Olá, estudante! Como vai? Chegamos à décima segunda lição da disciplina de Noções de Direito. Como breve retomada, na lição anterior, abordamos os principais modelos de garantias, que são: alienação fiduciária, fiança bancária, seguro garantia, hipoteca, penhor e aval, lembra-se? De igual modo, estudamos os conceitos, características e as fases da recuperação judicial e da falência. Vimos o que deve ser feito para que a empresa possa superar a crise financeira que a assola, e caso ela não consiga sair de tal crise, entra em cena o instituto da falência, que terá como objetivo principal levantar os ativos e passivos da empresa e consequentemente encerrar as suas atividades de forma permanente.
Agora, vamos estudar os conceitos de consumidor, fornecedor, produtos e serviços, pois, para que o empresário evite a recuperação e a falência, ele deve, necessariamente, reconhecer esses conceitos, uma vez que é o consumidor quem irá sustentar os seus negócios, seja pela compra de produtos ou serviços.
Inicialmente, eu poderia dizer que tratar sobre os conceitos de consumidor e fornecedor é algo simples, uma vez que, até entrarmos na era digital, o conceito poderia ser estático e concreto. Contudo, com a evolução da sociedade e das tecnologias, acabamos nos deparando com situações complexas de serem resolvidas e que necessitam do reconhecimento do poder judiciário, muitas vezes do Supremo Tribunal Federal, maior órgão do poder judiciário no Brasil. Assim, se precisamos de uma intervenção do STF, é porque o assunto a ser discutido não é um dos mais fáceis.
Agora eu pergunto, quem realmente pode ser considerado um consumidor nos dias de hoje? Com o avanço da economia compartilhada e das plataformas digitais, os limites do que constitui um consumidor tradicional estão se tornando cada vez mais difusos. Por exemplo, alguém que utiliza um serviço de compartilhamento de carros ocasionalmente é um consumidor da mesma forma que alguém que compra um carro?
Outro questionamento de suma importância é sobre os fornecedores/empresários. Como as cadeias de suprimentos globais estão afetando a definição de quem é um fornecedor? Muitos produtos são fabricados em diferentes partes do mundo, com componentes fornecidos por várias empresas. Isso levanta questões sobre responsabilidade e transparência na cadeia de fornecimento. O que acontece quando os fornecedores são empresas multinacionais que operam em jurisdições com diferentes regulamentações e padrões éticos? Isso pode criar desafios significativos em termos de responsabilidade corporativa e direitos dos consumidores.
Com os estudos dessa lição, você terá ferramentas para responder e solucionar os questionamentos levantados acima, e, para os novos desafios que venham a surgir no desempenho de suas atividades no dia a dia. Vamos lá?
O caso que será apresentado é um caso real envolvendo os direitos do consumidor e o fornecedor, entretanto, o consumidor teve uma baita dor de cabeça até receber o produto que tinha comprado pela plataforma de vendas. Acompanhe o caso:
Uma situação no mínimo constrangedora foi divulgada nas redes sociais. O filho de um dos maiores cartunistas do Brasil adquiriu um produto, especificamente uma placa de vídeo e recebeu potes cheios de areia. O rapaz comprou o produto em uma loja de eletrônicos e pagou R$ 14.500,00 mil (quatorze mil e quinhentos reais) e, ao abrir o produto, a surpresa! O vídeo relatando o ocorrido foi publicado nas redes sociais do rapaz e o conteúdo foi visto mais de 2 milhões de vezes. No relato publicado em suas redes sociais, ele conta que entrou em contato com a loja de eletrônicos no mesmo dia exigindo o reenvio da placa, porém, já informaram que não poderiam resolver naquele momento, direcionando-o para o setor de "objetos de alto valor". O problema é que o setor em questão não constava com atendimento por telefone, ou ao menos por chat, era tudo por e-mail!
Foram mais de 20 dias sem a resolução do problema. Diante da falta de solução, ele decidiu registrar a reclamação em sites especializados e abriu um B.O. (Boletim de Ocorrência) e entrou com uma ação judicial contra a empresa. Mas, não pense que este é um caso isolado. Acontece com pessoas famosas ou não, produtos caros ou baratos. A ideia de trazer este caso é para que você compreenda que os conceitos de consumidor, fornecedor, produtos e serviços, estão relacionados.
E se quiser se aprofundar ainda mais no assunto, acesse ao vídeo da reportagem sobre o caso apresentado clicando aqui.
Até aqui você teve uma boa noção de como se caracterizam as relações de consumo, até porque todos nós somos consumidores, uma vez que compramos e utilizamos os produtos como destinatários finais. Para que o conteúdo fique de melhor compreensão e você tenha fluidez em sua leitura, irei dividir o conteúdo em quatro partes, da seguinte forma: conceito de consumidor; conceito de fornecedor; conceito de produto; e conceito de serviço. Feitas tais considerações, vamos estudar?
O conceito de consumidor se refere a um indivíduo ou entidade que adquire bens ou serviços para seu próprio uso final. Esse conceito é fundamental tanto no âmbito do direito do consumidor quanto no contexto econômico e comercial. Assim, em outras palavras, um consumidor é uma pessoa física ou jurídica que adquire bens ou serviços para satisfazer suas necessidades pessoais, familiares ou empresariais, com o objetivo final de consumo próprio. O conceito de consumidor também está previsto no art. 2º do Código de Defesa do Consumidor - CDC, onde prevê que "consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final" (BRASIL, 1990).
Cabe mencionar que o fato de ser destinatário final pode ser atribuído tanto a pessoas físicas como jurídicas, ou seja, o destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do produto ou do serviço. Os autores Benjamin e Marques (2013) esclarecem as características de ser destinatário final da aquisição de bem ou serviço:
Não basta ser destinatário fático do produto, retirá-lo da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência - é necessário ser destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para revenda, não adquiri-lo para uso profissional, pois o bem seria novamente um instrumento de produção cujo preço será incluído no preço final do profissional que o adquiriu ( BENJAMIN; MARQUES, 2013, p. 94).
Ainda sobre o tema do consumidor destinatário final, em regra, a aquisição de bens ou a utilização de serviços para implementar ou incrementar a atividade negocial descaracteriza a relação como de consumo. A exemplo disso, suponha que uma pequena empresa esteja buscando expandir sua presença on-line e aumentar suas vendas. Ela pode contratar uma agência de marketing digital para criar uma estratégia abrangente que inclua a otimização do site da empresa para mecanismos de busca, campanhas de publicidade on-line (como anúncios no Google Ads ou no Facebook Ads), gerenciamento de redes sociais, criação de conteúdo relevante (blogs, vídeos, infográficos etc.) e monitoramento de métricas de desempenho.
Com a implementação desses serviços de marketing digital, a empresa pode alcançar novos públicos, aumentar o tráfego em seu site, gerar leads qualificados e, por fim, aumentar as vendas de seus produtos ou serviços. Com esse exemplo podemos notar que a pequena empresa utilizou de um serviço de marketing como forma de incremento de suas atividades, desta forma ela não se caracteriza como destinatária final, ou seja, não é consumidora.
Você já notou que muitos dos conceitos que estudamos no decorrer dessa disciplina possuem amparo legal, ou seja, a sua previsão decorre de uma lei, e com o conceito de fornecedor não seria diferente, tendo em vista que o Código de Defesa do Consumidor apresenta o conceito de consumidor, no seu art. 3º, conforme segue:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços (BRASIL, 1990).
Assim, podemos notar que o conceito de fornecedor vai abarcar tanto a pessoa física como a pessoa jurídica que atuam no mercado de consumo.
De acordo com Finkelstein e Neto (2010), todas as atividades de produção, montagem e criação etc. previstas no art. 3º do CDC, devem ser, necessariamente, desempenhadas de forma profissional. Como exemplo, uma pessoa comum, ao vender seu automóvel, não pode ser considerada como fornecedor, desta forma, a relação entre as partes é cível, devendo ser aplicado o Código Civil. O conceito de fornecedor está previsto no Código de Defesa do Consumidor, e ao caracterizar este conceito, levou-se em conta três parâmetros de suma importância, são eles:
Amplitude do conceito de fornecedor.
Necessidade de o fornecedor exercer a atividade profissionalmente.
Irrelevância da caracterização da onerosidade ou gratuidade para a caracterização do fornecedor.
Assim, não há a necessidade da compra efetiva de um produto para que se possa caracterizar a relação de consumo, pois as pessoas que possuem acesso gratuito à determinado bem ou serviço, também podem ser beneficiadas pelo Código de Defesa do Consumidor. Para que você entenda melhor essa situação, vamos a um exemplo. Imagine a seguinte situação: uma pessoa compra um ar-condicionado e ganha a instalação por parte de uma terceira pessoa que atua profissionalmente com a instalação de ar-condicionado. Após a instalação, malsucedida, o equipamento cai sobre a cabeça do consumidor, causando-lhe lesões.
Nesse caso, mesmo que a instalação não tenha sido paga, porque foi um serviço gratuito devido a compra do ar-condicionado, quem fez a instalação do equipamento terá a responsabilidade sobre o fato ocorrido. Para que fique ainda mais claro, vou apresentar outro exemplo: considere que pessoas privadas de sua liberdade (detentos) recebem doação de um laboratório farmacêutico e passam mal devido aos remédios doados, assim, eles podem vir a se utilizar do Código de Defesa do Consumidor para que as medidas cabíveis sejam tomadas.
Configurada a relação de consumo, ou seja, quando de um lado há o fornecedor e de outro o consumidor, notamos que o consumidor destinatário final não é profissional, pois se fosse, a relação seria empresarial, aplicando-se o Código Civil e as legislações competentes, e não de uma relação de consumo. Por fim, e não menos importante, cumpre destacar que, de acordo com o art. 3 do CDC e o inciso X, do art. 6º da mesma lei, o Estado também é equiparado a fornecedor, estando sujeito às regras do CDC (BRASIL, 1990).
Para que haja a relação de consumo, é necessário que um bem ou serviço esteja no centro dessa relação. O conceito de produto e serviço também tem previsão no Código de Defesa do Consumidor. Para que possamos estudar cada um sem confusões, será feita uma separação neste momento e iremos iniciar nosso estudo pelo conceito de produto.
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC) no Brasil, produtos são definidos como bens móveis ou imóveis, novos ou usados, tangíveis ou intangíveis, destinados ao consumo. Em outras palavras, “produto é qualquer objeto de interesse em dada relação de consumo, destinado a satisfazer uma necessidade do adquirente, como destinatário final” (FINKELSTEIN; NETO, 2010, p. 20).
O CDC estabelece uma série de direitos e deveres tanto para os consumidores quanto para os fornecedores em relação aos produtos, visando proteger os interesses e a segurança dos consumidores. Sendo assim, para que um fornecedor disponibilize seus produtos no mercado de consumo, ele deve, necessariamente, observar alguns pontos importantes que possuem previsão expressa no CDC, são eles:
Qualidade e Segurança: O CDC estabelece que os produtos devem atender aos padrões de qualidade e segurança estabelecidos pelos órgãos competentes.
Informação e Publicidade: Os fornecedores são obrigados a fornecer informações claras, precisas e ostensivas sobre os produtos, incluindo características, composição, modo de uso, garantia, prazo de validade, entre outros.
Garantia: O CDC estabelece que os fornecedores devem oferecer garantia contratual para os produtos, estipulando prazos e condições para reparo, troca ou restituição em caso de defeitos ou vícios.
Responsabilidade Civil: O CDC prevê a responsabilidade civil dos fornecedores por danos causados aos consumidores em decorrência de defeitos ou vícios nos produtos.
Direito de Arrependimento: O CDC prevê o direito de arrependimento para compras realizadas fora do estabelecimento comercial, como por telefone, internet ou catálogo.
O CDC tem como objetivo garantir a proteção dos consumidores em suas relações de consumo, assegurando que os produtos oferecidos no mercado atendam aos padrões de qualidade, segurança e informação estabelecidos pela legislação.
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, um serviço é definido como qualquer atividade oferecida no mercado de consumo em troca de pagamento, abrangendo também aquelas de cunho bancário, financeiro, de crédito e securitário, exceto as resultantes de relações de trabalho (BRASIL, 1990). Isso significa que o serviço abrange uma ampla gama de atividades que são oferecidas no mercado em troca de pagamento, incluindo desde serviços bancários e financeiros até serviços de lazer e entretenimento, consultorias, transporte, educação, saúde, entre outros. As principais Características do Serviço, de acordo com o CDC são:
Intangibilidade: Os serviços são frequentemente intangíveis, o que significa que não são físicos e não podem ser tocados ou vistos antes de serem adquiridos. Isso contrasta com os produtos tangíveis, como bens físicos, que podem ser inspecionados antes da compra.
Personalização: Os serviços muitas vezes podem ser altamente personalizados para atender às necessidades individuais dos consumidores.
Produção e Consumo Simultâneos: Em muitos casos, os serviços são produzidos e consumidos ao mesmo tempo. Por exemplo, em uma consulta médica, o serviço é prestado e consumido quando o paciente é atendido pelo médico.
Imperfeição e Variabilidade: Os serviços podem ser mais suscetíveis a variações de qualidade e desempenho devido à natureza humana da prestação de serviços. Por exemplo, a qualidade de um serviço de restaurante pode variar de acordo com o atendimento dos garçons ou a habilidade do chef.
Relação Direta com o Consumidor: Os serviços frequentemente envolvem uma interação direta entre o prestador de serviços e o consumidor.
Duração Limitada: Muitos serviços são temporários e têm uma duração definida. Por exemplo, uma consulta médica, uma viagem de táxi ou uma sessão de treinamento são serviços que têm um início e um fim determinados.
O CDC estabelece diversos direitos e garantias para os consumidores em transações envolvendo serviços, incluindo o direito à informação clara e precisa sobre os serviços oferecidos, o direito à segurança e à qualidade dos serviços prestados. Essas disposições visam proteger os consumidores e promover relações comerciais justas e equilibradas entre fornecedores e consumidores.
Agora você possui conhecimento suficiente para aplicar na prática os conceitos adquiridos sobre consumidor, fornecedor, produtos e serviços. Aplicar os conceitos de consumidor e fornecedor na prática envolve considerar as relações comerciais entre as partes envolvidas em transações de compra e venda de bens ou serviços. Podemos ver esses conceitos aplicados na prática em diversas situações, vejamos algumas:
Identificar as partes envolvidas: Ao iniciar qualquer transação comercial, é essencial identificar claramente quem são as partes envolvidas. O consumidor é aquele que está adquirindo um produto ou serviço para seu próprio uso final, enquanto o fornecedor é aquele que está oferecendo o produto ou serviço para ser adquirido.
Conhecer os direitos e responsabilidades: Tanto os consumidores quanto os fornecedores têm direitos e responsabilidades específicos de acordo com as leis de proteção do consumidor e outras regulamentações aplicáveis. É importante que ambas as partes estejam cientes desses direitos e responsabilidades para garantir transações justas e transparentes.
Garantir a qualidade e segurança dos produtos ou serviços: Os fornecedores têm a responsabilidade de garantir a qualidade e segurança dos produtos ou serviços que estão oferecendo aos consumidores. Isso inclui garantir que os produtos e serviços sejam seguros, livres de defeitos e erros e que atendam às expectativas razoáveis dos consumidores.
Promover o relacionamento de longo prazo: Tanto os consumidores quanto os fornecedores podem se beneficiar ao promover um relacionamento de longo prazo baseado na confiança, transparência e respeito mútuo. Isso pode levar a transações comerciais mais estáveis, satisfação do cliente e fidelidade à marca.
Ao aplicar esses conceitos na prática, as empresas podem construir relacionamentos sólidos com os consumidores, garantindo a satisfação do cliente e o sucesso a longo prazo do negócio. E agora está na hora de você colocar a mão na massa. Eu quero que você pesquise sobre a relação entre as pessoas que utilizam aplicativos de carona, se há ou não a relação de consumo. Após, troque os resultados de sua pesquisa com seus colegas e discutam sobre o assunto.
BENJAMIN, A. H. V.; MARQUES, C. L.; BESSA, L. R. Manual de direito do consumidor. Ed. 5ª. São Paulo: Thomson Reuters: Revistas dos Tribunais, 2013.
BRASIL, Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm. Acesso em: 19 mar. 2024.
FINKELSTEIN, M. E. R.; NETO, F. S. Manual de direito do consumidor. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.