Política & Conflitos

Mesmo longe dos focos de conflito, Caxias do Sul, desde a sua formação, esteve envolvida nos grandes eventos locais e mundiais. Fique sabendo um pouco como repercutiram as revoluções e guerras em Caxias do Sul.

Longe dos centros políticos do estado, a região colonial italiana não passou ilesa pelas várias revoluções e conflitos locais e mundiais. Talvez pelo distanciamento e por se sentir excluída do eixo político, a região tendeu a simpatizar, apoiando ideias e grupos que, de uma ou de outra forma, questionaram o status quo.

A população também não esqueceu as suas origens quando conflitos eclodiram do outro lado do oceano, mexendo com os sentimentos da população, que neste momento precisou lidar com sua identidade.

Manifestação da Liga de Defesa Nacional contra o fascismo, defronte à sede social do Clube Juvenil.Caxias, 22/05/1942. Autoria Studio CalegariFundo João Brusa Netto. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Os colonos se revoltam

Os novos ares trazidos pela República e pela emancipação acenderam entre os colonos o desejo de participar ativamente da vida política. As antigas cartas, reclamando e exigindo, deram espaço para as ações. Foi assim que, na carona das disputas entre Silveira Martins e Júlio de Castilhos em relação à República, envolveram os colonos, que desde 1890 se puseram de um lado ou de outro, por motivos pessoais ou vingança. E assim foi até a Revolução Federalista de 1893.

Os imigrantes já haviam tomado partido na disputa e, mediante o resultado da eleição para o Conselho, realizada pela primeira Junta Governativa Municipal, teve início a primeira revolta dos colonos, em novembro de 1891.

Líderes da primeira Revolta dos Colonos. Em primeiro plano, ao centro, de farda, o delegado de polícia Francisco Januário Salerno, e à extrema direita, com uma faixa ao peito, o chefe Afonso Amabile.Vila de Santa Tereza de Caxias, 15 de novembro de 1891.Fundo João Spadari Adami. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Os ânimos não se acalmaram, pelo contrário: a Revolução de 1893 só vai agravar as constantes tensões entre governo e colonos. Em 1894, o Intendente teve de enfrentar um dos momentos mais tensos, quando a "Villa" foi invadida por revolucionários federalistas sob o comando de Belisário Baptista, chefe político da Região de Cima da Serra. Seus mais de 300 homens, saquearam e atacaram edifícios públicos, chegando a executar o Chefe do PRR local, Tenente-coronel Miguel Antonio Dutra Netto, conforme conta o jornal O Cosmopolita, de 28 de junho de 1903.

O Cosmopolita de 28 de junho de 1903, capa. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

A Grande Guerra

Às vésperas do conflito mundial a ansiedade entre a população caxiense crescia. É importante entender que, neste momento, a população de Caxias é formada, em sua maioria, por descendentes de italianos e conta ainda com muitos nascidos na Itália. Exemplo disso são as comemorações do dia 20 de setembro na época, que lembravam tanto, se não mais, a tomada de Roma em 1870, marco da unificação italiana, juntamente com a data Farroupilha.

Com a eclosão do conflito, alguns caxienses se alistaram no exército italiano. Uns tombaram na Europa e outros retornaram. Em homenagem aos que não voltaram, foi colocada uma placa sob o busto do poeta italiano Dante Alighieri, que repousa na praça central da cidade.

Angelo Bracagioli, um dos combatentes que não voltaram da Grande Guerra, entre 1914 e 1918. Segundo seu irmão Alberto Bracagioli, Angelo alistou-se devido a uma desilusão amorosa.Fundo Angelo Bracagioli. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Albo d’Oro dei Caduti in GuerraRafael Zambelli: combate e morte durante a Primeira Guerra Mundial. Soldado nascido em Caxias do Sul foi capturado pelos alemães durante o conflito e morreu em 2 de março de 1918. Seu nome aparece na lista de mortos do Governo Italiano.


O monumento a Dante Alighieri, na praça de mesmo nome, foi inaugurado em 15 de novembro de 1914, na administração do Intendente Penna de Moraes. As placas de bronze vistas na fotografia foram colocadas em 1921, por ocasião do Centenário da morte do poeta. A placa afixada na parte inferior do monumento homenageou o sargento Raffaele Zambelli e o soldado Angelo Bracagioli, caxienses voluntários do exército italiano, mortos durante a Primeira Guerra Mundial, lê-se:

“1915-1918 SARGENTO ZAMBELLI RAFFAELE SOLDATO BRACAGIOLI ANGELOFIGLI DI QUESTA TERRA MORTI COMBATENDO PER L ITALIA CAXIAS RICORDA”.
Grupo comandado por Felipe Portinho, participantes da Revolução de 1923. Aparecem como “Os Heróes [sic] da Serra” no Álbum dos Bandoleiros, Porto Alegre, 8ª ed. 1924. p42.Fundo AHM. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Dr. Romolo Carbone, diretor médico da Cruz Vermelha, na enfermaria do Hospital Pompéia, atendendo ao Sgto. Joaquim Ignácio Velho, ferido no ataque a São Francisco de Paula, em 06/nov./1923. Identificados, conforme a máscara:Caxias, nov./1923. Autoria Giacomo Geremia. Fundo Luiz Henrique Santini. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Revolução de 1923

Caxias não fazia parte do eixo político gaúcho. A cidade crescia preocupada com o trabalho e quase que alheia às disputas políticas estaduais da Velha República. A eclosão da revolução foi vista com simpatia, principalmente entre aqueles que sentiam-se mais afastados do poder centralizado, os moradores do interior do município. Aproximar-se do grupo assisista passou a ser a forma de mostrar a insatisfação com o poder instituído.

A candidatura de Assis Brasil teve grande apoio na região, em especial, por motivos ligados à religião, já que Borges, por ser positivista, era tido como inimigo dos católicos. As más condições das estradas, que dificultavam o escoamento da produção, também justificavam o respaldo.

Na cidade, os chamados “bandoleiros” eram temidos, fazendo com que as pessoas se escondessem, como relata Vasco Peretti. No interior, a população era simpática aos revoltosos. Prova disso, é o caso dos irmãos Biondo, em Ana Rech, que provavelmente serviu para aumentar a antipatia dos colonos ao governo Borgista.

A morte de um Assisista

Amedrontada, a cidade se protegia dos ataques Maragatos. Em uma das principais investidas dos rebeldes, o jovem revolucionário Quintino Biazus, de 22 anos de idade, faleceu apesar dos esforços empregados pelo médico operador da Cruz Vermelha Caxiense Dr. Romolo Carbone.

O enterro de Quintino comoveu a cidade e foi acompanhado até o cemitério por cerca de três mil pessoas.

O comércio local fechou. Médicos, industrialistas, comerciantes, enfermeiros da Cruz Vermelha Caxiense com seus uniformes e distintivos, bem como representantes de todas as classes sociais compareceram ao cortejo.

Cortejo fúnebre do revolucionário Quintino Biazus, na então rua Júlio de Castilhos, entre as ruas Visconde de Pelotas e Marechal Floriano. Caxias, 17 de outubro de 1923. Autoria Giacomo Geremia.Fundo Família Dal Prá. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

No dia 14 de outubro de 1923, as tropas de Borges de Medeiros resolveram tomar a vila de Nova Trento onde estavam os revolucionários mais conhecidos da região. Quintino foi ferido no combate, transferido para Caxias e internado no Hospital Pompéia, onde veio a falecer.

Os revolucionários eram chamados de bandoleiros pelo jornal “O Brazil”, que na edição de 20 de outubro de 1923, cita o enterro:

“Heroismo inglorio e manifestação accintosa. Vimos deslisar pelas ruas da cidade o prestito funebre que acompanhou á necròpole o esquife daquelle revolucionario que tombou em Nova Trento em combate com as forças legaes. Vimo-lo, o grande cortejo, fazendo o trajecto que vae do hospital ao templo catholico, onde a encommendação foi solenne”

As cicatrizes do conflito foram tão profundas que Caxias esteve no roteiro da campanha de pacificação do Estado. O General Zeca Netto, em 1924, veio para cidade com a intenção de restabelecer o clima entre os adversários.

Discurso de Zeca Netto na Praça Dante.À esquerda, pode-se ler na faixa horizontal: “Sauda o Glorioso Condor dos Tapes” e na faixa vertical: “Salve Glorioso Chefe Dr. Assis”.Caxias, 1924. Autoria não identificada. Fundo Júlio João Eberle. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.


Getúlio Vargas acompanhado por correligionários. Entre eles, o Padre Luiz Victor Sartori (atrás de Vargas) , capelão militar no Palácio do Catete.Rio de Janeiro, déc. 1930. Autoria não identificadaCedência Venisio Sartori. Divulgação Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

1930, Caxias apoia Vargas

Depois dos acontecimentos de 1923, a região de colonização esteve mais ativa na vida política do Estado e Caxias apoiou fortemente Getúlio Vargas. Da região saíram tropas que se juntaram à coluna e marcharam até a capital federal. A Coluna do Nordeste integrou as forças revolucionárias golpistas sob o comando do general Waldomiro Lima, que saiu do Rio Grande do Sul e chegou ao Rio de Janeiro.

Abaixo, grupo de soldados caxienses comandados pelo Ge. Waldomiro Castilhos de Lima que integraram a “Coluna do Nordeste” na Revolução de 1930.

Na cidade, no ano de 1930, pelo tocar do sino da Igreja Matriz, foi reunida a população para receber a notícia da Revolução. A elite local apoiou Vargas e foi instalada em Caxias uma Junta Revolucionária e Governativa.

Os movimentos políticos se radicalizam

Fascismo

Em final dos anos de 1920 e durante toda a década de 1930, ocorreu em Caxias um movimento ligado ao fascismo italiano, organizado por agentes consulares, como o Dr. Romolo Carbone e o construtor Silvio Toigo. O movimento dirigiu-se à burguesia local e ocorreu devido a existência de uma sociedade formada por imigrantes italianos em sua maioria. Foi a partir das Sociedades Italianas que o movimento teve início, buscando aproximação com o Partido Republicano. O grupo fascista estava ligado aos detentores do poder econômico. Nos quadros fascistas destacaram-se industriais e médicos, o que relegou ao movimento um caráter elitista. O restante da população, como profissionais liberais, operários, colonos e as camadas médias, foram envolvidos apenas de forma indireta.

O núcleo fascista de Caxias, na década de 1930, se reunia na Sociedade "Principi di Napoli".
Grupo de homens do partido fascista fardado como os Camisas Negras, em frente ao prédio da Sociedade Príncipe de Nápole, na rua Júlio de Castilhos.Caxias, déc 1930. Autoria Studio Geremia.Fundo Studio Geremia. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Caxias, déc. 1930. Autoria Jacob Kappes Fundo Jacob Kappes. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Integralismo

As camadas médias urbanas e rurais se identificaram com o integralismo, inflamados pelo catolicismo e conservadorismo. O Integralismo em Caxias atraiu para suas fileiras, principalmente a mocidade católica, trabalhadores do comércio, profissionais liberais e pequenos proprietários. O núcleo local da AIB, fundado em setembro de 1934, se organizou por iniciativa do Vereador Humberto Bassanesi, tendo como sede, a Associação dos Empregados no Comércio da cidade. Atuando entre 1934 e 1937, a AIB realizou em Caxias uma série de comícios. Elegeu, em 1935, três dos sete vereadores e publicou o periódico "O Bandeirante".

Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Estado Novo

O operariado urbano até os anos de 1920 aproximava-se do anarquismo, em especial, os trabalhadores de descendência lusa e italiana. Já na década de 1930, tendiam a associar-se aos grupos trabalhistas e comunistas, ao mesmo tempo que, no interior, o cooperativismo se mantinha forte.

Porém, com o advento do Estado Novo, os grupos e movimentos foram postos na ilegalidade, e Caxias novamente se adaptou.

Manifestação na Praça Dante Alighieri em apoio ao Estado Novo. Lê-se na faixa afixada em frente à Catedral: "Os Caxienses saúdam no Estado Novo a extinção dos extremismos". O avião da Força Aérea sobrevoou Caxias do Sul a pedido do Sr. Júlio Maurício Sassi.Caxias. 1937. Autoria não identificadaFundo Família Saldanha. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

A despeito de perseguidos e presos, novamente a cidade esqueceu o passado que não interessava e saudou a chegada do novo Regime em uma praça em obras.

Thomaz F. de Almeida fala sobre sindicalismo e perseguição no Estado Novo. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

A Segunda Guerra Mundial

Com o andamento do conflito os ânimos ficaram exaltados na cidade, o apoio explícito ao fascismo se torna insustentável após a entrada do Brasil na Guerra. As associações fascistas se esvaziavam e a elite local migrou para o apoio aos grupos nacionalistas como a Liga de Defesa Nacional.

Durante o conflito mundial, em Caxias, a Praça Dante Alighieri converteu-se em palco das manifestações, como relata Serenita Maria Adami Giazzon (2013) no depoimento ao Banco de Memória Oral do Arquivo Histórico Municipal.

Em uma ocasião, na época da guerra, quando afundaram nossos navios, todo mundo saiu do cinema e foi para Praça, foi aquela aglomeração, aquele empurra-empurra, vou te dizer, foi uma coisa séria. Aí começaram os comícios, a gente participava, o pai era um entusiasta também. Eu ainda lembro do Natal Chiarello, do Olmiro de Azevedo, do Percy Vargas falando. Era sempre na Praça. (Depoimento Serenita)
Manifestação em repúdio ao Eixo nas ruas centrais da cidade.Caxias do Sul, RS. 1943. Autoria não identificada.Fundo João Spadari Adami. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

A praça também foi personagem central em uma das maiores polêmicas do período, a mudança de seu nome. A população de Caxias, indignada com o afundamento de navios brasileiros, saiu em manifestação pelas ruas, removendo as placas com os nomes de logradouros públicos relacionados aos países membros do Eixo. Os principais alvos foram a Praça Dante Alighieri e a Avenida Itália.

Jornal A época 22 de março de 1942. p.05.

Posteriormente foi organizado comício pela Liga de Defesa Nacional para inaugurar as novas placas, descrito em pormenores no jornal A Época nº 182 de 24 de maio de 1942.

Manifestação da Liga de Defesa Nacional que trocou o nome da Praça Dante Alighieri para Ruy Barbosa, defronte ao Banco do Estado do Rio Grande do Sul. Momento em que é descerrada a placa com a nova denominação.Caxias, RS. 22 de maio de 1942. Autoria Atelier Calegari.Fundo João Brusa Netto. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Em 1990, o Poder Legislativo Municipal propôs o retorno do antigo nome como uma homenagem àqueles que, junto a outras etnias, construíram a cidade de Caxias do Sul. O projeto foi aprovado por unanimidade. A partir de 12 de junho de 1990, a praça mais antiga da cidade recuperou o seu nome original, Praça Dante Alighieri.

Ao mesmo tempo em que era proibido falar italiano nas ruas e estabelecimentos, os pracinhas da Região Colonial Italiana eram enviados para participar da missão da FEB. Muitas vezes os pracinhas faziam o papel de intérpretes na Itália.

O período foi marcado por um forte sentimento de patriotismo e apoio, numerosos eventos tomaram a praça e as ruas da cidade mostrando o ânimo do povo caxiense, até que Caxias visse de perto os horrores da Guerra.

Despedida dos pracinhas da FEB no desfile na praça central,de onde partiram para Porto Alegre, rumo ao Rio de Janeiro. Caxias, [1942-1943]. Cedência de Alexandre Milesi. Divulgação Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami
Rua Sinimbu defronte à Praça Dante,Caxias. Autoria Studio Geremia.Fundo Studio Geremia. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Grupo de funcionárias [da seção de Cutelaria] da Gazola, Travi & Cia. [no término da jornada de trabalho].Caxias do Sul, [1944 a 1947]. Autoria Studio Geremia.Fundo Gazola. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

A Guerra chega a Caxias

Caxias entra efetivamente na guerra quando duas empresas são declaradas de interesse estratégico. A Metalúrgica Abramo Eberle, situada no centro da cidade, passa a confeccionar equipamentos e espadas para o esforço de guerra. Enquanto a Metalúrgica Gazola, mais afastada, passa a fabricar munições e projéteis.

Ato de Declaração de interesse bélico

Entre 1940 e 1942, o país começou a movimentar-se quanto à defesa e armamento, mobilizando a indústria para suprir do que viria a necessitar para a defesa e mobilização das Forças Armadas. Diante desta conjuntura, José Gazola, reúne os membros da empresa e resolve viajar ao Rio de Janeiro, oferecendo seus serviços aos órgãos técnicos do Ministério da Guerra e da Marinha, que não tiveram dúvidas em aceitar.

A empresa iniciou, então, a fase de produção de material bélico, utilizando-se de motores a óleo, gasolina e gás pobre, devido à falta de energia elétrica suficiente, tudo sob a fiscalização técnica militar. Por decreto (de 10 de Dezembro de 1942), a Indústria Gazola foi declarada “de interesse militar”, fornecendo peças e elementos de munição para artilharia e infantaria, espoletas, detonadores, petardos, bujões para bombas de aviação e atuando na recuperação de carregadores para projéteis e outros objetos de guerra e precisão. A responsabilidade deste compromisso foi grande e exigiu o aumento de espaço: em amplo terreno de 30.000 m², devidamente arborizado e adaptado, foi estabelecida a segunda unidade industrial da empresa, destinada exclusivamente à confecção de material de guerra.

Seção de Embalagem de material bélico da Gazola Travi & Cia. Ltda., cuja produção era destinada ao Exército Nacional.Caxias, [1943]. Autoria Studio Geremia.Fundo Gazola. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

A Guerra faz suas vítimas em Caxias

No dia 22 de julho de 1943, a cidade de Caxias é pega de surpresa quando uma explosão destrói um dos pavilhões da empresa Gazola. Agindo de forma intensa e acelerada, uma violenta explosão, ainda com causa indeterminada, fez voar pelos ares o principal pavimento da nova fábrica, destruindo-o completamente e ocasionando a morte instantânea de sete operárias, todas mulheres. Após um ano e cinco meses, fez uma oitava vítima, Anoema da Costa Lima. Com o advento da guerra, a mão de obra feminina passou a ser mais presente nas fábricas. No entanto, a indústria caxiense, desde os primórdios, se utilizava de força de trabalho feminina em larga escala devido ao menor custo.

A edição de 31 de julho de 1943 do jornal “O Momento” relata sobre a explosão que ocorreu na empresa Gazola, Travi & Cia., tal acidente vitimou sete operárias, seis delas fatalmente, deixando uma seriamente ferida.

Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Em homenagem às vítimas da explosão, foi construído, ainda em 1943, o Marco em Memória às Moças Operárias, junto a um dos pavilhões de munições da empresa. Seu formato lembra um obelisco e possui uma placa de bronze; o marco foi tombado pelo Município de Caxias do Sul e lançado no Livro do Tombo em 30 de junho de 2003.

Cerimônia cívica em homenagem às vítimas da explosão ocorrida em 22/07/1943. Caxias, 25/08/1943. Autoria Studio Geremia.Fundo Gazola. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Cerimônia cívica em homenagem às vítimas da explosão ocorrida em 22/07/1943. Caxias, 25/08/1943. Autoria Studio Geremia.Fundo Gazola. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Após o término do conflito e o retorno dos pracinhas, a cidade homenageou seus soldados. Hoje, Caxias do Sul conta com um Museu da FEB, mantido pela prefeitura.

O Momento, 11 de maio de 1946. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Homenagem aos ex-pracinhas, funcionários da Metalúrgica Eberle, nas Comemorações do Cinquentenário da empresa. Caxias do Sul, 02/abr./1946. Autoria Studio Geremia. Fundo Alberto Arioli . Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Golpe de 1964, o fim das liberdades

Desde a renúncia de Jânio Quadros as tensões cresciam. A exemplo do restante do Estado do Rio Grande do Sul, Caxias do Sul participa da Campanha da Legalidade. Entretanto a legalidade perdura por pouco tempo.

Operários caxienses desfilam em Porto Alegre na Campanha da Legalidade. Porto Alegre, 1961. Autoria não identificada.Fundo AHM. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Desfile dos calouros de Direito na praça Ruy Barbosa.Caxias do Sul, 1962.Fundo Diretório Acadêmico de Direito. Acervo do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

A sociedade convulsionada toma as ruas e, em 1964, o golpe de Estado Civil -Militar se impõe. O país entra em regime de exceção. Os jornais continuam a noticiar, mas não por muito tempo, pois logo é imposta a censura. Políticos, militantes, estudantes, sindicalistas e trabalhadores são perseguidos, sofrem ações repressivas e violências de todo tipo.

O país inteiro entra em um momento de silenciamento das vozes de oposição. Em Caxias do Sul, no dia 20 de abril de 1964, é revogada a última eleição municipal. Entre os políticos que tem seus mandatos cassados está o 2º Vereador mais votado, Percy Vargas de Abreu Lima, que hoje dá nome à Casa de Cultura Municipal. Também o Dr. Henrique Ordovás Filho teve seu mandato cassado e foi preso por 29 dias em Porto Alegre. Inaugurado em 2001, o Centro Municipal de Cultura foi denominado em sua homenagem.

Sessão comemorativa ao encerramento das aulas mantidas pelo Grêmio Atlético Eberle. Momento do discurso de Humberto Bassanesi, orador oficial do Grêmio Atlético Eberle. Em destaque, Percy Vargas de Abreu e Lima representando o Centro Cultural Tobias Barreto de Menezes.Caxias, 19/01/1942. Autoria Studio GeremiaFundo Metalúrgica Abramo Eberle S.A. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami

Ouça os depoimentos sobre as perseguições políticas durante a Ditadura Militar na playlist.

Entrevistas do Acervo do Banco de Memória Oral do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

O povo volta para a rua

A partir de 1979 a população caxiense volta a se manifestar em reunião para debater o projeto de anistia. Em 1984, a exemplo de todo Brasil, sai pelas ruas pedindo "Diretas Já".

Acervo do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
Acervo do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.


O Brasil volta ao regime democrático e logo vemos os jovens novamente tomando as ruas. Desta vez exercendo seu direito de manifestação e pedindo a saída do então presidente Fernando Collor de Melo.

Manifestações pedindo a saída do presidente Fernando Collor de Melo, no Largo de São Pelegrino.Caxias do Sul, 1992. Autoria não identificadaFundo Diretório Acadêmico de Estudantes UCS. Acervo do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.

Referências

  • Foto de Capa: Desfile militar do [9º BC] na inauguração da Sede do Tiro de Guerra 248. Junho de 1942. na rua Sinimbu defronte à Praça Dante, durante o período da segunda guerra mundial. Caxias, 1942-1945. Autoria Studio Geremia. Fundo Studio Geremia. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
  • ADAMI, João Spadari. História de Caxias do Sul 1864-1962. Caxias do Sul: São Miguel, 1962.
  • ALVES, Eliana Rela. Fides nostra, Victorian nostra: os italianos católicos e o processo de aquisição do poder político na intendência de Caxias: 1890 - 1924. Dissertação (Mestrado em História) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 1995.
  • CÂMARA MUNICIPAL DE CAXIAS DO SUL. A casa da comunidade: história do legislativo em Caxias do Sul. Caxias do Sul: São Miguel, 2019.
  • CHIARELLO, Antonio. Natal Chiarello – Vida e Obra. Caxias do Sul: Educs, 1995.
  • CONPAGNONI, Luiz. Porque tornei-me e continuo integralista. Boletim, Diretoria do Movimento Mocidade Integralista de Caxias do Sul. Acervo Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.
  • GIRON, Loraine Slomp. As sombras do littorio: o fascismo no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Parlenda, 1994.
  • LOPES, Rodrigo. Personagem esquecida da explosão da Gazola, Anoema da Costa Lima ganha placa em obelisco. Coluna Memória, 21 de julho de 2018. Disponível em: http://pioneiro.clicrbs.com.br/rs/geral/noticia/2018/07/personagem-esquecida-da-explosao-da-gazola-anoema-da-costa-lima-ganha-placa-em-obelisco-10515436.html
  • LOPES, Rodrigo. Memória: 20 anos sem o doutor Henrique Ordovás Filho. Coluna Memória, 03 de agosto de 2018. Disponível em: http://pioneiro.clicrbs.com.br/rs/geral/cidades/noticia/2018/08/memoria-20-anos-sem-o-doutor-henrique-ordovas-filho-10526525.html
  • MACHADO, Maria Abel. Construindo uma cidade: história de Caxias do Sul - 1875/1950. Caxias do Sul, RS: Maneco, 2001.
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  • TOMAZONI, Mário Alberto. Álbuns da cidade de Caxias (1935-1947): as reformas urbanas fotografadas. Dissertação (Mestrado em História) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2011.