Categorias Freireanas

Para compreensão de categorias freireanas, buscamos algumas obras de Paulo Freire, tais como: Educação e Mudança, Pedagogia do Oprimido, Educação como prática da liberdade, Pedagogia da Esperança, Pedagogia da Indignação, Pedagogia da Autonomia e, por fim, Política e Educação. Nestas obras tentaremos extrair as categorias a partir da escuta inicial do grupo de aprendentes.

No vídeo do Projeto Memória (2005) sobre a experiência de Freire na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, há um fragmento da fala de Freire em que ele explica que o que fez não foi um método, mas uma filosofia. Esse é um princípio que norteia a organização destas categorias, extrair na filosofia de Freire, o mais importante sobre a educação.

Para compreensão das categorias freireanas, torna-se fundamental a compreensão da não neutralidade da educação e principalmente, da “quebra” do poder do/a educador/a existente numa lógica de educação bancária, pois quando Freire diz que os/as educandos/as têm o direito e dever de terem seus sonhos, mesmo que sejam diferentes dos sonhos dos/as educadores/as. Essa fala tem uma densidade importante para a definição das categorias, como se estivéssemos apreendendo da obra de Freire quais são os princípios para uma educação progressista. Quais conceitos/ princípios freireanos sustentam a práxis educativa?

Inicialmente, é importante destacar o significado da leitura de mundo (sociedade) e da educação em Freire, pois para ele, essa é uma condição para compreender essa relação:

É por isso que o problema real que se nos coloca não é o de insistir numa teimosia sem sucesso – a de afirmar a neutralidade impossível da educação, mas reconhecendo sua politicidade, lutar pela postura ético-democrática de acordo com a qual educadoras e educadores, podendo e devendo afirmar-se em seus sonhos, que são políticos, se impõem, porém:a) deixar claro aos educandos que há outros sonhos contra os quais, por várias razões a ser explicadas, os educadores ou as educadoras podem até lutar;b) que os educandos têm o direito de ter o dever de ter os seus sonhos também, não importa que diferentes ou opostos aos de seus educadores (FREIRE, 1993b, p. 21).

Anuncia-se assim, a primeira categoria: politicidade. A educação como uma ação política e o sonho como atitude para educandos/as e ducadores/as. Essa categoria configura-se na compreensão de que o processo educativo tem um caráter político que precisa ser identificado, ou seja, “não há nem jamais houve prática educativa em espaço e tempo nenhum de tal maneira neutra, comprometida apenas com ideias preponderantemente abstratas e intocáveis” (FREIRE, 1992, p.78). Entende-se, assim, que que essa categoria traduz, na mesma medida que a educação, um conceito político:

É na diretividade da educação, esta vocação que ela tem, como ação especificamente humana, de endereçar-se até sonhos, ideais, utopias e objetivos, que se acha o que venho chamando politicidade da educação. A qualidade de ser política, inerente à sua natureza (FREIRE, 1997, p. 110).

Somos seres históricos, constituídos/as de tudo e todos que passaram pela nossa trajetória de vida. Tudo que me constitui, me faz, me delinea, em termos de princípios e valores e em termos de ação concreta. Somos seres culturais.

Para a segunda categoria freireana, convidamos o compromisso. “O compromisso seria uma palavra oca, uma abstração, se não envolvesse a decisão lúcida e profunda de quem o assume. Se não se desse no plano do concreto” (FREIRE, 1983, p.15). Essa categoria está localizada na indissociabilidade freireana entre as ideias e a ação, pois a primeira condição para que um ser possa assumir um ato comprometido está na nossa capacidade de agir e refletir. “É exatamente esta capacidade de atuar, operar, de transformar a realidade de acordo com finalidades propostas pelo homem, a qual está associada sua capacidade de refletir, que o faz um ser da práxis” (FREIRE, 1983, p.17).

Implica nessa segunda categoria, a tentativa de diminuir a distância entre o que dizemos e o que fazemos, ou seja, “ensinar exige a corporeificação das palavras pelo exemplo” (FREIRE, 1997, p. 38). Este fundamento serve de âncora ao primeiro princípio enunciado, sustentáculo de uma concepção de qualidade na educação, também se relaciona à necessária articulação entre a teoria e a prática na atividade e formação docente.

Freire complementa (1997, p. 38) “a prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer”. Essa atitude tem, necessariamente, pela característica humana do ser comprometido, uma concepção e uma prática que nutrem uma escolha: educação para quem?

A terceira categoria surge como um conceito, talvez ainda abstrato na sociedade em que vivemos, porém fundante para os princípios freireanos de uma educação progressista: a ética nas relações humanas sob a forma de respeito com o outro. “O que sobretudo me move a ser ético é saber que, sendo a educação, por sua própria natureza, diretiva e política, eu devo, sem jamais negar o meu sonho ou minha utopia aos educandos, respeitá-los” (FREIRE, 1992, p.78). Educar significa respeitar. Respeitar o outro, com o outro. Esse outro não é um ser abstrato, mas o sujeito concreto que vive, sofre, ama e se move no compromisso com a transformação social.

Arriscar, disponibilizar, conquistar, construir são verbos que transitam na definição da ética enquanto uma ação de respeito com o outro. Colocar-se no lugar do outro, apresenta-se como uma situação necessária para a compreensão do conceito práxico dessa categoria.

Várias categorias podem ainda originar destas já anunciadas, a depender dos/as aprendentes. A ideia não é chegar com todas já delineadas, mas sim, fazer esse movimento em conjunto. Anunciamos, assim, algumas categorias freireanas: politicidade, ética, democracia, diálogo, com princípios e práticas que assegurem a dignidade humana, a liberdade e a justiça social.

Pensar categorias freireanas, desse modo, significa estabelecer como princípios: o pressuposto político da educação (A favor de quem? Contra quem?), a ética das relações (Como? Quais valores?), a democracia (Com quem?) e o diálogo (Para que?). Para a compreensão desses princípios em Freire, torna-se essencial compreender o movimento em que gravitam. Não há uma ordem e nem sequência necessária para análise e interpretação dessas categorias. São complementares, indissociáveis, articuladas, gravitam e circulam em torno da filosofia freireana da educação. Esse conceito não é abstrato, para Freire, implica na concretude de uma ação, uma opção a favor de quem luta, implica em um compromisso social assumido em busca de uma sociedade menos excludente e mais humanizada. Enfim, buscar categorias que sustentem um pensar e um fazer a educação, a partir da práxis humana, na potencialidade humana de pensar e agir na e com a realidade.