Definir o substantivo ser no contexto filosófico é uma tarefa bastante delicada. Como se observa em relação a vários outros conceitos filosóficos, cada pensador deu uma pincelada, tirou ou acrescentou algo, às vezes até colocando suas distintas interpretações em contradição. E quanto mais abstrato o conceito, mais isso parece ocorrer.
Podemos dizer, no entanto, de maneira simplificada, que ser é um termo genérico usado para se referir a qualquer coisa que é, qualquer coisa que existe - por exemplo, um homem, uma mulher, um pássaro ou uma pedra. Nesse sentido, o termo mais adequado e específico seria ente.
Normalmente, porque esses entes "se apresentam" a nós de maneira caracteristicamente própria e distinta - isto é, de tal forma que um não se confunde com outro, como um pássaro não se confunde com uma pedra, uma mesa ou um ser humano -, tendemos a pensar que eles são algo caracteristicamente próprio e distinto.
Ora, se supomos que todas essas "coisas" são de maneira caracteristicamente própria e distinta, acabamos inferindo que têm" algo que lhes é inerente, intrínseco, essencial, que as constitui e determina. Portanto, o termo ser também pode ser definido, strictu sensu, como aquilo que uma coisa (um ser ou ente) é ou "tem" que lhe é próprio e que não depende de outros seres ou de quaisquer circunstâncias para ser.
O ser, neste último sentido, ficou conhecido mais tarde, no jargão filosófico, como a coisa em si, expressão adotada pelo filósofo alemão Immanuel Kant no século XVIII. Assim, no primeiro sentido, seria a coisa; no segundo, a coisa em si.
Inerente - que está em algo (ou alguém), fazendo parte dele de maneira inseparável.
Intríseco - que vem de dentro e faz parte de algo (ou de alguém) como próprio (por oposição a extrínseco, que vem de fora).
HAMLET - Ser ou não ser, eis a questão
Ser ou não ser, eis a questão: será mais nobre
Em nosso espírito sofrer pedras e setas
Com que a Fortuna, enfurecida, nos alveja,
Ou insurgir-nos contra um mar de provações
E em luta pôr-lhes fim? Morrer.. dormir: não mais.
Dizer que rematamos com um sono a angústia
E as mil pelejas naturais-herança do homem:
Morrer para dormir... é uma consumação
Que bem merece e desejamos com fervor.
Dormir... Talvez sonhar: eis onde surge o obstáculo:
Pois quando livres do tumulto da existência,
No repouso da morte o sonho que tenhamos
Devem fazer-nos hesitar: eis a suspeita
Que impõe tão longa vida aos nossos infortúnios.
Quem sofreria os relhos e a irrisão do mundo,
O agravo do opressor, a afronta do orgulhoso,
Toda a lancinação do mal-prezado amor,
A insolência oficial, as dilações da lei,
Os doestos que dos nulos têm de suportar
O mérito paciente, quem o sofreria,
Quando alcançasse a mais perfeita quitação
Com a ponta de um punhal? Quem levaria fardos,
Gemendo e suando sob a vida fatigante,
Se o receio de alguma coisa após a morte,
–Essa região desconhecida cujas raias
Jamais viajante algum atravessou de volta –
Não nos pusesse a voar para outros, não sabidos?
O pensamento assim nos acovarda, e assim
É que se cobre a tez normal da decisão
Com o tom pálido e enfermo da melancolia;
E desde que nos prendam tais cogitações,
Empresas de alto escopo e que bem alto planam
Desviam-se de rumo e cessam até mesmo
De se chamar ação.