Desde o início de nossas lições, temos nos esforçado para compreender o que é economia e quais são as ferramentas que os profissionais dessa área utilizam para analisar a realidade social das interações econômicas, especificamente entre os dois principais agentes, os consumidores que representam a demanda e os produtores que representam a oferta.
Vimos como alguns fatores — por exemplo: preço, renda, preço de insumos, preços de bens próximos, tecnologia, entre outros — exercem algum impacto sobre o comportamento desses dois agentes (oferta e demanda), motivo pelo qual aprendemos conceitos, como curva de demanda, curva de oferta, elasticidade e excedente do consumidor e do produtor, tudo isso com o propósito de entender as decisões que são tomadas e quais os impactos de tais fatores sobre elas.
Vimos, até o momento, que aparentemente pessoas interagindo em um mercado de concorrência perfeita parece ser uma boa forma de alocar (destinar) os recursos na economia, no entanto aprendemos nos 10 princípios da economia e, também, na lição sobre a história da ciência econômica, que em alguns momentos o mercado não é totalmente eficiente, sendo, por isso, necessário que o Estado intervenha para corrigir possíveis falhas de mercado. Mas, afinal, cadê essas falhas?
Na lição de hoje, aprenderemos justamente isso, que o mercado é imperfeito. Isso porque, em determinados momentos, a oferta não considera em seus custos de produção (lembre-se da aula sobre excedente do produtor) alguns fatores que vão gerar custos a terceiros. Exemplo disso é a poluição gerada por grandes indústrias, que não é considerada como um custo direto para as empresas, pois a indústria simplesmente a produz, gerando um grande custo social, isto é, um prejuízo.
Esse efeito não esperado, não internalizado, pela empresa é chamado externalidade e será o objeto de estudo desta lição. Aprenderemos sobre esse conceito e como ele é nocivo para o bem-estar da sociedade.
Lembrando, novamente, que caso você precise de ajuda para descobrir a definição de algum conceito, poderá consultá-lo ao final da lição, desde que ele esteja sublinhado da seguinte maneira: “minidicionário”, combinado?
Já aconteceu de você estar em uma situação em que a ação de uma outra pessoa gera algum efeito direto ou indireto sobre sua vida, seja de forma negativa, seja positiva? Vou dar alguns exemplos, observe se você se identifica: alguma vez, alguém estava consumindo algo e jogou a embalagem na frente da sua casa? Ou uma pessoa estava consumindo algo, que tinha um cheiro desagradável, e este chegou até você? Algum vizinho já ligou o som em uma altura que atrapalhou os seus estudos ou descanso?
Se você respondeu sim para alguns desses exemplos, você foi afetado por uma ação de um terceiro que, ao ser executada, gerou um efeito adicional não mensurado. Uma pessoa que fuma um cigarro, por exemplo, não pensa na fumaça que será expelida, mas sim em sua satisfação pessoal; alguém que escuta uma música em uma altura elevada não faz isso pensando em atrapalhar os vizinhos, mas sim em aproveitar de uma melhor forma o som.
Esses exemplos dados mostram que, algumas vezes, nossas ações podem acabar afetando outras pessoas, sem que isso seja a nossa intenção direta, ou pelo menos que as consequências não tenham sido pensadas e planejadas de forma coletiva.
Da mesma forma, empresas, ao jogarem os resíduos líquidos ou gasosos na natureza, não estão considerando isso em sua política de preços, ou seja, o custo social da poluição não está embutido no preço cobrado, de forma que a sociedade acaba pagando além do preço do produto, o preço da poluição, ou seja, paga duas vezes.
Esse efeito indireto causado pelas empresas que não estão inseridas nos preços e acabam gerando custos sociais é chamado de externalidade (MANKIW, 2013). Mas como são geradas as externalidades? Como elas podem ser mensuradas e calculadas? Como é possível que o Estado, juntamente com as empresas, tome ações para corrigir essa falha de mercado, que acaba impactando de forma expressiva no bem-estar da população?
Compreender as externalidades é de fundamental importância para que, futuramente, você seja capaz de identificar em ações do setor privado e público, quais serão seus efeitos e como afetarão sua vida como cidadão e como profissional. Além de possuir conhecimento para identificar em quais momentos a intervenção do setor público é fundamental para fazer com que a economia de uma região consiga ser mais eficiente, em termos de alocação dos seus recursos escassos, atendendo o interesse da maioria daquela sociedade.
A forma como a tributação em combustíveis ocorre, principalmente a gasolina, é um exemplo prático para entendermos o conceito de externalidade e como o Estado, por meio dos seus representantes, é capaz de exercer ações, visando à redução ou, até mesmo, a eliminação dos impactos dessas externalidades. De acordo com Mankiw (2013), a utilização de automóveis gera três principais externalidades, ou seja, geram três resultados não intencionais.
O primeiro e mais notável é a poluição. De acordo com Tanji (2021), a Organização Mundial da Saúde (OMS) elaborou um estudo, no ano de 2019, e constatou que, durante um ano, 7 milhões de pessoas, aproximadamente, morrem por desenvolverem doenças relacionadas à poluição, principalmente por monóxido de carbono (CO) e outros gases.
Para comprovar a relação da emissão desses gases com os automóveis, foi constatado que os veículos geram em torno de 60% desses poluentes. Assim, um dos motivos para o elevado valor de tributos nos combustíveis é justamente para desestimular o consumo por meio da utilização de veículos automotores; além disso, a queima dos combustíveis com origem em fósseis é um fator que, também, impacta o aquecimento global.
Outra razão apontada por Mankiw (2013), para a elevada tributação da gasolina, ocorre por conta dos congestionamentos. Caso já tenha enfrentado um congestionamento em um horário de pico, sabe o quão estressante essa situação pode ser. Ao aplicar altos tributos para a gasolina, estimula-se que as pessoas usem transporte público, rodízio de utilização de carro entre colegas de serviço e outras práticas que evitem o congestionamento no trânsito.
Por fim, mas não menos importante, a utilização em larga escala de automóveis acaba por gerar uma externalidade em função do potencial aumento no número de acidentes de trânsito. Ao adquirir um veículo, você aumenta potencialmente a probabilidade de envolvimento em acidentes.
Dessa forma, tributos elevados são uma forma de reduzir as externalidades geradas pela utilização de automóveis, ou seja, têm a intenção de diminuir a poluição, os congestionamentos e os acidentes. Destacamos que o debate, aqui, não é sobre o valor do combustível em si, mas o porquê da OMS (Organização Mundial da Saúde) indicar uma elevada tributação sobre os combustíveis.
O case te deixou intrigado(a)? Assista ao vídeo a seguir para conhecer um pouco mais sobre essa história:
Uma breve contextualização é importante para começarmos a entender a externalidade. Como mencionado anteriormente, existem momentos em que uma determinada ação gera resultados não esperados que acabam afetando outras pessoas. No exemplo do carro, ao optar por usá-lo, você afetará o bem-estar da sociedade, pois aumenta, ainda que de forma pequena, a poluição.
Por definição, externalidades podem ocorrer entre consumidores e produtores e são ações que afetam terceiros, mas não são consideradas no preço dos custos (PINDYCK; RUBINFELD, 2013; MANKIW, 2013).
Para explicar, vamos pensar na realidade de uma empresa que produz, por exemplo, alumínio, cuja emissão de poluentes é significante. Ao produzir o alumínio que será ofertado no mercado por aqueles que demandam esse produto, o preço estabelecido será aquele que, ao menos, cobrir os seus custos de produção (como vimos na lição sobre excedente do produtor) e, também, deve estar dentro da disposição a pagar dos consumidores (como aprendemos, na lição sobre excedente do consumidor).
Esse preço, no entanto, não leva em consideração o efeito da poluição que é gerado, ou seja, o custo social dessa produção não está sendo considerado, de forma que a sociedade acaba arcando com essa poluição. Esse é um exemplo claro de externalidade negativa, pois acaba afetando terceiros, nesse caso toda a sociedade (MANKIW, 2013).
Os exemplos são diversos, pois podemos pensar em empresas que geram poluição por meio de resíduos físicos, líquidos, gasosos e, até mesmo, sonoros. Mas como mensurar essa e outras externalidades negativas? Para aprender como isso funciona, temos que estudar outros dois conceitos: o de custo social e o de internalização de uma externalidade.
Mantendo o exemplo da empresa de alumínio, a atividade gera uma poluição e acaba causando danos a terceiros. Esse dano provocado a terceiros é o chamado custo social, que indica o quanto que custa para a sociedade aquela externalidade. Para resolver esse problema, basta que a empresa considere nos seus custos produtivos os custos sociais, ou seja, é preciso que a empresa internalize (traga para dentro) esse problema (VARIAN, 2012).
Como sempre, os economistas gostam de usar gráficos para ilustrar suas ideias. Como vimos em lições passadas, no mercado, a interação entre pessoas comprando e vendendo bens estabelece a quantidade que será demandada e ofertada bem como o preço. Quando a quantidade demandada é igual à ofertada, temos o que é chamado equilíbrio de mercado. Graficamente, como indicado na Figura 1, o equilíbrio de mercado é dado pelo ponto A, em que a curva de demanda cruza a curva de oferta (MANKIW, 2013).
Figura 1 - Equilíbrio de mercado considerando as externalidades / Fonte: adaptada de Mankiw (2013).
Perceba que, no ponto A, a economia está em equilíbrio, pois a oferta é igual à demanda. No entanto, como a produção de alumínios gera poluição, a sociedade está pagando por algo que não está embutido nos preços, pagando um valor acima do que seria o correto, ou ótimo. Na Figura 1, a curva de oferta (lembre-se da lição sobre excedente do consumidor) representa o custo de produção do alumínio sem considerar o custo social que a atividade tem, ao gerar externalidades negativas para a sociedade. Vamos corrigir esse problema?
Como aponta Mankiw (2013), a forma de corrigir as externalidades é incorporar no custo das empresas os custos sociais gerados pelas externalidades. Ou seja, internalizá-las, trazer o custo das consequências para dentro da empresa.
Novamente, vamos usar um gráfico de oferta e demanda, mas agora, nesse gráfico, consideraremos que, na curva de oferta, estão embutidos os custos usuais e o custo social. A forma de representar a nova curva de oferta e o novo ponto de equilíbrio é dado pela Figura 2, observe:
Figura 2 - Equilíbrio de mercado considerando as externalidades / Fonte: adaptada de Mankiw (2013).
Perceba que existe um espaço entre a nova curva de oferta (em vermelho) e a antiga curva de oferta (em cinza). Esse espaço representa o custo que a poluição causa à sociedade (VARIAN, 2012).
Lembra que vimos, em nossa primeira lição, que um dos 10 princípios da economia é: o governo pode melhorar os resultados do mercado? Estudar externalidades é importante, pois elas fazem parte das chamadas falhas de mercado (PINDYCK; RUBINFELD, 2013). Falhas de mercado são situações em que o mercado, por si só, não é capaz de distribuir de maneira eficiente os recursos na economia, sendo necessária a presença do governo para melhorar o seu desempenho.
Políticas públicas para corrigir externalidades
Até o presente momento, apenas, estudamos que as externalidades existem e que elas levam a resultados ineficientes do mercado, motivo pelo qual a atuação do governo se faz necessária.
Economistas consideram que tanto os agentes individuais que determinam oferta e demanda como o governo reagem de diferentes formas às externalidades, mas sempre com o mesmo objetivo: melhorar a situação de toda a sociedade.
O governo, especificamente, pode adotar duas principais formas para lidar com as externalidades, são elas: políticas de comando e controle e as políticas baseadas no mercado (MANKIW, 2013).
Políticas de comando e controle
Essas políticas são mais diretas, elas são adotadas pelo gestor público (governo) e visam impor obrigações ou proibições a determinados comportamentos (VARIAN, 2012).
Para eventos como esse, é pertinente que o governo atue, proibindo legalmente essa prática. É impossível, no entanto, proibir toda e qualquer atividade poluidora, andar de carro é um exemplo disso. Por essa razão, cabe à sociedade definir a quantidade de poluição que será permitida.
Nos Estados Unidos, por exemplo, existem órgãos de controle de poluição que estabelecem normas que as empresas têm que seguir, seja por meio de uma quantidade específica de poluição que pode ser gerada, seja mediante a adoção de novas tecnologias que reduzem a emissão de poluentes, como forma de compensar a poluição gerada.
Políticas que são baseadas no mercado
As políticas baseadas no mercado para reduzir as externalidades negativas são basicamente duas: Impostos corretivos e subsídios e Licenças de poluição negociáveis.
Um exemplo clássico disso é a tributação de atividades que geram externalidades negativas. Os impostos que têm essa função são chamados de impostos corretivos (MANKIW, 2013). Normalmente, os economistas preferem esse tipo de atuação do gestor público à regulamentação direta.
Já as Licenças de poluição negociáveis são, novamente, um caso em que o governo gera um estímulo para que o mercado internalize as externalidades negativas (MANKIW, 2013). Para esse tipo de ação, o gestor público estabelece que cada empresa pode produzir uma determinada quantidade de poluição, vamos imaginar 50 toneladas de lixo por ano. Esse valor de 50 toneladas por ano para cada empresa, de acordo com o gestor público, é a quantidade ideal.
Suponha que a empresa hipotética X planeje aumentar sua produção e, para isso, terá que aumentar a quantidade de lixo produzido para 75 toneladas. Havendo uma outra empresa B disposta a baixar sua própria quantidade de lixo para 25 toneladas, o governo pode permitir que as empresas façam essa troca, contanto que a primeira pague a segunda um valor como compensação. É como se a empresa X comprasse da fábrica B o direito de usar 25 toneladas a mais de lixo.
Para encerrarmos essa lição, saiba que as externalidades não são apenas negativas, mas podem ser também positivas, ou seja, podem melhorar a situação da sociedade. O exemplo clássico para uma externalidade positiva é a educação. Se pensarmos do ponto de vista unicamente individual, quem investe em educação tende a, no futuro, ter melhores salários, gerando, assim, um ganho particular.
No entanto, ao pensar no coletivo, uma sociedade bem instruída tende a tomar melhores decisões, principalmente em termos de eleição, conservação do patrimônio público, além de, normalmente, ser mais eficiente e mais produtiva. Isto é, a intenção do indivíduo, ao estudar, não é necessariamente contribuir com a sociedade, mas ao estudar, ele acaba externalizando, contribuindo positivamente com a comunidade que está inserido.
Outros exemplos que podem ser citados são as construções de praças em locais públicos. Estas, além de gerar bem-estar social, tendem a valorizar o espaço urbano, que, por sua vez, melhora os hábitos de condução, garante mais segurança para o condutor e diminui os riscos de acidentes, entre outros.
Ficou interessado(a) sobre esse tema? Clique no play a seguir e assista ao vídeo.
Um dos grandes desafios que temos, enquanto agentes econômicos, é saber como destinar nossos recursos da melhor forma possível, alcançando, assim, o máximo de bem-estar. No entanto, algumas vezes, podemos errar, o que é natural, por isso o processo de conhecimento é algo fundamental para que possamos atingir as metas e objetivos estabelecidos.
Muitas vezes, as decisões e ações tomadas podem gerar resultados para além do que esperávamos, afetando a vida de outras pessoas, sem que isso tivesse sido considerado no planejamento inicial, ou seja, geramos externalidades.
Quando pensamos em empresas, essas externalidades têm um potencial maior de afetar não apenas uma pessoa, mas um grupo ou uma região, quem sabe até um país.
Por essa razão, a lição de hoje é muito útil para sua vida, atual e futura, pois, ao compreender que existem custos sociais na produção de bens e serviços de uma economia, você entenderá que é importante que o Estado intervenha na economia, não simplesmente como um agente passivo, observador, mas sim como um agente que exista com a função de melhorar o desempenho e a eficiência do mercado.
Já pensou o quão nocivo é a poluição não somente para sua geração, mas também para as futuras? Como a contaminação de nascentes pode piorar potencialmente a situação de todos, no longo prazo?
Ainda que não vivamos em um mundo perfeito, muito tem sido feito, ao longo dos anos, para combater essa externalidade tão negativa, mas esse, ainda, é um problema que gera diversos custos sociais, de forma que o mercado, por si só, não é capaz de corrigi-lo e, assim, a presença do Estado, seja por meio de políticas de comando e controle, seja por políticas que são baseadas no mercado, faz-se necessária.
As externalidades não são apenas negativas, pois existem fatores, como educação, que geram não somente um benefício individual, mas também coletivo. Da mesma forma, a construção de praças públicas ou obras similares, pensada com objetivo de criar um ambiente de lazer para a região, valoriza o espaço urbano, faz com que seus imóveis tenham uma valorização em seus preços e gera potenciais ganhos para os proprietários.
As externalidades são inúmeras, positivas ou negativas, e na lição de hoje você conheceu apenas alguns exemplos que têm custo social. O mais importante, porém, é que você aprenda a se atentar para a existência das externalidades ao seu redor.
Para apurar essa percepção, vou propor um desafio: analise em suas redes sociais quais postagens têm uma intenção, mas que também geram outras consequências? Por exemplo, um “meme” tem a intenção de fazer as pessoas rirem, mas pode ofender, ou gerar uma conscientização sobre algum assunto. Liste algumas postagens de exemplo.
Tabela 1 - Significado dos termos técnicos da Economia / Fonte: o autor.
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MANKIW, N. G. Introdução à economia. [S. l.]: Cengage Learning, 2013.
PINDYCK, R. S.; RUBINFELD, D. L. Microeconomia. [S. l.]: Pearson Itália, 2013.
TANJI, T. Carros ainda são vilões para a qualidade do ar, mas poluição no Brasil poderia ser muito pior. Auto Esporte, abr. 2021. Disponível em: https://autoesporte.globo.com/um-so-planeta/noticia/2021/04/carros-ainda-sao-viloes-para-a-qualidade-do-ar-mas-poluicao-no-brasil-poderia-ser-muito-pior.ghtml. Acesso em: 7 mar. 2022.
VARIAN, H. R. Microeconomia: princípios básicos. [S. l.]: Elsevier Brasil, 2012.