Data de postagem: 28/03/2012 14:09:21
Em Jesus o tempo chegou à sua plenitude, e é isto que queremos celebrar em comunidade: a proximidade do Reino que se manifesta nas ações de Jesus e em nosso compromisso com a transformação da sociedade.
A celebração da Ceia do Senhor (Eucaristia) é um espaço que Deus nos concede para a conversão. Não somos mais santos do que os outros pelo fato de nos reunirmos para celebrar. Fora de nossas igrejas pode haver gente que crê mais do que nós no Deus vivo e verdadeiro, e mais do que nós colabora com ele por meio do inconformismo profético.
O apóstolo Paulo nos ajuda a discernir o momento presente. Para quem crê em Jesus, o Reino é o valor absoluto e insubstituível, mesmo que não estejamos vivendo momentos de expectativa em torno do fim do mundo.
2. Evangelho (Mc 1,14-20): “O tempo já se cumpriu”
Nos domingos do Tempo Comum deste ano vamos refletir sobre o Evangelho de Marcos. Ele o escreveu com a preocupação de mostrar quem é Jesus aos que se preparavam para receber o Batismo. A cada passo essa obra revela quem é Jesus. Ao mesmo tempo vamos conhecendo o que significa ser cristão. (Os que derem atenção a esse aspecto terão, ao longo do ano, excelente oportunidade de promover uma catequese contínua e libertadora.)
Marcos situa rapidamente o contexto em que aparece o programa de Jesus, sintetizado pela primeira declaração do Mestre nesse evangelho. Temos uma vaga indicação de tempo (“Depois que João Batista foi preso”) e de lugar (“Jesus foi para a Galiléia”, v. 14). O mensageiro de Jesus foi preso. Marcos dirá mais adiante quais os motivos da prisão do Batista e as razões que o levaram à morte (cf. 6,17ss). Esse dado é importante. O mensageiro de Jesus mexeu com os interesses e privilégios dos poderosos. O que irá acontecer com Jesus? Aos poucos o evangelho mostrará que Jesus, “o forte” (1,7), não se deixa amedrontar pelos poderosos, vencendo os mecanismos que geram morte para o povo. A Galiléia é o lugar social onde Jesus inicia sua atividade. Essa região era sinônimo de marginalidade, lugar de gente sem valor e impura. É no meio dessa gente e a partir dela que Jesus anuncia seu programa de vida: “O tempo já se cumpriu e o Reino de Deus está próximo. Convertam-se e creiam no evangelho” (v. 15). Depois que ressuscitou, o Mestre convida os discípulos a descobri-lo vivo na Galiléia (cf. 16,7), sinal de que a prática de Jesus em nada difere da dos que o desejam seguir.
O programa de Jesus (v. 15) consta de três momentos. Em primeiro lugar, ele anuncia que “o tempo já se cumpriu”. A espera da libertação chegou ao fim. Deus está presente em Jesus, atuando seu projeto de liberdade e vida. O caminho de Deus e o caminho dos marginalizados são uma coisa só (cf., acima, o evangelho da festa do Batismo do Senhor). O desejo expresso em Is 63,19 (“Quem dera rasgasses o céu para descer!”) se cumpriu, pois com Jesus o céu se rasgou (cf. Mc 1,10) e o Deus invisível se tornou gente no meio dos empobrecidos. Fez-se pobre como eles.
Em segundo lugar, Jesus anuncia que “o Reino de Deus está próximo”. Deus tomou a decisão de reinar. Por que o Reino de Deus está próximo? Porque a realeza de Deus vai tomando corpo através dos atos libertadores que Jesus realiza ao longo do evangelho. Está sempre próximo também mediante a prática dos seus discípulos, aos quais confiou a continuação daquilo que anunciou e fez. O Reino é uma realidade dinâmica. Refazendo a prática de Jesus no tempo, as pessoas e as comunidades vão abrindo espaços para que o Reino se torne realidade.
Em terceiro lugar, Jesus diz: “Convertam-se e creiam no evangelho!” Conversão é sinônimo de adesão à prática de Jesus. A libertação esperada, o céu rasgado, de nada adiantariam se as pessoas que anseiam pela libertação continuassem amarradas aos esquemas que mantêm uma sociedade desigual e discriminadora. O Evangelho de Marcos é apenas o início da Boa Notícia da libertação trazida por Jesus (cf. 1,1). Ela se tornará realidade mediante o compromisso das pessoas e comunidades que dizem sim ao Mestre.
b. Como dizer sim à Boa Notícia de Jesus (vv. 16-20)
Os vv. 16-20 mostram o sim de algumas pessoas à Boa Notícia trazida por Jesus. A vocação de Simão e André, Tiago e João (bem como a de Levi em 2,13-14) é apenas um sinal do que acontece com todas as pessoas que, em qualquer tempo e lugar, sentem necessidade de mudança na sociedade. Marcos não se preocupou em detalhar a vocação de todos os discípulos (e nisso foi imitado pelos evangelistas que vieram depois dele). O que acontece com alguns deles serve de medida para os demais.
Jesus escolhe pessoas simples e as chama a partir da realidade do dia-a-dia. Simão e André, Tiago e João são trabalhadores que ganham a vida pescando. (Levi está sentado na coletoria de impostos, cf. 2,14.) Não importa se o que fazem é honesto ou desonesto. O apelo é igual para todos, e a resposta é imediata: “Eles deixaram imediatamente as redes e seguiram a Jesus… Eles deixaram seu pai Zebedeu na barca com os empregados e partiram, seguindo a Jesus… Levi se levantou e o seguiu” (1,18.20; 2,14).
O apelo feito a Simão e André vale para todos os discípulos: “Sigam-me, e eu farei de vocês pescadores de homens” (v. 17). A frase de Jesus recorda Jeremias 16,16 (“Enviarei numerosos pescadores para pescá-los”). Aí se fala do julgamento de Javé sobre a sociedade idólatra. A frase recorda também o chamado de Eliseu (cf. 1Rs 19,19-21). Ser “pescador de homens”, portanto, é ser profeta do Reino à semelhança de Jeremias e Eliseu. Não é possível seguir a Jesus sem um mínimo daquele espírito profético inconformado com a situação vivida pelo povo. Os que não se conformam e lutam para mudar as situações, provocam o julgamento de Deus na história. São essas as pessoas que Jesus procura e chama.