12. Percepção, intuição, ação, reflexão

1. A percepção não é um mero registro mental do "mundo exterior", mas uma escolha valorativa de alguns aspectos do ambiente. O que é valioso no ambiente manifesta-se na forma de predisposições emocionais, sentimentais, sensoriais (agradáveis/desagradáveis) -- boa parte dessas predisposições foram selecionadas no passado biológico de nossa espécie.

  • ambiente (savana)
  • comida (açúcar, gordura, sal)
  • atração sexual (simetria, saúde, potencial reprodutivo feminino, potencial provedor masculino)
  • perigos (precipícios, cobras, aranhas, leões)
  • cooperação social (moralidade: empatia, justiça, lealdade, autoridade, pureza, liberdade; divisão social do trabalho; linguagem; religião)
  • narrativas (como resolver problemas; padrões adequados de ação; memória)


2. Essas predisposições (boa parte das quais é inconsciente) moldam a formação automática de pensamentos, crenças, modos de falar e padrões de ação.

  • atenção voltada para o que é valioso; habilidades especiais (dentro/fora; adiante/atrás), discriminação de sequências temporais
  • formação automática (não reflexiva) de pensamentos e crenças
  • linguagem adequada à cooperação social
  • padrões de ação adequados à cooperação (reciprocidade generosa)

Ver : https://vimeo.com/55035079



3. Atenção conjunta, intencionalidade compartilhada

  • Teoria da mente
  • perspectiva de primeira pessoa
  • distinção eu, tu, isto; objetivo/subjetivo


4. (J. Haidt; Kahneman) Primeiro formamos uma intuição (ou crença), e apenas depois refletimos

  • A reflexão consciente em geral não forma crenças novas, apenas corrige ou justifica as crenças que já temos, caso elas sejam desafiadas
  • Intuições: especialmente em situações que se repetem e das quais temos feedback sistemático a respeito do resultade de nossas ações


5. Ilusões perceptuais e viéses cognitivos

  • Percepção humana tem facilidade para ver mudanças apenas dentro de certos parâmetros (velocidade, cores, cheiros, tamanhos); fora desses parâmetros ou não percebemos nada ou tendemos a nos enganar
  • Viés: negativo, conformacional, confirmacional, supervalorização de opiniões pessoais (desvalorização de estatísticas ou análises impessoais)

6. (Lakoff) Em geral, pensamos por metáforas e frames, não por meio de regras lógicas

  • Maior parte do que ocorre em nossa mente é inconsciente.
  • Razão não funciona adequadamente na ausência de emoções.
  • Em geral, pensamos por metáforas, "frames" (molduras), protótipos, analogias e narrativas.
  • Frames: universidade (professores, estudantes, diploma, provas, salas de aula, bibliotecas, RUs, etc.; ações típicas: professor leciona para estudantes numa sala de aula; estudante vai à biblioteca retirar um livro ou ao RU para almoçar, etc.); hospital; família; governo; igreja; ônibus; estádio de futebol
  • Metáforas: mais é para cima; menos é para baixo; afeto é quente, desafeto é frio/seco; o futuro está à frente, o passado está atrás;


Amor é fogo que arde sem se ver; / É ferida que dói, e não se sente; / É um contentamento descontente; / É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer; / É um andar solitário entre a gente; / É nunca contentar-se de contente; / É um cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade; / É servir a quem vence, o vencedor; / É ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor / Nos corações humanos amizade, / Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

(L. Camões)



7. Termômetros têm crenças sobre a temperatura?

Submarinos sabem nadar?


8. Organismos biológicos: luta pela existência, energia e tempo limitados

Discriminação do que é relevante no ambiente para a sobrevivência e reprodução é selecionado.

Mecanismos automáticos de discriminação em bactérias, células, organismos complexos. (Em mamíferos: instintos, emoções, sentimentos, padrões perceptuais)

--> Termômetros não se importam com a temperatura, pessoas se importam.


9. Mentes: adaptadas para discriminar o que é relevante e orientar o comportamento em direção ao que mais importa (valores)

Percepção: a maior parte da informação disponível no ambiente é desconsiderada.

Molduras perceptuais: percebemos apenas uma pequena parcela do ambiente, a que se mostra saliente no ambiente para nós

Saliências ambientais não são constantes e variam conforme o contexto.

Autocorreção de molduras perceptuais

--> Processos inconscientes

10. Estrutura da relevância (fenomenologia)

i. Relevância para o mim agora: molduras perceptuais (cores, sabores, cheiros, sons etc.)

ii. Busca do que é relevante: sistema de identificação de informações preditivas do que é relevante por meio de padrões. (Informações sobre o ambiente são parciais, ambíguas, às vezes enganosas; por isso, padrões ambientais são selecionados e não informações particulares.) Atenção seletiva de padrões ambientais, pessoais e sociais. (Cultura)

iii. Consciência do futuro: o que é relevante para mim agora pode não ser no futuro para ou para o meu grupo. Há coisas mais importantes do qeu eu ou do que o grupo a que pertenço. (Transcendência, religião)


Padrões na música: https://www.youtube.com/watch?v=9xbj2qQpIaU

https://www.youtube.com/watch?v=4yCdk5yMnwc


11. (Vervaeke) Prazer, pertencimento, amor

Relevância imediata: eros

Relevância para o meu grupo: philia [Cf. Tao Te Ching 27]

Relevância transcendente: reverência [e seu correlato, a humildade] com relação ao que aparece como sagrado (agape) [Modelo: amor materno/paterno pelos filhos (cf. Harry Frankfurt, The importance of what we care about]

http://www.templobudista.org/


Paulo, I Coríntios 13

Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, sou como um bronze que soa ou um címbalo que retine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência, ainda que eu tenha tão grande fé que transporte montanhas, se não tiver amor, nada sou. Ainda que eu distribua todos os meus bens e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, de nada me aproveita. O amor é paciente, o amor é prestativo, não é invejoso, não é arrogante nem orgulhoso, nada faz de inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita nem guarda ressentimento. Não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais passará. As profecias terão o seu fim, o dom das línguas terminará e a ciência vai ser inútil. Pois o nosso conhecimento é imperfeito e também imperfeita é a nossa profecia. Mas, quando vier o que é perfeito, o que é imperfeito desaparecerá. Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança. Mas, quando me tornei homem, deixei o que era próprio de criança. Agora, vemos como num espelho, de maneira confusa; depois, veremos face a face. Agora, conheço de modo imperfeito; depois, conhecerei como sou conhecido. Agora permanecem estas três coisas: a fé, a esperança e o amor;mas a maior de todas é o amor.


Bach, Erbarme dich