Aprendemos, na lição passada, que a restrição orçamentária é um fator importante na decisão de consumo, e isso por motivos óbvios, não é mesmo? Se os produtos e os serviços fossem de graça, não precisaríamos trabalhar para obtê-los. No entanto a realidade em que vivemos faz com que seja necessário termos alguma fonte de renda para podermos atender às nossas necessidades de consumo.
Na lição de hoje, concluiremos tudo o que vimos nas lições passadas referente à teoria do consumidor. Iniciamos nossos estudos sobre o consumidor analisando as cestas de mercado, as preferências e os tipos de bens na economia (esperamos que tenha ficado claro estes conceitos), e, em nossa última lição, vimos a restrição orçamentária. Na lição de hoje, juntaremos tudo o que aprendemos e vamos entender como os economistas analisaram como é a escolha do consumidor.
Quando você vai a algum estabelecimento comercial adquirir um bem e ou um serviço, como você se prepara para esta compra? Já pensou nisso? Você vai com o dinheiro “contado” e com o item em mente que comprará, ou você apenas sabe que precisa comprar determinado produto, por exemplo uma camiseta, e, na loja, decide qual adquirir, considerando uma margem para cima ou para baixo do preço que está disposto a pagar?
Pode parecer simples para você, mas uma grande preocupação das empresas é saber como o consumidor toma sua decisão de consumo, por isso, elas investem tanto em marketing e publicidade para tentar convencer as pessoas a comprar com elas. Como todas as pessoas têm suas preferências e possuem uma renda limitada, é esperado que a maior parte das decisões de consumo sejam as mais racionais possíveis (mesmo que em alguns momentos elas não sejam).
Dessa forma, na aula de hoje, finalizaremos o conteúdo da teoria do consumidor e fecharemos esse quebra-cabeça que tem como peças as cestas de mercado, as preferências do consumidor e a restrição orçamentária.
Na aula de hoje, veremos como os economistas analisam a forma como as decisões de consumo são tomadas. Mas por que isso é importante?
Imagine que você é dono de uma grande empresa e está pensando em expandir seu negócio para várias regiões do Brasil. No entanto você não conhece as características de consumo do povo das regiões onde tem interesse de fazer tal investimento. O que você sabe é o nível de renda da população (por exemplo, na média, a população recebe de 2 a 5 salários mínimos) e mais ou menos os preços cobrados por produtos similares aos da sua empresa (sua empresa vende roupas para jovens e adolescentes e sabe que, nas regiões, há empresas que ofertam algo parecido).
Não seria interessante você conhecer um pouco mais sobre a população e como ela faz suas compras? Quais preços poderiam ser adotados? Que tipo de marketing deve ser feito? Quais produtos serão lançados?
Talvez para você isso não faça muito sentido, mas saiba, que no mundo em que vivemos, a todo momento, as empresas estão pensando justamente nisso, desde as empresas de pequeno como as de grande porte.
A teoria do consumidor da economia é uma forma de desenhar (quase que literalmente) como se espera que o consumidor faça sua escolha entre os produtos e os serviços na economia. Como cada indivíduo possui um tipo de comportamento, o ideal seria analisar caso a caso, não é mesmo? No entanto, por meio das hipóteses (que aprendemos em lições passadas) e ferramentas da economia, é possível que se tenha uma ideia, um comportamento esperado, de qual será o comportamento do consumidor.
Para você ter uma noção de como é importante para as empresas e para os economistas compreender a escolha do consumidor, analisaremos uma notícia que foi publicada em fevereiro de 2022, que trouxe alguns dados relacionados a uma tradição gaúcha: o consumo de chimarrão. Os dados mostraram que, no início da pandemia, o consumo aumentou cerca de 20%, entretanto os altos índices de inflação e o desemprego mudou todo o cenário, o que levou a indústria do setor prever um recuo de 15% na erva mate. A razão para esse recuo se deu, pois os maiores consumidores eram a população de classe média e baixa, e, ao terem que escolher entre comprar arroz ou erva-mate, escolhiam o arroz. A reportagem ainda menciona que o padrão de consumo da erva-mate, no Rio Grande do Sul, costumava ficar em torno de 100 toneladas por ano, e, em 2021, o consumo ficou 15 mil toneladas abaixo (GONZATTO, 2022).
Observe como diversos fatores influenciam o consumo. No caso da notícia mencionada, a crise econômica que estamos passando está afetando, diretamente, a renda da população gaúcha, que, ao decidir entre bens essenciais (arroz) e supérfluos (mate), acaba escolhendo pelo arroz, pois além do efeito contaminação do consumo pelo compartilhamento da bomba tem a questão do corte de gastos. Veja, dessa forma, que tudo que estamos aprendendo na disciplina tem uma ligação direta com a sua realidade, e a teoria do consumidor é uma área de grande aplicabilidade para compreender o mundo em que vivemos.
O case o(a) deixou curioso(a)? Assista ao vídeo, a seguir, para conhecer um pouco mais sobre essa história:
Na presente lição, fecharemos nossa análise sobre a teoria do consumidor, pois, a partir do que aprendemos em lições passadas, em que vimos a curva de indiferença, os tipos de preferências e a restrição orçamentária, temos todas as ferramentas necessárias para estudar e entender como os economistas analisam a escolha do consumidor.
Talvez você esteja se perguntando: mas qual a utilidade disso para minha vida agora? A resposta para isso é bem simples, pois, na verdade, no atual nível de ensino que está, talvez o conteúdo dessa e de outras disciplinas não fará muito sentido prático, mas lhe ajudará a entender como funciona a organização econômica de uma empresa, de um lar e de um governo, o que será de grande importância para sua vida futura tanto como um(a) possível aluno(a) de graduação como também no aspecto profissional, onde estará inserido em um mercado de trabalho complexo e que demanda conhecimento que pode lhe fazer ter um destaque em relação aos demais.
Como já aprendemos, os consumidores têm que escolher entre diferentes produtos, e esta escolha pode ser representada por curvas de indiferenças, que mostram diversas combinações de bens e serviços que geram o mesmo nível de utilidade (lembra-se?). Mas, como visto na lição passada, todos enfrentamos uma restrição de renda, que pode ser representada pela linha orçamentária, pois nosso salário não é infinito e temos que escolher o que consumir dentro das nossas possibilidades (como já vimos, economia é a ciência da escolha) (VARIAN, 2012).
Então, em nossa lição, veremos que os economistas esperam que, dados os desejos de consumo e a limitação de renda, o consumidor escolherá a cesta de mercado (lista com as quantidades dos produtos que se quer adquirir) que gerará o maior nível de satisfação, dada a limitação da renda. Para isso, algumas condições devem ser obedecidas.
Primeira condição - a cesta escolhida deve estar sobre a linha orçamentária; isso porque, como aprendemos na lição passada, a linha orçamentária mostra as cominações de produtos onde toda a renda é gasta, logo, valores à esquerda de linha orçamentária indica que uma parte da renda não foi gasta, e, como em nossa análise não consideramos poupança, um ponto à esquerda, existe uma parte de renda que ainda pode ser usada. Qualquer ponto à direita da linha é um ponto impossível, pois a linha orçamentária representa exatamente o limite da renda.
Segunda condição - deve dar a combinação de bens e serviços que o consumidor prefere uma vez que o consumidor possui uma preferência por determinados produtos, que estamos nos limitando a vestuário e alimento, mas que pode ser facilmente expandido para outros produtos. A escolha do consumidor deve atender a este critério, ou seja, de que a cesta com as combinações dos produtos seja uma cesta desejável.
A partir destas duas condições, o que podemos concluir? Talvez, você já tenha entendido, mas, para ter certeza, explicaremos com calma. A escolha do consumidor deve considerar tanto a cesta de mercado com os produtos desejáveis por parte do consumidor, mas também a limitação da renda que todos têm. Como já aprendemos, podemos representar cestas de mercado por meio das curvas de indiferença (lembra-se?) e também já vimos que a linha orçamentária indica justamente a restrição da renda, logo, se unirmos em um único gráfico essas duas curvas, poderemos dizer qual será a escolha do consumidor (PINDYCK; RUBINFELD, 2013).
Na Figura 1, podemos ver como fica esta análise, ou seja, como é nossa interpretação da escolha do consumidor a partir de tudo que já vimos até o presente momento em nossa disciplina sobre a teoria do consumidor. Um ponto importante a se destacar é que os economistas sempre estão procurando alcançar a chamada escolha ótima, que representará a melhor escolha possível entre todas as demais. É normal utilizarem o termo escolha que maximiza a utilidade do consumidor (VARIAN, 2012).
Figura 1 - Representação da escolha ótima do consumidor / Fonte: adaptada Pindyck e Rubinfeld (2013).
Mantendo as informações da nossa aula sobre restrição orçamentária, admitiremos que nosso consumidor possui uma renda de R$80,00, e que o preço do vestuário é de R$2,00 por unidade, e o preço dos alimentos é de R$1,00 por unidade. Dessa forma, dados os preços dos produtos, a renda do consumidor e as cestas de mercado disponíveis, qual será a escolha ótima desse nosso consumidor hipotético?
Vamos analisar um pouco mais a fundo a Figura 1. Vimos que as curvas de indiferença representam combinações de cestas de mercado (que em nosso exemplo contêm dois produtos, alimentos e vestuários) que trazem a mesma satisfação, ou seja, ao longo de cada curva, o consumidor é indiferente às proporções de alimento e vestuários que consumirá. Mas você pode se perguntar: mas e aquelas hipóteses que fizemos sobre as preferências, até agora não as aplicamos? Muito bem, se você percebeu isso, mostra que é um(a) aluno(a) curioso e quer aprender o conteúdo. Lembra que umas das hipóteses que aprendemos sobre as preferências é de que os consumidores sempre desejam mais a menos (com algumas poucas exceções)? Então, aqui fica mais claro o porquê disso. Como admitimos que o consumidor sempre quer mais bens e serviços, quanto mais “alta” a curva de indiferença, maior a utilidade que ela gera. Então, das três curvas de indiferença da Figura 1, qual a que indica o maior nível de utilidade? Exato, a curva U3. Por ser a curva mais alta, ou mais à direita, veja que ela tem maiores quantidades de vestuários que a curva U1 e U2.
Imagine você, os bens que consome com frequência e gosta de consumi-los. É de se esperar que quanto maior for a quantidade desses bens, maior seria sua satisfação, não é mesmo? A lógica aqui é a mesma. No entanto veja que a curva U3 e a cesta de mercado C está acima da linha orçamentária, ou seja, acima da sua capacidade de comprá-la. Logo, é impossível adquirir tal cesta.
Na curva U1 temos a cesta A, que, como está à esquerda da linha orçamentária, é uma cesta possível de se adquirir. Escolheremos esta cesta então? Pense bem, pois, se perceber, a curva de indiferença U1 está à esquerda da curva de indiferença U2, ou seja, tem uma menor quantidade de alimentos e vestuários, e como admitimos que sempre mais é melhor que menos, então, é possível realizarmos alguns ajustes nas quantidades para obter um pouco mais de ambos os produtos (PINDYCK; RUBINFELD, 2013).
Qual será a escolha ótima, ou seja, a escolha que traz o máximo de utilidade possível, respeitando a limitação da renda? Essa escolha acontecerá no ponto em que a curva de indiferença é mais alta, mas que toque a linha orçamentária. Veja que a cesta B presente na curva de indiferença U2 atende a este critério, ou seja, é a curva de indiferença mais alta e toca a linha orçamentária em um único ponto. Matematicamente, isso é chamado ponto de tangência, pois a inclinação tanto da curva de indiferença como da linha orçamentária é igual.
Lembra que vimos em lições passadas que a inclinação da curva de indiferença é dada pela Taxa Marginal de Substituição (TMS), e que a inclinação da linha orçamentária é a razão entre preços PA/PV (preço do alimento dividido pelo preço do vestuário). Aqui, novamente temos uma união de tudo que aprendemos sobre teoria do consumidor. Sempre que quisermos achar o ponto de escolha ótima do consumidor, temos que igualar a TMS com a relação PA/PV, de forma que:
À medida que avançamos nas lições, talvez, você tenha percebido que os assuntos vão se interligando e se complementando. Em nossa primeira lição, vimos que um dos princípios da economia é que as pessoas racionais pensam na margem. Apenas para recordar, esse princípio diz que as pessoas racionais, normalmente, sabem ponderar suas decisões para que obtenham o máximo de benefício não escolhendo opções extremas, mas levando sempre em consideração o quão benéfico, ou não, uma escolha pode ser. Essa escolha racional é considerada na margem, ou seja, se um pequeno acréscimo de algo aumentará ou diminuirá meu bem estar (MANKIW, 2013)
Imagine, por exemplo, que você está no deserto e que encontrou um tesouro contendo várias barras de ouro. No entanto sua água e gasolina acabaram, e a única opção de voltar é andando. Por ser muito difícil carregar o ouro, você pode tentar esconder parte do tesouro e carregar umas barras contigo, apenas para garantir. Com o passar do tempo, sua sede aumenta, concorda? Se, na jornada, você encontrar um mercador com água, enquanto está quase, literalmente, morrendo de sede, estaria disposto a pagar, em barras de ouro, a quantidade que o mercador pedisse, para ter um copo de água, não é mesmo? No entanto, à medida que você bebe água e sua necessidade passa, você não estaria mais disposto a dar grandes quantidades de ouro pelo quinto ou sexto copo (MANKIW, 2013).
Esta situação é para mostrar que, cada decisão de consumo deve ser considerada na margem, ou seja, se um pequeno acréscimo de algo será benéfico, ou não. Aqui, na teoria do consumidor, é o mesmo. Veja que o ponto B na Figura 1 possui 20 unidades de vestuário e 40 de alimento (considerando um preço de R$2,00 para o vestuário, R$1,00 para alimento e uma renda de R$80,00). Nesse ponto, toda sua renda é gasta com alimento e vestuário (R$2,00 * 20 + R$1,00 *40 = R$80,00).
Nesse ponto, o benefício marginal de consumir uma unidade adicional de alimento é igual ao custo marginal de adquirir esta unidade adicional. O custo marginal é medido pela inclinação da linha orçamentária, e o benefício marginal medido pela curva de indiferença. Se utilizarmos a equação (1), vemos que:
Veja que o benefício marginal foi exatamente igual ao custo marginal. Por essa razão, a cesta B representa uma escolha ótima para nosso consumidor hipotético, pois, nela, não há nenhum ganho viável em trocar unidades de alimento por vestuário, e vice versa (note que 20/40 = 0,5 e que 1/2 = 0,5) (VARIAN, 2012).
Ok, talvez você esteja pensando: como isso pode ser útil para minha vida agora? Como saber que a escolha ótima se dá quando uma regra matemática é verificada? Para responder isso, imagine que a todo momento as empresas estão procurando vender produtos e serviços no mercado, e que elas analisam não somente o tipo de produto, mas também o poder de compra de seu público alvo. Entender, ainda, que por meio de uma abordagem simplificada da realidade (lembra da nossa lição economia como uma ciência?), como as pessoas fazem suas decisões de consumo, considerando as preferências dos consumidores e sua renda, é uma boa forma de garantir uma maior chance de sucesso das empresas (MANKIW, 2013).
Ficou interessado(a) sobre esse tema? Clique no play, a seguir, e assista ao vídeo:
Fechamos nossa lição juntando todas as peças do quebra-cabeça montado sobre como entender o comportamento do consumidor. Ao aprender sobre cestas de mercado, vimos quais as opções de produtos que os consumidores possuem determinada quantidade de um ou mais bens a que o consumidor tem acesso; que possuem algumas preferências específicas, como integralidade, transitividade e não saciedade (caso tenha esquecido, dê uma olhadinha na lição sobre como se comporta o consumidor, a curva de indiferença) e que possuem uma renda que limita a quantidade de produtos e serviços que podem adquirir.
Na presente lição, juntamos todos estes três elementos em uma única abordagem, entendendo que a escolha do consumidor ocorrerá quando a Taxa Marginal de Substituição (que mostra a disposição do consumidor de renunciar a uma unidade de um produto para ter uma adicional de outro) for igual à razão entre os preços (ou o custo marginal de se obter uma unidade adicional de um produto) da sua restrição orçamentária.
Esta definição pode parecer difícil, mas basta você entender que a decisão de consumo levará em consideração a disposição do consumidor entre realizar trocas entre os bens até o ponto que achar que terá o maior ganho possível (em vez de adquirir quatro novos pares de sapatos, adquire apenas dois e uso o dinheiro restante para comprar uma nova camiseta), considerando o preço que está pagando (ou seja, pensando se vale a pena, financeiramente, desistir de dois pares de sapatos para comprar mais uma camiseta).
Como um exercício de reflexão, para facilitar a compreensão do que aprendemos, propomos o seguinte: pergunte para seus amigos de escola e familiares como eles decidem os produtos e os serviços que comprarão. Em sua pergunta, deixe claro que ele deve pensar no preço dos produtos, na forma de pagamento (à vista ou a prazo) e na necessidade (por exemplo, se sempre compram pensando em uma necessidade, ou se é comum comprar apenas para satisfazer uma necessidade temporária não essencial). Ah, você também faz parte dessa pesquisa, então, faça a mesma pergunta para você.
Após as respostas, reflita sobre o que descobriu em relação às decisões de consumo das pessoas que estão à sua volta e também sobre as suas.
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GONZATTO, M. Crise, calor, mudança de hábitos: por que o consumo de chimarrão caiu 15% no RS. GZH Economia, 2 fev. 2022. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/economia/noticia/2022/02/crise-calor-mudanca-de-habitos-por-que-o-consumo-de-chimarrao-caiu-15-no-rs-ckzyhbhwn0078017cf8klfoav.html#:~:
text=No%20ano%20passado%20e%20no,e%20a%20ado%C3%A7%C3%A3o%20de%20cuias. Acesso em: 14 mar. 2022
MANKIW, N. G. Introdução à economia. São Paulo: Cengage Learning, 2013.
PINDYCK, R. S.; RUBINFELD, D. L. Microeconomia. Pearson Education Brasil, 2013.
VARIAN, H. R. Microeconomia: princípios básicos. Rio de Janeiro: Elsevier Brasil, 2012.