Resumos das palestras

Danilo Lustrino

Participação da ocitocina como mediadora do eixo hipotálamo-músculo esquelético na regulação da massa muscular

A ocitocina (OXT) é um neuropeptídeo produzido principalmente pelos neurônios magnocelulares hipotalâmicos dos núcleos supra-óptico (SON) e paraventricular (PVN), sendo secretado na corrente sanguínea para então exercer suas ações clássicas nas células mioepiteliais das glândulas mamárias e na musculatura lisa uterina. Estudos recentes demonstraram que o músculo esquelético também expressa receptores para OXT (OXTR), e animais nocautes para este neuropeptídeo desenvolvem sarcopenia prematuramente, indicando que a OXT poderia ter um papel como reguladora da massa muscular. Nesse sentido, nós demonstramos que a ativação in vitro do OXTR inibe as duas principais vias proteolíticas musculares, isto é, proteassomal e autofágica, e que este efeito é dependente de um crosstalk entre OXTR-Gαq-Ca2+ e a Akt-FoxO. Além disso, roedores submetidos tanto ao tratamento farmacológico com OXT quanto à ativação quiomiogenética (DREADD) dos neurônios do SON apresentaram hipertrofia muscular, sugerindo que as ações anti-catabólicas no metabolismo de proteínas observadas in vitro também devem ocorrer in vivo. Desta forma, nossos resultados destacam um novo papel da OXT na regulação do metabolismo muscular e reforçam as evidências clínicas que indicam sua ação anti-diabetogênica, a qual poderia ser justificada, pelo menos parcialmente, através de um efeito protetor da massa musculoesquelética.


Arnon Jurberg

O minicurso sobre “Técnicas de estudo da função gênica em músculo esquelético” versará sobre diferentes abordagens para investigação de mecanismos moleculares associados à biologia muscular em cultura de células e em modelos animais, como camundongos e peixe-zebra. Os participantes aprenderão sobre a geração de células e animais geneticamente modificados, incluindo transgênese, nocaute/"knockin", sistemas condicionais e CRISPR.


Siefried Labeit

In this talk I will address the role of the E3 ligases MuRF1 and MuRF2 in skeletal muscle plasticity, starting with genetically modified mice undergoing models of atrophy and regeneration. Subsequently I will address our studies on a novel small molecule able to inhibit MuRF1 inhibitor developed by our group. We have used this molecule in models of cancer cachexia, diabetes and heart myopathy. We have observed that this small molecule can spare skeletal muscle from mass and function loss, representing a potential future therapeutic tool in clinical conditions involving skeletal muscle atrophy.


Alice Rodrigues

A prática regular de exercício físico aumenta a resistência muscular e força, gasta calorias e leva a uma diminuição da massa de tecido adiposo. Além disso, exerce importantes efeitos benéficos sobre a prevenção de doenças crônicas, como a obesidade e diabetes tipo 2. A liberação de exosomos é aumentada em soro de jovens adultos submetidos a um protocolo agudo de exercício físico. Os exossomos carregam microRNAs dentre outras moléculas e, portanto, exossomos contendo microRNAs podem ser liberados do músculo esquelético e entregarem seu conteúdo de microRNAs localmente no músculo esquelético ou em tecidos distantes como tecido adiposo. Nós comparamos por miRNAseq a expressão global de microRNAs presentes em exossomos do soro de animais sedentários com o de treinados em esteira por 8 semanas. Ao total 184 microRNAs exossomais foram regulados pelo exercício, sendo que 93 tiveram expressão aumentada e 91 diminuída. Nós identificamos o miR-1 como um dos miRNAs aumentados na circulação de animais treinados e testamos seu possível potencial terapêutico em modelo in vitro e in vivo de obesidade. Nossos dados sugerem que o miR-1, via ativação de AMPK, aumenta o metabolismo oxidativo e conteúdo mitocondrial do músculo esquelético, o que aumenta a sensibilidade à insulina, sugerindo uma nova função do miR-1 no músculo esquelético.


Anselmo Moriscot

Movimento: do micro ao macro

Nesse minicurso, vamos desenvolver elementos que destacam a importância do movimento para a biologia, desde organismos unicelulares ate organismos mais complexos. Vamos explorar aspectos moleculares, celulares e evolutivos para obter uma compreensão mais abrangente do movimento, finalizando com os movimentos de grande porte mediados pelo tecido muscular esquelético.


Flavia Guarnier

Envolvimento do músculo esquelético nas crises hipertérmicas e na hipertermia maligna: a relação com o estresse oxidativo e a prevenção por meio do treinamento aeróbio

A hipertermia é um aumento anormal da temperatura corporal acima do ponto de ajuste hipotalâmico causado pelo acúmulo excessivo de calor externo (ambiental) ou interno (metabólico). Em humanos, a susceptibilidade à hipertermia maligna (SHM), descrita pela primeira vez em 1960, é um distúrbio farmacogenético herdado de forma autossômica dominante, frequentemente associado a mutações no receptor de ryanodina tipo 1 (RyR1), o gene que codifica o canal de liberação de Ca 2+ do retículo sarcoplasmático (RS) do músculo esquelético. As principais características clínicas de HM incluem contração muscular descontrolada, ruptura de fibras musculares (ou seja, rabdomiólise), aumento dos níveis circulantes de creatina quinase (CK) e K+, e aumento do consumo de oxigênio. Curiosamente, crises hipertérmicas são muito semelhantes aos episódios de HM induzidos por anestésicos, e foram relatadas em humanos expostos a temperaturas ambientais elevadas ou exercícios vigorosos realizados em condições desafiadoras. Recentemente, a associação entre HM e crise por estresse térmico tem sido relacionada a outras proteínas presentes no retículo sarcoplasmático. Camundongos machos sem calsequestrina-1 (CASQ1-null), a principal proteína de ligação de Ca 2+ localizada no lúmen das cisternas terminais do RS que modula a probabilidade de abertura do RyR1, apresentam episódios hipertérmicos letais quando expostos a anestésicos, calor e exercícios vigorosos. A administração de antioxidantes exógenos (N-acetilcisteína e trolox) demonstrou ser capaz de reduzir a mortalidade de camundongos CASQ1-null durante a exposição ao calor. Como o treinamento aeróbico é conhecido por aumentar a proteção antioxidante endógena, submetemos os camundongos CASQ1-null a corrida em esteira por 2 meses a 60% de sua velocidade máxima por 1 hora, 5 vezes por semana. Nos níveis celular e molecular, o treinamento aeróbico é capaz de: (i) melhorar a função mitocondrial enquanto reduz seu dano e (ii) reduzir a atividade de calpaína e a peroxidação lipídica em membranas isoladas do retículo sarcoplasmático e das mitocôndrias. Com base nessas evidências, o efeito protetor do treinamento aeróbico parece ser essencialmente mediado por uma redução no estresse oxidativo durante a exposição de camundongos CASQ1-null a condições ambientais adversas.


Leonardo R. Silveira

Regulação do metabolismo e das propriedades contráteis do músculo esquelético pelo receptor nuclear Nr2f6.

A família de receptores nucleares é fundamental para traduzir os sinais ambientais em alterações transcricionais. Usando dados de ChIP-seq publicamente disponíveis, demonstramos que o cistroma do receptor nuclear Nr2f6 é enriquecido em genes do metabolismo oxidativo. O perfil global do transcriptoma de miócitos depletados para Nr2f6 revelou que essas células têm um aumento do potencial miogênico e experimentos subsequentes demonstraram aumento da capacidade de oxidação de lipídios, com a ativação concomitante das vias da AMPK e Akt. Por outro lado, a superexpressão de Nr2f6 em camundongos resultou em um estado atrófico, caracterizado por uma redução significativa na massa muscular (15%) e no conteúdo de miofibras (18%), seguido por um comprometimento (50%) na produção de força. Esse fenótipo funcional foi acompanhado pelo estabelecimento de uma assinatura molecular semelhante ao da inflamação, seguido de uma diminuição na expressão de genes envolvidos na contratilidade muscular e no metabolismo oxidativo. Nossos resultados revelam um papel central do Nr2f6 na manutenção do equilíbrio entre a função contrátil do músculo esquelético e a capacidade oxidativa. 


Geyse Gomes 

O papel de Yap na miogênese.

A formação de fibras musculares esqueléticas é um processo complexo controlado por diferentes vias de sinalização celular, incluindo as vias de Wnt, Shh e FGF. No entanto, o papel da via de Hippo não é bem conhecido neste processo e por isso decidimos investigá-la no modelo de cultura de células de músculo esquelético peitoral de embriões de galinha. Nossos resultados mostram que o principal fator de transcrição desta via, a proteína Yap, está altamente concentrada no núcleo de mioblastos. À medida que os mioblastos se diferenciam em fibras musculares, Yap passa a ser detectada majoritariamente no citoplasma. O tratamento das células com o inibidor da via de Hippo XMU-MP-1 (XMU), induz (i) a translocação de Yap para o núcleo de mioblastos e miotubos, (ii) a expressão de miogenina, e (iii) a fusão de mioblastos; levando a formação de fibras musculares bem maiores que as encontradas em culturas não tratadas. A hipertrofia induzida por XMU pode ser bloqueada pelo inibidor de proteína quinase C (PKC) calphostin, o que sugere que a via de Hippo pode modular o crescimento muscular de uma forma dependente de PKC.


Marcelo Barbosa Neves

Deficiência de Estrogênio e seu Impacto na Secreção de Irisina pelo Músculo Esquelético

O estrogênio desempenha um papel fundamental no ciclo menstrual e reprodutivo da mulher, atuando na fisiologia de diversos tecidos como o mamário, ovariano, cerebral, cardíaco, epitelial. Esse hormônio também atua no endométrio, no metabolismo ósseo, de colesterol, lipídeos, síntese proteica incluindo a homeostasia do tecido muscular. As mulheres experimentam mudanças hormonais drásticas devido à menopausa com declínio na concentração de estrogênio, também na menopausa ocorre perda de massa magra. O músculo secreta miocinas com propriedades endócrinas e parácrina. A irisina é um desses hormônios secretado pelo músculo quando estimulado, como durante o exercício físico. A irisina medeia um papel na homeostase energética com o processo de browning, na regulação do metabolismo da glicose e medeia um papel neuroprotetor. Assim, analisamos o efeito da deficiência de estrogênio na produção de irisina. Usando modelo de animal de ratos wistas fêmeas com 8 semanas de vida que foram divididas nos grupos, 1- sham (S) (injeção intradérmica de óleo de milho) n=7, 2 - ovarectomizadas (O) n=5 e 3 -ovarectomizadas com reposição de estrogênio (E) (injeção intradérmica de estrogênio, 0,7ug/ul) n=5. Esses animais foram sacrificados 60 dias após a intervenção cirúrgica. Foi analisado o delta do peso dos animais, o peso do útero e do músculo gastrocnêmio branco, não havendo diferença nesses parâmetros. A irisina sérica e no gastrocnêmio branco desses animais foi menor no grupo O em relação aos grupos S e E (p=0,0414) e (p=0,0332). Os dados foram analisados pelo teste t de Student não pareado e ANOVA Two-Way com pós-teste de Tukey e representados como média±EPM. Esses dados mostram que a ovarectomia, que causa uma diminuição do estrogênio está relacionado com a diminuição da secreção da irisina.


Dawit Albiero Pinheiro Gonçalves

EA exposição aguda ao estresse térmico ambiental (ETA) eleva a temperatura corporal central, o que pode induzir estresse térmico, cardiovascular e metabólico. Essas alterações podem ser prejudiciais ao desempenho do exercício, especialmente em exercícios aeróbicos prolongados. Por outro lado, a exposição de curto e médio prazo (2-4 semanas) ao ETA durante o exercício permite numerosas adaptações fisiológicas específicas que minimizam a perturbação térmica no organismo e aumentam o desempenho do exercício. Esse processo de treinamento no calor é referido como aclimatação ao calor (AC) quando realizado em ambientes artificiais, como salas quentes e saunas, ou aclimatização ao calor quando realizado em áreas / ambientes naturalmente quentes. Além dos efeitos benéficos da AC no exercício no calor, alguns estudos relataram que as adaptações fisiológicas induzidas pela AC teoricamente poderiam melhorar o desempenho do exercício aeróbico em condições de temperatura temperada, mas essa hipótese foi pouco investigada. Em um nível mecanicista, o ETA pode ativar ou inibir transitoriamente várias vias de sinalização que regulam o metabolismo energético celular, a contração e a vascularização. No entanto, os efeitos da AC de longo prazo (> 4 semanas) no tipo de fibra muscular, complexos mitocondriais e desempenho do exercício representam outras questões importantes que ainda não foram adequadamente abordadas, e o nosso grupo de pesquisa tem trabalhado para desvendar esses mecanismos. Por fim, para aumentar o estresse fisiológico sem um aumento subsequente na carga mecânica por meio do aumento da força ou da produção de energia, discutiremos a possibilidade de usar o calor como um componente da prescrição de exercícios para gerenciar a carga de treinamento externo em atletas ou mesmo em pacientes com doença metabólica (por exemplo, obesidade) ou lesão ortopédica (por exemplo, lesões musculares, articulares e tendíneas) que não puderam realizar exercícios de intensidade moderada-alta devido à sobrecarga mecânica.


Érika Stefani Perez

Biologia e controle do crescimento muscular em peixes

O músculo estriado esquelético atua transformando energia química em mecânica para a geração de força e movimentos, representando uma copiosa reserva energética para os organismos. Considerando a anatomia do tecido muscular nos peixes, diferentemente dos mamíferos, os tipos de fibras musculares são encontrados em compartimentos: branco/fast, intermediário e vermelho/slow. A formação destas fibras musculares ocorre através da miogênese, em que existem algumas peculiaridades que a difere da miogênese de aminiotas, devido à formação dos compartimentos musculares e pela retomada da miogênese através de processos hiperplásicos durante a vida adulta de espécies de peixes classificadas com crescimento indeterminado. As espécies que apresentam crescimento muscular através da continuidade da hiperplasia em mosaico ao longo do desenvolvimento possuem crescimento indeterminado, como o pacu (Piaractus mesopotamicus), e as que apresentam a hiperplasia em mosaico mais restrita ao início do desenvolvimento possuem crescimento determinado, como o zebrafish (Danio rerio). Inúmeros estudos contribuíram para o conhecimento acerca do crescimento muscular, entretanto, esse processo não é completamente compreendido. Nesse sentido, atualmente nossa pesquisa investiga o perfil transcriptômico do músculo esquelético de P.mesopotamicus e de D.rerio, com o objetivo encontrar possíveis marcadores de crescimento, manutenção e distinção desses dos padrões de crescimento muscular. Para tais objetivos, utilizamos a bioinformática para a análise de datasets transcriptômicos de ambas as espécies adultas e juvenis. A partir desses dados, foram montados os transcriptomas seguidos da obtenção dos Genes Diferencialmente Expressos (GDEs) e da análise do enriquecimento de via. Como resultados foi observado que os genes up-regulados no zebrafish enriqueceram  processos biológicos associados ao funcionamento do tecido muscular. Por outro lado, os genes down-regulados, mais enriquecidos no pacu, se associaram à formação do tecido muscular. A partir dos termos enriquecidos e seus genes, foi gerada uma rede de interação apenas com os processos biológicos de interesse: Embriogênese, Formação Muscular, ncRNAs e Citoesqueleto. Considerando as interações da rede, os valores de Fold Change e o número de counts, foram selecionados os genes noc3l (NOC3 Like DNA Replication Regulator), pes (pescadillo), wasla (WASP like actin nucleation promoting factor a), arpc1b (actin related protein 2/3 complex, subunit 1B), myog (myogenin), dock4b (dedicator of cytokinesis 4b) e dock9 (dedicator of cytokinesis 9) up regulados no pacu adulto e alguns no pacu juvenil, para validação. Assim como no transcriptoma, os genes arpc1b (p valor: 3.84e-05), wasla (p valor: 0.00291), pes (p valor: 0.002387) e dock4b  (p valor: 1.8e-07) foram up regulados no pacu e down regulados no zebrafish. O gene noc3l é associado à re-entrada de células satélites quiescentes no ciclo celular, contribuindo com a proliferação, assim como o pes. Já  o gene wasla possui função no processo de fusão de mioblastos e no remodelamento do citoesqueleto, assim como arpc1b e dock4b. É possível que estes sejam alguns dos alvos envolvidos no controle do crescimento indeterminado do pacu, haja vista o elevado número de transcritos no animal adulto, quando comparado ao zebrafish, na mesma fase do desenvolvimento. Considerando a função desses genes e o padrão de crescimento muscular indeterminado, é possível que no pacu, o maior crescimento do músculo esquelético seja atribuído ao eficiente recrutamento de mionúcleos para fusão de mioblastos, no processo de hiperplasia e hipertrofia, como evidenciado pela superexpressão de arpc1b, wasla e dock4b. Além disso, a eficiente síntese proteica junto à proliferação e diferenciação, regulados por pes e myog, também indicam que esses alvos são importantes para o crescimento muscular contínuo, que provavelmente persiste através da hiperplasia em mosaico e hipertrofia nos pacus adultos. Como próximas etapas da pesquisa, realizaremos a reação de imuno-histoquímica com amostras de pacu, tambaqui e tilápia para a validação do alvo wasla, além de ensaios funcionais de superexpressão e inibição de wasla em cultura de mioblastos de pacu e em zebrafish.