Escrito em 2003/2004
Ora, eu falo português, mas quem não fala? Um francês, é bem verdade, não fala, mas fala francês. Eu escrevo, escrevo em português, o que é escrever se não, bom... Escrever? É possível escrever coisas e não dizer nada, a língua me permite isso. Por exemplo, como faço agora, não foi dito completamente nada, apenas algo sobre a língua, algo que caso não fosse dito, não faria diferença nenhuma, quem se importa? Eu me importo, escrevo uma crônica e preciso falar alguma coisa sobre a língua portuguesa, usá-la indiscriminadamente apenas como efeito simbólico pode até ser legal, agrada inclusive a muitos que pouco se importam com o conteúdo, mas não descartam a estrutura, bonitinha como tem que ser. No entanto acho injusto fazer meus leitores perderem seu tempo (precioso ou não, ninguém quer ficar lendo porcaria) com uma crônica feita num momento de nenhuma inspiração de seu autor, então nos próximos parágrafos, mediante o possível, escreverei algumas coisas, (que torço) façam valer seu tempo perdido.
O que faço, ou melhor, vou fazer se não discutir acerca da língua? O que é a língua? Já parou para pensar? Espero que não, não tem nada a se pensar sobre isso, mas algumas coisas interessantes até podem ser ditas, por exemplo, quem não gosta da língua como efeito de diversão? – ler livros? – Não! Ninguém mais lê livros hoje em dia, leem piadas, no máximo. A língua complexa como é, só é usada hoje, no geral, de uma forma pobre, só como efeito de comunicação, uma comunicação cibernética, divertida e descomprometida, escrever bem ficou limitado ao nível acadêmico. Aprendemos na escola milhares de maneiras de escrever “por que”, em cada caso um uso específico, mas o que estão usando por aí? Pq. “Também” tem acento? Mas só se escreve “tb”, dessa maneira não é preciso ficar decorando coisas como proparoxítonas terminadas em sabe-se lá o que para se por o acento de forma correta. Não, não estou defendendo que a língua portuguesa deve sofrer uma radical mudança, que sejam aceitos os “tbs”, pqs”, “ehs” (és), “naums” (nãos) da vida. Só estou relatando o que ocorre por aí...
Mas o que realmente me irrita sobre a língua, é sua intelectualização, ou talvez melhor ainda, elitização. Reprimem-se aqueles que tentam escrever, que têm ideias, mas não se adequam a “estrutura” criada e legislada pelos corretores de provas de vestibular. Sim são esses os que educam nossa juventude a escrever, aprendemos hoje a escrever apenas porque no final do terceiro ano do ensino médio faremos um vestibular e nele haverá uma redação ou se mais, isso nem é tão importante, para responder questões que serão também encontradas nesse vestibular. O que ocorre no caso é uma clara confusão entre o conceito de objetividade e estrutura conservadora que se é imposto para as dissertações. Existe algo mais chato do que dissertar sobre um assunto pré-determinado e de uma maneira comum e a medida do possível pouco inovadora? Esqueçam a criatividade, “respeitem a norma culta”, “seria mais adequado dizer barbárie”, mas o que é mesmo barbárie? “Não sei, mas isso irá aumentar alguns pontos de sua redação” O pior, no entanto são as coletâneas, não já fosse o bastante o aluno estar encarcerado ao tema proposto, ainda vêm com essa coisa de coletânea. Funciona assim: O texto deve conter elementos plagiados (dizem que apenas deve ser feita uma análise crítica dos trechos retirados, é o significado no meio literário/acadêmico para “plagio permitido”) e alguns (vai com calma, hein!), poucos, originais. Mas que visão pessimista do futuro literário de nosso país é esse? Você que está lendo agora deve estar pensando “o que esse idiota está falando? Não sabe de nada”, talvez não, mas digo o que acredito que sei.
Hmmm... Li o parágrafo anterior novamente e notei algumas ideais umas tanto precipitadas, poderia ter apertado backspace e arrumado, mas achei que discuti-las aqui seria mais interessante, além do mais não é nada tão grave. A visão crítica sobre a educação e o incentivo à leitura do último parágrafo é injusta na medida em que foi feita uma generalização. No geral aquele quadro é perfeito, mas sempre existem as exceções, e uma vez que existam devem ser devidamente lembradas em minha crônica (sem citar nomes, o verdadeiro reconhecimento é o que você mesmo tem de si).
Proponho aqui, apesar da preguiça que tenho de fazê-lo, uma revolução. Uma revolução, companheiros! (Desta vez ficou bem mais convincente), talvez seja melhor tercerizá-la, dá muito trabalho uma revolução. “Mas que revolução?”.
- La Revolución, companheiro!
- Não entendo...
- Uma revolução da língua, ora pois!
- Sei... E no que consiste?
-Vamos mudar radicalmente nossa língua, não podemos mais tolerar escrever dessa maneira!
- Que maneira? Pra mim está bom desse jeito...
- Você é ignorante, não percebe que está sendo manipulado?
- Estou?
-É, estão usando a língua para dominá-lo, criam barreiras para dificultar seu direito de expressão, estão criando aos poucos seres permeáveis a um golpe, uma ditadura! Tirarão seu direito de expressão, e você nem perceberá, pois, já estão aos poucos, lhe condicionando isso!
- Se não vou nem perceber, qual é o problema?
- Como assim? Você não se sente mal oprimido dessa maneira?
- Não sei. Deveria?
- Sim! Deveria aderir a revolução!
- Legal, mas o que devo fazer primeiro?
-Nunca mais aceite escrever alguma coisa de forma correta, vamos marginalizar a língua, vamos levá-la ao alcance de todos!
- Esse papo me parece um tanto quanto comunista...
- Não se trata de nada disso, falo de justiça! Falo do direito de expressar o que pensamos, o que sentimos, da maneira que quisermos.
-Ainda me parece um papo comunista, eu não sou comunista, não vou aderir a revolução, pois revoluções são comunistas.
É verdade, revoluções são comunistas, quem gosta do comunismo? O que eu disse tem algum sentido? Estou sendo contraditório? É verdade, estou, é que mudei de ideia. Mudei de novo, sou contra uma revolução, não por revoluções serem comunistas, mas é que escrever errado é feito, não gosto do que é feio. Ações como essas... “Revoluções”, ora REVOLUÇÕES! Mas que droga! Estou cansado dessa ideia de revolução. Tudo deveria continuar como está eternamente. A língua portuguesa não tem pobrema como está, escrevo da maneira que quero, e quero escrever errado, anssim, viu? Estou escrevinhando errado! Lá, lá, lá! Não gostou? Sabe de uma coisa, não fiz para que gostasse. Fiz por que fiz, e por que quis assim fazer, e fasso de novo. Viu? Faço quantas vezes achar pertinente. Não, não devo desculpas a língua portuguesa, nem ela me deve. Do que estou falando? A língua portuguesa nem existe, é uma invenção do homem, não é? Quem a inventou? Quem se importa? Eu me importo, escrevi uma crônica inteirinha sobre alguma coisa que nem poderá lê-la. Pobre língua portuguesa, já que não pode ler, espero que permita que alguém a leia por você, alguém que se simpatize com você. Bom, que seja, se alguém ler essa crônica já feliz me fez. FIM. Quero dizer, até mais. Bom, “ponto final” então, acho que dessa maneira adéquo-me melhor as normas cultas, e se não também, peço perdões à língua portuguesa, que, como já disse, não existe, mas se existisse acho que mereceria que eu o fizesse.