3. Os fósseis

Quando partiu de Inglaterra, aos 22 anos, Darwin acreditava no relato bíblico do Génesis e que as espécies eram imutáveis. Ao percorrer a floresta brasileira, encheu-se de espanto com a enorme variedade de plantas e animais que vê pela primeira vez, de maravilha com a exuberância e abundância de seres vivos («a mente é um caos de prazer», afirma) mas também de devoção, pois encara ainda as espécies como elementos de um plano divino que se manteve inalterado desde o início da Criação. Mas, à medida que o HMS Beagle percorria o mundo, foi mudando de opinião. Na América do Sul, descobriu que nada era mais instável do que a crosta terrestre e encontrou fósseis gigantescos de animais extintos, mas parecidos com os animais vivos então existentes nesses sítios. Na costa do Uruguai e da Argentina, Darwin começou a vislumbrar um padrão: suspeita que se a extinção é um facto e quer ocorreu certamente em todo o planeta, tal como há uma ligação geográfica entre os fósseis e os animais actuais. Afirma que «Esta maravilhosa ligação, no mesmo continente, entre animais mortos e os vivos, lançará mais luz sobre o aparecimento dos seres biológicos do que qualquer outro grupo de factos». A teoria da evolução impunha-se.

a) Os fósseis

Geralmente, não é possível observar e medir directamente a formação de novos animais e plantas, pois este processo desenrola-se muito lentamente. Por esta razão, os cientistas têm de encontrar outras maneiras de recolher informação. Desde a época de Darwin, o método mais importante tem sido o estudo das rochas e dos fósseis.

Figura: Trilobites gigantes de Canelas (Arouca).

Os fósseis são vestígios materiais de organismos ou manifestações da sua actividade, que ficaram preservados no registo geológico. Os restos materiais são evidências de partes de um organismo (ossos, dentes, troncos, etc.) ou o organismo na sua totalidade, em casos raros.

Figura: Três tipos de fósseis - rasto de um animal que largou a pele; uma impressão deixada por um molusco bivalve; e um osso fossilizado de tartaruga. (Fonte:GNS Science National Paleontological Collection)

Quanto às manifestações da actividade desses organismos, poderemos encontrar vestígios orgânicos, como estruturas reprodutoras (ovos, sementes, esporos, pólen), excrementos (cuprólitos) e restos de construções orgânicas; ou rastos - icnofósseis ou icnitos - como pegadas ou impressões de outras partes do corpo (dentadas, por exemplo), pistas, galerias abertas em rochas, esqueletos ou troncos.

Figura: processo de fossilização.

Ver animação: http://fossil.uc.pt/pags/formac.dwt

No entanto, o registo fóssil constitui um guia valioso mas bastante incompleto sobre a vida dos animais e das plantas extintos: tal deve-se ao facto de que os organismos com partes duras (conchas, dentes, madeira e ossos) são mais propensos a que o processo de fossilização ocorra. Na verdade, para que um fóssil se forme, é necessário que ocorram transformações físicas e químicas ao longo de vastos períodos de tempo. Os fósseis resultam de vários processos geológicos: moldagem, permineralização, petrificação, recristalização, incarbonização, etc. As rochas sedimentares, isto é, compostas por sedimentos depositados nos cursos de água , são as melhores para que o processo ocorra.

Além dos fósseis, existem ainda espécimes conservados em âmbar ou congelados, bem como os “fósseis vivos” (animais primitivos) ainda existentes.

Figura: Insecto conservado em âmbar.

Figura: mamute congelado.

Actualmente, a Genética tem dado um valioso contributo científico, ao traçar linhagens com base no ADN das espécies. No caso dos mamu- tes congelados, coloca-se mesmo a hipótese de os "ressuscitar" através de clonagem.

b) O registo fóssil como

prova da evolução

A maioria dos fósseis é de épocas muito remotas, pelo que encontramos sobretudo orga- nismos já extintos.

Contudo, a maioria do registo fóssil mostra que esses organismos, apesar de diferentes, apresen- tavam aspectos semelhantes aos das formas de vida da actualidade. Os fósseis constituem assim uma prova da evolução das espécies, uma vez que mostram que houve mudanças biológicas mas que as diversas formas de vida são aparentadas.

Figura: Fóssil de Anomalocaris (e desenho da sua forma)

O Anomalocaris (camarão anómalo) é um género extinto de invertebrado marinho, que fazia parte da “fauna dos xistos de Burgess”, formação fóssil, do período Câmbrico (513 a 501 milhões de anos). Primeiramente classificado como um crustáceo, a descoberta de um fóssil completo permitiu constatar que é um enorme artrópode. Os Artrópodes são animais invertebradoscaracterizados por possuírem carapaças rígidas e apêndices articulados.

O Anomalocaris era um carnívoro e, na sua época, ocupava o topo da cadeia alimentar. Para apanhar as presas, nomeadamente trilobites, utilizava os dois apêndices articulados que possuía na parte anterior do corpo. Após capturada, a presa era levada até à boca, circular e formada por diversas placas afiadas de diferentes tamanhos. O seu tamanho variava entre os 45 e 60 cm, mas podiam atingir 1 a 2 metros.

Figura: Fósseis de diversos tipos de amonites.

Os amonóides ou amonites (Ammonoidea) constituem um grupo extinto de moluscos cefaló- podes surgido no período Devónico e que desa- pareceu na extinção K-T, no final do Cretácico, que também vitimou os dinossauros.

As amonites eram animais marinhos, que ocupavam o nicho ecológico das actuais lulas. Tinham dimensões muito variáveis, desde alguns centímetros a um metro de diâmetro. O animal vivia dentro de uma concha espiralada de natureza carbonatada, semelhante à dos Nautilus.

Figura: Fósseis de embriões de dinossáurio.

Jazidas com restos embrionários de dinossáurios preservados in ovo são extremamente raros. Mas são conhecidas algumas ocorrências, sendo a mais espectacular a jazida de Auca Mahuevo,Campaniano da Patagónia (Argentina), onde foi encontrado em elevado número de ovos com elementos esqueléticos de embriões.

Figura: Ninhos de ovos de Lourinhanosaurus.

Figura: Allosaurus europaeus (Museu da Lourinhã).

O dinossauro carnívoro Allosaurus fragilis do Jurássico Superior (cerca de 150 milhões de anos) é um dos mais conhecidos na América do Norte. Conhecem-se actualmente dezenas de espécimes, alguns dos quais atingem cerca de 12 metros de comprimento.Sobretudo conhecido na Formação de Morrison, nos Estados Unidos, descobriram uns ossos na Tanzânia e em Portugal em meados e finais do século XX, respectivamente.

Contudo, um achado na Praia de Vale Frades, perto da Lourinhã, veio melhorar o conhecimento sobre este dinossauro pois compreende parte do crânio e vértebras cervicais que apresentam diferenças relativas ao Allosaurus fragilis, nomeadamente no tamanho e forma do osso jugal do crânio. Assim podemos compreender que não se trata de Allosaurus fragilis, mas de uma espécie parecida, mas distinta, à qual foi dado o nome Allosaurus europaeus (Museu da Lourinhã, ML415).

O Allosaurus é um dos géneros de dinossauros que exista concomitantemente na América do Norte e na área que hoje é Portugal. Apesar do Atlântico Norte já existir durante o Jurássico Superior, os dinossáurios ainda o podiam transpor.

Figura: Dinossáurios de Portugal no Jurássico.

(Fonte:http://lusodinos.blogspot.com/)

c) O problema dos

"elos intermédios"

Charles Darwin sugeriu, na obra "A Origem das Espécies" (de 1859), que deveriam existir espécies de transição, elos intermédios perdidos que seriam os ancestrais comuns a diferentes espécies - incluindo algumas entre os seres humanos e o resto dos animais. Contudo, no seu tempo, os registos fósseis encontrados continham ainda enormes hiatos.

Contudo, dois anos após a sua publicação, em 1861, foi descoberto o famoso fóssil "Archaeopteryx", um elo entre os dinossauros e os pássaros.

Durante 150 anos, os paleontólogos têm procurado "elos intermédios" (conceito que, por si só, já gera alguns equívocos) e têm vindo a realizar importantes descobertas de fósseis que esclarecem o percurso evolutivo.

Figura: Thrinoxodon, um elo dos mamíferos.

A National Geographic publicou, em 2009, fotos de "Os 7 maiores elos perdidos desde Darwin", onde destacou os seguintes:o Archaepteryx;o Tiktaalik; o Amphistium; o Ambulocetus; o Hyracoterium/ Eohippus; o Homo Ergaster; e o Thrinaxodon.

Descubra-os em:

http://news.nationalgeographic.com/news/2009/02/photogalleries/darwin-birthday-evolution/#tiktaalik-missing-link_7792_600x450.jpg

Figura: "Archaeopteryx lithographica", o primeiro fóssil de uma espécie ave do período Jurássico tardio, encontrada em 1891 perto de Solnhofen (Alemanha).

O Archaeopteryx tinha aproximadamente o tamanho de um corvo, com asas pequenas mas largas e uma longa cauda. A plumagem era similar às das aves actuais, mas possuía maxilares com dentes aguçados, três dedos que terminavam em garras e uma longa cauda - o que o aproxima dos dinossauros. Tais características fornecem fortes evidências da ancestralidade das aves a partir dos dinossauros e, genericamente, da validade da Teoria da Evolução.

Figura: Archaeopteryx como elo perdido entre o Ornitholestes (dinossáurio) e o pombo (aves).

(Fonte: National Geographic)

Figura: O Acanthostega, antepassado dos anfíbios.

(Fonte: National Geographic)

O Acanthostega é um tetrápode, um dos ancestrais a nível evolutivo dos animais terrestres dotados de esqueleto, que saíram da água para povoar os mares. Juntamente com o Tiktaalik, são um dos elos de transição perdidos que deram origem aos anfíbios.

Figura: Evolução dos mamíferos, com o Thrinadoxon como elo intermédio (proto-mamífero).

Figura: "Ida", Darwinius masillae, fóssil de um primata com 47 milhões de anos, encontrado na Alemanha.

Em 2009, foi anunciado a descoberta de "Ida", um fóssil de um primata completo e perfeitamente conser- vado, com características proto-antropóides, que viveu há 47 milhões de anos, revelou algo mais sobre o nosso ancestral comum no ramo que nos liga aos primatas.

Para saber mais, visite o site oficial: http://www.revealingthelink.com/