarem, transmitir recados, alertas.

E essa dramaturgia no contexto em que vivemos é tal qual um grito de alerta, para que não esqueçamos nossa história.

Que relembremos os heróis que não estão emoldurados nos museus, mas que lutaram até a última gota de suor e sangue para que tenhamos o vislumbre do que seria a liberdade.

Caburé é a nossa história contada pelo nosso povo, não um povo servil e animalizado como pintaram os registros oficiais, porém um povo inteligente e articulado, que dominavam diversas tecnologia, e como nós, usavam a arte, como ferramenta de resistência.


Referências

BONFITTO, M. (2006). O ator compositor (2a. ed.). São Paulo: Perspectiva

COSTA, Iná C. Por uma crítica cultural dialética. In: O Sarrafo, jornal criado pelos grupos articulados dentro do movimento Arte Contra a Barbárie, n 1, março de 2003


Resenha por Nathalia Rios Moreira

RESENHA CABURÉ

Benedito Meia Légua, Constância D'Angola, Negro Rugério e Silvestre Nagô são personagens de uma história de luta e resistência. Eles enfrentaram muitas adversidades e desafios em suas vidas, mas não desistiram de lutar por sua liberdade e de seu povo.

A peça começa com os três biombos fechados, criando um clima de mistério e espera no público. A luz é baixa, criando sombras projetadas nas paredes do teatro. De repente, um som estrondoso é ouvido e um dos biombos se abre, revelando um cenário que remete à floresta, com árvores altas e densas e plantas exóticas.

Os personagens surgem de dentro das árvores e começam a interagir com o ambiente, dançando e cantando em uma linguagem própria, que remete às tradições do Timcumbí do Sapê do Norte. A música é vibrante e envolvente, e os atores usam figurinos coloridos e chamativos, com adereços que remetem às plantas e aos animais da região.

À medida que a peça avança, os outros biombos se abrem, revelando novos cenários e personagens. Em um deles, os atores encenam um ritual de cura, usando ervas e plantas medicinais. Em outro, uma história de amor é contada, com diálogos poéticos e emotivos.

Ao longo da peça, os biombos vão sendo abertos e fechados, criando diferentes atmosferas e cenários. A luz é um elemento fundamental, criando sombras e efeitos que realçam a beleza e a poesia da peça.

No final, os atores se reúnem no centro da arena, cantando e dançando em uma celebração que une todas as histórias e personagens da peça. A luz se apaga e os biombos se fecham, deixando no ar a sensação de que a magia e a beleza do Timcumbí do Sapê do Norte estão presentes em cada cena da peça.

Benedito Meia Légua: um líder quilombola, foi capaz de proteger sua comunidade contra o ataque de uma unidade inimiga. Sua arma mais poderosa não era uma arma física, mas sua fé em São Benedito, que o protegeu de balas inimigas. Constância D'Angola, outra líder quilombola, salvou crianças e velhos de uma situação perigosa e liderou uma contraofensiva bem-sucedida contra os invasores.

Negro Rugério: lutou bravamente contra a traição de um dos seus e defendeu sua comunidade com facão na mão e capoeira na perna. Infelizmente, ele não sobreviveu à luta, mas sua memória viveu entre seus companheiros de luta. Silvestre Nagô foi vítima da brutalidade

Negro Rugério: Nossas cercas que construímos não foram suficientes para conter a traição o chamado "Marculino", que havia passado nosso plano para seu mestre. nunca entendi os negros controlados que caçam e matam seu próprio povo. Corpos empilhados ao nosso lado. E do lado do inimigo. Era matar ou ser morto. Nunca houve apenas uma fuga da senzala, uma fuga da luta escolha. O dia clareou, a tarde chegou e a noite chegou. E por três dias o quilombo resistiu com facão na mão e capoeira na perna. E foi numa escaramuça com um capitão do mato apelidado de Cearense que fui para o chão, mas levei a maldita coisa comigo.

Silvestre Nagô: Chegou a notícia da captura do Quilombo de Sant’Ana pelas forças do governo ao porto de São Mateus, era difícil acreditar no que se ouvia: engenhos de farinha queimada, canoas machado e os sobreviventes presos novamente, desta vez na prisão cidade. Terminado o assalto, espancaram-me na praça do Porto, rasgaram-me o fraque, levaram meu chapéu havia também a carne esquartejada do negro Ruger naquela praça foi exposto. Não fazia sentido continuar nesta vida. E foi na foz do rio Itaúnas com mar e viveu seus últimos dias.

Constância de Angola: Quando o Zé Diabo me apanhou com um chicote na mão e uma pistola dois tiros por segundo, eu preparava dicumê na margem do Cricaré. como dois insetos nós olhamos um para o outro O primeiro tiro veio como um trovão que você vê primeiro uma lágrima de luz e então você ouve um barulho. E como um raio eu me esquivei. Eu não tive tanta sorte no segundo tiro, que passou pelo meu corpo. Mas eu não daria a esse desgraçado o prazer de se ver morrer. E com um soco direto abri sua garganta de orelha a orelha antes de deixar meu corpo cair.

Resenha por Nathália Dias Maciel Campos 

As raízes históricas e culturais do Espírito Santo não são amplamente  difundidas no nosso estado. Principalmente quando falamos do lado histórico afro brasileiro, que veio com a escravidão dos negros nas fazendas. Por estarmos  localizados no litoral, fomos uma capitania visada pela monarquia portuguesa. Sendo  assim, é fato que a escravidão foi um marco (triste) no nosso território, deixando o seu  legado cultural e social. 

Segundo o professor Cléber Maciel, pesquisador da história africana no Espírito  Santo, intelectual e militante negro, a maioria dos povos trazidos da África para o Espírito Santo era de origem Banto, o que indica que a cultura desse povo também foi  instituída aqui e absorvida por algumas comunidades. 

O pesquisador aponta que a população africana de origem Banto registrada no nosso estado, o ES, eram muito rebeldes e contrários a dominação escravocrata.  Estes eram marcados por organizar revoltas, serem organizados, em relação à luta  contra os escravistas, e destemidos. O que se pode ver quando lemos a obra Caburé,  dramaturgia da autora Nieve Matos, que busca contar a história de luta de um dos  maiores quilombos do norte do estado, em São Matheus, o quilombo de Nego Rugério,  localidade que era habitada por negros de origem Banto.  

Caburé é uma dramaturgia que traz a história do Ticumbi, que de acordo com  os registros de Cleber Maciel “trata-se de uma dança que acontece, segundo a  memória e a genealogia de seus integrantes, há mais de 200 anos na região norte do  Espírito Santo” (MACIEL, pág. 216, 2016). É a partir desse mote que vemos a luta de  Nego Rugério em tentar salvar os seus irmãos escravizados e liderar um ataque às  fazendas que mantinham outros negros em condições desumanas, assim como  aconteceu em todo período escravocrata.  

A peça de Nieve Matos traz diálogos de Nego Rugério com Dona Rita, uma  sinhá que pretendia manter os seus negócios de compra da farinha de mandioca e  comercializar nos portos. A produção da farinha era importante para os senhores de  engenho e foi posta como moeda de troca na história de Nieve Matos, a cada 100  sacas haveria uma libertação de um irmão escravizado.

A trama da dramaturga aborda a questão da escravidão de maneira única e  vívida. Vemos a formação dos quilombos, a sua funcionalidade e a organização do

povo escravizado em uma tentativa de libertar seus irmãos da crueldade que viviam.  Outro destaque vai para as canções que são postas na dramaturgia; a peça é toda  intercalada pelas canções, que segundo as rubricas, são encenadas pelos próprios atores da cena.  

As canções entre as cenas são como uma história a parte daquelas que já  foram postas entre os personagens que compõem a cena. São também como  presságios do que irá ocorrer no decorrer das próximas cenas.  

A leitura da peça da autora Nieve Matos traz a memória a luta dos negros  escravizados nas lavouras do Brasil tiveram e suas reverberações em nossa história e sua constante luta por direitos e dignidade social: 

Para os negros, o fim da escravidão não significou o fim dos sofrimentos e  das humilhações, mas foi o início de novas lutas pelo reconhecimento da  dignidade de ser livre; lutas por trabalho, salários justos, comida, saúde, educação e moradia; lutas contra o preconceito de cor, a discriminação racial e o racismo; lutas contra a violência policial, o extermínio das crianças e  adolescentes negros; lutas contra a exploração das mulheres negras. Enfim, lutas em defesa dos direitos que a própria Constituição Federal atual estabelece para um cidadão brasileiro livre. (MACIEL, pág. 104. 2016.

Infelizmente, a sociedade sem muito conhecimento, costuma propagar a ideia  de que os negros escravizados aceitaram passivamente a escravidão e todo o  sofrimento pertencente a esse movimento. Entretanto, quando estudamos vemos que  desde a captura em suas terras natais o povo negro resistiu e formulava 

saídas/revoltas a fim de conquistar sua liberdade.  

Obras como a da autora Nieve Matos auxiliam-nos a reafirmar a importância do  estudo e do conhecimento da história dos povos originários do nosso território. Assim  como os indígenas que estiveram aqui, os povos trazidos do continente africano são  responsáveis pela formação social de hoje. Lembrar que o movimento de luta dos  negros vai além de ser algo que já passou, mas um reflexo social da necessidade de  políticas afirmativas e combate severo ao racismo e qualquer forma de violência ao  povo negro pela sua historicidade.  

No momento em que a leitura foi feita por mim, rememorei vários textos sobre  a luta dos negros que foram escravizados, no entanto, há um poema de Newton  Braga, autor cachoeirense – portanto, com muito mais sentido ser associado a essa  dramaturgia, por se tratar de literatura de autoria capixaba –; o poema “Mandinga de  Negro”

Mandinga de negro 

Newton Braga 

(Sobre o motivo goiano do cativeiro)

Nêgo véio, feiticeiro, 

nêgo véio tá no tronco. 

Patrão disse que roubou. 

Nêgo véio n’um roubou... 

Nêgo véio tá no tronco  

Nêgo véio tá se rindo  

tá cuspindo, négo véio 

Nêgo véio n’um roubou... 

Feitô mal, infezadô, 

dá chicotada, chicotada. 

Nêgo véio tá se rindo  

Nêgo véio n’um roubou... 

O’a chicotada, nêgo veio. 

Nêgo véio, cadê dô? 

Olha o sangue, nêgo véio. 

Nêgo veio, cadê dô? 

.......................................................................................................................... 

(Há gritos de dor no cafezal distante. O filho do patrão corre endemoninhado,  

de cá pra lá, de lá pra cá. Ninguém perto do filho do patrão. E o chicote  cantando nele. 

E o filho do senhor morreu das pancadas que vinham do ar. 

Que ninguém deu) 

.......................................................................................................................... 

— E matáro o nêgo véio?  

— Nego véio? qui o quê! 

Patrão morre, feitô ou morre, 

se nêgo véio morrê.  

BRAGA, Newton. Poesia e Prosa. 2ªed. ES: Vitória/UFES. 1993. 



São as palavras de Newton Braga eternizadas nesse poema que mostram a  resistência emocional e física do negro escravizado no Espírito Santo, além da  dependência do funcionamento social depositado na força de trabalho escravagista  do estado. Vemos nesse poema uma adição as lutas retratadas no quilombo de Negro  Rugério. Não há uma espaço para uma análise profunda do poema, no entanto, não  se pode especificar se a sua escrita foi o registro de um fato histórico ou apenas uma  alusão aos acontecimentos históricos do estado.  

Além de todo potencial literário da poesia de Newton Braga, em comparação a  dramaturgia Caburé, esse texto é um complemento a questão abordada por Nieve  Matos, se tratando da emergente necessidade de nós, capixabas, sempre estarmos  atentos a historicidade, ao reconhecimento das múltiplas culturas do território espírito-santense, e a demanda de conhecimento das raízes históricas e sociais da formação  da população do nosso estado. 

Referências: 

BRAGA, Newton. Poesia e Prosa. 2ªed. ES: Vitória/UFES. Pág. 189.1993. 

Maciel, Cleber. Negros no Espírito Santo / Cleber Maciel. –2ª ed. – Vitória, (ES):  Arquivo Público do Estado do Espírito Santo, 2016. 282 p. : il. – (Coleção Canaã, v.22) 

MATOS, Nieve. Caburé. 


Resenha por Sávio Lima Lopes

Caburé, de Nieve Matos: entre a identificação dramática e a racionalidade épica. 

Por Sávio Lima Lopes. 

Escrita em 2019, Caburé é dramaturgia de Nieve Matos, com composição musical e letra de Elinho Guimarães e também com direção de arte de Antônio Apolinário. Nieve Matos é dramaturga, atriz, diretora teatral e professora, além de bacharela em Direção Teatral e Mestre em Artes Cênicas. Escreveu também “Cinzas de um carnaval”, com o também dramaturgo Fernando Marques e é a idealizadora do Coletivo “Elas tramam”, projeto fundado em 2017 que promove e difunde a escrita de textos para o teatro, através de um coletivo de quatorze mulheres do Espírito Santo. 

Caburé, é fruto de uma longa pesquisa realizada a partir do Instituto Cultural Tambor de Raiz, de Conceição da Barra, incluindo diversas visitas aos quilombos remanescentes para buscando valorizar a história oral contada pelos moradores. 

A peça busca recontar a história de um dos quilombos mais importantes do Porto de São Mateus - um dos principais desembarques da chegada de negros escravizados no Espírito Santo. Como prescreve a boa dialética, o mesmo lugar, que concentra o enorme volume de negros escravizados, é, também, um dos mais importantes pontos de resistência à escravização, contando para isso, com a formação de diversos quilombos. Um dos mais importantes pontos de resistência, foi o quilombo de Vila de Santana, hoje, um bairro de Conceição da Barra. Foi este quilombo, o liderado por Negro Rugério. 

O enredo se passa no norte do Espírito Santo e é baseado em personagens reais que participaram de um levante negro. A história gira em torno de Negro Rugério, líder quilombola, e Dona Rita Cunha, proprietária de terras. Dona Rita propõe um acordo de paz a Rugério, oferecendo proteção em troca da produção de farinha de mandioca pelos quilombolas. Rugério aceita, mas pede a alforria de um homem a cada 50 sacas de farinha produzidas. 

Na cena seguinte, Silvestre Nagô, um homem livre, conversa com Rugério sobre a venda da farinha no porto e a situação dos escravos. Rugério planeja um levante contra a opressão dos brancos e a favor da liberdade. Silvestre traz ferramentas para a luta, feitas por Mateus Purquério, um cativo do comerciante

Boaventura. Rugério convoca Viriato Cancão-de-fogo e Constância D'Angola para a luta, e a peça segue com cenas de dança e música. 

No terceiro ato, Constância D'Angola procura Mateus Purquério, que está escondido. Ela informa que Boaventura está desconfiado e que eles precisam sair do porto usando-o como escudo. Mateus mostra as ferramentas que fez para a luta. 

Chama atenção no texto, a utilização da música de maneira central - não acessória e também, as personagens coletivas que é uma técnica utilizada por Brecht para representar grupos ou coletividades, em vez de indivíduos (geralmente associados à individualidade burguesa).. Essas personagens, em geral, não são desenvolvidas com profundidade psicológica, mas sim representam um grupo social, uma classe ou uma coletividade. Funcionam, muitas vezes, como um coro, comentando e refletindo sobre as ações dos personagens principais e fornecendo perspectivas diferentes 

No entanto, cabe aqui ressaltar, que Nieve argumenta que, na produção da peça, trabalha-se com o que se tem; e muitas vezes, não há muitos atores; então, os mesmos atores se revezam nos personagens. Sendo intencional ou não, o efeito produzido, serve ao teatro épico.. 

Ao criar essa distância entre o espectador e as personagens, o teatro épico busca evitar que o público se identifique emocionalmente com os personagens e se envolva na história de maneira passiva. Em vez disso, o objetivo é estimular o pensamento crítico e promover a análise das estruturas sociais e políticas retratadas na peça. 

Dessa forma, as personagens coletivas contribuem para o efeito de distanciamento no espectador, uma vez que não são apresentadas de maneira realista ou individualizada, mas sim como representantes de um grupo ou classe social. Isso permite ao público manter uma postura crítica em relação ao que está sendo representado no palco. 

Por fim, é possível pensar nesta peça como uma estrutura dialética - intencional ou não: a música propõe um embalo rítmico, seduzindo o espectador a embarcar; as personagens coletivas impedem esse balouçar musical sedutor - exigindo que mantenha-se atento. No fim, na síntese, o texto inevitavelmente provoca uma identificação - ao menos em parte do público - espírito-santense: tomar consciência de que muita luta se produziu aqui. E que conhecer a história de nosso território é politizar a nossa existência. É esse o poder de Caburé.


Referências: 

https://www.portaldedramaturgia.com/profile/nieve-matos 

https://elastramam.wordpress.com/ 

http://conaq.org.br/noticias/peca-retrata-resistencia-no-quilombo-do-negro-rugerio/