JOÃO PEDRO TEIXEIRA E AS LIGAS CAMPODESAS

A Liga Camponesa de Sapé

Por Juliana Teixeira

Prof. História

Suas pesquisas concentram-se na historiografia

das ligas camponesas e dos líderes camponeses

João Pedro Teixeira e Elizabeth Teixeira, seus avós.

A história das Ligas Camponesas é de extrema relevância porque parte do princípio que rompe com as estruturas de dominação. É a resistência à expansão do capitalismo e a concentração da propriedade. Esse movimento questionou o monopólio das terras e traçou as medidas urgentes, as quais possibilitaram aos camponeses desenvolver a luta contra a opressão na sociedade regionalmente desigual.

Na Paraíba dos anos de 1950, o movimento das Liga começou a ser gestado, devido a dominação do grupo da Várzea. Esse grupo originou-se do modo de produção implantado no campo pela agroindústria canavieira, e se consolidou com o autoritarismo do Estado, que garantiu a dominação e a exclusão política e social do homem do campo. Diante desse cenário, começaram a surgir às lideranças e a participação dos trabalhadores que pretendiam melhores condições de sobrevivência. Devido às dificuldades legais de se fundar sindicatos rurais, as Ligas Camponesas surgiram como alternativa nas cidades que concentravam as produções de abacaxi e cana de açúcar.

Em meados de 1958 nasce a Liga Camponesa de Sapé, com intuito de proteger o camponês e dar-lhes mais condições de trabalho. A reunião de fundação realizou-se na Escola Estadual Gentil Lins, recebendo o apoio e ajuda de políticos independentes e pessoas civis.

A Liga Camponesa de Sapé ficou conhecida e foi maior destaque no movimento da luta pela terra, tendo sido considerada uma das mais poderosas do Brasil.

Os camponeses lutavam pelos seus direitos de plantar e colher na terra denunciavam os abusos cometidos pelos latifundiários, empreenderam uma série de lutas. No inicio de 1962, a confiança dos associados na Liga era total. O movimento havia estabelecido, não existia personificação no movimento, a Liga era o mais importante. João Pedro Teixeira juntamente com seus companheiros, em três anos de existência trouxe o progresso até o momento nunca visto, tanto para Sapé como para a região.

As Ligas Camponesas conseguiram transformar as relações de trabalho no campo, tornando o camponês consciente de seus problemas e suas possíveis soluções, partindo da organização e da sua própria luta. Foi uma forte inspiração e um marco na restruturação da questão da luta agrária de todo o país, violando o poder político das oligarquias tradicionais.

João Pedro Teixeira no Panteão da Liberdade

Por Maria de Nazaré Tavares Zenaide[1]

Julyanna de Oliveira Bezerra[2]

A Lei nº 13.598, de 8 de janeiro de 2018, reconhece e determina a inclusão do nome de João Pedro Teixeira no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, em Brasília.

O Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves é um lugar onde se celebra os ideais de democracia e da liberdade, um lugar onde se guarda a memória dos lutadores da nação brasileira. São pessoas que usaram a vida para a luta por justiça social, pela liberdade e a igualdade de direitos, por isso são pessoas dignas de serem lembradas. Ter o nome de João Pedro Teixeira escrito no Livro de Aço ao lado outros lutadores, como Zumbi dos Palmares, Tiradentes, Tancredo Neves e mais de 21 significa a eternização da luta pela reforma agraria.

Foram curtos 44 anos de vida (04.03.1918 a 02.04.1962) dedicados ao trabalho de educação e organização social do camponês por moradia, um pedaço de terra para trabalhar, alimento, saúde e proteção frente a violência do latifúndio.

Sua morada, espaço de vida e partilha, se constitui um lugar de memória, nas rodas de conversa no silêncio da noite, amorosamente João Pedro Teixeira escutava as falas e as dores dos irmãos camponeses, que, expulsos da terra, ou tendo seus roçados arrancados e casas destruídas, ou a vida ameaçada recebiam o amparo no abraço do líder e a solidariedade na força do coletivo. Não sabia João Pedro Teixeira, que ali ele plantaria a pedra fundamental que em 2006 se transformaria num Sítio de Memória, o Memorial das Ligas e Lutas Camponesas.

Disputando a terra, porque a terra é vida, é trabalho e liberdade João Pedro Teixeira preparou seus companheiros e Elizabeth Teixeira para darem continuidade a luta, pois tinha clareza de que sua vida, assim como, das demais lideranças das Ligas Camponesas de Miriri e Mari seria curta, já que o preço da liberdade seria a vida vencida pela tocaia e a pólvora. Esquecem os tiranos do latifúndio de que João Pedro Teixeira se eternizou na memória do povo. Hoje ele continua à luz do sol e do luar rondando os roçados e assentamentos rurais para ver e ouvir como está vivendo seu povo. Hoje ele caminha lado a lado nas romarias da terra, nas ocupações de lutas pela demarcação de terras para quem nela trabalha. Hoje ele adentra as escolas e universidades ensinando aos jovens o valor da liberdade, do trabalho e da justiça social. Como reitor da escola do campo, João Pedro Teixeira educa para a libertação, mesmo não tendo o direito de ter acessado à escola. João Pedro Teixeira ensina a soletrar a palavra liberdade e igualdade com o som e a força da enxada na terra.

A luta de João Pedro Teixeira junto as Ligas Camponesa da Paraíba, não pode ser silenciada ou esquecida, ela é parte da memória histórica de quem faz a luta pela terra, por isso torna-se fundamental construir uma educação que preserve a memória do tempo presente, pois, conhecer a nossa história é o passo fundamental para que se entenda o momento vivido e para a construção do futuro. Conhecendo o passado, entendemos o presente e temos condições de, no futuro, não cometermos erros já cometidos.

Hoje, cada camponês de Sapé e em todo Brasil, tem em João Pedro Teixeira um símbolo da resistência e da luta pela Reforma Agrária. Assim como na luta pela liberdade nos encontramos abraçados com Zumbi, na luta pela democratização da terra andamos lado a lado com João Pedro Teixeira. Seu nome é memória coletiva, pois nele se encontram cravados todas as lideranças mortas em combate na luta pela terra no Brasil.

João Pedro Teixeira, Presente e Sempre!

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NOTA:

Nada mais justo do que lembrar e valorizar a memória das Ligas Camponesas, não só vívidas em Sapé, mas também no Município de Sobrado, terra onde hoje vivem alguns familiares de Elizabeth Teixeira, viúva do líder camponês. Sobrado, como território de memória que remete aos séculos XVIII e XIX como vila, cujo aglomerado de casas ainda são registros da ocupação rumo ao interior da Paraíba, sente a responsabilidade de também registrar João Pedro Teixeira e Elizabeth Teixeira como símbolos que compõem a sua senda histórica. (Edno de Luna)

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REFERÊNCIAS


BRASIL. LEI Nº 13.598, DE 8 DE JANEIRO DE 2018. Acesso em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/Lei/L13598.htm, em 23 de julho de 2021.

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[1] Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal da Paraíba (1980), mestrado em Serviço Social pela Universidade Federal da Paraíba (1986), Especialização em Saúde Pública e Psicologia Social. Doutorado em Educação pela Universidade Federal da Paraíba (2010). Atualmente é membro do Grupo de Pesquisa da Pedagogia Paulo Freire (GEPPF/UFPB) e do Grupo de Pesquisa Memória, Política e Direitos humanos (CCHLA/UFPB). É membro da Comissão de Direitos Humanos, do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos e da Comissão Gestora do Pacto Universitário pela Promoção do Respeito à Diversidade, da Cultura da Paz e dos Direitos Humanos no âmbito da UFPB. Compõe a Comissão da Comissão da Verdade da UFPB. Atuou como membro do Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos de 2003-2018. Exerceu a Coordenação Geral de Educação em Direitos Humanos do Ministério da Justiça, gestão 2004-2007 na implementação do Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos. Atuou como consultora em Educação em Direitos Humanos junto ao Ministério da Educação e a Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais. Tem experiência de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação em Direitos Humanos, Direitos Humanos e Políticas Públicas, Educação para Nunca Mais, Memória e Verdade, Movimentos Sociais e Direitos Humanos, Violência social e escolar e segurança cidadã. É membro da Rede Latino-americana e Caribenha de Educação em Direitos Humanos, da Associação Nacional de Educação, da Associação Nacional de Direitos Humanos, Ensino e Pesquisa e da Rede Brasileira de Educação em Direitos Humanos.

[2] Possui graduação em pedagogia pela Universidade Federal da Paraíba (2014); Mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos, Cidadania e Políticas Públicas/NCDH/CCHLA/UFPB (2017), na Linha de Pesquisa Educação em Direitos Humanos, Cidadania e Políticas Públicas: Doutoranda em Educação no programa de Pós-graduação em Educação - CE/UFPB; Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisas da Pedagogia Paulo Freire (GEPPF/PPGE/PPGDH/UFPB) e e do Grupo de Pesquisa Memória, Política e Direitos humanos (CCHLA/UFPB); É membro do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos(CCHLA/UFPB); É membro da Associação Nacional de Educação - ANPED; Tem experiência na área de educação com ênfase em Educação Infantil, Educação de Jovens e Adultos, Educação em Direitos Humanos e Educação Popular.


HOMENAGEM

Paulo Palhano (*)

FOGO DE MONTURO

Viu-se um corpo estendido

Naquela estrada caído

O sangue marcando o chão

Pois carregava uma arma

Destas que alguns alarmam

Os livros na sua mão

Pois a notícia corria

Assassinato de dia

Com tiro de capataz

Pôs o fogo no monturo

Que no jornal teve furo

O camponês não tem paz

Fogo na palha da cana,

Cheiro de mel e a usina

Doces que muitos não provam

Na vida, a prova

De uma amarga vida

Vaticinou João Pedro Teixeira:

“Eu sei que o nego vai morrer.

Essa luta vai continuar, mas vai ser abafada.

Vai ficar como um fogo de monturo por baixo.

E quando ele levantar mais tarde,

Aí não tem água que apague esse fogo”

Tentaram calar a voz

Se fazendo de algoz

O camponês viu-se aflito

A repressão foi ousada

Mas não houve retirada

Enfrentaram o conflito

Ficou então a semente

De um homem tão resistente

Na força dos ideais

Pois viram cada irmão

Querendo libertação

Escravidão nunca mais

Fogo na palha da cana

Mel de purgar, o mais puro

Doce que muitos não provam

Mas hoje renovam

O fogo de monturo.

Edno Paulino de Luna


Edno de Luna fez a composição da música FOGO DE MONTURO. É uma obra prima poética, cuja letra, melodia, acordes e arranjos nos estimula a rompermos com as amarras da opressão e nos estimular a somarmos as muitas marchas de humanos pela libertação.

O Mártir João Pedro Teixeira, Elizabeth e seus companheiros e companheiras são personagens reais homenageados, pois já foram consagrados no coração, nas mentes e nas páginas da história.

A bandeira das Ligas Camponesas foi recuperada por Giovani Meirelles. Mas, faltava uma canção para coroar a fantasia e os movimentos da realidade.

Edno de Luna, com FOGO DE MONTURO nos doa um extraordinário hino histórico das Ligas Camponesas que certamente movimentará multidões, proporcionando a embarcarmos em uma imaginação coletiva que caprichosamente foi projetada para que cultivemos facilmente as suas estruturas - melodia, ritmo, notas, musicais, gerando uma memorização do acervo dessa história.

Nas madrugadas frias e longas, porém generosas, camponeses e camponesas se encontraram, dialogaram, se organizaram, se uniram e juntos caminharam do raiar do sol até a escuridão das noites com um único intuito: vencer a maldade e viver com liberdade. Claro que no chão de Sobrado, Sapé, Mari, Riachão e tantos lugares houve agonia, dor, ranger de dentes, mas creio que sempre incluíram o esperançar nos seus atos revolucionários em prol da pátria Brasil.

Edno de Luna nos faz aprender que as práticas educativas das Ligas Camponesas foram realizadas na matriz discursiva de Paulo Freire, nosso Patrono da Educação do Brasil, onde nessa contemporaneidade comemoramos os 100 anos de sua história. Agora, seu legado nos anima a vivermos a educação pautada em atos educativos libertadores.

Eles e Elas, camponeses, operários, padres, políticos e militantes foram brutalmente massacrados e mortos, banhando a mãe terra com sangue. Nós cantamos o FOGO DE MONTURO também para que os tiranos escutem e mentalizem: Todos, Todas, “Todes” continuaremos, como filhos e filhas das Ligas Camponesas, a honrosa luta popular pelas terras, pelos pães e pelas liberdades do Povo paraibano, nordestino e brasileiro.

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(*) Paulo Roberto Palhano Silva, natalense, instalado no Vale do Mamanguape. É professor da Universidade Federal da Paraíba, atuando no CCAE, Campus do litoral Norte. É doutor em Educação pela UFRN, PhD em Educação pela University Saint-Demi, Paris 8 – França e Pesquisador Produtividade (Pq), além de líder do Grupo de Estudos em Educação, Etnia e Economia Solidária, integrando a confraria da Academia de Ciências, Letras e Artes do Vale do Mamanguape Paraibano, escritor, poeta, afilhado de Padre Cícero do Juazeiro. Pesquisa Educação e Movimentos Sociais, Memória e História e lidera os eventos Seminário Internacional de Práticas Educativas – SECAMPO e a Jornada de Estudos Freireanos. É estudioso dos fenômenos que envolve o povo Popular: a luta pela terra; a formação dos educadores populares do MST; Pastorais Populares; Povos Indígenas, os Potiguara; Paulo Freire: história, legado e vida.