Apreciar as qualidades estéticas de uma obra de arte é bem diferente de notar suas propriedades físicas: tamanho, peso,
material de que é feito. Seu valor econômico, de troca, também não entra em consideração na apreciação estética.
Costuma-se dizer que a experiência estética, ou a experiência do belo, é gratuita, é desinteressada, ou seja, não visa a um interesse prático imediato. Só nesse sentido, podemos entender a gratuidade dessa experiência; jamais como inutilidade, uma vez ela responde a uma necessidade humana e social.
Ressalte-se que a experiência estética:
não visa ao conhecimento lógico, medido em termos de verdade;
não tem como alvo a ação imediata;
e não pode ser julgada em termos de utilidade para determinado fim.
Algumas vezes essa atitude desinteressada é chamada de contemplativa. Não nos enganemos, entretanto, com o significado dessa palavra. A contemplação não se opõe à ação: ao contrário, ela é também uma ação, pois é percepção ativa, que envolve antecipação e a reconstrução. É o que se verifica na experiência musical; nas artes visuais (sobretudo em seus aspectos formais, como a relação da figura com o fundo, formas, cores e tonalidades, diferentes planos etc.); na literatura (na estrutura narrativa). (...)
A experiência estética é a experiência da presença tanto do objeto estético como do sujeito que o percebe. Nenhum argumento racional ou conjunto de regras poderá nos convencer de que um objeto é belo se não pudermos percebê-lo por nós mesmos, se não estivermos frente a frente com ele.
A obra de arte, como já dissemos, pede uma recepção justa, que se abra para ela e ao mesmo tempo não lhe imponha normas externas. Essa recepção tem por finalidade o desvelamento do objeto, por meio de um sentimento que o acolhe e que lhe é solidário.
A obra de arte espera que aquele que a aprecia "jogue o seu jogo", isto é, entre no seu mundo, de acordo com as regras ditadas pela própria obra para que seus múltiplos sentidos possam aparecer.
O espectador, ao acolhê-la, atualiza as possibilidades de significado da arte e testemunha o surgimento de algumas significações contidas na obra. Outros a verão, e outros significados surgirão. Todos igualmente verdadeiros.
A fonte, 1917, Marcel Duchamp