Não é suficiente apenas denunciar uma improbidade.
Em um ambiente criado e mantido para abafar denúncias, para não funcionar, para amedrontar, cada ação no sentido de corrigir um procedimento irregular é importante.
Abrir uma denúncia ou reclamação contra o MP diretamente a este mesmo MP é, obviamente, uma perda de tempo.
E qualquer ação deve se apegar à pesquisa. Em se tratando de organismos públicos de competência maior, a pesquisa deve começar pela Constituição, e daí vamos descendo pela hierarquia legislativa até ver o que encontramos.
Fazendo a leitura da Constituição, chegamos ao artigo 130-A.
Art. 130-A. O Conselho Nacional do Ministério Público compõe-se de quatorze membros nomeados ...
§ 2º Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo lhe:
...
II zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas;
III receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Ministério Público da União ou dos Estados, inclusive contra seus serviços auxiliares, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional da instituição, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;
...
§ 3º O Conselho escolherá, em votação secreta, um Corregedor nacional, dentre os membros do Ministério Público que o integram, vedada a recondução, competindo-lhe, além das atribuições que lhe forem conferidas pela lei, as seguintes:
I receber reclamações e denúncias, de qualquer interessado, relativas aos membros do Ministério Público e dos seus serviços auxiliares;
II exercer funções executivas do Conselho, de inspeção e correição geral;
...
§ 5º Leis da União e dos Estados criarão ouvidorias do Ministério Público, competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Ministério Público, inclusive contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional do Ministério Público.
Derivando do tal artigo 130-A, temos o Regimento Interno do órgão. Tal norma está disponível no site do CNMP, mais especificamente no link sobre a Resolução 92 de 2013, junto com as demais emendas que afetam a Resolução.
A Resolução, se não passar de mais uma embromação (não posso deixar de ser realista), possui as atribuições necessárias para abordar as deficiências denunciadas nesta página.
Fortuitamente, a Resolução possui um "considerando" (são aquelas justificativas que, às vezes, antecedem o corpo de um ato administrativo normativo) bastante animador.
"Considerando as lacunas, omissões e eventuais incorreções observadas no atual regimento interno"
O fato de que em determinado momento foi identificada a existência de "omissões", e que esse fato foi escancarado, é um bom começo.
Essa justificativa foi o primeiro fator para que eu considerasse apostar no andamento de uma denúncia contra procedimentos do MP.
As competências da Corregedoria também não deixam a desejar, mas foram dois outros artigos que determinaram minha ação. São eles:
Art. 67. A Corregedoria Nacional do Ministério Público poderá realizar correições para verificação do eficiente funcionamento dos serviços do Ministério Público, em todas as suas áreas de atividade, havendo ou não evidências de irregularidades, sem prejuízo da atuação das Corregedorias Gerais do Ministério Público.
Art. 69. A Corregedoria Nacional poderá realizar inspeções para apuração de fatos determinados relacionados com deficiências dos serviços do Ministério Público, bem como de seus serviços auxiliares.
Esses artigos são importantes porquê, embora o Regimento preveja instrumentos tais como reclamações e representações, se os casos apresentados fossem apreciados unicamente sob uma ótica restrita à relação processo-procuradores envolvidos, haveria o risco de que o objetivo de minha representação não fosse atingido.
Isso porque a atribuição do controle dos atos administrativos pelo CNMP poderia não ser "abraçada" se o Corregedor entendesse que esses casos dizem meramente respeito à inércia dos Procuradores. E esse não é o caso, pois entendo que os indícios apresentados até aqui nos conduzem na direção da conclusão de que os Procuradores foram vítimas de um procedimento omisso no que diz respeito à verificação das informações.
Dessa forma, em 14/07/2018 resolvi preencher algum formulário disponível na página do CNMP.
A primeira constatação foi uma verdadeira ducha de água fria. Uma decepção.
O formulário disponível para efetuar minha representação e sistema de mensagens é mantido pela Ouvidoria do CNMP.
Não gosto de ser rude, mas, pela minha experiência até aqui, Ouvidoria e nada são a mesma coisa.
Consultando o Regimento, a desanimadora constatação. A respeito das competências daquela Ouvidoria, o deprimente trecho no Artigo 34 inciso VII:
Parágrafo único. A Ouvidoria Nacional não processará demandas relacionadas às unidades do Ministério Público, de forma a preservar suas competências, as atribuições de suas Ouvidorias e do próprio Conselho.
Essa é uma velha fórmula adotada por diversas instituições, inclusive privadas. Primeiro, alardear, em letras garrafais: aqui, tudo o que chega por aquele telefone é apurado. E aí colocar um mudo em um lado da linha ditando as reclamações, e um surdo do outro lado, recebendo.
Na falta de outra opção, resolvi proceder da seguinte maneira: preencher o tal formulário da Ouvidoria, e, se nada acontecer, mandar uma cópia para o e-mail da Corregedoria.
Acessando o formulário da Ouvidoria, nova constatação: um formulário ruim, confuso, e que não inspira a menor confiança. Mas pelo menos emite um código para acompanhamento. Rendeu o documento a seguir.
No primeiro dia útil seguinte, outra constatação: o código para acompanhamento leva às informações cadastradas no site, mas aparenta ser um documento estático, nada interativo. Nenhum campo a ser preenchido pelo CNMP. Nem responsável pela apuração, nem pela distribuição, nem mesmo um campo para informar que alguém está vivo e em condições de ler a denúncia. De forma confusa, há outro campo abaixo, mas para uso do denunciante, com o título "Adicionar reposta". Seria para o denunciante responder à ele mesmo? Nenhuma instrução, nem prazos. Para variar.
Em 17/07/2018 recebi resposta da Ouvidoria. Até que não demorou, mas, como eu já esperava, nenhuma providência foi tomada (nem encaminhamento) por falta de competência para tal.
Mas pelo menos recebi algumas informações mais claras sobre como proceder a denúncia.
E aqui encerrou a participação da Ouvidoria, que não chegou a ser muito diferente de todas Ouvidorias que já conheci.
Uma divisão que, além de se restringir a repassar informações que não tem, serve também para esclarecer dúvidas provocadas pela falta de clareza das informações do próprio órgão.
Finalmente, o campo "Adicionar Resposta" desapareceu. Não tenho como replicar a informação que me foi passada. Pelo visto, se tem uma coisa que a Ouvidoria não preza, é pelo feedback.