Padre Bartolomeu e a Passarola

Nesta página do nosso Website, irás encontrar a simbologia e a presença do Padre Bartolomeu Gusmão e do seu engenho na obra.

O Padre Bartolomeu Gusmão representa em Memorial do Convento, um exemplo de superação, já que o sonho do padre pretende exceder os limites que lhe são impostos pela sua condição humana. Outra característica representativa do padre é que este sonho não é algo individualizado, esta sua descoberta vai permitir que o Homem, enquanto ser, voe, e não apenas o Padre Bartolomeu. É caso para dizer que a aventura de voar só se tornou possível graças à união de vontades de pessoas que queriam que a passarola voasse.

A passarola constitui um símbolo da concretização do sonho, representando também a libertação do espírito e a passagem a um novo estado de consciência, uma vez que esta é igualmente um símbolo da ligação entre o céu e a terra, pois ousa sair do domínio do Homem e entrar no domínio de Deus. Por outro lado, é um símbolo dual, pois é causa do nascimento da Trindade terrestre, mas também é o motivo da separação da mesma.

SEGMENTOS TEXTUAIS


  • Apesar de todos os assuntos que possam existir, há algo que guia toda a gente, os seus sonhos.

“Além da conversa das mulheres, são os sonhos que seguram o mundo na sua órbita. Mas são também os sonhos que lhe fazem uma coroa de luas, por isso o céu é o resplendor que há dentro da cabeça dos homens, se não é a cabeça dos homens o próprio e único céu.”


  • Neste romance, o sonho de Bartolomeu Gusmão de construir a passarola, partilhado por Blimunda e Baltasar tem o papel principal na obra e, por isso, estas três personagens estão juntas em busca do mesmo sonho.

“e, em tantas noites passadas, uma terá havido, pelo menos, em que sonharam o mesmo sonho, viram a máquina de voar batendo as asas,”

  • Bartolomeu de Gusmão foi padre e por sinal um grande inventor brasileiro. De entre todas as suas invenções e experiências proveio o primeiro balão a ser construído no mundo. Este foi apresentado ao Rei de Portugal da época, D. João V a fidalgos e outros membros da corte, exprimindo ser possível controlá-lo e ao mesmo tempo transportar pessoas e tudo o que fosse necessário. Ficou reconhecido como "O padre voador".

" tendes apelido de Voador, padre, por que foi que vos deram tal nome, (...) Porque eu voei (...)"

  • Bartolomeu Gusmão nasceu no dia 18 de dezembro de 1685, em Santos, São Paulo. O seu pai era o cirurgião-mor Francisco Lourenço Rodrigues e a sua mãe Maria Álvares. Teve doze irmãos sendo que 8 destes se dedicaram à vida religiosa. Com 15 anos mudou-se para Lisboa.

" no Brasil nasceu e novo veio pela primeira vez para Portugal, de tanto estudo e memória que, sendo moço de quinze anos, prometia, e muito fez do que prometeu, dizer de cor todo Virgílio, Horácio "

  • "Quando calha, vem o padre Bartolomeu Lourenço experimentar aqui os sermões que compôs (...) Aqui ensaiou o padre Bartolomeu Lourenço o sermão que foi pergar a Salvaterra de Magos, estando lá el-rei e a corte, aqui está provando agora o que pregará na festa dos desponsórios de S.José, que lhe encomendaram os dominicanos."

Padre Bartolomeu Gusmão ia à Quinta do Duque de Aveiro, onde construíam a passarola, praticar os seus sermões como forma de rascunho, tal como fez no sermão que foi pregar a Salvaterra de Magos.

  • “parece impróprio que tenha o padre Bartolomeu Lourenço tão grande fama de orador sacro, ao ponto de o terem comparado ao padre António Vieira”

Através dos sermões de Padre Bartolomeu Gusmão, este chegou a ser comparado ao padre António Vieira, considerado por muitos o maior orador sacro de Portugal.

  • “Acaba o padre Bartolomeu Lourenço de dizer o sermão, nem quer saber do seu religioso efeito, só pergunta alheado, Então, gostaram, e os outros depois respondem, Lá isso, gostámos, sim senhor, mas este é um falar dos dentes para fora, que o coração não dá mostras de ter entendido o que ouviu, e se o coração não entendeu, não chega a ser mentira o falar da boca, mas sim ausência.“

O narrador considera que os sermões do padre Bartolomeu Gusmão eram fracos e por isso as pessoas não percebiam muito do que ele queria exprimir através das suas palavras.

  • O padre Bartolomeu quando convidado pelo rei a assistir à aula de cravo da Infanta Maria Bárbara conheceu Domenico Scarlatti, em pouco tempo ganharam a confiança um do outro, o que levou o padre a levar Domenico à quinta para ver a passarola. Quando chegou lá Domenico deparou se com uma:

“…ave gigantesca, de asas abertas, cauda em leque, pescoço comprido, a cabeça em tosco…” ( descrição da passarola).


  • "Mais uma fileira deixa de receber a luz do sol, a queda é tão violenta que o estômago parece querer saltar-lhes pela boca, e agora sim, o vento colhe a máquina com uma mão poderosa e invisível e lança-a para a frente, com tal velocidade que de repente fica Lisboa para trás"

Neste excerto está descrito o momento de queda da passarola. Uma vez que a fusão de éter e âmbar só funcionava com o Sol, ao perdê-lo, a máquina perdia o seu motor, deixava de funcionar, e isso resultou na queda livre do engenho, que se despenhou num monte já afastado de Lisboa.


  • "O padre ria, dava gritos, deixara já a segurança do prumo e percorria o convés da máquina de um lado a outro para poder olhar a terra em todos os seus pontos cardeais, tão grande agora que estavam longe dela, enfim levantaram-se Baltasar e Blimunda, agarrando-se nervosamente aos prumos, depois à amurada, deslumbrados de luz e de vento, logo sem nenhum susto, Ah, e Baltasar gritou, Conseguimos"

O padre Bartolomeu estava em euforia, a correr de um lado para o outro para puder olhar para baixo de todos os ângulos possíveis. A seguir, Baltasar e Blimunda levantaram-se, ainda com medo e ficaram deslumbrados com o que viram, enquanto a sociedade admirava a passarola confundindo-a até com o espírito santo, uma imagem religiosa no céu. Depois de passar o medo, Baltasar deu um grito como forma de festejo por finalmente ver a máquina a voar.

  • "Padre Bartolomeu (…) dizer de cor todo Virgílio, Horácio, Ovídio, Quinto Cúrcio, Suetónio, Mecenas e Séneca (...) e também dizer quem foram os autores de todos os livros de versos, antigos e modernos, até ao ano de mil e duzentos"

Nesta citação podemos perceber a aptidão para estudar do padre, o que o leva a ser um homem extremamente culto e sábio.


  • “ Pelas artes da alquimia, em que não sou hábil, (…) Partirei breve para a Holanda, que é terra de muitos sábios, e lá aprenderei a arte de fazer descer o éter do espaço”

Aliada à expressão anterior, nesta é possível perceber a frequente busca por conhecimento feita pelo padre.


  • “Adeus Blimunda, adeus Baltasar, cuidem um do outro e da passarola, que eu voltarei um dia com o que vou buscar, não será ouro nem diamante, mas sim o ar que Deus respira”

Momento de despedida do padre que vai partir em busca do Éter. Pode-se perceber o carinho do padre por Baltasar, Blimunda e pela passarola.


  • “Dentro de nós existem vontade e alma, a alma retira-se com a morte, vai lá para onde asalmas esperam o julgamento, ninguém sabe, mas a vontade, ou se separou do homem estando ele vivo, ou a separa dele a morte, é ela o éter, é portanto a vontade dos homens que segura as estrelas, é a vontade dos homens que Deus respira, E eu que faço, perguntou Blimunda, mas adivinhava a resposta, Verás a vontade dentro das pessoas, Nunca a vi, tal como nunca vi a alma, Não vês a alma porque a alma não se pode ver, não vias a vontade porque não a procuravas, Como é a vontade, É uma nuvem fechada, Que é uma nuvem fechada, Reconhecê-la-ás quando a vires (...) Tirou do alforge um frasco de vidro que tinha presa ao fundo, dentro, uma pastilha de âmbar amarelo, Este âmbar, também chamado eletro, atrai o éter, andarás sempre com ele por onde andarem pessoas, em procissões, em autos de fé, aqui nas obras do convento, e quando vires que a nuvem vai sair de dentro delas, está sempre a suceder, aproximas o frasco aberto, e a vontade entrará nele”

Explicação do Padre Bartolomeu a Blimunda de como esta deve reconhecer e recolher as vontades que constituem o Éter, e o modo como este porá a passarola a voar.


  • “O padre Bartolomeu Lourenço entrou violentamente na abegoaria , vinha pálido, lívido, cor de cinza, como um ressuscitado que ja fosse apodrecendo, Temos de fugir, o Santo Oficio anda à minha procura, querem prender-me, onde estão os frascos. (…) O padre tremia todo, mal podia sustentar se de pé,”

Relato do Padre durante o momento em que era perseguido pela inquisição