Estratégias Metacognitivas - Definição e Conceito

Pedro Henrique Maraglia

Extrato de: Estratégias de Ensino Metacognitivas: Uma Revisão

Sistemática de Literatura / – Rio de Janeiro: UFRJ / Núcleo de

Tecnologia Educacional para a Saúde, 2018, pg. 31-36

METACOGNIÇÃO E ESTRATÉGIA METACOGNITIVA

A inserção da metacognição em contextos educacionais já é uma realidade. Segundo Bransford (2007) a metacognição pode colaborar em processos de inquirição e outras ferramentas no ambiente de trabalho de alunos em situações de aprendizagem. Possibilita envolver estes alunos de forma mais ativa em sua aprendizagem, evidenciando situações críticas e permitindo progressos rumo à compreensão em relação ao que aprendemos e, a forma como aprendemos.

Assim, a utilização da metacognição surge como instrumento para a aprendizagem, na qual, é gradual o desenvolvimento da capacidade de o aluno identificar, controlar e desenvolver seus processos cognitivos, utilizando-os em futuras situações que envolvam a resolução de problemas. Desta maneira o desenvolvimento da metacognição possibilita a identificação, o monitoramento, a autorregulagem e de forma ativa, operação de habilidades mentais pelos próprios alunos (STEDILE ; FRIENDLANDER, 2003).

Considerada como tomada de consciência por parte do individuo de seus conhecimentos e modo de pensar, a metacognição se insere no contexto educacional como estratégia de aprendizagem:

[...] permitindo que os estudantes executem ações a partir da identificação de seus conhecimentos. Representa potencialidade para a aprendizagem, na medida em que promove nos estudantes um pensar sobre seus conhecimentos, oferecendo-lhes condições de controlar a execução de suas ações, como se um supervisor monitorasse seus pensamentos (Rosa 2014, p.16).

Pensada de forma simples, uma estratégia de aprendizagem é composta de ações planejadas para o favorecimento da própria aprendizagem. Porém ela pode ser pensada muito além disso. Segundo Boruchovitch (1999, p.2):

As estratégias de aprendizagem são técnicas ou métodos que os alunos usam para adquirir a informação (Dembo, 1994). Como aponta Nisbett, Schucksmith e Dansereau (1987, citados por Pozo, 1996), as estratégias de aprendizagem vêm sendo definidas como sequências de procedimentos ou atividades que se escolhem com o propósito de facilitar a aquisição, o armazenamento e/ou a utilização da informação. Em nível mais específico, as estratégias de aprendizagem podem ser consideradas como qualquer procedimento adotado para a realização de uma determinada tarefa (Silva; Sá, 1997).

Ainda para Silva e Sá (1997, p.19) as estratégias de aprendizagem são “[...] processos conscientes delineados pelos estudantes para atingirem objetivos de aprendizagem e, a um nível mais específico, como qualquer procedimento adotado para a realização de uma determinada tarefa”. Ressalte-se aqui a ênfase na consciência no desenvolvimento das estratégias de aprendizagem.

As estratégias de aprendizagem podem ser subdivididas em cognitiva e metacognitiva. Estratégias cognitivas compreendem comportamentos e pensamentos que diretamente influenciam o processo de aprendizagem, principalmente na forma como a informação será armazenada. Já as estratégias metacognitivas consistem em procedimentos individuais de planejamento, monitoramento e regulação (BORUCHOVITCH, 2001). Como ilustração disto, o resumo pode ser considerado uma estratégia cognitiva, pois, o aluno pode empregar esta estratégia para melhorar sua aquisição de informações relacionadas a algum conteúdo.

De forma mais específica, Dembo (apud BORUCHOVITCH, 1999, p.4) afirma que estratégias metacognitivas são procedimentos que a pessoa utiliza para planejar, monitorar e regular o seu próprio pensamento, ou seja, são ações planejadas de forma a potencializar a reflexão e introspecção do indivíduo, o levando a pensar o próprio processo de aprendizagem, permitindo elaborar estratégias diferenciadas conforme o grau de dificuldade. Por exemplo, quando um aluno, insatisfeito com a própria aprendizagem acessa o seu conhecimento sobre formas de estudar e baseado nisto decide ler previamente os conteúdos a serem trabalhados em uma determinada disciplina, fazendo anotações e elaborando perguntas a serem feitas durante a aula, ele está por meio de sua reflexão pensando no seu processo de aprendizagem buscando otimizá-lo. Importante aqui ressaltar, que o que define este conjunto de técnicas de estudo como metacognitivas, é que elas surgem apenas após um processo reflexivo do estudante, que desagua na sua adoção consciente e visando objetivo determinado.

Note-se que o mesmo Dembo (apud BORUCHOVITCH, 1999, p. 4), estabelece ainda, que estratégias metacognitivas são diferentes das estratégias cognitivas e estão relacionadas a comportamentos e pensamentos, que influenciam o processo de aprendizagem de maneira que a informação possa ser armazenada de forma mais eficiente. No entanto, Flavell (1979) e Flavell, Miller e Miller (1999) afirmam que é uma tarefa complexa separar o que são estratégias cognitivas de metacognitivas, dado que, de acordo como é pensada uma estratégia, ela pode assumir caráter cognitivo ou metacognitivo.

Por exemplo, como se ressaltou no parágrafo anterior; as técnicas de aprendizagem, ler previamente um assunto, fazer anotações e questionar o professor , não são elas próprias cognitivas ou metacognitivas. Naquele caso, foram entendidas como metacognitivas por conta do processo que as antecedeu. E este se caracterizou nas palavras de Dembo, como procedimentos utilizados para planejar, monitorar e regular o seu próprio pensamento.

Se, em contrapartida, as mesmas técnicas tivessem sido adotadas, sem adequada consideração relativa às suas características e adequação à metas desejadas, elas seriam consideradas como cognitivas. Cabe então notar que neste novo contexto, as técnicas justificaram-se por si mesmas, e ainda que conscientes, tiveram sua origem e destino no plano concreto da ação. Já no caso anterior em contraste, se por um lado o destino foi o mesmo, a fonte no entanto foi outra; o plano mais abstrato de modelos e conceitos ideais que permitiram a avaliação, planejamento e estabelecimento de metas. Ainda mais, devemos enfatizar que a diferenciação entre as estratégias cognitiva e metacognitiva se dá na intencionalidade do que se propõe. Portanto, a diferença não está tanto no que se faz, no ato em si, mas sim, no como, por que e para que se faz.

ESTRATÉGIA DE ENSINO E ESTRATÉGIA DE ENSINO METACOGNITIVA

Em contextos de ensino, pode-se observar ainda a existência de estratégias de ensino. Elas podem ser definidas como situações variadas, criadas pelo professor para facilitar aos alunos a interação com o conhecimento. Estas estratégias, portanto, são utilizadas pelo professor como meio de intervenção para potencializar o envolvimento dos alunos com a aprendizagem de acordo com os seus objetivos educacionais. Por exemplo, estas estratégias podem ter como meta: a observação, a liderança, a teorização e a síntese (MASETTO, 2003). Sobre este enfoque as estratégias de ensino são pensadas sob um viés cognitivo, e, portanto, podem ser consideradas estratégias de ensino cognitivas.

As estratégias de ensino empregadas pelo professor também devem encorajar o aluno a aprender, mantendo e aperfeiçoando sua competência como aprendiz. O professor pode, por exemplo, estimular o aluno a fazer escolhas, a trabalhar em grupo e, a responsabilizar-se por seu processo de aprendizagem, de maneira que se sinta capaz de realizar as tarefas propostas. Tais atitudes geram autonomia do aluno diante das experiências concretas na interação em grupo (MOREIRA, 2014).

Neste sentido, as estratégias de ensino têm como fonte principal o professor que as utiliza com o objetivo explícito de favorecer a aprendizagem do aluno. Já as estratégias de aprendizagem têm no aluno sua fonte e destino. São procedimentos diversos que o aluno escolhe fazer visando o seu próprio aprendizado. Cabe aqui ressaltar que o critério apresentado independe da técnica específica utilizada pela estratégia. Isto é importante enfatizar, pois, há circunstâncias em que uma mesma técnica pode ser classificada como estratégia de ensino ou de aprendizagem conforme o contexto onde é aplicada.

Portanto, as estratégias em si são versáteis, são um conjunto de procedimentos que podem ser utilizados em diferentes momentos do processo ensino-aprendizagem. Neste sentido podemos entendê-las como técnicas, modos de fazer algo. É apenas quando são adicionadas metas, objetivos, circunstâncias e contexto, que seu significado aflora na totalidade. Neste sentido, uma única técnica pode ser entendida como diferentes estratégias, a depender de como, onde, por que e para que são aplicadas. Ela pode ser considerada tanto de ensino, quanto de aprendizagem.

Um exemplo disso pode ser o relato reflexivo . Classifica-se como estratégia de ensino, quando utilizada pelo professor, visando desenvolver nos alunos a capacidade de produzir uma trama reflexiva sobre um conteúdo ou situação. Por outro lado, pode ser que um aluno conheça o relato reflexivo e perceba que ao fazê-lo os seus resultados melhoram, e ele se sente mais seguro em relação ao conteúdo. De posse deste conhecimento este aluno pode utilizá-lo em benefício de sua aprendizagem, e por isto, neste contexto o relato reflexivo constituir-se-á em uma estratégia de aprendizagem.

Mas não basta o raciocínio simples e maniqueísta de pensar apenas no binômio professor-aluno a discriminar entre estratégia de ensino ou de aprendizagem. Suponhamos que o mesmo professor que linhas acima utilizou o relato reflexivo com seus alunos, o faça para si mesmo como forma de melhorar o seu desempenho docente ou favorecer o aprendizado de novos conteúdos. Falaríamos então de uma estratégia de aprendizado que tem como fonte e destino o professor. Ainda mais, no mesmo exemplo, o mesmo professor com os mesmos alunos, utiliza o mesmo relato reflexivo como técnica de coleta de dados para apreender a maneira de pensar dos seus alunos, ajudando-o assim na escolha dos seus futuros procedimentos didáticos. Finalmente, se o professor ao vislumbrar o processo de pensamento dos seus alunos perceber que isso facilita a compreender e desenvolver o seu próprio pensar, falaríamos então de uma ferramenta introspectiva classificada como estratégia de desenvolvimento pessoal. Perceba-se então que a versatilidade citada no início do parágrafo, não o foi de forma leve e descompromissada. Ao contrário, decorreu de séria reflexão sobre o assunto.

Neste momento gostaria de abri um pequeno parênteses para um fato contemporâneo, pois, há que se considerar o que vivemos hoje, com a expansão do acesso a internet, principalmente facilitada pela utilização de smartphones com acesso a rede via dados móveis, o professor muitas vezes deixa de ser a fonte principal de informação. O aluno chega a sala de aula e deste contato com as informações advinhas da rede, possui algum conhecimento, o que gera uma readaptação a função do professor, que já não significa o contato primário, mas que deve auxiliar na utilização desta ferramenta para que os alunos possam fazer melhor proveito. E para isto é importante pensar estratégias

Como apontado anteriormente, as estratégias metacognitivas têm sido consideradas como estratégias de aprendizagem por autores como Boruchovitch (1999, 2001, 2007) e Rosa (2014), logo, abrangidas no campo de utilização do aluno visando melhorar seu processo de aprendizado. Mas de fato a utilização de estratégias metacognitivas estaria restrita a escolha do estudante? O professor, visando estimular a aprendizagem de seus alunos não poderia empregar estratégias metacognitivas em suas aulas? Para Ribeiro (2003) o professor tem toda a vantagem em estimular a metacognição, multiplicando as situações abertas de investigação e resoluções de problemas complexos, que por vezes levam o sujeito a escolher entre várias alternativas e a antecipar as consequências destas escolhas. Este gênero de atividade pode dar ao aluno, sobretudo se tem dificuldades, a oportunidade de conduzir de maneira refletida as suas próprias operações cognitivas.

Neste sentido, considerando a versatilidade no qual, estratégias podem ser tanto de ensino quanto de aprendizagem, dependendo é claro de sua perspectiva de utilização, bem como a possibilidade da metacognição ser estimulada pelo professor, podemos pensar então na existência de estratégias de ensino metacognitivas. Até o presente momento não encontramos na literatura uma descrição do que seriam estratégias de ensino metacognitivas, portanto, considerando isto, acreditamos ser razoável propor que estratégias de ensino metacognitivas sejam consideradas como, “Ações pedagógicas planejadas e empregadas pelo professor que, além trabalhar conteúdos, potencializem a autoconsciência de alunos em contextos de aprendizagem, propondo um discurso de segundo nível sobre a cognição, promovendo assim, a aprendizagem autorregulada”.

O que aqui se define e se discrimina como estratégia de ensino metacognitiva e cognitiva é em síntese o que se definiu e discriminou anteriormente como estratégia cognitiva e metacognitiva. Mantém-se, portanto presentes as noções de intencionalidade, planejamento, monitoração e regulação do próprio pensamento associadas à ação metacognitiva. Da mesma forma a diferença de planos, do pensamento abstrato para a ação concreta como característico à metacognição. É também similar falar, associados à estratégia cognitiva, de plano concreto da ação como fonte e destino, comportamentos e pensamentos que diretamente influenciam o processo de aprendizagem, principalmente na forma como a informação será armazenada.

O que se diferencia, no entanto aqui, é que é o professor a fonte de ambas, assim como o aluno o seu destino. Neste sentido ao se considerar a relação professor - aluno, o primeiro exerce a função de “ego ideal” para o segundo. É no exercício deste papel, que o professor induz, modula e estimula processos metacognitivos no aluno. E também em determinados momentos, ao revelar seus modos de pensar e gerenciar o conhecimento, tal qual o ego ideal, o professor estará explicitamente apresentando formas e modelos ideais de ações metacognitivas aos quais o aluno poderá incialmente imitar e em seguida desenvolver seus caminhos metacognitivos idiossincrásicos.

Pensar em estratégias de ensino metacognitivas e cognitivas é compreender a natural existência do binômio cognitivo e metacognitivo. Na existência de um, pode existir o outro, na condição da presença da intenção e regulação. E, em retorno ao já dito, podemos falar da possibilidade de coexistência simultânea das estratégias de ensino cognitivas e metacognitivas em presença de um professor que conheça e aplique os conteúdos e ferramentas metacognitivos em suas atividades profissionais.

Finalmente, é importante para o professor ter clareza na delimitação entre estratégia metacognitiva, de ensino metacognitiva e cognitiva, para que possa compreender melhor os processos metacognitivos durante a aprendizagem. No entanto, pensar estas estratégias como estanques e sem interrelacionamentos é um grande erro.

REFERÊNCIAS

BRANSFORD, J. D. et al. Como as pessoas aprendem. Editora Senac São Paulo, 2007.

BORUCHOVITCH, E. Estratégias de aprendizagem e desempenho escolar: considerações para a prática educacional. Psicologia Reflexão e Crítica, v.12, n.2, 1999.

BORUCHOVITCH, E. Algumas estratégias de compreensão em leitura de alunos do ensino fundamental. Psicologia Escolar e Educacional, v. 5, n. 1, p. 19–25, jun. 2001.

BORUCHOVITCH, E. Aprender a aprender: propostas de intervenção em estratégias de aprendizagem. In: ETD - Educação Temática Digital, n. 8, v.2, p. 156-167, 2007.

FLAVELL, J. H , MILLER, H. P. & MILLER, S. A. Desenvolvimento cognitivo. Porto Alegre: Artmed, 1999.

FLAVELL, J. H. Metacognition and cognition monitoring: a new area of cognitive-developmental inquiry. Americam Psychologist, Washington, D.C., v. 34, p. 906-911, 1979.

MASETTO, M. T. Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo: Summus, 2003.

MOREIRA, Ana Elisa da Costa. Relações entre as estratégias de ensino do professor, com as estratégias de aprendizagem e a motivação para aprender de alunos do ensino fundamental. 2014, 120 f. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade Estadual de Londrina, Paraná, 2014.

RIBEIRO, C. Metacognição: um apoio ao processo de aprendizagem. Psicol. Reflex. Crit., vol.16, no.1, p.109-116, 2003.

ROSA, C. T. W. DA. Metacognição no ensino de física. 1. ed. [s.l.] UPF Editora, 2014.

SILVA; SÁ. Saber estudar e estudar para saber. 2. ed. rev. e aum. Porto: [s.n.], 1997.

STEDILE, N. L. R.; FRIENDLANDER, M. R. Metacognição e ensino de enfermagem: uma combinação possível. Rev. Latino-Am. Enfermagem, v. 11, n. 6, 2003.