Olá, estudante! Seja bem-vindo à terceira lição da disciplina de Noções de Direito.
Na lição anterior, aprendemos um pouco sobre o Ordenamento Jurídico brasileiro, entendendo como ele se estrutura e quais suas características e classificação das normas jurídicas. Nesta lição, passaremos a tratar do tema “Pessoas Naturais”. Sendo assim, entenderemos o conceito jurídico de pessoas naturais, considerando as situações jurídicas previstas na legislação e que conferem personalidade jurídica a todos, e veremos a importância de se ter personalidade jurídica no mundo do direito.
O profissional técnico em administração precisa entender sobre Pessoas Naturais, isso porque as organizações são compostas por indivíduos, e o sucesso de uma empresa está intrinsecamente ligado ao entendimento e gerenciamento eficaz das pessoas que as compõem! Sendo assim, vamos nos aprofundar nesse assunto?
A vida em sociedade exige uma postura de paz entre as pessoas, sendo assim, exige do Direito que preveja regras que estabeleçam o início e o fim da personalidade da pessoa e sua exigência de direitos e deveres. Compreender sobre esse assunto é muito importante para o profissional técnico em administração, uma vez que a habilidade de lidar com as questões legais é essencial na gestão eficiente de equipes e nas relações corporativas.
Diante desse contexto, nesta lição, estudaremos as previsões do ordenamento jurídico que estabelecem as regras que conferem direitos e impõem deveres às pessoas. Além disso, verificaremos quem é sujeito de direito e sua capacidade jurídica, compreendendo os temas pertinentes às pessoas naturais, seus elementos e todas as suas características.
Ao compreender esses aspectos, você, técnico em administração, estará mais bem preparado para enfrentar desafios legais, contribuindo para a construção de ambientes corporativos mais éticos e conformes com as normas legais vigentes. Vamos prosseguir nesta jornada de conhecimento?
No case da lição de hoje, trago a você a história de João, que morava em uma cidade no interior do Paraná. O jovem, apesar de ter apenas 16 anos, recebeu um bem de seu avô a título de herança, tratando-se de um carro. Contudo, como ainda era menor de idade, ele não era habilitado e não podia dirigir, portanto, sua ideia foi de vender o carro e investir em seus estudos. João, estava com tudo planejado, porém, ao colocar a placa de vende-se em seu carro, na mesma hora ele pensou: será que eu, menor de idade, posso vender esse carro?
Por um instante, parecia que os planos de João estavam indo por água abaixo, porque ele tinha certeza de que não seria possível a venda do carro. Mesmo desanimado, procurou ajuda para entender o que as leis diziam. A primeira alternativa que encontrou foi ir até uma loja que vendia carros usados e lá encontrou Roberto, um técnico em administração que atuava no local.
João explicou toda a situação para Roberto, que, apesar de não ser formado em direito, tinha algumas noções básicas sobre o assunto e foi capaz de orientá-lo. Roberto explicou que, com 16 anos, ou seja, menor de idade, segundo as legislações brasileiras, João não teria capacidade legal para vender um carro, mas existiam algumas possibilidades. A primeira possibilidade seria que João esperasse completar 18 anos, pois, com a maior idade, não haveria mais empecilhos para a venda do carro. Porém, caso precisasse do dinheiro antes disso, ele poderia optar por um representante legal (pais ou responsáveis) para agir em seu nome e realizar a venda, ou tentar uma emancipação. Além disso, Roberto também orientou a João que seria importante consultar as leis específicas e buscar orientação jurídica para garantir que as normas e a proteção dos direitos envolvidos fossem cumpridas.
João ficou tão satisfeito com as explicações de Roberto que, depois de passar por uma orientação jurídica, desistiu de vender o carro de forma particular e fechou negócio com a loja de carros usados, que, agora, ganharia uma comissão pela venda do automóvel! Sendo assim, mesmo esse case sendo fictício, podemos observar uma situação que ilustra como o conhecimento jurídico pode ser um aliado valioso do profissional técnico em administração! Nesse caso, o conhecimento do técnico foi fundamental para que a loja de carros conseguisse mais um veículo e, claro, lucro para a loja, que seria a comissão pela venda do carro.
Para o direito, o termo “pessoa” é tudo aquilo que possui direitos e deveres previstos no próprio ordenamento jurídico, ou seja, o termo possui uma significação mais ampla do que simplesmente a indicação de uma pessoa humana, pois seria analisado sobre dois aspectos: as pessoas naturais e as pessoas jurídicas.
As pessoas naturais são as pessoas de carne e osso, aquelas que se originaram de um processo de gestação intrauterina, ou seja, somos você e eu. Já a pessoa jurídica é uma figura imaginária, criada pelo direito, mas que possui as mesmas capacidades de ser sujeito de direito e obrigação de nós, pessoas naturais. Sendo assim, em nosso país, nós, pessoas naturais, temos um CPF (Cadastro de Pessoa Física) e as pessoas jurídicas possuem um CNPJ (Cadastro de Pessoas Jurídicas).
Apesar da existência da pessoa natural e da pessoa jurídica, nesta lição, nós nos preocuparemos em estudar somente as pessoas naturais e, na próxima lição, daremos seguimento em nossos estudos e compreenderemos sobre as pessoas jurídicas.
A personalidade jurídica nada mais é do que a possibilidade de uma pessoa ser sujeito de direito e obrigações. Nos termos do Art. 1º, do Código Civil, “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil” (BRASIL, 2002, on-line), ou seja, sendo juridicamente caracterizado como pessoa, o indivíduo terá direitos.
O mesmo Código Civil, também, estabelece, em seu Art. 2º, que “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida” (BRASIL, 2002, on-line). Isso quer dizer que a pessoa natural se torna capaz de ter direitos somente se nascer com vida, e o ordenamento jurídico pátrio concebe que nascer com vida está vinculado à ideia de o bebê respirar, então, se, ao nascer, o bebê respirou, nasceu com vida.
Sendo assim, se o bebê nasce e respira, nasceu com vida e é sujeito de direitos. É importante ressaltar que mesmo que o bebê venha a falecer em poucos segundos após o nascimento, ainda sim, ele se tornou, mesmo que por pouco tempo, sujeito de direito. Esse é o exato conceito da teoria natalista de aquisição da personalidade adotada pelo Código Civil Brasileiro! Por outro lado, o ser natimorto, ou seja, que já nasceu sem vida, pela teoria natalista não seria sujeito de direito, logo, não seria pessoa para o ordenamento jurídico, apesar de alguns direitos relativos à personalidade lhes serem garantidos.
Ainda existem outras duas teorias importantes: a Teoria da Personalidade Condicional, que envolve o nascituro (bebê no útero da mãe), que tem alguns direitos especiais, tal como o direito à vida; e a Teoria Concepcionista, relacionada à personalidade jurídica existente para a pessoa desde a concepção.
Uma grande questão é sobre os direitos do nascituro, ou seja, aquele que está apto ao nascimento. Isso porque, no direito brasileiro, nos termos da parte final do Art. 2º, do Código Civil, muito embora a personalidade inicie-se com o nascimento com vida, com a respiração, ficam resguardados os direitos do nascituro desde a concepção. Um exemplo notável desse direito assegurado ao nascituro está previsto no Art. 1.798, do CC, que estabelece: “Legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento da abertura da sucessão” (BRASIL, 2002, on-line).
É pacífico na doutrina que a personalidade da pessoa somente é adquirida com o nascer com vida, mas que o ordenamento garante certos direitos ao nascituro, tal como a inviolabilidade de sua existência intrauterina, o direito de nascer etc. Já ao natimorto, ou seja, aquele que nasceu, mas sem vida, não é conferido nenhum direito da personalidade, haja vista a teoria adotada, contudo o ordenamento lhe confere direitos mínimos, tal como respeito, direito ao funeral, enterro e similares (TARTUCE, 2021).
A capacidade é a forma como se mede a possibilidade de pleno exercício dos direitos conferidos pela personalidade, sendo que, em alguns casos, a legislação limita a capacidade, sem, contudo, retirar a personalidade. A capacidade é vista, pelo direito, sobre três aspectos:
Capacidade de direito: trata-se da capacidade de a pessoa poder ser sujeito de direitos e contrair obrigações.
Capacidade de fato: trata-se da aptidão que detém a pessoa de poder, pessoalmente, realizar os atos da vida civil, e é essa que é limitada pelo ordenamento.
Capacidade civil plena: ocorre quando a pessoa detém, ao mesmo tempo, a capacidade de direito e de fato para os atos da vida civil.
Via de consequência, se a pessoa não detém a aptidão para o exercício dos atos da vida civil, ela será considerada incapaz. Nos termos do Art. 3º, do CC, “são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos” (BRASIL, 2002, on-line).
Por outro lado, o Código Civil estabeleceu que, muito embora não sejam absolutamente incapazes, há alguns casos em que a capacidade é limitada, sendo os casos dos relativamente incapazes. Estes, conforme os termos do Art. 4º, do CC, serão os maiores de 16 e menores de 18 anos, os ébrios eventuais (refere-se às pessoas que, de forma ocasional ou eventual, estão em estado de embriaguez, devido ao consumo de álcool) e viciados em tóxico (refere-se aos indivíduos que são dependentes ou têm vício em substâncias tóxicas, como drogas, medicamentos etc.), aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade e, por fim, os pródigos (aqueles que gastam mais do que têm) — a última categoria de pessoas que são consideradas relativamente incapazes para exercer certos atos da vida civil (BRASIL, 2022).
A legislação estabelece que os absolutamente incapazes serão representados por alguém, isso significa que os atos da vida civil serão realizados em nome do incapaz, mas realizados por outra pessoa, o representante. Já os relativamente incapazes serão assistidos, ou seja, os atos da vida civil serão praticados pelo relativamente incapaz, que deverá ser acompanhado pelo assistente (BRASIL, 2022).
No caso das pessoas com alguma deficiência transitória ou permanente que lhes impeça de exprimir sua vontade, o Estatuto da Pessoa Com Deficiência estabeleceu, no Art. 6º, que a limitação pela deficiência não afeta a capacidade da pessoa, com destaque para a pessoa casar ou constituir união estável; exercer direitos sexuais e reprodutivos; exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar; conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória; exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas (BRASIL, 2015).
A emancipação é o ato jurídico que antecipa os efeitos da plena capacidade de fato, permitindo o alcance da capacidade plena da pessoa que possui certas limitações pelo ordenamento. A previsão da emancipação está no Parágrafo Único, do Art. 5º, do CC (BRASIL, 2002):
Art. 5º A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria (BRASIL, 2002, on-line).
Sendo assim, o ato de emancipação pode ser realizado de três modos, sendo eles: voluntária, judicial e legal. Na forma voluntária, os pais conferem a emancipação nos termos do inciso I, do Art. 5º. Na forma judicial, como o próprio nome diz, a justiça concede na hipótese da parte final do inciso I, do Art. 5º. Por fim, a forma legal ocorre nos casos abrangidos pelos incisos II ao V, do Art. 5º.
O Código Civil é direto ao afirmar que o fim da personalidade jurídica da pessoa natural ocorre com a morte. Conforme o Art. 6º, a morte é atualmente reconhecida para fins legais mediante atestado médico que certifique o óbito, geralmente, associado ao encerramento das atividades cerebrais da pessoa. Esse evento deve ser formalizado em uma certidão de óbito, conforme delineado no Art. 9º, inciso I, do CC (BRASIL, 2002). Contudo, algumas vezes, não é possível certificar a morte no caso de pessoas ausentes, como as pessoas que desapareceram. Nesses casos, a lei estabelece critérios para que a morte das pessoas desaparecidas seja considerada presumida, isso implica que, legalmente, a pessoa é tratada como se estivesse morta, mesmo que não haja evidências diretas ou certificado de óbito.
A presunção de morte somente pode ocorrer nas hipóteses previstas na lei, duas delas estão no Art. 7º do CC (BRASIL, 2002):
Art. 7 o Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência:
I - se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;
II - se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra (BRASIL, 2002, on-line).
Além dessas previsões, a Lei nº 9.140/1995, reconhece como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação ou acusação de participação em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, justamente o período conhecido como pré-golpe, regime militar e pós-golpe (BRASIL, 1995).
A identificação da morte, especialmente quando estivermos falando da morte presumida, é relevante, se considerarmos a necessidade de sucessão do patrimônio da morte, nos termos da legislação civil (GAGLIANO; PAMPLONA, 2020)
A comoriência é um fenômeno em que se identifica o evento morte de duas ou mais pessoas e não é possível se identificar a ordem cronológica das mortes, ou seja, quem faleceu primeiro, refletindo exatamente nos critérios de sucessão entre os envolvidos. Nos termos do Art. 8º, do CC, “se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos” (BRASIL, 2002, on-line).
Os direitos da personalidade são aqueles que conferem atribuições de proteção em um aspecto amplo às pessoas, tendo como base as premissas da dignidade da pessoa humana, previstas na Constituição da República de 1988 (GAGLIANO; PAMPLONA, 2020)
Nos termos do Art. 11, do CC, os direitos da personalidade possuem algumas características (BRASIL, 2022):
Os direitos absolutos são aqueles opostos a todos. O mais importante critério do direito brasileiro é que não há direito necessariamente absoluto em todas as situações, pois, no caso concreto, pode haver alguma situação que permita seu afastamento. Também, existem, por exemplo, os direitos relativizados, tais como os direitos que necessitam do Estado para sua efetivação, tais como saúde, educação etc.
São direitos que não podem ser alienados, porém os efeitos patrimoniais dos direitos da personalidade podem ser disponíveis, por exemplo, direito ao nome, nos termos do Art. 18, do CC, em que o nome de alguém não pode ser utilizado, salvo com a autorização (BRASIL, 2002).
Os direitos da personalidade são irrenunciáveis, mas os efeitos patrimoniais podem ser.
Os direitos da personalidade não prescrevem com seu desuso, ou seja, não é porque a pessoa não os utiliza que ela perde esse direito. Por sua vez, os efeitos patrimoniais poderão prescrever.
Os direitos da personalidade não integram o patrimônio da pessoa, porém podem ser explorados economicamente, tal como ocorre com o direito de imagem da pessoa.
Os direitos da personalidade nascem com a pessoa e morrem com ela, mas, em alguns casos, esses direitos poderão ser garantidos antes de nascer, tal como o direito à vida intrauterina para o nascituro, ou após a morte, como é o caso de respeito à honra dos mortos.
A fim de promover a fixação máxima do que aprendemos hoje, realizaremos uma atividade prática. O intuito é que você verifique o conteúdo, tente aplicar os conhecimentos aprendidos na lição de hoje e possa identificar o melhor caminho a ser trilhado no caso, buscando levar em consideração seu conhecimento para chegar a uma conclusão que atenda às expectativas.
Tente imaginar que você seja dono de um imóvel localizado na sua cidade, mas resolve vendê-lo. Pelo que estudamos você pode vendê-lo? Se puder, existe alguma necessidade que a lei obrigue para que esse ato tenha validade jurídica?
Chegamos ao fim de nossa atividade, estamos indo bem, você tem bastante trabalho e, agora, finalizaremos por aqui para nos encontrarmos na próxima atividade. Até breve!
BRASIL, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm. Acesso em: 7 fev. 2024.
BRASIL, Lei 13.146, 06 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm. Acesso em: 7 fev. 2024.
BRASIL. Lei 9.140 de 4 de dezembro de 1995. Reconhece como mortas pessoas desaparecidas em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979, e dá outras providências. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9140.htm#:~:text=L9140&text=LEI%20N%C2%BA%209.140%2C%20DE%2004%20DE%20DEZEMBRO%20DE%201995.&text=Reconhece%20como%20mortas%20pessoas%20desaparecidas,1979%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias. Acesso em: 7 fev. 2024.
TARTUCE, F. Manual de Direito Civil. 11. ed. Rio de Janeiro, Forense; Método, 2021.
GAGLIANO. P. S.; PAMPLONA, R. Manual de direito civil. 4. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020.