Textos avulsos

Ilustração: Sveta Dorosheva

Textos avulsos

Esta secção pretende "albergar" textos avulsos, de temáticas diversas, que os alunos,  professores e encarregados de educação escreveram por fruição e enviaram para a nossa BE.


Ilustração: Akikio

Maria já não mora aqui!

Foi numa manhã clara do princípio de Outubro. Eu tinha saído cedo de casa para comprar pão. Quando virei a esquina de regresso a casa, vi Maria a meter-se dentro de um táxi. Lembro-me que não levava uma grande bagagem. Apenas uma pequena mala e um saco de onde se conseguia ver algum do seu material de pintura. Chamei-a várias vezes, enquanto tentava alcançá-la, mas o táxi acabou por partir sem que Maria sequer olhasse para mim.

Bastante confusa com aquela súbita partida, subi a correr as escadas até ao nosso apartamento. Talvez ela tivesse deixado algum papel escrito a explicar o que estava a acontecer. Procurei por toda a casa sem nada encontrar. Maria tinha ido, sabe-se lá para onde, deixando ficar tudo o que lhe era mais querido: os seus livros, as suas pinturas, os cadernos com os seus poemas, as suas roupas mais bonitas, os seus colares e anéis. Era como se fosse apenas já ali e não demorasse a voltar. Mas já se passaram três anos. Maria continua sem regressar. Cada vez sinto mais saudade daquilo que ela representou na minha vida: a alegria de viver cada dia na mais perfeita plenitude de Ser.

Com a sua partida, eu parti também para um qualquer espaço aonde tudo parece estar entre parêntesis. Por isso, acalento a esperança do seu regresso.

Eu não sei viver sem Maria.

"Sofiar" (Pseudónimo) (Professora)

Ilustração: Shiori Matsumoto

 Ler… a minha paixão

Tal como o personagem no texto, Bastian, eu também gosto muito de ler. E, ainda mais importante, eu gosto do que os livros me ensinam.

 Quando andava no 3º ano eu não gostava nada de ler. Até que, um dia, recebi um livro como presente. Mal abri o presente torci logo o nariz. Passado uma semana, decidi começar a lê-lo. Quando acabei, percebi que, afinal, ler não era assim tão mau como eu pensava. E acabei por ler a coleção inteira.

 Os livros que eu mais gosto de ler são aqueles de aventuras, mas aventuras reais, pois acho que a História tem coisas muito interessantes para nos ensinar.

 Costumo ler à noite, antes de me deitar e acabo sempre por ficar uma hora a ler, pois quero sempre ver a página a seguir e, muitas vezes, perco a noção do tempo…

Durante as férias já tinha lido todos os meus livros e deitar-me sem ler nada parecia-me tão estranho… Mal voltei à escola fui logo buscar um livro.

 Hoje em dia, tenho por hábito ler muito, e é esta a minha paixão.

Matilde Sardinha(aluna)

Ilustração: Adrian Patout

Paixão

Tenho muitas paixões de diferentes tipos: de comida, de música, de escrita… Mas há uma que me marcou e tenho orgulho, digamos ... , de a ter.

Há quase um ano atrás, comecei a ser fã de uma banda australiana. Sei no que estás a pensar: “É a velha estória de uma banda que salvou a vida de uma miúda com a sua música.” Mas a minha é diferente. Eles não me salvaram, estava bem antes de os descobrir, só me mudaram para melhor, acho eu.

Através das suas canções e influências musicais, descobri e compreendi muita coisa que, anteriormente, não entendia.

Aprendi que as aparências não importam, desde que uma pessoa tenha intenções boas. Alguém pode ter cabelo pintado, tatuagens, “piercings” por todo o lado e ser criticado na sociedade apesar de: reciclar, ajudar os que necessitam e ser bom com toda a gente… não sei, coisas assim, boas, tal como uma pessoa que não fuma, pode ter uma aparência boa e ser aceite na sociedade, mas, no fundo, é a pessoa mais malvada do mundo.

Entendo melhor aqueles que ouvem música “punk rock”, porque as canções têm uma mensagem positiva e encorajadora, a maior parte delas. Nem todas são sobre “perdi a minha namorada, que tristeza” ou “quero morrer porque perdi o meu verniz preto”, quase todas falam de pessoas, em várias situações, por exemplo, que não desistiram quando a vida foi má para eles. Outras, falam sobre como é ser criticado por todos, mas seguir em frente, que alguém há de entender os seus objetivos.

 Apercebi-me que o amor é amor, não importa para quem é. Aprendi que tenho que ser mais confiante e que é normal ser um rejeitado; tenho que dizer o meu ponto de vista pois, faço parte da geração que vai mudar o mundo.

Sou mais compreensível agora e mais feliz comigo própria, só por causa deles (e de outras pessoas à minha volta, claro).

Sei que não é uma paixão comum e que não esperava que eu tivesse uma assim, mas eu estou feliz com ela.

Mihaela Dimofte (aluna)

Legenda: Monica Rohan

MANTA DE RETALHOS 

Numa vila, lá no alto do país, um menino de doze ou treze anos, caminhava pela neve até à sua escola. Era franzino, de olhar triste e óculos remendados com fita adesiva.

Sempre que se sentava na sua carteira, o seu olhar voava para o infinito e, de tristeza estampada no rosto, o menino permanecia ausente de tudo o que se passava dentro da sala. Um caderno pouco escrito com letra hesitante e uma esferográfica roída eram os únicos objetos que expunham em cima da sua mesa. Há muito que o livro o deixava de o acompanhar.

A professora não entendia. Porquê aquele alheamento, aquela ausência, aquela apatia, aquela desmotivação? Já tinha deixado de lhe marcar falta de material, porque os repetidos apelos para casa, para a mãe, não tinham surtido efeito. Um dia, a professora resolveu falar com o menino; tinha que perceber o que se passava. Tentou, mas não conseguiu. A boca do João não se abriu. Só aqueles olhos tristes, de súplica, de…. A professora não desistiu e substituiu os interrogatórios por sorrisos, olhares cúmplices, expressões de bondade, e uma empatia muda foi crescendo entre eles. Os dias foram passando e, um dia, a professora reparou  numa expressão de dor que saltava da cara do João. No fim da aula, a professora comprovou aquilo que já tinha percebido. Aquele corpo franzino estava repleto de manchas escuras, de marcas de violência. A partir dos laços que já os unia conseguiu, finalmente, ouvir a história do João. Uma história triste como a de muitos meninos que vivem em lugares como este, escondidos entre as montanhas e a neve.

O pai do João bebia, bebia muito, herança de uma infância também dura e infeliz e de uma pobreza que ele não queria, porque tinha jurado a si mesmo que nunca viveria com ela. Mas de que adiantaram as juras…. Tinha em casa três filhos para alimentar, uma mulher que se desfazia em trabalho, que se consumia como a lenha da lareira. Todos os dias ela ficava mais gasta, mais velha e, apesar das tareias que apanhava, os seus olhos ainda faiscavam. Que sonhos ela ainda alimentava? Como os conseguia ter, apesar de tudo?

Um dia, o pai do João entendeu que o sonho da mulher, apesar de ser comum ao de todas as mães, era grandioso: tornar o futuro dos filhos mais leve. Por isso, tudo fazia para que eles fossem à escola, estudassem. Contava-lhes histórias antigas, tão antigas como os montes que sempre estiveram à frente da sua casa, histórias que a acompanharam desde menina. O pai do João entendeu a cumplicidade que unia os filhos à sua mulher e imaginou-se só, mais só do que sempre estivera porque, num ápice, compreendeu que a teia do auto compaixão em que se tinha enredado o tinha tornado num desconhecido temido. E foi com estas certezas que mais uma vez bebeu, bebeu, bebeu. E, à medida que bebia, uma onda de fúria e ódio o foi invadindo. Quando chegou a casa bateu na mulher e porque o João tentou defender a mãe, também lhe bateu. Depois, sabendo que o filho gostava de ir à escola, foi ao saco do João e rasgou-lhe o caderno, porque os livros já tinham sido rasgados noutras ocasiões. Obrigado a dormir no quintal, o corpo do menino tremeu o resto da noite agarrado à mãe, enquanto, mais uma vez esta lhe tentava compor os óculos.

Comovida, a professora acariciou a cara do João, ofereceu-lhe o seu livro e olhou pela janela. A neve branca e serena continuava a cair lá fora.

Este é um retalho que pertence a uma manta cosida pelo fio invisível do tempo e por uma agulha que já coseu muitos retalhos como este.

 Ainda hoje esta manta está sobre a minha cama. Ainda hoje ela mantém as cores de ontem.

Cristina Ramos  (Professora)

Ilustração: Berk Ozturk 

Confidência

Gosto de fazer desenhos desde que era criança…

 Enquanto estou em casa, desenho porque é um espaço tranquilo e permite-me concentrar. Basta pegar num lápis, uma folha e uma revista e as ideias vêm-me à cabeça. Às vezes até invento desenhos, só mesmo para fazer o tempo passar.

Fui evoluindo o meu traço a ver e observar ao pormenor desenhos de outras pessoas. A minha mãe e avó entusiasmaram-me nesta tarefa e ajudaram-me a colocar características novas nos desenhos.

Nas aulas, ou com os meus amigos, ganho inspiração e estou constantemente a desenhar – daí eu ser muito distraído… Sempre que tenho uma folha e um lápis, começo a imaginar e ponho-me a desenhar.

Às vezes, em viagens, nas férias, levo o meu caderno e uns estojos para desenhar. Costumo olhar para as paisagens e relevos e imagino… Desenho também animais, caras, para além de copiar fotos, pelo que, o mais interessante no meio disto tudo, é que eu estou com a cabeça nas nuvens sempre que me ponho a desenhar…

Na minha vida, os desenhos estiveram sempre presentes, gosto de tentar desenhar e copiar certas coisas que me inspiram, como, por exemplo, símbolos, bonés, celebridades, carros, animais e até séries da televisão. Às vezes desenho coisas que se desenrolam ao longo da minha vida.

Bem, eu adoro desenhar! Isto, para mim, não é um estilo de vida, mas sim, parte da minha vida…

Jorge Parrança, (aluno)

Ilustração: autor desconhecido [Ares?]

História da mala do avô Alberto

Fazia mais de vinte anos que a velha mala não saía de cima do armário….ou melhor, saía nos dias das grandes limpezas, era-lhe sacudido o pó, e colocada de novo no mesmo local, por vezes lembravam-se de a abrir para recordarem-se do que tinham lá depositado: panos antigos, cortinas ou colchas e nos últimos tempos as bonecas com que as crianças da casa entretanto deixaram de brincar….Quando veio para Lisboa, nos confusos anos 70, já era uma mala antiga. Trouxe-a a avó Manuela, quando desfez a sua casa na Abrunheira e disse para os netos: “esta mala é muito antiga…já acompanhou o meu pai, quando ele foi para a 1ª Grande Guerra em França, como Oficial Médico!”

E assim vivia a mala na nossa imaginação: uma mala viajada que tinha estado na longínqua França (nesses tempos a França ficava muito longe, para lá dos Pirenéus! Onde se falava uma língua muito difícil de perceber!) e presenciado a essa guerra distante, em que os portugueses tinham combatido ao lado dos Aliados contra os Impérios Centrais. Sim, a mala tinha acompanhado o avô na histórica batalha de La Lys! A recordar-nos a passagem do avô Alberto por essa aventura, ainda havia lá por casa uma panelinha de cobre com o brasão da cidade de Aire-sur-la-Lys, presente que o avô Alberto tinha trazido à minha avó, então com 7 anos.   

Mas a mala não descansou, mal o avô Alberto regressou a Coimbra da guerra, abraçou a sua mulher Ernestina e a sua pequena filha Manuela, e foi logo destacado para ir combater a gripe espanhola para Évora. Esta doença, também conhecida como a peste pneumónica foi a maior epidemia dos tempos modernos, matou milhões de pessoas em todo o mundo, e em Portugal terão sido mais de 140 mil vítimas. Nesta época a maior parte da população vivia na miséria, havia escassez de alimentos por causa da guerra e poucas condições de higiene …ingredientes mais que suficientes para a propagação do vírus…. Segundo a minha avó, o seu pai, como médico, tinha sido mobilizado para

apoiar o combate à epidemia nesta região que teria poucos médicos para a luta necessária contra esta calamidade!

Parece que depois a mala terá regressado ao "rame-rame" dos dias iguais, terá acompanhado o avô Alberto noutras viagens de curta duração …

Um selo da Companhia de Navegação Colonial, colado numa das abas desta maleta, recorda-nos outras proezas! Em 1948 embarcou com a família, no paquete Colonial rumo à aventura africana! Manuela, a minha avó, partiu com os seus filhos para Luanda, para se reunir com o avô Zé, seu marido, que era o médico responsável pelo hospital na fazenda do Bom Jesus que ficava no meio do mato, na África profunda.

Da viagem de barco recorda-se a minha mãe, então com 6 anos, que passaram o Natal a bordo, e ela não se esquece do deslumbramento quando viu a sua primeira árvore de natal no navio. Em sua casa, naquela época, como na maioria das casas portuguesas, era o Presépio, anunciando o nascimento de Jesus que reinava nesta festividade! Da viagem ficam ainda as memórias da festa de batismo da passagem da linha do Equador.

A África relatada nas histórias da família ficou povoada de animais exóticos e ferozes, de grandes e majestosas paisagens, de grandes plantações de açúcar e café e, o mais importante, de uma vivência de liberdade e de convívio com a população e a natureza, por parte dos meus tios e da minha mãe ainda meninos.

A mala entretanto, regressou à Abrunheira, onde terá ficado “esquecida” até vir como guardiã das memórias com a avó Manuela para Lisboa.

 Agora, com o risco de ir para o lixo, a mala viajou até ao Alentejo…vive connosco, na Vidigueira, abandonada a um canto da sala, sempre disponível para ser redescoberta, aberta e do seu interior sair mais uma história das suas viagens!!!!

Maria Manuel Gantes (Encarregada de Educação)

Ilustração: Henrietta Harris

Paranoia solitária

Segunda-feira:

Eu não sei bem porque estou a escrever num jornal em vez de escrever no computador; não é que as minhas palavras fiquem susceptíveis a alterações, é apenas… Preciso de organizar os meus pensamentos, preciso que fiquem gravados num suporte físico, concreto, real.

Há já uma semana que estou a fazer este trabalho. Sempre fui muito dedicado ao meu emprego. Infelizmente, acho que me excedi desta vez. Passar sete dias num apartamento, sem janelas e numa cave, afeta qualquer pessoa. É o que dá ser forreta e comprar o apartamento mais barato do prédio. Para além disso, não falei com ninguém durante estes dias, o que agrava a minha situação já deprimente. Não encontro ninguém online, muito menos alguém no skype para conversar.

Isto está a ser demasiado. Amanhã vou fazer uma pausa e sair à rua. Tentar, pelo menos.

Terça-feira:

Os acontecimentos de hoje foram… bizarros. Eu tenho a certeza que aconteceram só na minha cabeça, mas ainda assim sinto que vale a pena relatar isto.

Acordei depois de uma boa noite de sono. Como já estava quase a acabar o meu trabalho, decidi ir rua, mas como estava um enorme temporal não valia a pena ficar doente e gastar ainda mais dias.

Mas depois lembrei-me de uma coisa: os andares de cima têm janelas.

Perfeito, pensei eu; assim podia ver se havia pessoas sem ter que sair. Subi as escadas, mas fiquei desapontado ao reparar que as janelas eram postigos. Mas lembrei-me de outra coisa. A última janela, do último andar, podia-se abrir. A cada passo que dava mais entusiasmado ficava. Quando finalmente cheguei, aproximei a mão da manivela mas… algo me fez parar.

Não foi nenhuma respiração atrás de mim, nem alguém a gritar, nem tão pouco a correr nas escadas na minha direção. Foi algo dentro de mim.

Um sentimento fez-me parar. Não sei se foi medo, paranoia, ou uma mistura dos dois, mas eu tinha a certeza que algo de “errado” estava do outro lado; e a partir do momento em que abrisse a janela, iria arranjar uma forma de me “apanhar”.

Com medo, e a temer pela minha vida, corri para o meu apartamento na cave e lá fiquei até agora. Vou dormir e amanhã tentarei sair outra vez.

Quarta-feira: 

Eu… eu não sei o que aconteceu hoje. Já não tenho a certeza se isto é só da minha cabeça. Acho mesmo que há algo lá fora que não consigo explicar.

Tal como escrevi na entrada anterior, eu ia tentar sair outra vez hoje, mas o temporal continuava, desta vez só com vento. Pensei que nunca mais iria conseguir sair deste prédio, quando me apercebi que podia convidar uma amiga minha de infância para me fazer companhia.

Telefonei-lhe e perguntei-lhe o que estava a fazer. Ela soava um pouco ébria, e quando disse que estava numa festa com amigos, apenas confirmou ainda mais os meus pensamentos. Mas ainda assim, ela estava sóbria o suficiente para me entender. Ela disse que podia passar por cá no dia seguinte, dissemos adeus e desliguei.

Mas pouco depois, um pensamento cruzou-me a cabeça.

Não ouvi mais nenhum som, a não ser a voz dela. Se ela estava numa festa como disse, era impossível não ouvir a música, ou outras pessoas. Mas pus a possibilidade de ela estar numa varanda, ou a apanha ar fresco.

O ar… não, não, não, não, não, não! É impossível. Estava claramente muito vento lá fora, como é que é possível eu só ouvir a voz dela? Ela disse-me que estava numa festa, quase que lhe podia sentir o cheiro a álcool e ela não é uma pessoa mentirosa.

Como é que isto é possível? Como é que isto é possível?! Tenho que me acalmar, tem que haver uma explicação racional para isto. É como se alguém me estivesse a perseguir este tempo todo e conseguisse modificar a voz com algum equipamento para me apanhar…

 Quinta-feira (de manhã):

Não consegui dormir nada. Isto está a dar-me muitas voltas à cabeça. Eu não queria usar o computador com receio que mais alguma coisa fosse acontecer, por isso tentei pensar no passado. Concentrei-me especialmente num momento da minha infância. Nalgumas noites eu costumava ir até um parque perto de casa. Eu apenas me sentava nos baloiços, mas gostava da frescura da noite. Eventualmente, ela também se juntava a mim, a minha amiga. Depois disso comecei a ir todos os dias ao parque e ela também. Apenas conversávamos, mas gostávamos da companhia um do outro.

Deixando isso de parte, tive uma ideia. Eu tinha uma câmara antiga guardada, mas ainda trabalhava. Peguei nela e montei-a no fundo do corredor, a apontar para a minha porta, e passei os cabos junto à parede. Assim podia ver no computador quem passava sem ter que sair.

Quinta-feira (de dia):

Não me vou deixar enganar. Eles não me vão enganar. Irei resistir até eles desistirem. A minha “amiga” veio visitar-me hoje. Eu ouvi a campainha a tocar e perguntei-lhe o nome. Ela disse-mo, mas ainda assim muitas pessoas sabiam o nome dela. Tanto quanto sabia, podia ser algum assassino do outro lado. Depois ocorreu-me que tinha a câmara no corredor, e quando fui ver, era “ela”. Ainda assim, não estava completamente seguro que era ela; por isso perguntei-lhe algo que apenas eu e ela podíamos saber. E ela mencionou todas as noites, todas as conversas e todos os momentos que passámos juntos naquele parque. Aliviado por ouvir alguém “familiar”, ia abrir a porta, quando me apercebi… Deixei o portátil ligado a noite toda com a câmara dele apontada para o jornal enquanto escrevia. Qualquer “pessoa” podia ter-me visto a escrever naquele momento no jornal. Qualquer “pessoa” podia ter modificado a câmara para apresentar uma representação diferente da realidade. Qualquer “ser” podia estar do outro lado, impedido de passar pela porta por qualquer razão incompreensível.

Não quis acreditar. Isto não podia voltar a acontecer. Um momento de alegria destruído por o que podia ser, ou não, uma coincidência. Estás a exagerar, disse para mim. Mas eu sabia cá no fundo que isto era a sério.

Comecei a gritar e corri para a minha cama. Encolhi-me a um canto e gritei:

- Não és real, vai-te embora, para quem quer que se estivesse a passar por “ela”.

 Um mês depois:

Não sei que dia é hoje, nem quero saber. Destrui tudo o que tinha de tecnologia. Computador, telemóvel, televisão, tudo. É só uma questão de tempo até aqueles “seres” me cortarem o fornecimento de água e luz. A comida está quase a acabar. Penso que ainda me dure para mais uns dias, mas não vou sair deste apartamento. Tanto quanto sei, posso ser a última pessoa da Terra a resistir contra “eles”.

Espera, consigo ouvir algo. É “ela”. Pelos vistos, acho que trouxe a polícia para me fazer sair. Mas eu não vou. Não há nada neste mundo que me faça sair deste apartamento a não ser se carregarem o meu cadáver. Os argumentos dela são fúteis. Está tudo na tua cabeça; Isso é apenas do stresse; Não há nada a temer. Como se algo me fizesse mudar de ideias. Até acho impressionante que “eles” estejam a ficar desesperados.

“Ela” está a dizer que trouxe um psicólogo para me convencer. Eu consigo ouvi--lo, desta vez admirando a sua convicção. “Ele” diz-me que isto foi apenas um grupo de coincidências em conjunto com stresse e paranoia, que causaram as condições perfeitas para que uma situação destas acontecesse. Diz-me também que isto está sempre a acontecer, e geralmente acontece às pessoas mais espertas. Elas são as únicas capazes de ligar os pontos e criar uma imagem inexistente, entrando num círculo autodestrutivo de paranoia, a não ser que um catalisador as pare.

Tenho que dizer, os argumentos “dele” são bastante convincentes. Se calhar isto é tudo da minha cabeça. Provavelmente estava muito cansado por causa do trabalho e comecei a imaginar coisas cada vez piores. Eventualmente entrei em paranoia e acreditei que estava a ser perseguido por “seres” capazes de modificar tudo o que fosse tecnológico. A minha demência foi piorando, até ao ponto em que apenas estou à espera da morte, em vez de ter que lidar com aquela realidade.

Explica perfeitamente tudo o que aconteceu, e dá-me todas as razões para sair e acabar de uma vez com este pesadelo.

É exatamente por isso que não vou sair.

Como é que posso ter a certeza? Como é que posso saber o que é real e o que não é? Estes equipamentos com estes fios que emitem sinais de fontes desconhecidas, sem nunca saber totalmente como funcionam. Eu consigo ouvi-los a bater na porta com um aríete. No entanto, existem equipamentos capazes de recriar o som de pancadas na madeira da porta.

Espera, mas assim… uma câmara funciona ao transformar a luz em sinais elétricos. Qual é a diferença entre uma câmara e um olho?! Funcionam da mesma maneira, se um pode ser modificado então… não, não pode ser!

Eu estou a ver dois garfos no chão. “Eles” estão quase a arrombar a porta. Eu tenho que saber, eu tenho que saber!

Data desconhecida:

“Eles” continuam a insistir. Eu continuo a resistir. Trouxeram-me para um asilo. Pelo menos foram simpáticos o suficiente e trouxeram-me o jornal. Ainda assim, preferia ter morrido. Todos os dias, “eles” insistem em convencer-me que estou a inventar coisas. Mas a pior parte é quando “ela” me visita. “Ela” falava sempre que me tratariam aqui e depois podíamos começar uma vida juntos, esquecendo tudo o que aconteceu. Sempre que me visitava, eu pensava se afinal não seria eu a estar errado e se teria optado pelas piores decisões possíveis… dadas as circunstâncias.

 Mas ultimamente “ela” não me tem visitado. Até é melhor assim! Pelo menos não me enche a cabeça de dúvidas. Agora que não os consigo ver, não tenho receio “deles”. Acho que a única maneira de “eles” me apanharem era se eu os visse.

“Eles” vão quebrar, antes de mim 

João Vargas (aluno)

Ilustração: Oliveira Tavares

 

O futuro desenha-se no presente  

Há muitos anos, um jovem e pobre camponês chamado Tomás encontrou o seu caminho. Tudo começou num horrível dia de chuva enquanto Tomás corria para baixo de uma ponte. Ele era tão pobre que não tinha casa. Durante esse longo percurso, Tomás encontrou um velhinho que era muito pobre, e, tal como ele, também não tinha casa. Então, Tomás decidiu ajudá-lo; levou-o para debaixo da ponte, deu-lhe uma maçã que tinha guardada e depois tapou-o com uma manta, para o proteger do frio. De manhã, quando os dois acordaram, o velhinho agradeceu-lhe muitas vezes pelo seu ato generoso. De seguida, Tomás levou o velhinho para o jardim da vila, mas antes de se ir embora perguntou-lhe:

- Caro Sr., nunca me chegou a dizer o seu nome.

- O meu nome é Eduardo. - Disse o velhinho

- Como o Eduardo não tem casa, tal como eu, podia passar as noites  comigo debaixo da ponte. Lá, tenho comida e duas mantas. O que acha?

- Tu és um rapaz muitíssimo generoso, nem todos os jovens são como tu, dispostos a ajudar um pobre velhote. Com todo o meu orgulho aceito ficar contigo.- Disse o Eduardo muito comovido.

A partir desse dia, Tomás ia todas as noites buscar Eduardo para irem dormir.

    Passaram vários dias e tudo estava bem, tal como devia estar.

    Um dia, Eduardo sentiu-se mal e o Tomás preocupadíssimo perguntou-lhe:

  - O que se passa? É alguma doença que o está a afectar? Quer que chame alguém? Eu não sei o que fazer!

 - Rapaz, meu filho, sim eu estou …

- Não fale, poupe as suas forças, eu irei encontrar uma forma de o ajudar. Já sei! O Sr. Eduardo deve estar a ter uma quebra de tenção, mas não se preocupe, eu acho que sei o que fazer!

   Então o Tomás foi buscar água para ver se o Eduardo melhorava e assim foi.

   Depois deste ato generoso, um senhor passava a pé pela ponte e, por acaso, era médico. Tomás chamou-o e o médico soube logo o que fazer: levou o Eduardo para o hospital e trataram dele. Quando o médico saiu do consultório Tomás apressou-se a falar com ele:

   - Como é que está o Eduardo?

  - O Eduardo está bem, afinal foi só um susto. Tomás gostava de te perguntar uma coisa.

  - Vá, diga!- disse o Tomás com um ar assustado.

   - Tu gostas muito de ajudar as pessoas, não é?

   - É, mas porque me pergunta isso?

   - É que eu estive a pensar e achei que tu devias tirar o curso de medicina. Um dia mais tarde, poderás ajudar as pessoas que necessitem.

   - Eu adorava, mas não tenho dinheiro para tirar um curso.

   - Isso não é problema. Eu pago-te o curso e não quero nada em troca, já que mais tarde irás compensar tudo o que eu estou a fazer por ti.

  Quando saiu do hospital, o Sr. Eduardo foi para um centro de idosos e Tomás ia sempre visitá-lo, mesmo depois de se ter tornado num grande médico.

   Sofia Matado (aluna)

Ilustração: Carine Bouvard

Confissões

Bem… como começar…

Vocês não me conhecem, eu não vos conheço… mas com certeza que o conhecem… com certeza conhecem o meu pai.

Adolf Hitler. Conhecem, certo? Em pleno 1940, quem nunca ouviu falar do líder nazi, Adolf Hitler? Ninguém, com certeza.

Mas bem, eu sou sua filha. Ele esconde-me do mundo, fazendo-me refém em casa para que eu não assista ao que ele está a fazer. Mas eu sei bem o que ele fez… Ele julga que eu não faço ideia das invasões aos países vizinhos, ele julga que eu não sei dos campos de concentração e do extermínio…ele julga que todos os alemães estão do seu lado nesta ideia absurda de aniquilar os judeus, os ciganos, os homossexuais, as pessoas de raça negra… Aqui em casa, sempre me disseram que eles representam o mal, que devemos mantê-los distanciados, que não devemos conviver com quem não é de raça ariana.

Ele é parvo, desculpem lá. Os de raça ariana pura são altos, louros e têm olhos azuis. Ele é baixo, moreno e tem olhos castanhos. E de onde vem tanta adversidade contra os judeus? Desde pequena que tenho uma amiga, a Ariana, que é judia e nunca vi mal nela. Mas, de repente, quando liguei para a sua casa ninguém respondeu. Durante dias, e dias, e dias, ninguém respondeu por muito que ligasse. Até que, enfimalguém atendeu: um soldado.

- Daqui fala um agente da Gestapo, em nome de Hitler. As pessoas que tentou contactar foram transferidas para um campo de extermínio…

Lembro-me de lhe ter desligado o telefone na cara. Desde esse dia que não dirijo a palavra ao meu pai. Será por isso que ele odeia os judeus? Porque eu sempre me dei melhor com crianças judias do que com as alemãs? Será? Nunca saberei….

Adolf Hitler, que nem na própria casa é considerado uma pessoa decente, como consegue ser idolatrado por milhares de pessoas do partido nazi? Como?

Quando isto acabar, ele vai arrepender-se, ou talvez não! Talvez consiga levar a sua avante nesta Segunda Guerra Mundial. Talvez ganhe… Talvez ele consiga extinguir a raça judia… E mesmo que consiga, ele nunca será feliz. Ele não é um líder partidário, ele é um assassino em série que não tem julgamento.

O meu nome é Kristin Hitler e não tenho orgulho.

Catarina Galvão (aluna)

Ilustração: Anna Valdez

A minha experiência leitora

 “Ler não é trabalho é prazer (…) é comunicar com os outros: é pôr em comum.”

Cada pessoa desenvolve o gosto pela leitura se, anteriormente, tiver tido experiências gratificantes. Aprender a ler e adquirir o gosto pela leitura foi, e tem sido, para mim, a possibilidade de crescer, de aprender, de viajar no tempo e nas histórias. A leitura tem um papel muito importante na nossa vida e na nossa construção enquanto pessoas: torna-nos mais perspicazes, mais conhecedoras, mais completas, mais capazes de sonhar...

Sempre procurei ler. Contudo, a cada fase da minha vida as leituras foram mudando, de acordo com a minha perspectiva de criança, de adolescente e de adulta. Os temas e os gostos foram mudando, tal como eu, para que, e também na leitura, a minha evolução pessoal se concretizasse. Houve alturas em que adorava ler histórias aos quadradinhos sempre acompanhadas dos desenhos engraçados e muito divertidos – a parte visual era muito importante para mim – depois passei para a fase dos policiais, da aventura, da ficção científica, e hoje encontro-me muito ligada a leituras que remetam para os laços familiares, a luta do ser humano para alcançar a felicidade, a harmonia, os valores humanos, familiares e de vida. Cada vez mais, encaro a leitura como instrumento complementar para uma vida mais completa e repleta de novas oportunidades para, através de um ou vários livros, poder construir um novo mundo pessoal, conhecer outros mundos, outras vidas, outras realidades, outras vivências.

Ler muito, e de forma variada, é um dos caminhos para a originalidade. Uma pessoa é tão mais original e peculiar quanto mais conhecer o que disseram os outros e quanto mais conseguir expandir as visões, as considerações e o conhecimento sobre o próprio mundo.

Fernanda Canelas (Professora)

Ilustração: Nicolas Francescon

Pânico e felicidade

Um dia, cruzava os mares um enorme iate. Os passageiros estavam tranquilos a desfrutar do belo passeio quando ocorreu uma avaria no motor. Instaurou-se o pânico, os passageiros corriam perigo de vida. Para piorar a situação, houve falhas de segurança, nomeadamente, o número de botes salva-vidas era insuficiente para que todas as pessoas se salvassem. O capitão não queria acreditar na situação em que estava e mais cedo ou mais tarde teve que anunciar aos passageiros o incidente. Os momentos seguintes foram de grande angústia e terror. Passava-se o tempo e deu-se um naufrágio.

Um grupo de cerca de vinte pessoas ficou retido no iate e naufragou durante meses no oceano. O grupo estava num pequeno bote por isso o espaço disponível era escasso. As pessoas tiveram que aprender a lidar com a situação. Um dia, John avistou uma ilha ao longe e olhou para os membros do grupo com olhos de alegria e esperança.

Na ilha, o grupo ficou desapontado porque ela estava praticamente intocável pelo Homem e, por isso, não estavam a salvos. Conseguiram adaptar-se aquelas condições de vida e aprender a extrair da natureza tudo o que precisavam para sobreviver. Entre muitas peripécias também havia momentos tristes em que alguns membros se deixavam ir abaixo emocionalmente.

O tempo passava-se e o grupo estava desesperado e sem qualquer esperança de salvação até que um dia John, um homem que liderava o grupo e era bastante forte emocionalmente, avistou um navio ao longe na linha do horizonte. Os momentos seguintes foram de felicidade e também de pânico porque em alguns momentos chegou-se a pensar que o navio estava cada vez menos ao alcance de vista. Mas John conseguiu chamar a atenção do navio ao causar um “mini-incêndio” e assim todos se conseguiram salvar nesta aventura que também serviu de lição de vida.

Pedro Cunha (aluno)

Ilustração: Maria Over

Olé Barcelona!

Estávamos no princípio do 2º período, na aula de Geografia. A aula estava a decorrer normalmente quando o professor nos disse que íamos fazer uma visita de estudo durante quatro dias a Barcelona.

Eu adorei a ideia, fiquei tão entusiasmada que comecei logo a falar com a Liliana e a Leonor e a pensar o que iriamos ver, onde iriamos dormir e com que professores iriamos.

Os dias arrastavam-se e nós estávamos cada vez mais ansiosos, talvez por isso, as aulas pareciam-nos eternas.

A uma semana de irmos para Barcelona, e ainda com muitos testes por fazer, não conseguíamos evitar falar da viagem, era um assunto difícil de contornar. A Liliana só falava da viagem de avião, o Diogo falava do Estádio do Barcelona, dos jogadores e do Messi, a Soraia falava da praia, eu falava das compras que pensava fazer e o Bernardo treinava o seu espanhol misturado com português!

E chegou o dia 27 de Maio. Acordei muito entusiasmada mas um bocado triste porque ainda tínhamos um teste de História para fazer.

Sonolenta, arrastei-me até à escola com os meus amigos e com um pensamento na cabeça: “estou a 10 horas de entrar no avião”.

Este pensamento recorrente foi cortado com o enunciado de História. Estava na hora de adiar a expectativa e concentrar-me no que era importante de momento.O resto da manhã passou-se entre conversas com o professor de Geografia e o meu grupo de colegas que estava de partida.

16h! Tinha chegado o momento. O comboio, um pouco antigo, pareceu-nos o melhor meio de transporte do mundo. A carruagem era nossa. Ouviam-se os gritos da Liliana, as gargalhadas da Leonor e do Diogo, as conversas animadas entre os professores e o Bernardo…

Lisboa estava a 1 hora e pouco de distância e Barcelona apenas a 2 horas.

A aventura finalmente começou!

Mariana Estrela aluna

Ilustração: Antonio Caparo

A Vingança

Era uma vez um rapaz, chamado Boris, que vivia numa pequena e velha aldeia na Austrália.

Boris sofria de problemas mentais e por isso era sempre excluído da sociedade. Pelo facto de não ter amigos, Boris, começou a amedrontar as pessoas que via na rua. Boris, esperava que as pessoas, depois de uma noitada, regressassem a casa e quando as apanhasse na rua, pregava-lhes sustos de morte.

Uma noite, apanhou uma rapariga relativamente nova na rua, colocou a sua máscara, pegou no seu martelo e o susto que lhe pregou foi de uma monstruosidade tal que a rapariga entrou em coma.

Boris sentiu-se muito mal consigo mesmo e correu para casa, sem chamar uma ambulância, ou pedir ajuda. Enquanto isto, a rapariga foi socorrida por uma ambulância que a transportou para o hospital.

O que Boris não sabia era que, enquanto a rapariga estava em coma, o seu espírito procurou por vingança e foi rapidamente para a casa dele.

Boris chegou ao seu prédio e achou estranho o elevador estar com uma falha de energia, decidiu ir pelas escadas. Ao longo da subida até ao seu apartamento, que era no 8º andar, foi assistindo a uma série de alucinações, que achou ‘’normais’’ devido ao seu problema.

Chegou ao seu apartamento, abriu a porta e assim que entrou, sentiu a presença de uma outra pessoa. Primeiro, começou por ouvir uns sons estranhos, crianças a gritar e a chorar, etc. … Passado um bocado, começou a ver sombras. Por último, o espírito fez uma aparição. Boris permaneceu imóvel, sem sinal de vida, até que caiu imóvel no chão.

Pouco tempo depois chegou a polícia e constatou que Boris estava morto. Chamaram uma ambulância, para tentar uma reanimação, mas nada.

Na autópsia, constataram que tinha sido um ataque cardíaco, mas nunca vieram a descobrir o que o causou.

Gonçalo Geraldo (aluno)

Ilustração: Matt Haber

Manhã de primavera

Era uma linda manhã de primavera, o sol estava alto, pouco passava do meio-dia e eu estava sentada no tronco da maior, da mais antiga e com mais folhas, árvore do meu quintal. Sobre os meus velhos jeans estava o meu livro favorito: um livro de poesia.

Todas as manhãs, sem exceção, depois de ajudar o meu pai na nossa horta - que embora pequena tinha abundantes, vistosos e sumarentos vegetais - eu ia para aquela mesma árvore ler o meu livro. Adorava sentir aquela pequena brisa de vento a infiltrarem-se nos meus longos cabelos ruivos; adorava sentir o calor dos raios de sol que penetravam entre os pequenos espaços sem folhas da árvore e que encontravam, sem quaisquer problemas, a minha face sarapintada de pequenas sardas. Adorava aqueles lindos e relaxantes momentos, em que combinava a leitura, a coisa mais importante para mim, e a natureza que eu tanto adorava. Esperava um dia conhecê-la mais a fundo.

Faltava-me uma pequena quadra para acabar de ler o meu livro quando oiço o chiar da porta (já há muito enferrujada, mas sempre esquecida pelo meu pai) das traseiras da cozinha da casa principal. Deduzi que fosse a minha mãe para me avisar que o almoço estava pronto. Provavelmente seria açorda, mais uma vez…

 Ela adora fazer açorda, talvez pelo facto de ser a única coisa que a minha falecida avó lhe ensinou e de ela conseguir fazê-la na perfeição – dou uma pequena risada ao pensar nisso.

Realmente, não me enganara. Reconheci de imediato a voz melodiosa da minha mãe a chamar por mim.

- Eleanor anda para dentro, o almoço já está na mesa. Anda rápido!

Terminei de ler a quadra, que já sabia de cor, e fechei o livro. Ainda com ele seguro entre as mãos, salto do tronco da árvore, num salto ágil e rápido e passo a correr pelo grande caminho de erva rasteira e flores campestres.

Assim que chego a casa, vou até à casa de banho e lavo as minhas mãos que ainda tinham pequenas porções de terra debaixo das unhas. Assim que as achei minimamente apresentáveis, fechei a torneira da água e sequei as mãos na toalha.

Pousei o livro em cima da bancada de pedra da cozinha e fui em direção à grande mesa redonda da sala de jantar.

- Bom dia, minha querida! – Disse-me a minha mãe antes de me dar um beijo longo e repenicado que deixou as minhas bochechas vermelhas.

- Sabes mãe, eu adoro poesia, ela ajuda-me a compreender o mundo! Hoje tomei uma decisão muito importante.

- Ai sim filha? E que decisão é essa? – Pergunta-me ela com um aspeto intrigado e um sorriso bem grande.

- Já sei que profissão quero seguir! – Declaro com um grande sorriso e os olhos a brilhar. – Eu quero ser escritora para mostrar a toda a gente como é o mundo. Ajudá-los a compreenderem-no melhor e a verem as coisas como eu as vejo.

A minha mãe abriu os braços e puxou-me para ela, num abraço apertado e caloroso. E assim permanecemos durante uns breves minutos com um sorriso rasgado nos lábios.

MS  (aluna)

Ilustração: Marco Somà

A minha vida em poucas palavras

Acordei.

Como há já tantos anos, as minhas costas queixaram-se, mas já estava tão habituada que nem liguei… Calcei os meus chinelos de quarto e fui até à casa de banho. Enquanto tomava banho, olhei para a minha mão, já enrugada, onde tinha o meu anel de casamento. Os anos podiam ter passado, mas a minha paixão permaneceu…

Após tantos anos, continuo apaixonada por aquele rapaz que vi, ainda novo, com o seu casaco e calças de cabedal e o cabelo para cima como se usava na época, encostado à parede, perto de uma jukebox. Continuo apaixonada por o mesmo rapaz que, para me conquistar, cantou uma música por baixo da janela do meu quarto, acompanhado apenas pela sua guitarra acústica. Pelo mesmo rapaz que, de propósito, me levou a fazer uma travessia de barco pelo rio Tejo, só para me pedir em casamento. Continuo apaixonada por aquele rebelde, cujos pais deserdaram, por querer casar com uma miúda do campo. Continuo apaixonada por o homem que envelheceu comigo. Continuo apaixonada por aquele velho rezingão que deve neste momento estar lá em baixo a preparar-me o café como sempre fez…

Saí finalmente do banho e vesti-me. Quando cheguei à cozinha, lá estava ele a fazer o pequeno-almoço… Sentei-me à mesa, ele serviu-me e sentou-se também.

-Hoje estive a pensar… - começou ele - antes de te conhecer, o meu maior sonho era passar a vida e envelhecer com alguém. E sabes que mais? Não me arrependo nada da escolha que fiz.- Disse-me, sorrindo.

Augusta (pseudónimo)aluna

Ilustração: Nati

 

Sem pontos

Se os contos de fadas

Se lessem sem pontos

Todos os príncipes

Andariam perdidos

Todas as vírgulas

Seriam encantadas

 

E no meio desses nadas

Muitas torres

Seriam fechadas

Muitos sapos

Perderiam a esperança

 

E se os contos de fadas

Se lessem sem pontos

Não restaria sequer

uma ténue lembrança

 

Não

Porque no meio desses nadas

Talvez uma simples criança

Imaginasse mil histórias

Que não estando contadas

Nascem nessa magia

Livre de pontos e linhas

Simples e nuas

Assim despontadas

 

João Pedro Martins (Professor)

Ilustração: Fred Calleri

 

Amigos de verdade

“Amigos de verdade não se importam se tu és gordo, magro, baixo, alto, rico, pobre, preto, branco, gay, lésbica, bissexual…” (Eminem)

E acima de tudo, não te fazem chorar horas a fio sobre algo que tenha dito... Durante anos a fio as pessoas fizeram-me chorar e ainda fazem... o que é normal visto que eu sou uma “maricas” do pior... Mas, o pior de tudo é que essas pessoas se diziam minhas amigas... Sabes uma coisa? Amigo não maltrata, amigo não goza, amigo não magoa, amigo é amigo para o bem e para o mal...Das pessoas de quem não gostamos tanto faz se elas te chamam: “saco de ossos”, fanhosa, Pinóquio, Bifa, BORBULHA, gorda, se elas te gozam por não teres mãe ou pai...Mas dos teus "amigos" custa 3000x mais do que de uma pessoa de quem não te importas, e sabes porquê? Porque amigo é um irmão, e um irmão é uma pessoa que te ama e que tu amas, aconteça o que acontecer...

***

A próxima etapa: Capítulo 2

Tinha chegado à altura de mudar, de crescer, de viver a vida para lá das florestas que ela tinha sempre conhecido. Era a altura de mudar para a grande cidade e esquecer, um pouco, a aldeia e a pequena casa na floresta onde crescera, era a altura do liceu.Quando ela entrou na sala, depois de ter ando perdida por toda a escola, apercebeu-se de que era diferente. Não era nem mais feia, nem mais bonita, nem a mais mal vestida, nem a melhor… apenas diferente das outras raparigas e rapazes …

Quando ela entrou naquela sala, apercebeu-se de que aquela etapa da sua vida estava a terminar. Iria mudar, não só a sua forma de pensar como de existir e viver a sua vida.

A campainha tocou e, tal como o vento leva o som, o som levou os alunos; todos menos ela. Afinal, não conhecia ninguém naquele sítio a não ser a si própria.

Um rapaz veio ter com ela, Ele tinha uns olhos azuis que lhe faziam lembrar o céu no meio das árvores altas da sua terra e na cara, uma boca rosada e bochechas semelhantes às do seu avô… e isso fê-la ter saudades das montanhas, das florestas. Por momentos quis desistir de tudo e voltar para casa…

Mas o que lhe aconteceu a seguir mudou a sua vida para sempre…

 Atena, (pseudónimo), aluna

Ilustração: Gribanova Ksenia

Pequenas coisas da vida

Saí de casa e logo o meu cabelo ruivo começou a ondular ao sabor da suave brisa que soprava naquela tarde primaveril. Não me apetecia estar em casa e, neste fim-de-semana, todas as minhas amigas haviam partido para as aldeias circundantes para visitarem as avós…

Decidi que isso não me impediria e resolvi sair e ver que sorte me esperava.

Olhei em volta e decidi que iria à praia. Coloquei os meus fones nos ouvidos, como de costume e fiquei a ouvir a música…

Na praia, a areia suave tentava penetrar nos meus sapatos, mesmo sem grande sucesso, apesar de alguns grãos de areia terem sorte. O meu cabelo, que estava à mercê do que o vento decidisse fazer, estava completamente bagunçado e sem esperanças de melhorar tão rápido…

Mas nem tudo é mau quando se vai a uma praia completamente deserta…

A quietude daquele lugar enchia-me de calma, fazendo-me pensar com mais clareza em todas as decisões que tomara, nas que devia ter tomado e nas que iria tomar… Este lugar transmitia-me uma calma sem igual e sem antecedentes. Este lugar era o sítio que eu mais adorava em todo o mundo… Não que conhecesse muito mundo, visto que o mais longe que já fui foi “ali” à Espanha, mas pronto…

Distraída com toda aquela calma, acabei por chocar com um rapaz que vinha na minha direção. Chocamos com tanta força que acabei por cair e bater com o rabo no chão. Ele ajudou-me a levantar e só tive tempo de olhar para os seus olhos verdes, antes de sentir a minha face a rosar e ele ir-se embora…

***

Uma semana depois… 

Abri os olhos, piscando-os freneticamente. Uma luz forte incidia sobre mim… provinha da janela do meu quarto, deixada aberta na noite anterior.

Obriguei-me a levantar o meu corpo cansado e “arrastei-me” até à cozinha, onde comi o pequeno-almoço, ou seja, uma banana e um copo de leite.

Depois de fazer a minha higiene pessoal, vesti o meu uniforme escolar: uma saia vermelha pelo joelho, uma camisa branca, um colete vermelho com o emblema da escola, umas meias brancas pelo joelho e sapatos de vela castanhos… Não gosta nada dele, mas tem de ser.

Com a mochila às costas, desci as escadas a correr e dei um beijo na testa da minha mãe, que já estava a preparar o seu pequeno-almoço, e saí apressadamente de casa.

Cheguei à escola, e constatei que nenhuma das minhas amigas já tinha chegado… Sentei-me no banco do costume a ler um livro do meu autor favorito, Nicholas Sparks.

-Com que então, “A Melodia do Adeus”? – Uma voz masculina fez-se ouvir perto de mim.

-Já sei o que vais dizer… que devia antes ver o filme, certo? – Afirmei, sem tirar os olhos do meu livro.

-Não. Por acaso até acho que ler é importante nos dias que correm. – Ele afirmou.

Olhei, com cara de espanto, para o rapaz que se tinha dirigido a mim. Só depois reparei que se tratava do rapaz da praia… do rapaz que há uma semana que insiste em permanecer na minha mente… do rapaz cujos olhos verdes me fazem ter sonhos lindos à noite… Estaria a sonhar? O seu corpo aparentemente musculado e, sem duvida, bem constituído estava de pé em frente do meu frágil e pequeno corpo sentado. O seu cabelo castanho encaracolado balançava ligeiramente ao vento, tal como o meu cabelo ruivo, um tanto despenteado.

-Gostas de ler? – Perguntei finalmente.

-Adoro! Posso sentar-me? – Ele respondeu-me, mostrando-me o seu sorriso mais perfeito.

Acenei que sim com a cabeça, na certeza de que estes encontros repentinos com ele se iriam repetir…

Patrícia, (pseudónimo) (aluna)

Ilustração: Mimi Ilnitskaya

O Coração 

O coração

bate forte,

bate forte de paixão,

quanto mais se alimenta,

mais cresce de emoção.

O amor é alimento

que se pode sentir.

A alegria é satisfação

que nos faz sorrir.

 

Quem não sabe sorrir,

não sabe viver,

 a doença da tristeza,

 é pior do que a de não ver.

 

Quem sabe sorrir

tem bondade em si,

mesmo sendo pobre

pode ser feliz.

 

Ser feliz é bom,

é ser livre, ter liberdade,

poder cantar

e crescer com a idade.

 

Alguém com avareza

nunca pode receber,

é egoísta e detestado

nem gasta para comer.

Diogo Galinha  (aluno)

Ilustração: Dal Sang

Peça com nome não atribuído

-E o papel principal masculino vai para Jean!- disse o produtor.

Ouviram-se palmas de satisfação e, de seguida, fez-se silêncio. “- Bem, ainda bem que estão contentes. A protagonista da peça será… a Emilly. Agora esforcem-se ao máximo e vemo-nos amanhã!”

A partir daí, Emilly, não ouvira mais nenhuma palavra. O homem saiu, deixando todos a fazerem uma festa na sala.

Emilly estava corada e a sorrir, enquanto Jean se mostrava superficial, sem deixar que os sentimentos tomassem conta dele.

Carol, Dan, Zack e Sofie estavam radiantes pelos seus papéis secundários e por dançarem com quem tanto desejavam. Finalmente abandonaram a sala.

***

(Dia seguinte) 

Quando Mike, o diretor da peça chegou à sala, Emilly e Jean já estavam a ensaiar. Jean tinha uns calções esfarrapados e sujos com óleo, talvez devido a trabalhar numa oficina. Emilly estava com umas leggins, um bonito colar, talvez de uma das mais caras joalharias desta cidade, e uma camisa clara que lhe dava um ar mais juvenil.

Dan e Zack apareceram logo a seguir. Dan é do tipo de rapaz que não se mete em confusões mas, pela sua expressão, algo o preocupava; a companhia também não ajudava, o Zack… o traquina do Zack.

Carol e Sofia chegaram pouco depois com a roupa da peça na mão. Carol sorria timidamente desejosa de começar a ensaiar no duro e Sofie, não consegui decifrar o seu olhar, mas percebi que talvez estivesse a amar todo aquele circo.

O ensaio começou (continuou para Emilly e Jean), com todos a gritar, a tentar fazer os melhores passos possíveis e melhorando-os a cada passo. Quando este terminou… bem, pode-se considerar que este foi o maior ensaio que alguma vez tivera!

Alice Capito (aluna)

Ilustração. David Van der Veen

A história da Maria...

"Não importa o que o passado fez de mim.

Importa é o que farei com o que o passado fez de mim." (Jean-Paul Sarte)

A história da Maria começa como tantas outras: era uma vez uma menina, não muito bonita mas muito airosa, que um dia resolveu partir para encontrar uma vida melhor. A vila abandonou e à cidade se aventurou. 

No caminho que percorreu, seus sapatos rompeu e os trapos já velhinhos que vestia, eram a única coisa que a cobria. Mas sem medo e com vontade, lá foi a Maria! Ao avistar a grande cidade, a Maria estremeceu. Como seria viver ali onde o verde se perdeu e o cinzento, em seu lugar, apareceu! Recordando a sua vila, tão modesta mas acolhedora, a Maria chorando lá se foi aos poucos consolando!

Uma casita pequena encontrou e nela se aninhou. A partir daquele momento seria ali o seu cantinho, o cantinho da Maria.

 Com coragem e determinação, a pequena Maria foi crescendo no meio de toda aquela confusão e, sem dar por isso, tornou-se "grande". Grande como o amor que ainda sentia pela sua terra e por tudo o que para trás deixou. Grande por ter encontrado aquilo por que tanto lutou. Grande por ter tido coragem e ter encontrado outro amor, um amor diferente daquele que pelo seu passado sentia, um amor diferente mas imenso, que a transformara na pessoa que sempre desejou. 

Com isto a Maria aprendeu que, mesmo pequenos, todos podem ser "grandes" um dia. Basta acreditar e seguir, com coragem, os passos da Maria.

 Elsa Boto( professora)

Ilustração: Sabzi

Os pares dançam juntos numa festa

Carlota trazia um vestido vermelho vivo com um pequeno folho amarelo. Os saltos dos seus sapatos verdes pareciam querer quebrar com todo o peso neles colocados. Carlota vinha de uma família um tanto abastada e trabalhava como advogada, Joaquim, o seu par, vestia um fato preto perfeitamente engomado, mas, mesmo largo, deixava notar alguns vestígios do excesso de comida. Joaquim tinha uma mercearia e o negócio avançava bem e a passos largos. A cada dia, tinha mais investidores e até já pensava em abrir uma segunda loja, na baixa.

-A música está boa… - deixou Carlota escapar dos seus lábios pintados de um vermelho forte.

-A companhia é melhor. – Afirmou Joaquim, sorrindo.

Mais atrás, Jormão, conhecido como o “engatatão”, mirava as mulheres solteiras. Esfregava o seu bigode castanho com a mão enquanto pensava onde se deveria sentar para o seu fato preto não ficar amarrotado. Perto dele passou uma donzela e ele logo se preparou para tentar “engatá-la”. Aproximou-se devagar e colocou-lhe uma mão no fundo das costas. A rapariga, inocente, sorriu-lhe e juntos abandonaram o bar.

Carlota e Joaquim ficaram juntos, a dançar, até todos já terem abandonado a festa. Quando finalmente saíram do bar, o cabelo preto de Carlota começou a ondular ao sabor do vento.

Joaquim foi deixa-la a casa, com a promessa de que no dia seguinte se iriam encontrar.

Catarina Galvão(aluna)

Ilustração: Choi-Mi-Kyung

Os anos passaram

Ela vivia numa casa perdida, no meio de uma floresta, onde tudo o que a rodeava a fazia feliz …

Ela vivia com o seu avô, um homem que fora alto e elegante nos seus tempos de juventude e que agora vivia com o que lhe restava desses dias. Um homem a quem a velhice não assustava. Continuava com uns olhos de um verde profundo, uns olhos penetrantes e sem maldade que combinavam com umas bochechas rosadas e um sorriso amigável  para todos, como se de uma criança ingénua se tratasse. 

 Ela, a quem chamavam carinhosamente Nina, já não era a mesma pessoa, já não era a criança que todos pensavam que seria para sempre. Ela cresceu, trocou as tranças pelo cabelo solto, os rebuçados pelo creme para as borbulhas, a alegria de ser criança pela adolescência.

Nina (pseudónimo), aluna

Ilustração: Henrietta Harris 

Só falta um pouco mais …

Estou Farta! Farta disto tudo. Apenas quero morrer.

Os dias já não são dias, as noites já não são noites. Aqui, existe apenas solidão. Esta solidão que me consome até não deixar quase nada daquilo que eu sou.

Estas paredes que antes nos protegiam dos perigos lá de fora só me encurralam. Encurralam-me numa vida que eu não quero mais viver. Sinto falta dos seus abraços quentes e apertados, das suas mãos suaves e fortes a passearem pelo meu corpo, do toque dos seus lábios nos meus. Sinto falta de todos esses pequenos momentos que até há poucos dias me faziam sentir viva, que me faziam sentir humana.

Agora, a única coisa que tenho dele são gemidos e gritos de desespero, desespero por não poder cravar os seus dentes na minha carne e arrancá-la do meu corpo. Já pensei inúmeras vezes em entregar-me, mas depois quem tomaria conta dele? Quem iria querer tomar conta dele, de um homem honesto e bondoso que teve a pouca sorte de ser mordido para salvar a sua namorada?

 Agora já ninguém o vê como eu vejo. Todos os que olham para ele pensam: “quando é que ela ganha juízo e percebe que aquilo é só um zombie, já não é o rapaz que ela em tempos amou?” E eu tenho cada vez mais vontade de responder: “ quando é que todos vocês vão perceber que sendo ele um zombie, ou eu, só com ele é que eu me sinto completa?”

Por mais coisas que me possam dizer, ou mostrar, eu sei que dentro do seu ser, ele ainda sabe quem é, ainda sabe quem eu sou e ainda sabe quem somos nós juntos.

Apesar de pouca, eu ainda tenho esperança, que a ciência me ajude, nos ajude. Eu sei que estou quase lá, só falta mais um pouco para podermos voltar, voltar a correr, voltar a pular, voltar a respirar, voltar a trocar olhares e sorrisos, voltar a trocar palavras de amor, voltar a observar o mundo que nos rodeia. Só falta mais um pouco para podermos voltar a ser felizes juntos. Voltarmos a ser felizes nos braços um do outro.

Karen, (aluna)

Ilustração: Girofla.

Experiência sem igual

Olá!

O meu nome é Sophia e sou voluntária numa instituição de voluntariado britânica chamada “Comic Relif”. Neste programa em que me inscrevi, enviam-nos para ajudar os mais desfavorecidos... Tenho algum receio do que vou encontrar, confesso, mas espero conseguir fazer o meu melhor!

Estou agora num avião a caminho de uma antiga colónia britânica, o Gana, onde irei trabalhar. Desejem-me sorte!

***

Finalmente aterrei! Assim que cheguei, uma equipa que já tinha ido buscar a minha mala levou-me para a comunidade de Agbogbloshie, na capital do Gana, Accra. Quando cheguei, vi crianças a brincarem com uns carrinhos feitos de madeira, o que me fez sorrir. A olhar por eles estavam duas senhoras idosas que pareciam moer algo entre duas pedras…

-Falam inglês? – Perguntei a um dos monitores do programa.

-Sim. Apesar de ser uma comunidade pequena, nós ensinamos-lhes.

Cheguei-me perto de uma pequenina que brincava com uma boneca de trapos…

-Olá, linda. Onde estão os teus pais? – Perguntei, tentando não a assustar.

Ela olhou-me com um olhar desconfiado, depois tristes e por fim ternurento.

-Ali. – Disse por fim, apontando para o Céu.

Fiquei chocada com o que a pequena me disse e depois abracei-a. Queria extrair toda a sua dor, todo o seu sofrimento, e passá-los para mim, para que ela pudesse ser feliz… Custa-me saber que milhões de crianças nestes países são órfãs…

-Está tudo bem… - disse a menina, – eles estão a olhar por mim. Nesse momento emocionei-me.

-Tu queres brincar comigo? – Perguntou a menina.

-Claro! Acho que tenho um tempinho. – Disse e ela sorriu.

Estávamos a brincar quando um homem alto e aparentemente forte se aproxima.

-Obruni! Estás a brincar com a Fridous? Ela é a minha sobrinha.

Obruni é uma palavra akan que significa, literalmente, “homem branco”. É utilizada várias vezes, mas não para ofender as pessoas. E Fridous é um nome típico no Gana. Foi tão bom saber que a menina não estava sozinha!

-Sim. Estamos a brincar, – respondi. – Sou a Sophia. – Levantei-me e estiquei a mão.

- Sou o Keita, – disse apertando-me a mão.

Keita e Fridous disponibilizaram-se logo para me mostrar tudo e me dizer como as coisas funcionavam por ali. Vi a sua casa… Viviam num bairro de lata, sem água, nem eletricidade. Aquela visita custou-me muito, pois ninguém devia viver nestas naquelas condições tão diferentes das que estamos habituados…

No fim da tarde, já tinha conhecido várias pessoas, cada uma com um nome diferente e com vários significados… Decorei alguns que realmente me marcaram, por alguma razão, como, Keita, que significa “aquele que adora”, ou Niara, que significa “aquela que tem grandes propósitos” e Aduoa, que significa “paz”.

Só deixei a comunidade no final da semana, mas já estava tão apegada às pessoas que só me apetecia trazê-las comigo… Se antes já estava determinada a ajuda-los, agora que os conheço estou ainda mais!

 Foi, sem dúvida, uma experiência que me deixou muito mais alerta para o que se passa no mundo e quero voltar ao Gana, quem sabe, no próximo ano, para visitar aquelas amáveis pessoas que me acolheram tão bem…

Sophie (pseudónimo) (aluna)

Ilustração: Jennifer Yoswa

Se a vida fosse fácil...

Se a vida fosse fácil, a esta hora estaria no topo do mundo...

Talvez, se a vida fosse fácil, neste momento, estaria com as pessoas que mais amo e não me magoaria quando elas partissem!

Se a vida fosse fácil, não magoaria quem amo por ser quem sou.

 Se a vida fosse fácil, não me sentiria excluída de todos os grupos em que me tento encaixar.

Se a vida fosse fácil, poderia pertencer a qualquer grupo que quisesse.

Se a minha vida fosse fácil, não seria julgada pelo que não sou e poderia ser feliz com quem eu quisesse…

Mas a vida não é fácil porque nós estabelecemos metas, impomos desafios, que acabamos por achá-los difíceis  e nos levam a “cair”.

A vida é difícil  porque encontramos sempre barreiras, ou muros de 10 metros, os quais pensamos ser intransponíveis. E é aí que nos tornamos fortes, mais do que pensávamos, e ultrapassamos qualquer obstáculo sem qualquer esforço. 

Temos de ver a vida e tudo que faz parte dela, não só com os olhos, mas com a cabeça e o coração, caso contrário ficamos paralisados à espera que os nossos sonhos se concretizem!

Alyn, (pseudónimo) (aluna)

 

Ilustração: Jason Brooks, fashion

A experiência de uma adolescente

Ela caminhava, solitária, rua fora… Observava cada detalhe da rua, anotando-o num caderno que levava na mão esquerda. O seu cabelo castanho com algumas madeixas rosa ia sendo sacudido e batia-lhe nos ombros enquanto andava. A música dos seus fones era audível, mesmo de longe.

De repente, a rapariga parou e voltou-se. Pude vislumbrar o seu rosto. Maquilhagem escura, como a sua roupa, e bastante carregada. Fixou-me com um olhar, como que a examinar-me, e anotou algo no seu pequeno caderno. Algo no seu olhar castanho revelava solidão e intriga… Virou-se novamente e retomou a sua caminhada. Avançava pela rua, continuando a anotar tudo. Podia ser escritora, ou poetiza, pela maneira como anotava tudo o que a rodeava. Chegada à estrada principal, voltou a olhar-me. Fez um gesto com a cabeça, como se me estivesse a chamar e ficou parada em frente à padaria. Avancei, lentamente.

-Sou a Olívia. E tu? – Perguntou a rapariga misteriosa, que agora sabia que se chamava Olívia.

-Bernardo. O meu nome é Bernardo.

-E porque me estavas a seguir?

-Porque vou para a escola, – constatei.

-Pois… Andas em que escola?

-Ando no liceu.

-Eu também… Vamos juntos?

Espantado com o seu convite, aceitei sem demoras. Avançamos lentamente, sem uma única palavra. Ela deu-me um dos seus fones, para que pudesse ouvir a sua música. “The Unnamed Feeling” dos Metallica (para quem não conhece: http://www.youtube.com/watch?v=t8Xaet7OpaM  ) Rock antigo e puro, nada que não esperasse daquela rapariga. Olívia… Estava encantado com ela. Tal como eu, gostava de Rock antigo e andava sozinha. Quando, finalmente, chegamos ao Liceu e tivemos de nos separar, quis segui-la de novo para partilhar com ela a minha própria solidão.

***

Dia Seguinte 

Saí de casa e vi Olívia. Gritei-lhe para que esperasse e ela assim fez. Sem hesitar, voltou a entregar-me um dos seus fones. Todos os dias continuamos com esta rotina, até que um dia, a caminho da escola…

-Matos.

-Hã? – Perguntei.

-Matos. O meu nome é Olívia Matos.

-Bernardo Silva. - Disse.

A partir daí, todos os dias de manhã, a caminho da escola, Olívia contava-me partes da sua vida. Por exemplo, descobri que tem 17 anos, como eu, vem de uma família pequena, como eu, os pais dela passam muito tempo a trabalhar e são ricos, por isso, muitas vezes a sua única companhia é a música e a escrita. Todos os dias, sem faltar, partilhávamos mais um facto interessante sobre cada um de nós.

Mas, um dia, Olívia não apareceu. Numa terça-feira de manhã, Olívia faltou ao nosso encontro diário. Esperei mais de trinta minutos antes de ir para a escola… Quando entrei, todos me olharam. Uma rapariga veio ter comigo e entregou-me um envelope. Dizia: “Entregar especificamente ao Bernardo Silva, do 11ºB, no dia 16-4-2013”. Engoli em seco e afastei-me dos olhares daqueles que estavam curiosos. Sentei-me num banco na parte detrás da escola e abri a carta:

Bernardo,

Desculpa partir assim, mas já não aguentava. Eu era apenas uma adolescente e os adolescentes precisam de alguém. Foste o mais parecido que alguma vez tive com  um amigo… Os nossos encontros matinais despertavam em mim uma alegria… Mas essa alegria não era superior à mágoa e tristeza existentes no meu coração. Desculpa se não  faz sentido o que fiz, mas quero que saibas que te amei. Agora, vou olhar por ti de um sítio melhor. De um sítio sem mágoa, tristeza, ou solidão.

Da sempre tua,

Olívia 

Ao ler as declarações de Olívia, compreendi o que ela fizera. Ela planeou isto, ou não teria pedido para me entregarem isto neste dia específico. Uma lágrima caiu pelo meu rosto, mas tinha que ser forte; tinha que ser forte por Olívia… Com certeza era isto que ela iria querer…

***

Bem, passaram seis anos desde que Olívia morreu. Para deixar claro, já não é o Bernardo que está a escrever, eu apenas vim contar o resto da história porque ele não teve hipótese de a contar…

Após a morte de Olívia, Bernardo tentou manter-se firme, por ela… Mas, o amor que ele sentia por Olívia era mais forte. Ele sentia a falta da sua amada e queria estar junto dela. Na escola, começou a ser gozado. A sua alcunha era “O namorado do fantasma”… Eles diziam coisas como: “Mata-te! Vai visitar a tua namorada!” ou “Não tens saudades da Olíviazinha? Não?”, entre muitos outras… Como devem imaginar, uma pessoa que está a sofrer a perda de uma outra que ama e ter de ouvir isto, começa a entrar em colapso… Um dia, tal como Olívia, ele desistiu.

Na minha opinião, não foi uma atitude fraca... Ele tomou as suas decisões, fez as suas escolhas. Enquanto vivo, ele foi forte, mas atingiu o “fundo do poço”. Agora, no liceu, eles são conhecidos por todas as dificuldades que lhes foram apresentadas e, para além disso, agora não há uma campanha de sensibilização sobre bullying em que eles não sejam referidos. As suas vidas não foram em vão e, onde quer que estejam, eles sabem disso.

Énia (pseudónimo) (aluna)

Ilustração: _度薇年

Finalmente…

Tudo aquilo que espero concretizar, todos os sonhos que tenho por realizar, só os posso colocar agora em jogo, pois sempre fui muito limitada nisso com os meus pais. Finalmente já não dependo mais deles para tomar as minhas decisões e o meu futuro, posso ser eu a escolher aquilo que quero ser e aquilo que quero fazer.

Para além de ser o dia dos meus anos, é também o dia em que vou deixar o meu país, o país que sempre me acolheu. Não posso dizer que fui muito feliz aqui, mas também não posso dizer que fui infeliz. Mas está na altura de começar uma nova vida, cheia de sonhos para realizar; uma vida cheia de novas aventuras e, claro, cheia de amor, aquele amor que deixei partir há já três anos.

Todos os dias falo com ele; todos os dias troco lindas e apaixonadas mensagens, mas é claro que não é o mesmo. Há três anos que os nossos lábios não se tocam que os seus braços não me envolvem, que os nossos olhares não se cruzam como antes; há  três anos que não sou totalmente feliz, nem estou completamente viva. Mas hoje, a minha felicidade vai ser reposta, vou finalmente estar com ele. 

***

Tinha acabado de aterrar, estava agora a sair da porta de embarque e o meu coração batia cada vez mais depressa. Já tinha revisto, vezes sem conta, as palavras que iria dizer ao Nuno assim que nos voltássemos a reencontrar.

Ali estava ele, de olhos postos no grande placar das aterragens, com uma mão apoiada no cotovelo e outra parada em frente da sua boca, roendo as unhas. Conseguia notar-se perfeitamente à distância que estava extremamente impaciente com a minha chegada e isso fez suscitar um grande sorriso no meu rosto.

Sem mais demoras, comecei a correr o mais depressa que as minhas pernas me permitiam, cada vez mais excitada com o nosso reencontro.

Comecei a gritar o seu nome, e nem um segundo se passou até ele rodar a cabeça na minha direção e, de repente, vi um grande sorriso crescer nos seus lábios. Ele começou a corre na minha direção e, quando estávamos a meros centímetros de distância, ambos abrimos os braços e fui envolvida nos seus fortes e reconfortantes braços. Finalmente um abraço ocorreu entre nós, um abraço há tanto tempo esperado.

Com os nossos corpos colados, conseguia sentir o seu coração a bater; estava acelerado, assim como o meu, devido à nossa ansiedade e também ao esforço físico que tínhamos acabado de fazer para ficarmos novamente juntos.

Ele desfez o nosso abraço e olhámo-nos nos olhos.  Finalmente vi os seus olhos castanhos como o chocolate quente que eu tanto adorava pela manhã. Logo de seguida desviei os meus olhos para os seus lábios que formavam aquele sorriso que eu tanto amava, aquele sorriso que me deixava totalmente louca e apaixonada por ele, o sorriso que há tanto tempo não via ao vivo e de que sentia tantas saudades.

Sem mais demoras, beijámo-nos e, finalmente, mais uma demonstração do nosso amor estava a realizar-se. Há tanto que não tocava naqueles lábios perfeitos e sensíveis… há demasiado tempo que não sentia a sua língua a percorrer todos os cantos da minha boca! Depois destes pequenos carinhos, finalmente proferimos as nossas primeiras palavras.

Nuno- Finalmente, Susana! Nem sabes o quanto eu sofri todas as noites sem ti ao meu lado para me abraçares, sem as tuas palavras sábias e reconfortantes. Tive tantas saudades tuas meu amor.

Susana- Oh, Nuno! Eu amo-te tanto. Finalmente vamos poder começar uma vida juntos.

Nuno sorriu uma última vez para mim, e beijamo-nos novamente. Um dos muitos beijos que certamente iríamos trocar durante a nossa vida juntos.

Leonor, (pseudónimo), 9º ano

Ilustração: Cécile Mancion

Era uma vez…

Hei príncipe! Sim, tu que estás a ler este texto…limpa as lágrimas, levanta a cabeça e põe o teu melhor sorriso…e sabes porquê? Porque chegou a hora de seres feliz. Sim, todos nós já sabemos que só querias ser feliz com ela, mas percebe uma coisa, ela hoje tem um e amanhã tem outro. Ela não te dá o devido valor, ela não te merece e, enquanto ela vive a vida, tu choras todas as noites por ela. Ao mesmo tempo, existe algures no mundo uma rapariga que chora por ti todas as noites, não por não namorar contigo, mas por não te ver feliz, e ela própria sente-se magoada e sofre tanto como tu, e sabes porquê? Porque essa rapariga que chora todas as noites, para no dia seguinte te dar um sorriso, ou te contar uma piada, para arrancar da tua boca o mais perfeito sorriso, ela faz isso porque te ama realmente, apesar de ela pensar que tu não a mereces…Pois ela acha-te o rapaz mais perfeito do mundo e sente-se a pior rapariga; aquela que adora vingar-se, que é a mais teimosa, que demonstra ser forte, mas lá no fundo até pode ser a mais fraca…mas sabes o que a torna forte? O que a torna forte é aquela enorme vontade que tem de te ver feliz, mesmo que não seja com ela, mas com a pessoa que amas…Rapaz, abre os olhos! Ela é a tua princesa. Ela não quer o seu próprio bem, mas o teu bem porque tu és o bem dela!

Já reparaste que quando tu sorris os olhos dela brilham? Ainda não? Então fica atento, os olhos dela brilham ainda mais que as estrelas porque tu, tu és o seu mundo!

Esquece aquela idiota que no passado te fez sofrer, segue em frente pois o presente e o futuro reservam-te muitas mais felicidades do que aquelas pequenas recordações que tiraste partido daquela relação.

Não te esqueças que ela vai estar sempre ao teu lado, quer seja nos bons ou nos maus momentos. Não te esqueças que é ela que, depois de ambos passarem a noite a chorar, te aparece à frente com aquele sorriso contagiante. Não te esqueças que ela é a única que te põe a sorrir. Não te esqueças que ela te ama mais do que tu possas imaginar…

Percebe uma coisa: só com ela é que tu vais conseguir ser feliz. Esquece tudo o que aconteceu no passado, tanto as recordações más e boas… pois vais ver que o futuro te trará experiências que nunca mais irás esquecer e, nessas experiências, ela apoiar-te-á, em todas…Mas já sabes, quando ouvires um não da boca dela respeita-a, compreende-a e dá-lhe ouvidos, porque ela é a pessoa que melhor te conhece, mesmo sem tu saberes, ela sempre foi e será a pessoa com quem mais te identificas.

Agora, depois de teres lido este texto, abre os olhos para o mundo e vê quem é que realmente te merece. Vais perceber que só o nome dela fará sentido na tua cabeça e será a única palavra que sairá da tua boca.

Reage! Já passou o tempo de sofrer e ficares a chorar pelos cantos.

Sê feliz e fá-la feliz.

Porque, não te esqueças, basta tu estares triste para ela também ficar…pois tu és a felicidade dela.

Ama-a, protege-a, respeita-a, compreende-a, fá-la sentir-se única, trata-a como uma princesa…pois, mais tarde ou mais cedo terás de tratá-la como ela é para ti: com uma RAINHA!

Beatriz Batista (aluna)

Ilustração: Cho Mi Kyung

Apenas um capítulo da minha vida

Capítulo 21

Voltei-me a sentar, desta vez interessada na conversa dele, com um ar preocupado e ao mesmo tempo de ansiedade…

Nick: - Porque é que vais de novo para Portugal?!

…mas quando ouvi aquelas palavras a serem expelidas pela sua boca, não consegui sincronizar, qualquer palavra!

Levantei-me, e antes que ele dissesse alguma coisa, as lágrimas começaram-me a cair!

Ele sabia, se calhar percebia melhor que a Leonor e talvez fosse o único que me apoiasse a 100%! Era difícil para mim, extremamente difícil, voltar a falar na vida que tive, principalmente quando só podia ser eu a tratar das coisas, quando os meus pais iam “trabalhar”, quando apenas viravam costas àquele Inferno, (a casa)! Aquele era o único momento, o momento em que conseguia ser quem sou, dançar, cantar, divertir-me um pouco e esquecer-me de tudo o que me rodeava!

Era difícil para mim, quando era nova, ouvir os meus irmãos falarem de festas, ou de algo, que eu não poderia ir tão cedo! Mas ainda bem que fui eu e não o coração mole do meu irmão, apesar de ser mais velho do que eu e a DarcyEle parece que tem sérios problemas mentais. Não o estou a ofender, até porque esses problemas eram simplesmente do coração e não mentais. Não sei o que os meus pais fizeram ao Greg pouco antes de eu nascer, pois não estava cá para saber… Ainda bem que foi diferente com a minha pequena e frágil princesa, pois ela seria demasiado, hum como ei-de dizer pouco tolerante a estes pedidos, e aos ditos trabalhos forçados! Já para não falar da promessa que os meus pais me fizeram: se eu vivesse com eles e fizesse tudo o que eles quisessem até aos meus 18 anos, eu poderia ir-me embora e fazer o que eu quisesse, como, por exemplo, conseguir entrar para a escola de que falei, e que não pararei de falar a minha vida inteira!

Alguns de vocês podem perguntar: como é que eu sei de tudo isto, se quase não frequentava a escola? Pode dizer-se que eu conheço pessoas, que conhecem sítios e que sabem coisas. “Essas pessoas”, não passavam de um rapaz que me atirou um saco de compras para o chão quando tinha apenas 8 anos. Ele era filho de uma bibliotecária.

Continuando…

Comecei a falar com o Nick, sobre tudo o que eu queria fazer em Portugal e porque simplesmente quero dizer um adeus aos meus progenitores. Claro que não vai ser fácil, pois não entrei na escola! Mas até conseguir ir para Portugal, ainda deverão acontecer algumas coisas! Espero eu!!!

A minha vida está completamente virada do avesso. Por vezes penso que estou a viver um pesadelo, daqueles que não têm fim. Deus me livre!

****

Pouco depois de ter explicado tudo ao Nick,

Nick: - E se as coisas não correrem como tu queres?!

Eu:- Bem, terei de tentar alguma coisa, mas… - ia continuar, mas o Nick não me deixou acabar.

Nick:- Mas…! Não vais enfraquecer, pois não? Não agora! Não depois de teres esperado 18 anos para isto, não depois de quase teres entrado na escola dos teus sonhos, não agora que me conheceste! Não vais deixar os teus pais quebrarem de novo os teus sonhos?! Ou vais?! E baixando o tom de voz, acrescentou: -Não me vais deixar aqui!

Eu:- Não, claro que não. Espero que consiga.

Ergui a minha mão e levei-a até à sua cara sempre macia olhando-o nos olhos. O meu estômago começou a dar as voltas, como nunca antes o tinha feito. Aquele azul dos seus olhos deixava-me louca, parecia que estava a perder a força nas pernas, que ia fraquejar e deixar-me cair. A minha cara estava a começar a ficar quente, talvez por estar a ficar corada, mas naquele momento não queria saber de nada. Cada vez a cara de Nick estava mais próxima da minha e o meu coração demasiado acelerado para conseguir ouvir o seu, mas ele apenas me abraçou. Era o que queria naquele preciso momento, algo valoroso e reconfortante que me fizesse desaparecer todas as mágoas. Era ali que eu queria estar o resto da minha vida, debaixo daqueles braços que me faziam sentir mais protegida, mais viva, mais calma, mais tranquila e mais feliz! Estes eram os únicos braços que estariam ali sempre para me abraçar e para me darem apoio, assim eu o esperava!

Ele levantou-se, encarou-me e disse:

Nick- Vamos divertir-nos, ou não?

Eu- Estás a espera de quê ? – Perguntei-lhe, começando a correr depois lhe ter atirado tinta azul que lhe atingiu um pouco o queixo.

Nick- Agora vais ver! - Mergulhou o seu pincel na lata de tinta laranja e, logo de seguida, correu na minha direção e pintou-me um pouco a cara e o cabelo. Como sempre, para mim uma guerra é sempre uma guerra, nem que seja uma de comida; acho que nessa, eu estaria debaixo de uma mesa a comer enquanto eles tentavam atirar comida uns aos outros. Bem, neste momento já andávamos os dois a correr um atrás do outro, cada vez com mais tinta. Parei um pouco para voltar a mergulhar o pincel, seguindo isto Nick fez o mesmo. Comecei a correr contra ele mas, desta vez, por detrás do pequeno cadeirão que tinha posto ali e que agora já estava às cores e não castanho… Ao passar pelo cadeirão, Nick veio atrás de mim, o que foi uma sorte, pois, ao passar pelo cadeirão tropecei numa lata de tinta verde e cai em cima dela. 

***

Nick pensamento On 

Estava a correr atrás dela, com um pincel cheio de tinta, calcámos um monte de papéis que encobriam o chão, fomos contra as paredes, porque o chão estava cheio de tinta, e, quando passamos por trás do cadeirão, ela caiu.

Tentei segurá-la, mas ao fazê-lo cai em cima dela e ficamos os dois em cima de um monte de tinta verde, azul, laranja, e das suas várias combinações! Nunca tinha visto os seus olhos como agora. Apetecia-me beijá-la, sentir finalmente os seus lábios nos meus e senti-la minha, mas não o consegui fazer depois de saber o que se passara com ela no passado!

***

Eu 

Ele estava em cima de mim, paralisado, tal como eu…

Beija-me idiota - pensava eu e quase supliquei a Deus para que Nick o fizesse. Pouco depois não consegui resistir àqueles olhos azuis, tão azuis que transpareciam o mar e o céu; aquele azul que me paralisava sempre que ele chorava, ria, ou apenas olhava para mim; aqueles olhos azuis que, daquela perspectiva, brilhavam tanto. E pronto, beijei-o, está feito! Finalmente tinha-me entregado a alguém. Tenho vergonha de dizer que aquele foi o meu primeiro beijo. Nunca tive coragem, nem oportunidade para fazê-lo, até porque sempre quis que fosse especial e com o rapaz certo.

Sim tenho a certeza que foi a altura certa.

***

Pensamento de Nick 

 Percebi que ela se estava a aproximar de mim e, finalmente, beijou-me. Porque não fui eu?! Que invasão de sentimentos finalmente, algo que eu queria que acontecesse desde que ela cá chegou, e aconteceu. Aqueles olhos apesar de serem castanhos como chocolate ou avelãs, ou como queiram… o que ia dizer mesmo?!

Ao separarmo-nos, os nossos olhos brilharam como, ou mesmo mais, todas as estrelas do céu, e o seu sorriso lembrava-me por vezes o do meu irmão por causa das pequeninas convinhas, mas o dela era um pouco mais tímido O meu coração batia cada vez mais rápido e de certeza que o meu sorriso era ridículo,mas a verdade é que ela me fazia muito bem!

 ***

Eu 

Levantámo-nos e, de seguida, ele pediu-me desculpa, apesar de ter sido eu a beijá-lo, por isso disse-lhe tímida mas sinceramente:

- Mas fui eu que te beijei… e… realmente foi porque quis! - Breves pausas entrecortaram as minhas palavras.

Ele olhou para mim e sorriu: – Ahm… vamos arrumar isto?

- Claro- disse-lhe, enquanto o meu estomago ainda dava saltos.

***

Minutos depois... 

Aquele quarto estava completamente lindo, ou era assim que eu o via. Aquelas cores retratavam o que estava vivo dentro de mim e o que ainda não tinha sido perdido por todas as lutas que travei. Estávamos cansados e, contudo, aquilo tinha-me feito esquecer que ainda teria de fazer o jantar!

- Que tal uns bifes com natas?

Alyn (Pseudónimo) (aluna)

Ilustração: Gürbüz Doğan Ekşioğlu

Conflitos interiores

Às vezes é difícil seguirmos o nosso coração, por isso seguimos a cabeça, o que nem sempre é boa ideia porque, provavelmente, desiludimo-nos  mais ao seguir o coração. Regra geral, quando nos guiamos pela cabeça nem sequer tentamos fazer as coisas, mas, às vezes, quando seguimos a cabeça desejávamos ter seguido o coração e, noutras ocasiões, seguimos o coração e desejávamos ter seguido a cabeça. Não adivinhamos. Quando pensares que deves seguir o coração, é a cabeça que o escolhe, porque com o coração podes sempre dizer que tentaste e, se não resultar, não ficas na dúvida.

 Foi isso que eu fiz, segui o coração e agora tenho a minha história; a história de uma rapariga e um rapaz que agora se conhecem um ao outro como ninguém... mais que amigos, são irmãos,

                    almas gémeas,

                                  falam um com o outro,

                                                 riem um com o outro...

                                                        choram um com o outro

                                                                           sentem confiança…

 o amor que os une é imenso, como se já se conhecessem de uma outra vida. 

Ele é alguém muito especial, que sabe  quando o meu sorriso é falso, quando eu estou triste só de olhar para os meus olhos, que é….

                                                 doido,                                     estúpido,                             irritante,

                                                                  lindo,

                                                                      parvo,                                         

   querido,                       perfeito,

 

o meu menino de olhos verdes .

Atena (Pseudónimo)aluna

Ilustração: San Weber

Correspondência de guerra

Segunda-feira, 16 de Maio de 1916

Querida irmã:

Desta vez é para ti que escrevo.

Tenho bastantes saudades tuas e de ouvir todos aqueles conselhos e abraços que me deste depois de eu ter conseguido conquistar algo em mim. Agora estou pronto para conquistar a paz.

Esta semana não tem sido fácil, já perdi dois grandes companheiros e tenho uma notícia para te contar. O tiroteio à nossa volta dificulta-nos a audição, mas, de qualquer maneira e com todas aquelas bombas e tiros, não deixamos de ouvir a voz humana a gritar, a implorar…

No meio de tanta agitação, não deixei de ouvir os gritos do John; corri ao seu encontro, mas já não havia nada a fazer. Estou disposto a vingar a sua morte.

Felizmente ganhamos desta vez e, se não acontecer uma outra vez, espero morrer feliz, mesmo não realizando os meus sonhos.

Espero que a minha Letícia esteja bem. Diz-lhe que o papá manda beijinhos e que a ama muito.

Diz à mãe que, se tiver oportunidade de me ver, já não vai olhar para aquele cobarde que conhecia; vai encontrar alguém de quem se pode orgulhar. Já não sou aquela criança que pensava que tudo era uma brincadeira. Infelizmente não é!

E tenho um conselho para te dar: quando se quer muito uma coisa, arranja-se sempre coragem para tê-la, só temos de a procurar na  alma e no  coração.

 

Beijos, querida Eleanor.

Do teu irmão Nick

Alice Capito (aluna)

Ilustração: Elia-Mervi

Lágrimas para quê?

Telma e João, namoravam à cerca de um ano e meio. Telma conhecia João como ninguém e João conhecia totalmente Telma. Viviam juntos num apartamento, ambos não tinham família. A mãe e o pai de João morreram, pois trabalhavam nas minas no Brasil, um trabalho que era bastante doloroso. Já os pais de Telma estavam em coma há cerca de três anos porque viajavam pelo mundo e, na fronteira de França com Espanha, sofreram um grave acidente de viação.

Eles eram um casal bastante amoroso mas João tinha um grave problema de saúde: tinha uma deficiência físico-motora e andava numa cadeira de rodas. Não era por isso que Telma deixava de o amar; muito pelo contrário, tinha-lhe mais amor, mais carinho, mais afeto e mais orgulho pela pessoa que ele era. Enfim, tinha-lhe mais tudo…era uma paixão incondicional.

Certo dia, Telma ia a atravessar uma rua na passadeira com o João quando, de repente, surgiu um carro a alta velocidade e… Telma sobreviveu, mas não digo o mesmo de João. O condutor saiu do carro e viu João no chão, caído, inconsciente, com a cadeira de rodas virada do avesso… foi horrível!

O condutor chamou o INEM e foram para o hospital, mas já não havia nada a fazer. O João morreu.

Recebendo esta notícia, Telma ficou mal, mas muito mal, aquele momento foi indescritível. 

No dia seguinte realizou-se o funeral. Não havia número para contar a quantidade de lágrimas que amigos de João, e principalmente Telma, derramaram por ele. Foi um momento para esquecer.

Telma não conseguia viver sem João e a dor que sentia no peito era tanta que passava os dias a chorar pelos cantos da casa, a olhar para a fotografia do namorado e a relembrar todos os momentos que passaram juntos.

Até que chegou, finamente, uma boa notícia. Os seus pais acordaram do coma e estavam em perfeito estado de saúde, apesar de ainda precisarem de alguns cuidados. Ao ouvir esta notícia, Telma foi ter com os seus pais e abraçou-os com todas as suas forças. Um ambiente de felicidade brilhava naquele momento no quarto do hospital.

Ela não se esquecia de João, e desde a morte dele, nunca mais amou ninguém. Decidiu viver um dia de cada vez, uns dias bem, outros mal, mas queria viver …

Daniela Fialho (aluna)

Ilustração: HM Saffer 

O Ouro do Mediterrâneo...

O menino seguia com muita atenção a gota grossa amarelo dourada que escorregava devagarinho, como quem tem todo o tempo e sabedoria do mundo, por entre os sulcos vidrados do galheteiro, já velhinho, da avó. Deslizava suavemente, dobrando com muito cuidado cada esquina, como quem tivesse medo de cair e se perder… De repente, quase parou na fundura de um vinco mais marcado ali, exatamente onde a faixa atrevida de sol ardente, que tinha conseguido esgueirar-se por entre o cortinado, já velhinho, da avó, a fez brilhar em chispas de luz. O menino levantou-se, de súbito, para chegar mais perto e mergulhou o olhar até ao fundo daquele lago de luz dourada e… viu oliveiras de mil anos, espalhadas por montes e vales, viu mil azeitonas verdes, castanhas, pretas, e viu um fio grosso de azeite dourado que ganhou vida e, numa bolha grossa, lhe disse em surdina, como quem conta um segredo:- “Eu sou o Ouro do Mediterrâneo. Sabes, há muitos, muitos anos, veneravam a minha árvore, a oliveira, em cuja sombra se acolheram, nas encostas do Mediterrâneo, da Grécia à Tunísia, filósofos, artistas, matemáticos, poetas e viajantes que, juntos, foram tecendo as malhas da cultura da Europa do Sul, que é ainda a tua.

E durante muitos, muitos anos, mais de três mil, guardaram-me, ano após ano, em grandes e pesadas talhas de barro, no local mais íntimo e secreto de suas casas – é assim que se acautelam os tesouros – para comigo regarem, em artes de feminino feitas, ervas, legumes, peixes e pão, e, queimando-me, espantarem, das suas noites, a escuridão.

E eu, de tão amado, acreditava que seria assim até ao fim dos tempos. Mas não.

Sabes, houve uma guerra – terá sido a maior de todas, diziam – que deixou as gentes muito alteradas. Nada ficou como antes. As ideias, hábitos e costumes agarraram-se as franjas dos ventos e correram, muito depressa, espalhando-se por todo o lado – sabes, as franjas do vento são muito mais velozes que as ondas do mar – e por aqui, nestas terras minhas do Mediterrâneo, foram, assim, aparecendo uns líquidos gordurosos, de vários tipos, a princípio, de mansinho, como quem está envergonhado, mas rapidamente pressenti a dimensão do seu atrevimento e da minha desventura.

        Começaram por me roubar a luz da noite. As candeias ficaram esquecidas, vê bem, algumas vezes ao lado das minhas talhas. E na escuridão chegavam-nos, longínquos e apagados, os sons da alegria, ou da intimidade, que já tinham sido nossos.

Mas o pior foi quando, uns tempos mais tarde, chegaram, com grande alarido, e vindos de terras, para mim muito estranhas, uns óleos que morriam de inveja de mim. Fizeram de tudo para convencerem as gentes minhas do Mediterrâneo, que eles seriam, mesmo melhores que eu na fritura, no tempero, na caldeirada, e - céus! - até na sopa e salada se atreveram a entrar. E muitas das minhas gentes – sabes como gostam sempre muito de tudo o que vem de outras paragens, as minhas gentes – acreditaram neles, coitadas. E, coitado de mim também, que fui ficando, cada vez mais tempo, no fundo das talhas, a meio dos garrafões, e até nos lagares, antes de ser eu mesmo, se foram esquecendo de mim.

      Sabes, não há mentira nem disfarce que sempre dure. O tempo faz a verdade vir ao de cima, como eu próprio se me misturam com água. E há sempre quem – muito poucos é certo – goste de pensar por si mesmo, de procurar provas para fundamentar conclusões, cientistas investigadores, dizem. E lembraram-se de mim, de investigar, cientificamente, o que eu, desde a noite dos tempos, havia dado, sem eu próprio o saber, aos habitantes da bacia do Mediterrâneo que tanto me cuidavam.

E sabes o que, sobre mim, descobriram? Sabes o que te posso oferecer quando me escolhes para me levares contigo, todos os dias?

- Melhoro a digestão e evito a azia que sentes quando escolhes outros em vez de mim para temperar ou cozinhar;

           - Ajudo o fígado e a vesícula a eliminarem o lixo do teu sangue, e até empurro algumas areinhas antes que se atrevam a ser pedras com o nome, pretensioso, de litíase;

           - Comigo, o intestino consegue despachar-se com mais facilidade;

           - Ainda aí, faço um trabalho permanente – e como fico cansado! – para impedir o colesterol de voltar para trás. Assim consigo, sem que ninguém desconfie, mantê-lo baixo apesar dos disparates que os homens grandes fazem quando comem;

           - Nas artérias vou impedindo que se atulhem e entupam; por isso, dizem que sou amigo do coração;

           - A pele, torno-a mais brilhante e macia e atraso a chegada das rugas, ainda melhor quando me usam em cremes de beleza;

           - Nas articulações diminuo as inflamações, que é como quem diz, as dores e o desgaste;

            - E por todo o lado, mesmo nos sítios mais escondidos e pequeninos no interior das células, elimino com muito vigor os radicais livres de oxigénio. Eu nem sei bem o que são, mas ensinaram-me, que eles agridem e envelhecem todo o corpo. Por isso são maus para ti e eu sou capaz de te defender. Não achas que tenho razões para estar muito orgulhoso?

Agora, que sabem tudo isto sobre mim, sou olhado muito respeitosamente. E, confesso, não disfarço a vaidade com que me aprumo, dentro de garrafas lindíssimas, feitas expressamente para mim, quando me colocam no lugar de maior destaque da mesa de quem, profundamente, me aprecia ou me derramam – com rituais quase iniciáticos – sobre iguarias de cozinha de autor por todo o mundo, muito para além do meu querido…”

E a gota foi engrossando, engrossando e quase caía, quando o menino, num gesto rápido de aflição, a agarrou com a ponta dos dedos trémulos, agora do tanto que sabia, e de olhos fechados a levou à boca, deliciado, mas ainda lhe pareceu ouvir “… Mediterrâneo”.

                                        Cristina Sales.  In: ” Revista Ovelha”, 2009

                                                        Texto enviado por João Carvalho   

                                                          (Encarregado de Educação)            

Ilustração: Arianna Floris

Uma história de amor

Era uma vez, uma pequena rapariga que se apaixonou por um rapaz lindíssimo. Ele era único, especial … ela nem tinha palavras para o descrever. O pior é que essa rapariga nunca lhe conseguiu dizer, tinha medo da sua reação.

 Mas um dia, ele começou a gostar dela. Ela apercebeu-se disso mas, mesmo assim, não era capaz de dizer que o amava. Até que, certa vez, ele pediu-a em namoro. Ela ficou sem saber o que dizer. Pensou por alguns segundos, mas não pode evitar e pronto… aceitou. Foi o dia mais feliz da vida dela, saltou, gritou por o nome dele bem alto. Ele era muito romântico e a rapariga amava-o com todas as suas forças; era a pessoa que mais amava na vida. Mas ela, sempre com medo de o perder, começou a ficar preocupada com as idas dele a uma determinada terra, pois havia lá uma rapariga que também gostava dele. Começou a ficar preocupada, e ele dizer-lhe que era ciúme; mas não, era simplesmente medo de o perder. Bem lá no fundo, a rapariga sabia que ele seria incapaz de a trair porque o seu coração estava ligado a uma única pessoa, que era a ela.

No entanto, um dia, o rapaz começou a mudar a sua atitude para com ela. Sem perceber o que se passava, quase desesperada, ela foi falar com ele. Depois de uma longa conversa ele disse que a amava e abraçou-a. 

À medida que o tempo foi passando, o amor entre eles foi crescendo de dia para dia, de mês para mês, de ano para ano; o seu amor nunca parava de crescer, era maior que o universo. Nunca se tinha visto um casal mais unido e apaixonado como este, pois nada nem ninguém os podia separar. Viveram a sempre juntos, faziam tudo um pelo outro. Até que o tempo foi passando e eles foram envelhecendo.

Um dia, ele ficou muito doente e foi para o hospital. Ela sem poder fazer nada, ia desmaiando de preocupação. Entretanto, o médico chegou e disse que o pior que se poderia esperar: que já nada havia a fazer para o salvar. Ela quis vê-lo uma última vez. Entrou no quarto e lá estava o seu único amor deitado nunca cama de hospital. Então, agarrou-lhe na mão e ajoelhou-se no chão a chorar, enquanto o ouvia dizer-lhe: “ Eu Amo-te!”. Ela ficou admirada e pediu lhe para ele não partir sem ela. Nesse momento, as máquinas começaram a apitar. “Pronto! A sua vida tinha acabado”, pensou ela. Mas o amor superou tudo e, com uma simples lágrima na mão dele, ele levantou-se e disse-lhe: “Está tudo bem, meu amor!”.

Ela, sem saber o que dizer, abraçou-o e, quando a viram sair com ele do quarto, todos os médicos, pacientes e enfermeiros, ficaram admirados e perguntavam o que se tinha passado. Ele respondeu-lhes simplesmente que tinha sido o seu amor por ela que o fez curar! E viveram eternamente felizes!

Beatriz Campaniço (aluna)

Ilustração: Andrea De Santis 

Reflexos de um verdadeiro tesouro   

  Querida amiga:

há tempo suficiente que não te escrevo ou que te vejo, para saber por onde devo começar. 

  O navio anda pelo mar, de cima para baixo, de baixo para cima, ondas límpidas  mares negros e sem fim.

Não sei bem para onde vamos e tento nem sequer sair do meu pequeno cubículo por causa do pequeno grande favor que o senhor meu pai me pediu: guardar o tesouro do navio. É evidente que este só poderia estar seguro comigo, apesar de estar um guarda a vigiar-me quase dia e noite e outro a vigia-lo e assim sucessivamente. Claro que acabo por fechar a porta; claro que, sendo a única mulher no navio, tenho de me mostrar capaz e claro que ninguém me faria nada, tu conheces-me (sorriso).

  O tesouro é lindo, estou continuamente a vê-lo, não passo um dia sem o fazer. Não é daqueles que nós nos fartamos, como acontecia com o lago que nós explorávamos em pequenas. Cada vez que o vejo e revejo, deslumbro-me mais, apesar de estar dentro de um baú, coberto de enigmas e ter sido citado em cartas e conferências, onde o senhor meu pai participava e de eu pensar que eram apenas isso, uma seca! 

  Dentro do baú, por baixo de uma tábua de madeira enfeitada com tecido vermelho para transparecer o seu fundo, estava tudo muito organizado, limpo, transparecendo o brilho das joias, coroas, lindos anéis de todos os tipos e cores que possas imaginar… Adorarias estar aqui comigo. Tenho a certeza de que nos íamos divertir a experimentá-los e a tirar fotografias.

Acho que se eu te disser que a joia que mais me afetou foi um espelho, vais achar-me um pouco tola. Mas este espelho é a coisa mais simples e bonita que lá encontrei e, acredita, cheira a pétalas de rosas. Um simples espelho azul com cheiro a rosas! Fiquei tão deslumbrada, que acabei por perguntar ao capitão, meu pai, a história do espelho. E ainda bem que o fiz porque acabei por saber que pertenceu à senhora minha mãe, e por isso o cheiro a pétalas de rosa. Lembraste do seu nome? Dona Rosa de La Esperanza! E é por isso que a joia com mais significado do tesouro é o espelho e a sua história.

   Bem tenho de ficar por aqui. Talvez para o mês que vem tenha mais aventuras para te contar! (sorriso) 

   Despeço-me com carinho, saudade e orgulho.

Da amiga que bem conheces.

Xassta 

Alyn  (pseudónimo)aluna

Ilustração: Amy Abshier Reyes

Uma história de amor

Era uma vez, uma pequena rapariga que se apaixonou por um rapaz lindíssimo. Ele era único, especial … ela nem tinha palavras para o descrever. O pior é que essa rapariga nunca lhe conseguiu dizer, tinha medo da sua reação.

 Mas um dia, ele começou a gostar dela. Ela apercebeu-se disso mas, mesmo assim, não era capaz de dizer que o amava. Até que, certa vez, ele pediu-a em namoro. Ela ficou sem saber o que dizer. Pensou por alguns segundos, mas não pode evitar e pronto… aceitou. Foi o dia mais feliz da vida dela, saltou, gritou por o nome dele bem alto. Ele era muito romântico e a rapariga amava-o com todas as suas forças; era a pessoa que mais amava na vida. Mas ela, sempre com medo de o perder, começou a ficar preocupada com as idas dele a uma determinada terra, pois havia lá uma rapariga que também gostava dele. Começou a ficar preocupada, e ele dizer-lhe que era ciúme; mas não, era simplesmente medo de o perder. Bem lá no fundo, a rapariga sabia que ele seria incapaz de a trair porque o seu coração estava ligado a uma única pessoa, que era a ela.

No entanto, um dia, o rapaz começou a mudar a sua atitude para com ela. Sem perceber o que se passava, quase desesperada, ela foi falar com ele. Depois de uma longa conversa ele disse que a amava e abraçou-a. 

À medida que o tempo foi passando, o amor entre eles foi crescendo de dia para dia, de mês para mês, de ano para ano; o seu amor nunca parava de crescer, era maior que o universo. Nunca se tinha visto um casal mais unido e apaixonado como este, pois nada nem ninguém os podia separar. Viveram a sempre juntos, faziam tudo um pelo outro. Até que o tempo foi passando e eles foram envelhecendo.

Um dia, ele ficou muito doente e foi para o hospital. Ela sem poder fazer nada, ia desmaiando de preocupação. Entretanto, o médico chegou e disse que o pior que se poderia esperar: que já nada havia a fazer para o salvar. Ela quis vê-lo uma última vez. Entrou no quarto e lá estava o seu único amor deitado nunca cama de hospital. Então, agarrou-lhe na mão e ajoelhou-se no chão a chorar, enquanto o ouvia dizer-lhe: “ Eu Amo-te!”. Ela ficou admirada e pediu lhe para ele não partir sem ela. Nesse momento, as máquinas começaram a apitar. “Pronto! A sua vida tinha acabado”, pensou ela. Mas o amor superou tudo e, com uma simples lágrima na mão dele, ele levantou-se e disse-lhe: “Está tudo bem, meu amor!”.

Ela, sem saber o que dizer, abraçou-o e, quando a viram sair com ele do quarto, todos os médicos, pacientes e enfermeiros, ficaram admirados e perguntavam o que se tinha passado. Ele respondeu-lhes simplesmente que tinha sido o seu amor por ela que o fez curar! E viveram eternamente felizes!

Beatriz Campaniço (aluna)

Ilustração: Anna Speshilova

  A Natureza

Carolina, menina de onze anos,  era tímida e não falava com os amigos da sua escola. Gostava da natureza e a sua disciplina preferida era Ciências da Natureza.

Sempre que terminava a escola ela ia para casa, lanchava e, logo de seguida, ia fazer os trabalhos de casa.

Quando tinha tudo pronto ia sempre para o seu jardim. Lá, deitava-se na relva debaixo da sua grande árvore «a macieira» e brincava com a relva, com as pedras e também, de vez enquanto, com os insetos que pousavam no jardim dela.

Na segunda-feira acordou, tomou o pequena almoço e foi para a escola. Como lá ela não tinha amigos andava sempre sozinha, mas costumava dizer: «nunca estou sozinha pois tenho a minha melhor amiga: a natureza».

A natureza para ela era uma segunda família, não só para ela como para as outras pessoas. É que a natureza tem regras mas ninguém, ou quase ninguém, as respeita.

Mas Carolina era uma menina que pensava maneira diferente das outras. Ela não gostava de poluir a natureza, de matar os animais, de fazer qualquer coisa que estragasse a natureza...

Carolina sabia que não tinha amigos com quem pudesse falar, mas sim uma amiga verdadeira a quem podia contar o que quer que fosse que esta guardaria sempre o seu segredo: a natureza.

Glória Ribeiro(aluna)

Ilustração: Ronald Himler

Desabafo

Olá, chamo-me Miriam. Tenho 14 anos e vivo em Portimão. Raramente escrevo, mas hoje apeteceu-me mesmo agarrar na caneta e começar a escrever. Caso não saibam, mas estamos no ano de 1915.  Sim, há já um ano que começou a 1ª Guerra Mundial e  parece que nunca mais acaba. Mesmo que acabasse haverá alguém que começará a 2ª.

O meu pai está agora a lutar contra os alemães, juntamente com o meu irmão mais velho. Já não escrevem há um mês. Estamos muito preocupados, especialmente a minha mãe, pois o pai pôs em cima dela todos os seus deveres. 

O meu pai é um comerciante rico; sim, nunca me queixei de não ter que comer; do que me queixo é de os meus pais não me darem a atenção que eu desejava. Mesmo assim gostava muito deles. Eu admito que gozava com a sorte que tinha; ria-me dos meus colegas por eles não serem como eu.  Adorava os meus pais, apenas queria que me dessem alguma atenção. Admito que fui uma  menina mimada em pequenina. Ainda me lembro, no dia 5 de Outubro, quando a minha mãe agarrou no meu braço e me levou para a para a praça, onde estava um senhor muito engraçado a falar na varanda da Câmara Municipal. Nesse momento eu puxei a saia da minha mãe. Queria que ela me pegasse ao colo para ver aquelas bandeiras vermelhas e verdes que nunca tinha visto.

Aqui estou eu com 8 anos. Adorava passear na praça com a minha mãe e o meu irmão mais novo, o Danilo. Éramos muito amigos até ao dia 28 de Julho. Querem saber o que aconteceu? Pois vou contar-vos. Ele faleceu nesse dia.  Foi no primeiro dia em que a 1ª Guerra começou. Nesses primeiros dias, os guardas entravam em todas as casas dos habitantes das pequenas aldeias, para verificar se eles não tinham escondido algum “mergulhador”. Nessa época, fugimos para a casa dos meus avós, pois na cidade havia muito barulho e confusão. Quando os guardas chegaram, pensaram que o meu irmão estava a esconder alguma coisa, pois tinha o medo no olhar. Bateram-lhe tanto que nem vos digo nada, depois agarraram na pistola e dispararam. A minha mãe chorou e, nem sei como, dos olhos do meu pai rolaram algumas lágrimas. Eu tive medo de tocar no corpo do meu irmão, estava tão ferido que tive receio de o magoar, apesar de saber que ele já não sentia nada pois estava morto. A minha mãe dizia que a culpa era dela, mas todos nós sabíamos que ninguém tinha culpa.

Valentina Diaciuc (aluna)

Ilustração: Gary Bunt 

Ódio ao tabaco: quero um último adeus!       

Não sei por onde comece… ao fim de oito anos as recordações ainda me pesam e desorientam. Num dia, estava tudo bem e no dia a seguir tudo se complica. Porquê? Porque tem que ser assim? A pessoa que eu mais amava…Com seis anos de idade, o meu avô era o meu grande amor, meu conselheiro, meu amigo… Era um pai para mim; cheguei a gostar mais dele do que do meu próprio pai…Num dia saiu com o seu novo trator e, por azar, tinha que ligar o ar condicionado um dia inteiro, porquê? Porque o fizeste? Uma pneumonia estragou-lhe a vida, é o que os médicos “dizem”. Para mim, o que lhe estragou a vida foi o tabaco porque se não fumasse quase três maços por dia, os seus pulmões não estariam cheios de fumo e talvez tivesse conseguido sobreviver. Ficou de cama, mas estava estável e, numa noite, às tantas da madrugada, ouvi bater à nossa porta. Assustei-me porque pensava que… nem sei… Quando ouvi a avó, ainda mais assustada fiquei. Não era susto, era medo que sentia… A minha casa encheu-se de gente mas ninguém me contava o que se passava. Foi aí que o meu primo entrou no meu quarto e nos contou, a mim e aos meus manos, que tinhas partido… Invadiu-me uma sensação que nunca tinha sentido. Era como se estivesse a morrer por dentro. Uma lágrima surgiu nos meus olhos, mas o meu primo disse-me para não chorar, pois ninguém podia saber o que ele nos tinha contado. Um sentimento de raiva apoderou-se de mim. Tinha apenas seis anos e não sabia o que fazer com tanta raiva. Fechei os olhos e foi a imagem do meu avô que me conseguiu acalmar. No dia seguinte, levaram-me para outra aldeia, não me deixando dar-lhe um último adeus. Isso só piorou aquilo que já sentia; odiava todos aqueles que me rodeavam mas, acima de tudo, odiava-me por nunca lhe ter dito o quanto o amava…

Uns meses mais tarde, disseram-me o motivo da sua partida. Foi ai que o ódio ao tabaco começou. O ódio é tanto que me faz uma impressão enorme respirar o fumo do tabaco dos outros. Se não fosse o tabaco ele não tinha morrido, é esta a minha opinião. Porque penso assim, não sei. A única coisa que sei, é que apenas pedia um dia mais, para lhe poder dizer tudo o que não disse. Ele era a “minha casa”, meu “porto de abrigo”, só ele tinha aquele toque especial que eu amava, sabia sempre as palavras usar certas para me acalmar.

Hoje, com quase 15 anos, continuo a sentir uma saudade enorme, mas o meu problema não é a saudade, é a raiva que vive há oito anos dentro de mim, que me torna fria, por vezes bruta. Mas se sou assim, devo-o a todos aqueles que não me deixaram despedir do meu avô. Só queria dizer-te um último adeus, dar-te o último beijo, dizer que o amava mais que tudo, e…

Ao longo destes oito anos deparei-me com todo o tipo de situações e, nas fases menos boas da vida, procurava, e procuro, conforto nos pensamentos que se enchem de recordações dele…

Odeio o tabaco por o ter levado de mim, odeio o tabaco por estragar a vida a milhares de pessoas, mas odeio mais ainda as pessoas que não percebem o mal que faz…

Só pedia um último Adeus…

Por favor, nunca deixes para amanhã aquilo que podes fazer e dizer hoje  porque amanhã pode ser tarde e ontem ainda era possível… Pensa bem no que queres. Eu perdi a pessoa que mais amava na vida sem ele saber o que eu senti por ele. Não deixes que aconteça o mesmo contigo!

Oito anos…

Amar-te-ei sempre avô.

"Estrela" (pseudónimo) aluna

Ilustração: Uma das pinturas de Banksy

Artista mistério

Desde Setembro de 2011, têm vindo a surgir pinturas misteriosas em vários locais públicos da região de Leiria. Nazaré, Monte Real, Praia da Vieira e Leiria são alguns dos locais onde têm aparecido.

  Há uma menina na parede de um cemitério segurando um ramo de flores, corvos nos pilares de um viaduto, um viajante a correr na estação de comboios de Monte Real, sardinhas na Praia da Vieira, uma nazarena, um retrato de um arquiteto… Ao todo já são sete as obras.

O misterioso artista, trabalha durante a noite: ninguém sabe quem é, nem quando vai voltar a deixar de novo obra. Os trabalhos tanto são pequenos desenhos, como obra de vulto, caso dos corvos em 12 pilares de um viaduto.

As pinturas têm sempre uma relação com o local, e parecem chamar a atenção sobre locais e factos: como a pintura junto à Sé de Leiria, onde o padre Amaro beija uma mulher. O local foi o cenário desta importante obra de Eça de Queiroz e encontra-se em ruínas, sem qualquer referência ao “Crime do Padre Amaro”.

O mesmo se passa com o retrato do arquitecto Ernesto Korrodi, a mais recente obra do artista, pintada numa das paredes de um edifício que este notável arquitecto projectou. E que também se encontra em ruínas.

Talvez, pela forma como as obras surgem e pelas mensagens que passam, são muito apreciadas nas redondezas e levam a verdadeiras romarias aos locais.

O artista utiliza a técnica do stencil: impressão de formas desenhadas a partir de uma superfície de onde é aplicada tinta. Os trabalhos são a preto e branco e até agora não tiveram qualquer assinatura.

As criações são mesmo muito elogiadas, mas todos se perguntam quem será o artista mistério, que teima em não querer ser identificado.

Todos anseiam pela próxima obra e que o artista deixe qualquer pista que o permita identificar.  

Aqui bem perto da Vidigueira, encontrei um trabalho utilizando a mesma técnica.

De quem será?

Ana Marto (Encarregada de Educação)

Ilustração: desconhecemos o autor

O Zé dos passarinhos

Zé era um rapazinho que passou a sua infância em monte e hortas onde os seus pais trabalhavam, ganhavam o seu sustento e dos seus irmãos. Ele adorava os animais e era com eles que passava grande parte do dia, andava ”a cavalo” nos carneiros, criava pássaros dando-lhes comida no bico, corria atrás dos patos, fugia com os animais e escondia-os para que os pais não os matassem para a alimentação. Quando ia para a escola na aldeia mais próxima, levava sempre imenso tempo no caminho porque brincava com os passarinhos, observava os carreiros de formigas, os coelhos que saltitavam por detrás das moitas, etc, etc.

Tudo era motivo para o Zé se atrasar para a escola onde, por vezes, levava reguadas da professora pelos atrasos. Mas de nada adiantava, ele voltava a chegar atrasado e sempre pelos mesmos motivos.

O Zé cresceu, tornou-se homem, casou e construiu uma casa com um grande jardim e árvores no quintal. Um dia, quando o Zé observava os arbustos viu um pequeno ninho com muitos ovinhos e logo calculou que o ninho era pequeno para tantos passarinhos. A partir daí todos os dias ia ver se os pássaros já tinham nascido. Até que um dia isso aconteceu; com  receio que eles caíssem do ninho o Zé arranjou uma gaiola, colocou o ninho dentro desta e pendurou-a numa árvore do seu quintal. Eu jamais acreditei que aquilo resultasse até porque dizem que quando se mexe nos ninhos “engeitam”, ou seja, os pais abandonam os ninhos mas o incrível aconteceu. Os pais vinham à gaiola dar de comer aos filhotes e estes quando os avistavam abriam logo o bico esfomeados e assim foram crescendo na gaiola. Estavam lindos, cantavam o dia inteiro. O Zé estava encantado com os seus pintassilgos; eles eram uma vitória. Tinha tanto cuidado com eles que quando chovia ia buscá-los para debaixo de telha.

Um dia, estávamos a almoçar quando começou a chover torrencialmente. O Zé correu para a gaiola levou-a para a marquise mas, como estava a almoçar, pousou a gaiola em cima de uma cadeira e veio acabar a sua refeição.  Ao fim de algum tempo ouvimos um enorme alarido no quintal. Corremos para ver o que se passava e o espectáculo era aterrador. Kiara, a nossa cadela, tinha decapitado os pintassilgos. Ela aproximou-se da gaiola e eles, talvez julgando que lhe iria levar comida, acabaram por serem eles comidos por ela. O Zé ficou furioso; correu a apanhar a Kiara e, quando a apanhou, preparava-se para lhe dar uma tareia tão grande, tão grande… do tamanho da sua revolta. Mas, ao levantar a mão para descarregar toda a sua revolta, ouviu-se um grito tão arrepiante mas tão arrepiante, tão profundo….paaaaiiiiiiiii nããããoooooo….. O pai olhou-a e ao ver o pânico nos seus olhos cheios de lágrimas soltou a cadela e correu a abraçar a sua filha. Por muito triste e zangado que estivesse com a Kiara não poderia magoar a sua menina, pois sabia que ela adora a sua cadela.

P.S Esta história não foi inventada, foi relatada pois aconteceu mesmo na nossa casa.

 

Francisca Ribeiro (Encarregada de Educação)

Ilustração: Anuska Allepuz

A Casa do Rossio

As tardes escuras de Inverno atraíam palavras rasas, palavras doutro mundo, só dizíveis se quase segredadas. Sob qualquer pretexto, relâmpago ou anúncio de trovoada, a Casa do Rossio era desligada. À luz de vela, entre sombras hesitantes, escolhiam-se temas sinistros, sobrenaturais. Uma cafeteira grande e amolgada era a receita para os frios que, num ápice, percorriam de lés a lés a pele dos mais crentes: óptima para as gargantas que secavam de tanto murmurar. Depois o café de cevada assentava para todos. Era o mote para peixe frito ou torradas com um fio de azeite, polvilhadas de açúcar amarelo. Enquanto o alimento durasse, viessem todos os arrepios de almas penadas, de fantasmas, de batidas anónimas nas portadas do quintal...

Quando chegava a Primavera, minha avó, sem tardes escuras, entristecia…

        João  Pedro Martins (Professor)

Ilustração: Eve Farb

Agora aqui!

Hoje estava sentada num banco e comecei a pensar...

Apesar de minha vida ser agora aqui, embora goste do país em que estou, da sua cultura, paisagens, tradições e apesar de ter amigos aqui…

Eu sei que este é o país deles e todos estão no seu lugar, mas a minha casa não está aqui, não é esta… mas sei que estar aqui pode se útil…

O livro pode ser um amigo se gostares de ler e o fizeres com paixão e não por obrigação.  Mais do que um amigo, pode ser um mundo paralelo onde se pode fugir da realidade, dependendo do tipo do livro. Pode ser o teu amigo e pode-se aprender coisas novas; pode ser um guia que abra caminhos desconhecidos, conselheiro, inspiração ou pode ajudar-te a aprender novas expressões e palavras.

Nós viajámos, de facto, mas, no final, qualquer aventureiro se cansa…

 Assim, um dia, vou colocar a minha mochila nas costas, provavelmente será uma decisão espontânea, lançando-me, quem sabe, num tempo difícil a perguntar pela milésima vez «Quem és?», olhando-me no espelho…

Simona Dudau (aluna)

Ilustração. Graça Morais

Passadas suaves

É já aquela hora em que ninguém desconfia de nada. Entre sons adormecidos ouço passos firmes que não reconheço e duas vozes cruzadas – o tom é firme mas cordial. Fecha-se uma porta, o estampido é abrupto. Levanto-me pondo ordem na secretária e enquanto retiro a pen do computador, um som seco de eco curto e baixo vibra na vidraça da pequena janela que me ilumina o fim de tarde. Dou alguns passos até ao corredor – os funcionários saindo como baratas debaixo dos móveis – recolhemos logo de seguida – nada de nada. Passadas suaves, estranhamente fugidias deslizam rumo às escadas, um dossier derrubado algures e após um hiato de onde já nada se espera, um guinchar de pneus chega-me da garagem. Aqui o filme aclara e sigo apenas o instinto. Voo de guarda-chuva em punho e ao passar pelo gabinete 12, grito – É o Chefe Fernandes! Chamem o 112, já! – deslizo pelo corrimão como um adolescente e atalho pela frente do edifício, cortando a via ao carro que já se adivinha… preparo o meu dardo improvisado, de espigão metálico e varetas aerodinâmicas – de um lance o estupor surgiu, de um lance varo o pára-brisas…  

 João Pedro Martins (Professor)


Ilustração: Debbie Criswell 

O meu Natal na Roménia

É véspera de Natal. Tudo em redor está coberto com um manto branco de neve imaculado e fofo. A árvore é decorada e os presentes são embrulhados. Espero o Pai Natal. A minha mãe prepara todos os tipos de pratos maravilhosos e eu olho pela janela gelada para ver os flocos de neve brilhante.

Nas ruas, ouvem-se cânticos e tudo se parece mais com uma história.

Eu e a minha família ficamos perto da árvore a comer petiscos e a contar histórias.

Em minha casa, o meu pai ajuda-me a decorar a árvore, a minha mãe prepara a comida e os meus tios estão encarregados de fazer as compras e os meus avós decoraram a casa. O Natal é um dia em que se está perto da família e daqueles que são queridos.

Na minha família não só ganhamos presentes como também oferecemos: este é o charme do nosso Natal. Nele, o que é mais bonito são os enfeites da árvore. É assim o Natal na Roménia e sempre será.

Simona Dudau (aluna)

(Nota: Este foi o primeiro texto escrito em português pela autora)

Ilustração: Irene Mala

Receber

Só um coração aberto

recebe um presente...

 

Só uma mente aberta

recebe sabedoria...

 

Só uma pessoa aberta

recebe amor....

 

Só tu e eu recebemos

a loucura do amor.

Diogo Langue (aluno)

Ilustração: Shamsia Hassani

  Escuridão, solidão…

A minha vida é só escuridão, amor não. 

Não! Por favor, faz-me parar de rimar. Não quero cantar, nem dançar porque assim vou cair no chão, para acordar com pavor à escuridão.

Quero um beijo do meu amor. Só me falta ir parar ao Afeganistão e largar o meu coração nesse teu coração bonito e sincero, no meu só existe a noite.

A minha vida é só escuridão porque assim posso ir direito ao teu coração para me pores de novo nesse teu coração bondoso e milagroso.

Tu sabes que a minha dor é tanta que tenho de andar a tua volta como os anéis de Júpiter, que me vão dar um jeitão para rimar e voltar para o teu coração. Só espero que gostes, porque vou morrer contigo no meu coração. Assim, vou estar a tua espera, com esta dor no meu peito, como um trovão, para ir para o pé de ti no céu. Vigiar-te-ei e serei teu anjo-da-guarda, como um Pai.

 Carlos Caipirra (aluno)