Instruções de Allan Kardec ao Movimento Espírita

Instruções  de Allan Kardec ao Movimento Espírita

(Revista Espírita e Obras Póstumas)

Nota do organizador  

Nem todos os espíritas já tiveram oportunidade de compulsar as páginas da Revista Espírita, o Jornal de Estudos Psicológicos de Allan Kardec, publicado sob a responsabilidade direta do Codificador no período de janeiro de 1858 a abril de 1869. 

A Revista Espírita é uma espécie de tribuna livre, um laboratório experimental, onde Allan Kardec sondava a opinião dos homens e a impressão dos Espíritos acerca de determinados assuntos, ainda hipotéticos ou mal-compreendidos, não os incorporando às obras básicas da Doutrina senão depois de haverem passado pelo critério da concordância e da universalidade do ensino dos Espíritos.  

Publicava somente orientações judiciosas, com clareza, correção de estilo, visando à formação de grupos e de sociedades espíritas que, então, se multiplicavam na França e em outros países.  

1 – Propagação do Espiritismo 

Ressuscitado das crenças antigas, pode-se vê-lo em 4 fases: 

1º O da curiosidade, no qual os Espíritos batedores hão desempenhado o papel principal para chamar a atenção e preparar os caminhos.  

2º O da observação, no qual entramos, e que podemos chamar também de período filosófico. O Espiritismo é aprofundado e se depura tendendo à unidade de Doutrina e constituindo-se em Ciência.  

3º O período de admissão, no qual o Espiritismo ocupará uma projeção oficial entre as crenças oficialmente reconhecidas. 

4º O período da influência sobre a ordem social. A Humanidade, então sob a influência dessas ideias, entrará num novo caminho moral. (setembro de 1858, p. 363-371) 

2 – Polêmica Espírita  

Explicação sobre o silêncio ante os ataques de outros jornais. A maioria delas contém muito personalismo. Estas respostas tomariam muito tempo, o qual poderia ser empregado mais utilmente, pois seriam muito pouco interessantes para os nossos leitores que assinam a Revista para se instruírem e não para ouvirem diatribes mais ou menos espirituosas. Quando se entra por um caminho, fica difícil sair dele. Há polêmica e polêmica. Os assuntos sérios não devem ser renegados. (novembro de 1858, p. 443-445) 

3 – Médiuns Interesseiros  

Cupidez é o defeito dos Espíritos imperfeitos. Receber dinheiro inspira confiança bem medíocre. A maior garantia contra o charlatanismo é o mais absoluto desinteresse, por isso que não há charlatães desinteressados. (março de 1859, p. 94-96) 

4 – Fraudes Espíritas  

Lembra aos que não admitem as manifestações físicas, que a fraude existe em todos os grupos humanos: na medicina, no comércio. Os que não são idôneos estão sempre tentando enganar os seus clientes. (abril de 1859, p. 143-146)  

5 – Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas: Discurso de Encerramento do Ano Social de 1858-1859 

A Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas foi formada sem um desígnio premeditado, sem um projeto preconcebido. O objetivo da sociedade não consiste apenas na pesquisa dos princípios da ciência espírita; vai mais longe: estuda também as suas consequências morais, pois é principalmente nelas que encontra a sua verdadeira utilidade. Para que dê frutos sazonados, há necessidade da homogeneidade e da compreensão entre os seus membros. (julho de 1859, p. 255-274)  

6 – Deve-se Publicar tudo quanto Dizem os Espíritos?  

Publicar sem exame, ou sem correção, tudo quanto vem do Mundo Espiritual (há espíritos letrados e iletrados) é dar prova de pouco discernimento. Deve-se levar em conta o desinteresse e o julgamento imparcial. (novembro de 1859, p. 423-427)  

7 – O Espiritismo em 1860  

Agradece aos leitores e enaltece o Espiritismo verdadeiro, isto é, o Espiritismo compreendido em todas as suas consequências morais. A prosperidade crescente da Revista é um indicio do favor com que é acolhida. Lógica do futuro, pois explica o problema da incerteza do além-túmulo. Afirma que o homem só aceita como certo o que lhe parece lógico. (janeiro de 1860, p. 15-21) 

8 – Escassez de Médiuns  

Critica a comparação injusta: sessão espírita sem médiuns é como um concerto sem músicos. Há médiuns e médiuns. Os bons médiuns são raros.

Na ausência de médiuns, sugere:

1) reler e comentar as antigas comunicações, cujo estudo aprofundado fará com que seu caráter seja mais bem apreciado;

2) contar fatos de que se tem conhecimentos, discuti-los, comentá-los, explicá-los pelas leis da ciência espírita;

3) ler, comentar e desenvolver cada artigo de O Livro dos Espíritos e O Livro dos Médiuns assim como todas as outras obras sobre o Espiritismo;

4) Discutir os diferentes sistemas sobre a interpretação dos fenômenos espíritas. (fevereiro de 1861, p. 74-79) 

9 – Discurso de Allan Kardec na S.P.E.E. por Ocasião da Renovação do Ano Social de 1861 

Fala dos inimigos (externo) do Espiritismo e dos inimigos no interior da Sociedade. Malgrado as pressões internas e externas, o Espiritismo caminha a passos largos e sua marcha progressiva é mais rápida desde que entrou na via filosófica séria. Os inimigos nada poderão fazer contra a vontade de Deus porque nada acontece sem a sua permissão. “Se essas coisa acontecem, é que Deus o permite, para avivar a fé que se extingue nas trevas do materialismo”. (maio de 1861, p. 199-209) 

10 – Discurso de Allan Kardec na S.P.E.E. durante a Abertura do Ano Social de 1862 

Dados os problemas, e querendo desistir da Sociedade, recebe a seguinte mensagem:  

“A sociedade formada por nós com o teu concurso é necessária; queremos que subsista e subsistirá, não obstante a má vontade de alguns, como tu o reconhecerás mais tarde. Quando existe um mal, não se cura sem crise. Assim é do pequeno ao grande: no indivíduo como nas sociedades; nas sociedades como nos povos; nos povos como o será na Humanidade. Dizemos que nossa Sociedade é necessária. Quando deixar de o ser sob a forma atual, transformar-se-á, como todas as coisas. Quanto a ti, não podes nem deves te retirar. Contudo, não pretendemos subjugar o teu livre-arbítrio; apenas dizemos que a tua retirada seria um erro que um dia lamentarias, porque entravaria os nossos desígnios...” (junho de 1862, p. 227-239) 

Fala aqui da exiguidade dos recursos financeiros, que o impede de fazer mais coisas em prol do Espiritismo.  

11 – A Luta entre o Passado e o Futuro 

Trata do que fora anunciado, ou seja, uma verdadeira cruzada contra o Espiritismo. De vários pontos assinalam-se escritos, discursos e até atos de violência e de intolerância. Regozijar. Fariam tanto barulho por causa de uma mosca que voa? (março de 1863, p. 103-109) 

12 – Falsos Irmãos e Amigos Inábeis  

O Espiritismo repousa sobre uma lei da Natureza. Sua marcha não poderá ser impedida. Quem, pois, poderia opor-se ao desenvolvimento de uma lei da Natureza? Sendo obra de Deus, insurgir-se contra ela é revoltar-se contra Deus. Se não podemos parar a marcha geral, podemos retardar a marcha parcial (nossa conduta). (março de 1863, p. 109-118)  

13 – Decisão Tomada pela Sociedade Espírita de Paris a Respeito de Questões Religiosas  

Lembra ao autor da carta: o fim essencial do Espiritismo é a destruição das ideias materialistas e o melhoramento moral do homem; ele não se ocupa de discutir dogmas. A Sociedade se julga no dever de exortar o autor da carta bem como o seu médium, a não se deixarem iludir por tais comunicações e a se restringirem ao objetivo essencial do Espiritismo. (março de 1863, p. 124-126)  

14 – Exame das Comunicações Mediúnicas que nos são Enviadas  

Fizemos o seu exame e classificação e esperamos que ninguém haja de se surpreender ante a impossibilidade de inseri-las todas,  considerando-se que, além das já publicadas, há mais de três mil e seiscentas que, sozinhas, teriam absorvido cinco anos completos da Revista, sem contar um certo número de manuscritos mais ou menos volumosos. (maio de 1863, p. 217-221) 

15 – Período de Luta 

O primeiro período foi de curiosidade; o segundo, filosófico (O Livro dos Espíritos). Com o avanço, o Espiritismo entra na fase da luta, porque haverá muitos que tentarão combater a ideia nova. Exemplo: auto-de-fé de Barcelona, de 9 de outubro de 1861. (dezembro de 1863, p. 504-507) 

16 – Sociedade Espírita de Paris: Discurso de Abertura do 7º Ano Social de 1864 

O sinal de prosperidade da sociedade, não está, pois, nem na cifra de seu pessoal, nem no montante de sua reserva bancária; está inteiramente na progressão de seus estudos, na consideração que conquistou, no ascendente moral que exerce lá fora, enfim no número de adeptos que aderem aos princípios que ela professa, sem que, por isso, dela participem. (maio de 1864, p. 192-199) 

17 – Relatório de Caixa do Espiritismo Apresentado por Allan Kardec à Sociedade Espírita de Paris em 1865 

Defende-se das críticas que faziam a respeito de usar os recursos para proveito pessoal.

Nota: esta exposição tinha sido feita apenas para a Sociedade; mas, tendo sido pedida por unanimidade a sua inserção na Revista, julgamos por bem aquiescer a esse desejo. (junho de 1865, p. 221-231) 

18 – Nova Tática dos Adversários do Espiritismo  

Nunca uma ideia grande e verdadeira deixou de triunfar. O campo do Cristianismo nascente era circunscrito; o do Espiritismo é o mundo todo. Por vezes, o dinheiro é o argumento que substitui a lógica. Não se viu uma mulher confessar ter recebido 50 francos para simular loucura, depois de haver assistido a uma única reunião espírita?

Como todas as ideias novas, a ideia espírita não podia deixar de ser explorada por gente que, não tendo alcançado êxito em nada por má conduta ou por incapacidade, estão à espreita do que é novo, na esperança de aí encontrar uma mina mais produtiva e mais fácil. 

A maior prova está no conflito de ideias. Esse conflito, embora provocado com má intenção, venha dos homens ou dos maus espíritos, é, contudo, necessário. (junho de 1865, p. 254-260) 

19 – O Espiritismo sem os Espíritos 

Vimos uma seita se formar: A negação da prece. Eis outra: Nada de comunicação dos Espíritos. Esta terá mais chance de prosperar.  

Não se trata de negar o fato das manifestações, mas de estabelecer a superioridade do julgamento do homem, ou de alguns homens sobre o dos Espíritos; numa palavra, de desvincular o Espiritismo do ensino dos Espíritos, pois as instruções destes últimos estariam abaixo do que pode a inteligência humana. 

Em se tratando da ausência da prece. Os que acham insuficiente, tratem de dar mais; mas não será dando menos, tirando o que faz o seu charme, a força e a popularidade que o suplantarão. (abril de 1866, p. 150-157)  

20 – O Espiritismo Independente 

Carta escrita com a sugestão de mudar o título do jornal: chamar-se-ia Jornal do Espiritismo Independente. Independente de quê?  

Outra carta: Espiritismo liberto não só da tutela dos Espíritos, mas de toda direção ou supremacia pessoal, de toda subordinação às instruções de um chefe, cuja opinião não pode fazer lei, considerando-se que não é infalível.

Aquele que diz, por exemplo, “Não devemos mais receber instruções dos Espíritos”, não emite um princípio absoluto? – Deveria dizer: “Aqui não se dá a palavra aos Espíritos”. (abril de 1866, p. 157-163) 

21 – Do Projeto de Caixa Geral de Socorro e outras Instituições para os Espíritas 

Trata-se da caridade que se possa fazer aos irmãos necessitados. Ter cautela para iniciar e continuar o trabalho. Além da emoção, deve-se levar em conta a razão. (julho de 1866, p. 271-276) 

22 – Olhar Retrospectivo sobre o Movimento Espírita  

O Movimento Espírita já dura 15 anos. Será fogo de palha como dizem os adversários? A tenacidade de sua evolução é por causa da profundidade e multiplicidade das raízes pelas quais se liga aos mais graves interesses da Humanidade. (janeiro de 1867, p. 17-27) 

23 – O Espiritismo é uma Religião? 

No sentido filosófico, o Espiritismo é uma religião, e nós nos vangloriamos por isto, porque é a Doutrina que funda os vínculos da fraternidade e da comunhão de pensamentos, não sobre uma simples convenção, mas sobre bases mais sólidas: as próprias leis da Natureza.  

Por que, então, temos declarado que o Espiritismo não é uma religião? Em razão de não haver senão uma palavra para exprimir duas ideias diferentes, e que, na opinião geral, a palavra religião é inseparável da de culto; porque desperta exclusivamente uma ideia de forma, que o Espiritismo não tem.  

A religião do Espiritismo, religião que pode conciliar-se com todos os cultos, isto é, com todas as maneiras de adorar a Deus. É o laço que deve unir todos os Espíritos numa santa comunhão de pensamentos, esperando que ligue todos os homens sob a bandeira da fraternidade universal. (dezembro de 1868, p. 487-495) 

24 – Os Desertores  

O Espiritismo não foge à regra, pois todas as grandes ideias tiveram os seus desertores. Em se tratando do Espiritismo, deve-se analisar a deserção entre os curiosos, os adivinhadores, os entusiasmados etc. Quanto aos espíritas convictos, a deserção é rara. Allan Kardec fala de fraquezas humanas, como o orgulho e o egoísmo. Acha que há desfalecimentos, em que a coragem e a perseverança fraquejaram diante de uma decepção. Ele diz: "Entre os adeptos convictos, não há deserções, na lídima acepção do termo, visto como aquele que desertasse, por motivo de interesse ou qualquer outro, nunca teria sido sinceramente espírita". (Obras Póstumas, p. 247-253) 

25 – Ligeira Resposta aos Detratores do Espiritismo 

A crítica é útil, mas deve ser feita com conhecimento de causa. Ora, a crítica tem por demais provado que lhe ignora os mais elementares princípios, fazendo-o dizer precisamente o contrário do que ele diz, atribuindo-lhe o que ele desaprova, confundindo-o com as imitações grosseiras e burlescas do charlatanismo. (Obras Póstumas, p. 257-261) 

26 – Projeto 1868 

Um dos maiores obstáculos capazes de retardar a propagação da Doutrina seria a falta de unidade. O único meio de evitá-la, se não quanto ao presente, pelo menos quanto ao futuro, é formulá-la em todas as suas partes e até nos mais mínimos detalhes, com tanta precisão e clareza, que impossível se torne qualquer interpretação divergente. (Obras Póstumas, p. 339-343) 

27 – Fora da Caridade não há Salvação  

Compreendo uma religião que nos prescreve retribuirmos o mal com o bem e, com mais forte razão, que retribuamos o bem com o bem. Nunca, entretanto, compreenderia a que nos prescrevesse que paguemos o mal com o mal. (Obras Póstumas, p. 337-338) 

Cópia e anotações de trechos do livro:  

BEZERRA, Evandro Noleto (organizador). Instruções de Allan Kardec ao Movimento Espírita: Compilação de Artigos da Revista Espírita e de Obras Póstumas contendo orientações e diretrizes ao Movimento Espírita. Rio de Janeiro: FEB, 2005.  

São Paulo, julho de 2013.