SALLES, Cecília Almeida. Crítica Genética

Fichamentos bibliográficos diplomáticos de Isaias Carvalho

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SALLES, Cecília Almeida. Crítica Genética – Uma Introdução. São Paulo: Educ, 1992. 112 p.(Série Trilhas)

APRESENTAÇÃO

Gênese da Crítica Genética

Relevância da delimitação

Crítica Genética: uma ciência nova

A Crítica Genética e os escritores

Pressupostos básicos

DEMARCANDO O CAMPO DA CRÍTICA GENÉTICA

Definição do propósito

Caracterização do objeto de estudo

Relação do geneticista com o manuscrito

Detalhamento do trabalho do geneticista

Discussão sobre abordagem teórica

CRÍTICA GENÉTICA EM AÇÃO

A Metafísica evolutiva e a escritura

Três modos de evolução

Tichismo

Agapismo

Ananquismo

IMPLICAÇÕES DOS ESTUDOS GENÉTICOS

A ressurreição do autor

Gênese e valor da obra

Objetividade do manuscrito

Lucidez e cegueira

Autocorreção do processo

Estudos sobre criação e crítica literária

Estética em criação

Revelação de poéticas

Pluralidade de resultados

Horizontes da Crítica Genética

APRESENTAÇÃO

Gênese da Crítica Genética p.9-11 {1} Esse primeiro momento {1968, iniciativa de Louis Hay, França, Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), germanistas ou de origem alemã para organizar os manuscritos do poeta alemão Heinrich Heine que tinham acabado de chegar à Biblioteca Nacional} dos estudos genéticos (1968-75), denominado por Almuth Grésillon de “momento germânico-ascético”, {2} foi seguido pelo “momento associativo-expansivo” (1975-85), quando se instaurou o diálogo entre esse grupo de pesquisadores e outros que começavam a se interessar pelo estudo de manuscritos de Proust, Zola, Valéry e Flaubert: problemas comuns os uniam. P.10 A Crítica Genética é, assim, introduzida no Brasil por Philippe Willemart {que organizou o I Colóquio de Crítica Textual: O Manuscrito Moderno e as Edições, na Universidade de São Paulo (1985)}. {3} p.11 A terceira fase na evolução das pesquisas em Crítica Genética é o “momento justificativo-reflexivo”, como Grésillon o batizou, que se iniciou em 1975 e, pelo que me consta, ainda não terminou. {pode ser que nunca termine... um aborto} {a CG também pode ser chamada de GENÉTICA TEXTUAL??}

Relevância da delimitação {crescente interesse no Brasil} p.12 Há, também, uma forte tendência de se estabelecer paralelos da CG com outras disciplinas que trabalham com o manuscrito (como, por exemplo, a Filologia ou mais especificamente a Edótica). {?} // Como estados lidando com uma nova ciência, temos de ser muito rigorosos no que diz respeito à sua definição, para não estarmos dando à luz a uma crítica que já nasce para ser criticada por suas nebulosas fronteiras.

Crítica Genética: uma ciência nova p.13 É importante ressaltar que estou tomando como base o pensamento de Charles S. Peirce, que concebe ciência como um empreendimento de busca interminável, feito por um grupo de pessoas motivado pelo desejo da descoberta ou pelo impulso de penetrar na razão das coisas. A vida do cientista está no desejo de aprender a lição que o universo tem para ensinar.

A Crítica Genética e os escritores p.14 Enquanto o geneticista tem a curiosidade de conhecer e compreender a escritura em processo, o escritor mostra interesse em conhecer e compreender as pesquisas desenvolvidas por esse cientistas. {? Aprendizagem}

Pressupostos básicos

DEMARCANDO O CAMPO DA CRÍTICA GENÉTICA p.17-18 O manuscrito seria, portanto, a concretização de um processo de contínua metamorfose. Este é o campo de estudo da CG e o ponto de partida para a aventura desses pesquisadores, que se assemelha, por vezes, à atividade do arqueólogo, do geólogo e do historiador. P.18 Ao mergulhar no universo do manuscrito, as camadas superpostas de uma mente em criação vão sendo lentamente reveladas e surpreendentemente compreendidas. {?}

Definição do propósito p.18 O interesse da CG está voltado para o processo criativo artístico. Trata-se de uma investigação que indaga a obra de arte a partir de sua fabricação, a partir de sua Gênese. Como é criada uma obra? Esta é sua grande questão. {e as obras científicas? Não estão entrando no jogo também?} p.19 (...) ocupa-se da relação entre texto e gênese, mais especificamente, procura pelos mecanismos de produção textual, tendo em vista a atividade do criador. Essa nova crítica permite discernir leirs específicas da produção criativa e, assim, melhor entender a gênese da obra de arte ou o processo de invenção artística. O geneticista – o pesquisador em CG – investiga o texto em seu vir-a-ser, daí deter-se, muitas vezes, na contemplação do provisório. Ele pretende tornar a gênese legível, revelar o sistma responsável pela geração da obra. O resultado desse trabalho, o texto (re)estabelecido em sua gênese, revela fases da escritura, mostra o autor em seu fazer literário, na medida em que reconstitui os paradigmas visitados durante a aventura da criação poética. P.23 Do desejo de violar segredos, surge o propósito de natureza mais peculiar da CG: o geneticista quer exatamente ver a criação artística por dentro. É o instinto de penetrar na mente humana em estado de poesia. O pesquisador busca a história secreta das criações (...). p.25 A CG nos faz penetrar na terceira dimensão da arte, aquela do vir-a-ser – a gênese do texto, a linguagem in statu nascendi.

Caracterização do objeto de estudo p.26 A CG utiliza-se do percurso da criação para desmontá-lo e, em seguida, pô-lo em ação novamente. // A CG refaz, com o material que possui, as etapas sucessivas da gênese de um texto e os mecanismos que sustentam a produção literária. P.27 O que a distingue dos outros estudos que também têm o manuscrito como objeto é, portanto, sua preocupação estar centralizada na compreensão do processo de criação. P.28 Caminha-se por sobre as pegadas deixadas pelo escritor e adota-se uma perspectiva teleológica diante delas. (...) Falamos em perspectiva teleológica no sentido em que a obra publicada e tomada como elemento unificador: o significado de todo material brota na relação que opera com a obra considerada final. P.29 (...) para os geneticistas, obra publicada e “rascunho” são um único objeto. Caminhos e descaminhos, que os “rascunhos” deixam transparecer, convivem de forma simultânea e harmônica {?} conduzindo o escritor em direção a sua obra. P.32 Essa unicidade inerente ao manuscrito traz de volta, de certo modo, a aura da obra de arte que Benjamin viu atrofiando-se na era da reprodutibilidade técnica. P.33 Essa crítica guarda, portanto, um procedimento indutivo cujos modelos são elaborados por generalização a partir de observações concretas. P.34 A CG faz uso de inferências partindo de fatos concretos que funcionam como índices de suporte para uma teoria. Registra dados de fato, da experiência viva, para corroborar dados teóricos, ou seja, é um processo de investigação experimental de suposições teóricas. // A objetividade e unicidade do material restabelecem a aura da obra literária, como já vimos, mas livra, ao mesmo tempo, a criação da mística difusa em que costuma ser envolvida – um objeto de adoração e culto. [documentos] p.35 São índices do escritor em ação, uma escritura em processo, um pensamento em evolução. // É a mobilidade complexa e a estabilidade precária das formas. P.36 Nesse ambiente, o geneticista tem uma particular facilidade em compreender o sonho de Foucault. “Sabe qual é o meu sonho? Criar uma editora de pesquisa. Vivo perdidamente atrás dessas possibilidades de mostrar o trabalho em seu movimento, em sua forma problemática. Um lugar onde a pesquisa poderia se apresentar em seu caráter hipotético e provisório.” P.39 Pode-se também afirmar que a tarefa da CG é aquela de passar dos materiais brutos para uma construção intelectual. Transformar a materialidade bruta do manuscrito em sua realidade de construção intelectual, isto é, cada “fragmento” do manuscrito, seja ele um rascunho, uma nota, uma rasura, é uma peça concreta e palpável de um mecanismo de caráter intelectual. // Se, por um lado, a riqueza do material oferece ao seu crítico uma infinitude de ângulos e perspectivas de abordagem, por outro lado, a “realidade” desse material não permite vôos para além de sua concretude. P.41 A análise do geneticista é guiada pelas provas que o manuscrito oferece. Esse material tem uma função heurística, mostrando a direção na qual o caminho da investigação deve ser levado e os aspectos do processo criativo que podem ser iluminados.

Relação do geneticista com o manuscrito P.49 O geneticista, como cientista que é, procura formar um diagrama de um complexo estado de fatos.

Detalhamento do trabalho do geneticista p.53 {primeira tarefa do geneticista: o prototexto} {1}O prototexto não se confunde com os diferentes documentos pertencentes aos diversos momentos daquele processo criativo. O prototexto é a elaboração ou organização crítica desses documentos. P.55 Estabelecer um prototexto consiste, naturalmente, em escolher um ponto de vista crítico determinado. Em seu estabelecimento há, necessariamente, implícita uma orientação escolhida. P.56 (...) toda transcrição de manuscrito é modelada por um olhar, o qual, por sua vez, dever ser também modelado pela realidade do seu objeto, se deseja produzir dele uma representação adequada. {aprendizagem, espelhos} p.57 {2} Estando de posse do prototexto, o geneticista se expõe a esse labirinto criativo e o observa. P.58 A CG não escapa do sonho de todas as ciências de encontrar explicações e leis. Seus pesquisadores estão empenhados em buscar as leis (ou algumas leis) que regem a criação artística. // A CG exige de seu pesquisador a procura, em outras ciências, de instrumental teórico que o habilite a analisar e interpretar o material e, assim, poder falar em explicações ou leis. P.59 A tarefa do geneticista parte, portanto, do manuscrito, passa pela escritura para chegar à gênese e reencontrar o texto sob uma nova abordagem. P.60 Neste ponto, como veremos, é que se pode dizer que a CG não é falha ou dependente, mas totalmente autônoma em plena prática interdisciplinar.

Discussão sobre abordagem teórica p.64 Em sentido amplo, procura-se por uma teoria adequada ao objeto manuscrito de um modo geral e ao propósito dessa ciência, ou seja, esmiuçar o processo criativo. Já em outro nível, cada investigador direciona sua pesquisa para metas mais específicas de acordo com as leis por ele buscadas e, também, é importante mencionar de acordo com o que seu material fornece, as especificidades do manuscrito com o qual ele está trabalhando.

CRÍTICA GENÉTICA EM AÇÃO

A Metafísica evolutiva e a escritura p.65 Faremos uso da Metafísica evolutiva, segundo a teoria de Charles S. Peirce, para compreendermos um pouco mais a evolução do processo criativo. P.66 Estabelecemos a relação da ciência da realidade – a Metafísica – com o pensamento humano a partir da constatação de Peirce de que há uma harmonia ou sintonia da mente humana com as leis do universo. O processo da natureza e o processo do pensamento são similares. {??!!!!!!!!!!} P.67 O manuscrito expõe, desse modo, a tendencialidade de uma mente, o caminhar para um propósito que é o desejo do artista de chegar à obra com determinadas características. O manuscrito mostra um processo evolutivo: a continuidade e sucessão de idéias que crescem e influenciam outras.

Três modos de evolução p.68 Tichismo, ananquismo e agapismo são os três modos de evolução do pensamento. {Peirce}

Tichismo p.68 Tichismo é a evolução por variação fortuita, circunstancial; absoluto acaso, indeterminação e espontaneidade. P.73 Em um estudo que pretende compreender o mecanismo do processo criativo não se pode, portanto, deixar de levar em conta a intervenção do acaso e, principalmente, não se pode ser insensível ao fato de que o acaso tem poder criador.

Agapismo p.69 Agapismo – amor criativo – é a evolução marcada pela tendencialidade. A lei do amor. É a adoção de certas tendências mentais, não totalmente sem propósito como no tichismo, nem cegamente, isto é, por força da lógica ou das circunstâncias, como no ananquismo, mas por uma atração imediata pelas idéias cuja natureza é admirada antes da mente possuí-la.

Ananquismo p.69 Ananquismo é a evolução por necessidade mecânica, determinada por força bruta – teoria dos cataclismos. O desenvolvimento do pensamento consiste, neste caso, na adoção de novas idéias sem prever para onde elas tendem, mas tendo um caráter determinado por causas internas ou externas à mente. P.81 É o amor que realmente move a criação; amor por aquela idéia que é ainda a promessa de um ser. // A idéias se atraem por amor: um jogo constante e incansável de sedução entre ideal e idealizador. {por amor e por ódio e intolerância também!!! Ou não?}

IMPLICAÇÕES DOS ESTUDOS GENÉTICOS

A ressurreição do autor P.83 Philippe Willemart constata: o autor não morreu. Com esses estudos, ele volta, inevitavelmente, a viver. O escritor ocupa lugar de destaque como criador e artesão que vamos conhecendo pelo itinerário de se caminho criativo. // Vemos com nitidez a mão que escreve, hesita, rasura, escolhe, rabisca, recomeça... No entanto, está claro que não é este homem que o geneticista procura ,as a escritura por ele desenvolvida. P.85 “O escritor é o “autor” das correspondências, das anotações e dos cadernos (...)”. No entanto, continua Willemart, “uma vez sentado à sua mesa e disposto a escrever, o escritor se ‘transmuta’, ouso dizê-lo, em autor...” p.85-86 Acreditamos, como Peirce, que fictício seja aquilo cujas características dependem de alguém que lhes atribuiu – como o universo ficcional criado pelo escritor; e o real, por sua vez, é aquilo que possui determinadas características independendo do que os indivíduos possam lhe atribuir. {real e fictício???!!!} p.86 A CG foge das fortes amarras teóricas dualísticas que sempre direcionaram os estudos literários. Teorias que ora enfatizam a relação autor/obra, ora obra/receptor, e ora a obra em relação a ela mesma. O geneticista, em seu interesse pelo processo, assiste ao espetáculo da construção de uma obra por uma mente criadora que, além de sonhar com um leitor, tem no próprio criador o seu primeiro receptor. P.87 As dualidades são destruídas e uma relação triádica aflora.

Gênese e valor da obra p.88-89 Trata-se, na verdade, de uma delimitação do objeto de estudo mais do que uma limitação. Embora estudemos um objeto que vai adquirindo valor estético aos olhos de seu criador, ao longo do processo, não faz parte do campo de ação do manuscrito o valor que será conferido no futuro a sua última versão – aquela que é publicada ou que está em condições de ser publicada.

Objetividade do manuscrito p.90 O fato de o manuscrito não explicar tudo sobre aquela criação, por outro lado, nos leva à conclusão de que nunca vamos ter acesso a todo o caminho criativo, embora com o manuscrito tenhamos acesso a muito desse caminho.

Lucidez e cegueira p.91 O geneticista é, portanto, um voyeur de muitas das escolhas que o escritor se obriga a fazer. A escritura, como toda escolha, mostra-se em sua lucidez e cegueira. P.92 Conhecer os bastidores criativos nos dá uma certeza: conhecemos as peças (ou algumas peças) do quebra-cabeça mas a magia de colocá-las em seus devidos lugares continua ou aumenta.

Autocorreção do processo

Estudos sobre criação e crítica literária

Estética em criação p.97 Partindo da conclusão de que os estudos genéticos podem renovar os estudos literários e ampliando o âmbito dessas conclusões, pode-se dizer que a CG abala, de certo modo, a concepção de estética tradicionalmente relacionada à obra publicada – o obra literária fechada na perfeição de sua forma final. P.98 (...) pode-se falar numa estética do inacabado, da imperfeição ou da busca por perfeição. P.101 É impossível determinar a origem {exata} daquela obra, por estarmos, escritor e crítico, sempre no meio da cadeia criativa.

Revelação de poéticas p.102 O papel da Crítica Genética é, na verdade, revelar uma teoria da criação implícita em cada processo criador (...). p.103 O geneticista, pressentindo a harmonia entre as leis da natureza e as leis da mente, procura, em meio às irregularidades do processo criativo, os modelos de regularidade que oferecem ao criador seu método.

Pluralidade de resultados p.104 (...) por [a CG] caracterizar-se pela multiplicidade de abordagens, o resultado desses estudos surge, necessariamente, sob forma plural. P.106 Há a chance de se ver o repetível na criação, podendo, assim, fazer generalizações sem afetar a unicidade de cada processo específico. Isto representa lago de estrema importância para o avanço na constituição e uma teoria da criação textual – em permanente crescimento.

Horizontes da Crítica Genética p.107 (...) a magia da criação não tem essência – é uma verdade estéril ao limitar-se simplesmente a observá-la como ilusão. É vital investigar os processos que dão corpo a essa ilusão e, assim, encontrar a essência da magia.

Resumos e resenhas de Isaías Carvalho no

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Itabuna/Ilhéus, Bahia, Brasil

Ilustrações dos temas na base da página por: Wellington Mendes da Silva Filho