Menstruação: sagrada e profana
Desde a Antiguidade a menstruação era vista com maus olhos. Na Idade Média (Séc. V - XV), a falta de separação entre o natural e sobrenatural, a misoginia e a visão conservadora do mundo, incentivada pela Igreja Católica, resultaram na sua demonização e precarização da saúde feminina.
Como a ciência via a menstruação?
Uma das referências mais conhecidas acerca do assunto é encontrada nos escritos deixados pelo grego Hipócrates, mencionando a utilização de protetores intra vaginais entre suas contemporâneas. Sem ter como examinar cadáveres humanos, Hipócrates pensava que o útero fosse subdividido internamente, formando inúmeras subdivisões e saliências, e que o seu interior continha tentáculos e ventosas. Ainda assim, foi quem primeiro analisou o fenômeno da menstruação, atribuindo ao mesmo uma função benéfica à saúde.
Mas, infelizmente, no geral, os médicos e cientistas não consideravam a menstruação como parte do ciclo reprodutivo, mas sim, como uma doença que afligia as mulheres mensalmente. Eles supunham que se o sangue da menstruação não fosse eliminado pela vagina, seria necessário retirá-lo do corpo de outra forma, usando práticas como, por exemplo:
Colocar lã com leite e pepino no órgão genital;
Remover o sangue direto da veia.
A visão negativa do sangue menstrual se originou na Grécia antiga. Alguns médicos medievais usavam teorias que consideravam o sangue como sujo e prejudicial. Na verdade, os registros científicos eram bem parciais, já que foram escritos por homens e membros da Igreja Católica.
Não que não existam estudos por mulheres. Na verdade, as curandeiras conheciam ervas, até mesmo com propriedades anticoncepcionais. O problema é a dificuldade de encontrá-los, já que eram pouco documentados.
Crenças populares
A ciência não se dedicou muito a compreender a menstruação. Isso preparou um território fértil para o surgimento de crenças populares. E, como sabemos, quando se desconhece um assunto, ele fica muito mais vulnerável a informações falsas. A atualidade é repleta de fake news devido à desinformação. Na Idade Média, aconteceu a mesma coisa e isso precarizava a saúde feminina.
Era proibido ter relações sexuais com mulheres durante a menstruação. O sangue menstrual era considerado venenoso e o ato sexual durante a menstruação era visto como desonroso e tóxico, já que o sangue “queimaria” o pênis.
Ainda, acreditava-se que a criança nasceria ruiva. O diferente sempre causou espanto, a perseguição dos ruivos foi reflexo desse desconhecimento. Os cabelos vermelhos eram marca do desejo sexual bestial e degeneração moral. No manual de caça às bruxas, o Malleus Maleficarum, a combinação de cabelos vermelhos com olhos verdes era considerada características de uma bruxa, lobisomem ou vampiro.
Logo, a mulher ruiva era duplamente amaldiçoada. Sofria discriminação por ser mulher, e também carregava a marca da “relação sexual profana”. Materiais como o manual de caça às bruxas demonizavam a mulher na sociedade cristã, o que resultou na perseguição e morte de centenas durante a inquisição. Click no link abaixo para saber mais sobre esse tema.
Influência Religiosa
Como a menstruação era mal explorada cientificamente, a Igreja Católica aproveitou para ditar o que a sociedade deveria pensar sobre mulheres e o sangue menstrual. A própria conotação ruim do cabelo ruivo é fruto de ações do cristianismo.
A bruxa é uma figura que existia em outras culturas, muitas vezes vista positivamente. No cristianismo, ela era associada ao demônio e referência do que a mulher não deveria ser. Então, muitas “calamidades” e eventos negativos eram associados às mulheres bruxas.
A figura feminina tinha duas interpretações: Eva, que surge do pecado original e é responsável pela queda da humanidade; e Maria, redenção do ser feminino para explicar a origem de Cristo, representada pela pureza e maternidade divina - um modelo a ser seguido.
Foram os acadêmicos da Igreja os responsáveis pela mulher diabólica. Os homens eram aconselhados a desconfiar das mulheres. Isso mostra uma parte do porquê, na Era Medieval, a mulher e a menstruação eram vistas tão negativamente.
Agora, reflita: Qual a associação entre Eva e a maneira como a menstruação era vista na Idade Média?
A relação está no sangue menstrual ser ligado ao pecado original, o que tornaria a mulher impura para rituais religiosos, relações sexuais e, até mesmo, amamentação.
Como as mulheres lidavam com a menstruação
A pobreza de informações sobre a menstruação impactava, também, nos cuidados da saúde. As mulheres lidavam em meio a situações insalubres e precárias, com pedaços de tecidos ou seda e linho, isso se fossem de classe abastada.
A maioria das mulheres usavam linho. Como não existiam calcinhas, usavam um cinto para manter tudo no lugar. Sem o cinto, era comum cair pedaços do pano, apelidados de "tampão monstruoso”. Outros materiais eram o algodão, folhas, penas e musgo - não muito higiênicos. Eles eram inseridos dentro da vagina causando graves infecções e doenças.
Não usar nada era comum. O sangue escorria pelas pernas. Por esse motivo, usavam vestidos escuros, em tons de vermelho, para disfarçar as manchas de sangue menstrual.