Olá, estudante! Na aula de hoje, apresentarei um tema de total importância quando se atua no desenvolvimento de software — pense em software de maneira geral, seja ele instalado no seu computador, seja ele um site ou sistema web, seja ele um aplicativo para dispositivo móvel, o que é o nosso caso —, e esse tema é a acessibilidade.
Segundo Grilo (2019), é um assunto que ainda precisa ser muito discutido nos contextos citados anteriormente, ainda mais atualmente, com o surgimento de novas formas de interação. Os aplicativos, assim como as tecnologias, precisam acompanhar o ritmo, as limitações e as necessidades de seus usuários, e você, como futuro(a) profissional da área, tem a responsabilidade de que seu software, seu aplicativo ou seu site sejam utilizáveis por qualquer pessoa.
Não pense que a acessibilidade é somente uma questão de inclusão, pois esse tema também faz parte de um aspecto da experiência do usuário. Na lição anterior (lição 15), quando você foi apresentado(a) às Heurísticas de Nielsen — mais precisamente, à flexibilidade e à eficiência de uso —, você começou a compreender como essa questão é importante.
Quando se fala de acessibilidade em sistemas digitais, você considera a inclusão e contextualização das necessidades de pessoas com deficiência e, por esse motivo, aprofunda especificidades dos sujeitos para lhes proporcionar experiências adequadas. Portanto, eu e você adentraremos nessa questão tão importante ao longo desta lição. Vamos lá?
Para compreender melhor essa questão da acessibilidade, pense em uma situação em que João estava com seus amigos, conversando no intervalo de aula, e, depois de falar sobre os assuntos do dia a dia e assuntos da sua galera, eles tiveram uma ideia muito inovadora e pensaram na criação de um aplicativo que, até o momento, ninguém havia visto nada igual. Eles se organizaram e começaram o projeto para colocar essa ideia no papel, para, posteriormente, estar nos celulares de todo mundo.
Quando começaram a discutir sobre o projeto, eles perceberam que todos os envolvidos no desenvolvimento de software desconheciam as questões de acessibilidade — infelizmente, algo considerado “normal” ainda nos dias de hoje. Buscando alternativas, recorreram a um colega da turma que é surdo para os auxiliar a encontrar formas de acessibilidade, pois havia uma determinada função do novo aplicativo em que o auge dela era a emissão de um sinal sonoro.
A partir desse fato fictício, fica óbvio que entender as necessidades de cada pessoa é necessário para a acessibilidade, não é mesmo? As necessidades das pessoas podem e, geralmente, são, diferentes, dessa forma, cabe a você e à sua equipe, no papel de desenvolvedores de software, trazer acesso para essas necessidades e, consequentemente, proporcionar uma tranquilidade durante o uso do aplicativo. Assim, justifica-se completamente uma lição inteira para que você conheça o que fazer nesses casos.
O case fictício apresentado poderia ser, e acredito que seja, bem real no dia a dia de uma pessoa com necessidades especiais, mais precisamente, de uma pessoa autista. Sim, o autismo, que é uma síndrome comportamental de causas múltiplas e que tem vários níveis, denominados alto funcionamento e baixo funcionamento, de acordo com estes, também, é considerado uma necessidade especial e requer nossa atenção no desenvolvimento de softwares em geral.
A situação de nosso case é bem corriqueira e fácil de acontecer, infelizmente. Considere que você criou um aplicativo e, logo na tela inicial, há uma série de dois parágrafos explicando algumas funções básicas do sistema. Como você o conhece, provavelmente, colocou e organizou os dois parágrafos com o alinhamento do texto justificado para que fique uniformemente distribuído na tela e visualmente mais bonito no que diz respeito à interface do usuário.
Contudo, se pensarmos na pessoa com autismo, será que o texto está acessível? Bom, talvez, você não saiba, mas, no ato da leitura, essa forma de texto embaralha a visão de algumas pessoas com autismo, ou seja, não é acessível! Isso se dá pelo fato de que a leitura de pessoas com autismo, geralmente, é feita em formato de F, ou seja, lendo as primeiras linhas completas e, depois, diminuindo de acordo com a continuidade do texto.
E qual é a solução, então, para tornar esses dois parágrafos acessíveis para uma pessoa com autismo? Alinhar os textos à esquerda e dividi-los em pequenos blocos pode ser melhor do que ter três ou quatro parágrafos menores.
A acessibilidade, vista como um aspecto da experiência do usuário na utilização de softwares, caracteriza-se por tornar flexível um produto digital, ou seja, tornar a utilização possível a todos os indivíduos. Com a usabilidade, consegue-se mensurar a qualidade de uso de um determinado produto digital.
Um assunto recorrente no quesito da acessibilidade em produtos digitais é a errônea impressão de que acessibilidade se resume apenas a alto contraste ou navegação de teclado em sites e sistemas. Entretanto, o que de fato deve acontecer é se atentar para cada uma das especificidades do indivíduo e proporcionar uma experiência que tenha abrangência sobre essa especificidade, pois acessibilidade não é somente colocar uma fonte maior e atributo ALT nas imagens (atributo da Tag Image em HTML).
Olhando pelo lado da acessibilidade, conseguimos ampliar o alcance e a flexibilidade da interface, considerando a inclusão e contextualização de pessoas com necessidades especiais, em que é necessário se aprofundar em especificidades dos sujeitos, a fim de lhes proporcionar experiências adequadas.
Vale citar, aqui, também a definição da W3C Brasil (2013, on-line) sobre acessibilidade:
Possibilidade e condição de alcance, percepção e entendimento para a utilização, em igualdade de oportunidades, com segurança e autonomia, do meio físico, do transporte, da informação e da comunicação, inclusive dos sistemas e tecnologias de informação e comunicação, bem como de outros serviços e instalações.
As implicações de deixar e/ou desenvolver um produto digital com acessibilidade atualmente — mais precisamente, um site e, ainda, um aplicativo para dispositivos móveis — não são somente questões de organização de interface do usuário e/ou funcionalidades básicas, pois, segundo Henry, Abou-Zahra e White (2010), para a web e, consequentemente, aplicativos, a acessibilidade significa que pessoas com deficiência podem perceber, entender, navegar e interagir com páginas web e ferramentas e que podem contribuir igualmente, sem barreiras.
Quando se fala em inclusão por meio de acessibilidade de pessoas com necessidades especiais em produtos digitais, você pode até pensar — ou, pelo menos, deveria — em números, ou seja, inclui quantas pessoas? O IBGE ([2023]), no censo de 2010, traz que 24% da população brasileira é PCD — que é a sigla para Pessoas com Deficiência —, o que, em números absolutos, há, mais ou menos, 13 anos, é, aproximadamente, 46 milhões de pessoas. Faz sentido para você dedicar seu tempo a pensar na questão da acessibilidade agora? Pense em quantas pessoas precisam de você e de outros desenvolvedores. Por isso, invista um tempo do desenvolvimento de seu aplicativo em torná-lo acessível!!!
Já que mencionei o termo PCD no parágrafo anterior, gostaria de compartilhar, também, outro termo utilizado e que é aceitável que é PNE, que significa Pessoa com Necessidades Especiais. Esses dois termos citados, PCD e PNE, englobam, mas não estão restritos, a, principalmente, autismo, surdez, dislexia, cegueira, baixa visão e deficiências físicas.
Já que apresentei algumas das mais conhecidas necessidades especiais, vale deixar para você um link de um artigo que tem como objetivo trazer as terminologias atuais para se falar sobre deficiência: https://pessoacomdeficiencia.curitiba.pr.gov.br/conteudo/terminologia/116.
Já trabalhamos, no case desta lição, sobre autismo, correto? Para que você tenha mais informações sobre o autismo, também gostaria de deixar, aqui, um vídeo que simula uma criança autista em uma simples visita ao shopping. Para acessar o vídeo, clique aqui. O intuito do vídeo é que você compreenda quantos estímulos sensoriais uma pessoa com autismo tem e pense em como é importante oferecer recursos para melhorar o uso dos aplicativos que você desenvolverá futuramente.
Pensando no caso do autismo, algumas ações são importantes para o desenvolvimento de um aplicativo acessível. Uma dessas ações é utilizar muitos ícones para ilustrar ao invés de textos, pois isso ajuda no entendimento. Outras ações importantes no desenvolvimento de uma interface de usuário para pessoas com autismo é não utilizar textos imperativos em botões e links que sugiram alguma espécie de ordem como “Clique aqui”, “Faça o download” etc. Você pode substituir esses textos por: “Conheça nossos planos”, “Saiba mais”, “Veja o texto completo”.
Gostaria de apresentar, também, alguns tópicos importantes que você deve saber para criar acessibilidade para pessoas com dislexia. Essas pessoas têm dificuldade de concentração, o que pode dificultar o ato de leitura.
Você sabe como uma pessoa com dislexia enxerga os textos? Saiba mais pelo link a seguir: http://geon.github.io/programming/2016/03/03/dsxyliea.
Uma forma de melhorar a leitura para pessoas com essa deficiência é a utilização de uma fonte mais adequada, como, por exemplo, a Open-Dyslexic, encontrada em: Open-Dyslexic | dafont.com.
Conhecendo a existência dessa fonte e levando em consideração o quão importante é a questão da acessibilidade, será que devemos utilizá-la sempre nos aplicativos? A resposta para essa pergunta é: não necessariamente! Você pode, simplesmente, deixá-la disponível nas configurações de acessibilidade de seu aplicativo para que, caso a pessoa possua dislexia, entre lá e configure. Da mesma forma, as pessoas com baixa visão que utilizarão o aplicativo podem entrar nas configurações e alterar o tamanho da fonte, deixando-a bem maior do que a maioria das pessoas. Na prática, além dessa fonte, se tivéssemos de fazer uma única ação para deixar o aplicativo mais acessível para uma pessoa com dislexia, assim como com autismo, essa ação seria não justificar os textos.
Com relação à baixa visão, um dos pontos para deixar nosso aplicativo acessível para essas pessoas é trabalhar de maneira elegante os contrastes de cores. Para isso, você pode utilizar o site Contrast Checker. Além de um bom contraste, outra ação importante é não bloquear o zoom da tela, seja nos navegadores, seja nos dispositivos móveis. E, por falar em contraste e cores, devemos levar em conta, nesse trabalho, as pessoas com daltonismo.
Você sabe o que é daltonismo? É a dificuldade de enxergar cores como o vermelho ou o verde, sendo que existem os casos mais graves, em que a pessoa não enxerga cores. Deixo, aqui, um artigo intitulado “Veja o mundo com os olhos de um daltônico” para que você tenha a experiência e compreenda o quanto isso pode impactar no design e na mensagem que você quer passar com o seu aplicativo. O link é este: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/10/08/cultura/1507468141_020732.html.
Como aplicar, então, os conceitos vistos ao longo desta lição sobre acessibilidade? Pois bem, de maneira objetiva, todo conteúdo nos leva a entender que pessoas com necessidades especiais precisam estar no nosso radar ao desenvolvermos as interfaces de usuário e, principalmente, quando trabalhamos com a experiência do usuário, afinal, elas também fazem parte do nosso escopo e têm, sim, seus direitos. Aliás, produtos digitais deveriam ter a acessibilidade como requisito, porém nem sempre isso ocorre nas organizações. A maioria das justificativas de não aplicarem esses conceitos é que não há os recursos e o tempo disponíveis para realização de testes e que o custo de desenvolvimento, para além daqueles realizados para pessoas sem deficiência, são muito altos.
Você não deve deixar que tais justificativas o(a) desanimem de trabalhar com os devidos ajustes para cada uma das deficiências apresentadas nesta lição. Assim como qualquer item do desenvolvimento ou requisito do aplicativo, você não precisa pensar e implementar todas as ações para todas as deficiências de uma só vez, mas pense: se, a cada entrega de versão que você for lançar, tiver um item representando algo a mais de acessibilidade, já é um passo a mais na completude dessa tão importante tarefa dentro do desenvolvimento de um aplicativo. Obviamente, se for um aplicativo exclusivo para o público com deficiência ou o módulo de um aplicativo já existente, é sua obrigação tratar o máximo de funcionalidades para as diversas especificidades desse público. Sempre haverá espaço para um alinhamento do que precisa estar na funcionalidade do ponto de vista do aplicativo e a funcionalidade de acessibilidade para essa parte do software.
GRILO, A. Experiência do Usuário em Interfaces Digitais. Natal: SEDIS-UFRN, 2019.
HENRY, S. L.; ABOU-ZAHRA, S.; WHITE, K. (ed.). Accessibility, Usability, and Inclusion. W3C, 2010. Disponível em: https://www.w3.org/WAI/fundamentals/accessibility-usability-inclusion/. Acesso em: 9 maio 2023.
IBGE. Pessoas com Deficiência. IBGE Educa Jovens, [2023]. Disponível em: https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/20551-pessoas-com-deficiencia.html. Acesso em: 9 maio 2023.
W3C. Cartilha de Acessibilidade na Web. [S.l.]: W3C Brasil, 2013. Disponível em: https://www.w3c.br/pub/Materiais/PublicacoesW3C/cartilha-w3cbr-acessibilidade-web-fasciculo-I.html. Acesso em: 9 maio 2023.