Ceticismo e Espiritismo

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Considerações Iniciais. 4. Pirro. 5. A Grande Ilusão dos Sentidos. 6. Os Argumentos da Ilusão. 7. Dogmatismo e Ceticismo. 8. O Paradoxo do Cético. 9. Allan Kardec foi Cético? 10. Metodologia da Codificação Espírita. 11. A Influência do Ceticismo no Caráter Progressivo da Doutrina Espírita. 12. Conclusão. 13. Bibliografia Consultada.

1. INTRODUÇÃO

O que é ceticismo? Por que se opõe ao dogmatismo? Quem foi o seu maior divulgador? Como está posto na vida cotidiana? Como vê-lo dentro da ótica espírita?

2. CONCEITO

Ceticismo. Do grego skeptikos, aquele que inquire ou examina. Concepção segundo a qual algum ou todo conhecimento é duvidoso ou mesmo falso. Portanto, o homem deve renunciar à certeza, suspender seu juízo sobre as coisas e submeter toda afirmação a uma dúvida constante. Oposto a dogmatismo. (Jupiassu, 2008)

3. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Ideias céticas podem ser encontradas em muitos textos da filosofia grega antiga. Presentemente, é um dos temas mais ventilados no meio filosófico. É através do ceticismo que podemos questionar crenças e dogmas, alicerçados ao longo do tempo.

 Para os céticos não há verdade eterna que não possa ser posta em dúvida, não há autoridade que não possa ser rejeitada, não há teses que não possam ser analisadas sob a luz da razão.

 Para bem compreendê-lo, precisamos dividi-lo em: ceticismo sistemático e ceticismo moderado. O ceticismo sistemático, total ou radical, duvida da própria possibilidade de conhecimento do mundo; duvida de tudo. O ceticismo moderado utiliza a dúvida como modo de propor novas ideias.

 O ceticismo sistemático é impossível porque toda ideia é avaliada contra outras ideias. O ceticismo moderado deveria ser a norma de todo o aprendiz. Ele é sinônimo de mente aberta, que é a disposição para aprender novos itens e revisar crenças.

Os céticos rejeitam sociedades ou instituições autoritárias, em que uma única linha de pensamento é imposta a todos, deixando pouco espaço para a reflexão crítica.

4. PIRRO

Ceticismo é uma corrente de pensamento que remonta a Pirro, um jovem contemporâneo de Aristóteles que viveu no século IV a.C. Está contido nas compilações de Diógenes Laércio, Cícero e Sexto Empírico.

Diógenes Laércio, por exemplo, em Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres, apresenta o ceticismo de Pirro dentro de uma visão extremamente radical. Para Pirro, “Não há nada realmente existente, mas o costume e a convenção governam a ação humana: pois nenhuma única coisa é em si mesma mais isto do que aquilo”. De acordo com Charles Landesman, Pirro contradiz a si mesmo, pois fica implícito que costumes e convenções e ações são coisas realmente existentes. Talvez quisesse dizer que nossas crenças sobre o que existe baseiam-se em costume e convenção e não como o mundo é na sua realidade. (Landesman, 2006, p. 81)

5. A GRANDE ILUSÃO DOS SENTIDOS

Os céticos se baseiam na ilusão dos sentidos. Para eles, o mundo que se nos apresenta aos sentidos não é aquele que realmente interpretamos.

Thomas Hobbes (1588-1679) disse: “Quaisquer que sejam os acidentes ou qualidades que nossos sentidos nos façam pensar que existem no mundo, eles não estão lá, mas são apenas aparências e aparições. As coisas que realmente existem no mundo sem nós são os movimentos pelos quais as aparências são causadas. E esta é a grande ilusão dos sentidos”. “A grande ilusão dos sentidos” fundamenta-se em que as aparências não coincidem com as qualidades das “coisas que realmente existem no mundo”. (Landesman, 2006, p. 45)

6. OS ARGUMENTOS DA ILUSÃO

Para os que defendem os argumentos da ilusão, os sentidos às vezes nos enganam e podem fazê-lo em todas as ocasiões. Argumenta-se: talvez os sentidos nos enganem sempre. Erro: não é porque às vezes nos enganem que podem nos enganar sempre. Uma moeda pode estar viciada, mas não podemos inferir que todas estejam viciadas. (Blackburn, 1977)

7. DOGMATISMO E CETICISMO

O ceticismo radical nega que podemos chegar à verdade absoluta. O dogmatismo é o seu oposto, ou seja, é a atitude que consiste em admitir a possibilidade, para a razão humana, de chegar a verdades absolutamente certas e seguras.

O cético mantém uma atitude crítica diante da pretensão dogmática de ter descoberto a verdade. Está sempre questionando as suas teses. É por isso que o ceticismo é uma forma atual de filosofar.  

Segundo os céticos, não sabemos de nada, não temos certeza de nada e podemos colocar tudo em dúvida. Refutar o ceticismo tornou-se uma obsessão dos filósofos dogmáticos, sobretudo aqueles que se interessam pela teoria do conhecimento, já que a possibilidade do conhecimento e a descoberta da verdade é um assunto essencial para os céticos. (Smith, 2004, Introdução) 

8. O PARADOXO DO CÉTICO

O cético radical duvida de tudo igualmente. Ele coloca todas as hipóteses científicas ou não científicas no mesmo nível. É possível que ele peça tolerância ou até apoios para especulações não cientificas. Na prática, o ceticismo radical pode encorajar a credulidade. (Bunge, 2002)

9. ALLAN KARDEC FOI CÉTICO?

Poder-se-ia dizer que foi cético moderado. Em toda a obra da codificação, Allan Kardec tinha por base uma premissa muito importante: “É preferível rejeitar nove verdades a aceitar uma única como erro”.

10. METODOLOGIA DA CODIFICAÇÃO ESPÍRITA

Allan Kardec, quando organizou a Doutrina Espírita, utilizou o método científico em moda, ou seja, o método teórico-experimental. Ele não confiou em um único médium, nem em uma única mensagem. Pegava várias respostas, de diferentes médiuns, para, depois, publicá-las de acordo com os princípios da razão.  

11. A INFLUÊNCIA DO CETICISMO NO CARÁTER PROGRESSIVO DA DOUTRINA ESPÍRITA

Embora Allan Kardec tenha fundamentado os princípios espíritas sobre as leis da natureza, deixava sempre uma porta aberta à dúvida, pois se uma nova lei fosse descoberta, o Espiritismo teria de se pôr de acordo com essa lei. Acrescenta: “Não lhe cabe fechar a porta a nenhum progresso, sob pena de se suicidar. Assimilando todas as ideias reconhecidamente justas, de qualquer ordem que sejam, físicas ou metafísicas, ela jamais será ultrapassada, constituindo isso uma das principais garantias da sua perpetuidade”. (Kardec, 1975, p. 349)

12. CONCLUSÃO

O ceticismo moderado deve nortear as atitudes de qualquer indivíduo  na sua vida cotidiana. E, com muito mais razão, quando se insere nos meandros do Espiritismo, que lida com fenômenos extra-sensoriais, sujeitos a muitas dúvidas e erros de interpretação.  

13. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia. Consultoria da edição brasileira, Danilo Marcondes. Tradução de Desidério Murcho ... et al. Rio de Janeiro: Zahar, 1977.

BUNGE, M. Dicionário de Filosofia. Tradução de Gita K. Guinsburg. São Paulo: Perspectivas, 2002. (Coleção Big Bang)

JAPIASSÚ, Hilton e MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. 5.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.

KARDEC, A. Obras Póstumas. 15. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1975.

LANDESMAN, Charles. Ceticismo. Tradução de Cecília Camargo Bartalotti. São Paulo: Loyola, 2006.

SMITH, Plínio Junqueira. Ceticismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. (Passo-a-passo, 35)

São Paulo, julho de 2011.