Já dizia Alberto Caeiro (heterónimo de Fernando Pessoa), em pleno século XX, “Quando a Primavera vier / As flores florirão da mesma maneira / E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada”. Este ano a Primavera não vai ser a mesma coisa. Esta crónica é o resultado de um mês em casa, em quarentena, zelando pela saúde da sociedade em geral, mesmo que isso não signifique o auge da sanidade mental. É também uma reflexão vinda de uma pessoa atenta e preocupada, contudo, com uma perspetiva positiva perante a situação. Guarde-se esta redação para os mais pequenos que, modestamente, encontram a beleza nas mais pequenas coisas. Eles também sentirão a diferença porque, mesmo que pareçam desatentos, percebem os adultos e também detêm sensibilidade. Simplesmente não o demonstram, faltam-lhes muitas vezes os mecanismos necessários. E é precisa uma capacidade emocional grande para que nos aceitem no seio das suas emoções.
-Mas, porquê esta ligação? -pergunta-se - Bem, para mim, desde pequena, a Primavera foi sempre a minha estação preferida do ano e é, talvez, a estação em que vemos mais detalhadamente a personalidade de cada pessoa. Sentem-se mais alegres e dispostas a ajudar o outro. Talvez também porque me lembro de sentir e perceber bem o ambiente em que vivia, fosse ele mais ou menos agradável. Para mim, a Primavera sempre foi, é e será: casa dos avós, vivência em família e muita cor. Será também a laranjeira do quintal, assim como a romanzeira da vizinha. Pés descalços, amigos, família e passeios de bicicleta. Primavera é fazer um perfume com as pétalas das flores do jardim. A Primavera traz o Sol depois de vastos meses sem a sua presença. A Primavera traz-nos as flores e com elas os pardais, as andorinhas, as borboletas, as abelhas e o pólen. A Primavera traz-nos cor, traz-nos vida. A Primavera é mudança. Ora, este ano, Da Minha Janela Vejo uma Primavera diferente.
A Primavera é símbolo de ânimo, habitualmente associada à renovação da vida. Sem sair de casa, jamais a sentiremos da mesma forma. Agora vejo uma Lisboa vazia e com pouca cor, em tanto diferente da que via Fernando Pessoa. Acredito reencontrar-me com ela. Mas será que num futuro próximo?
Eis a questão que coloco:
Quando voltas, Primavera?
Maria Beatriz Reis
Numa pequena casa cor de rosa localizada na comuna italiana Varena, o pequeno Matteo, de 7 anos, observa os avós, que dançam ao som de Gianni Morandi. A música vem do gira-discos que descansa sobre o velho aparador de madeira. A janela da sala de estar tem as duas portadas abertas, deixando entrar uma leve brisa fria que faz o tecido da camisa de dormir de Nonna dançar. No ar ainda se sente o cheiro do risotto que Nonno tinha feito para o jantar.
Matteo gostava de ir dançar com os avós, mas tem vergonha. Isto porque, tal como a da sua casa, muitas das janelas dos seus vizinhos estão abertas. Matteo vê o senhor Marchetti, dono do café onde vai com a Nonna aos sábados, dançar também com a sua companheira de longa data.
De cada janela aberta eflui uma música diferente. Disto resulta uma sinfonia confusa, mas alegre, que intriga Matteo. O rapazinho levanta-se do sofá e caminha até a varanda. Passa pelos avós e estes não o impedem. Sabem que ensinaram bem o neto a não se empoleirar na sacada.
Desta nova posição, Matteo consegue distinguir que música vem de cada casa. A sinfonia alegre é agora menos confusa. Ao olhar para baixo, vê a senhora Pellegrino, amiga de Nonna, também sentada na varanda, a chorar. Matteo pensa que ela se deve ter emocionado com a música, e pergunta-se onde estará o senhor Pellegrino.
- O que vês da janela, amore mio?
Matteo vira-se e depara-se com Nonna, que olha para ele, curiosa, e lembra-se da vez em que Nonno lhe ensinou que não devemos ser bisbilhoteiros.
- Nada. – responde ele, rapidamente.
- Sabes que eu sei sempre quando me mentes, não sabes?
O rapazinho encolhe-se de vergonha e sente as bochechas aquecer. Depois de alguns momentos de ponderação, Matteo decide ser honesto:
- Estava a ver a senhora Pellegrino a chorar.
Subitamente, a expressão de Nonna torna-se séria.
- Oh mio dolce... - suspira Nonna, e senta-se ao lado do neto – Tu és um menino inteligente. Eu sei que, no fundo, tens percebido que algo de mau se passa com o mundo.
Matteo relembra as imagens assustadoras que tem visto na televisão.
- As pessoas estão a esquecer-se de como se respira, não é?
- Pode-se dizer isso, sim. - responde Nonna - E estás a ver quando vamos à piscina da Zia e tu queres sempre ver quanto tempo aguentas debaixo de água sem respirar?
- Da última vez consegui quase um minuto! - relembra Matteo.
- Pois conseguiste, pois conseguiste... - Nonna suspira – E estás a ver aquela dor no peito que te faz voltar à superfície?
Matteo assente.
Nonna continua: - Então... o senhor Pellegrino esqueceu-se de como se respirava. E sentiu essa dor. Mas, infelizmente, não teve a força suficiente para voltar à superfície.
- Porquê? – questiona Matteo.
- Porque quanto mais velhinhos somos, menos força temos.
Matteo assimila o que a Nanna acaba de lhe dizer, e olha mais uma vez para o exterior, pensativo.
- Em que é que estás a pensar, amore mio?
Matteo não responde imediatamente. Em vez disso, observa os seus vizinhos que dançam.
- Não percebo porque é que estão todos a dançar. Eu danço quando estou feliz, não quando sei que os meus amigos se estão a esquecer como se respira.
Nonna sorri ternamente, aproxima-se mais do neto, e sussurra-lhe ao ouvido:
- Perché grande quanto la tristezza del mondo è, non possiamo mai smettere di ballare.
Matteo pensa no que a avó lhe acaba de dizer, e vê-a levantar-se e voltar para dentro de casa. O rapazinho faz o mesmo e volta a sentar-se no sofá. Nonno e Nonna retomam a sua dança.
Agora, ao olhar novamente para os seus avós a dançar, o pequeno Matteo repara em algo em que não tinha reparado antes. Matteo observa o tremer da enrugada mão esquerda de Nonno, posicionada nas costas de Nonna. Observa também a força com que as mãos dos dois se unem e levitam ao nível das suas cabeças.
Subitamente, a vergonha que sentia antes desaparece, Matteo levanta-se do sofá e junta-se aos avós.
Guilherme Alves
Ainda há pouco tempo, da minha janela, eu via as pessoas na rua a viverem a sua vida normalmente. Via lojas cheias de clientes, via gente a ir trabalhar, a levantar dinheiro e a passear-se pelo supermercado, sem medo. Via crianças a brincar no parque com os pais, que se sentavam, a olhá-las, da esplanada de um qualquer café; e via idosos, despreocupados, a jogar xadrez nos bancos de jardim. A vida passava-se descontraidamente, com um certo ruído na rua que, embora fosse poluidor, enchia a cidade de alegria e diversão.
Hoje, da minha janela, eu vejo uma comunidade mais unida, a tentar dar ânimo a estes dias marcados pela distância social e a amenizar a solidão e o tédio que o isolamento provoca. Vejo também muita gente a desrespeitar os conselhos dados pelo Estado, usando como pretexto para sair de casa inúmeros motivos irracionais, como a corrida, que agora todos parecem ter começado a praticar. Vejo-me a ter de usar máscaras e luvas para ir ao supermercado e vejo uma crescente depressão na vida das pessoas que estão limitadas a viver em suas casa. Vejo, no entanto, um agradecimento geral, dirigido a todos os funcionários públicos, que estão envolvidos no combate à pandemia.
No futuro, eu espero vir a ver, da minha janela, uma sociedade rejuvenescida, uma cidade que se enche, por fim, de vida, de pessoas despreocupadas, de jardins floridos e de esplanadas povoadas de gente. Espero que tudo se resolva e que volte ao normal.
Vasco Cruz
De: Gonçalo
Para: António
Olá amigo, espero que a tua quarentena esteja a ir bem, melhor que a minha, assim o desejo.
Estou a escrever-te uma carta porque já tentei de tudo e não me consigo entreter com nada, por isso tive a ideia de te escrever uma carta sobre o que eu vejo da minha janela, todos os dias.
Bem, tudo começa mais ou menos às 10 horas, quando acordo e abro a persiana, e vejo um espantoso vazio na rua; não se ouve nada nem se vê ninguém. Parece um filme da história do fim do mundo.
Mas quando vejo alguém a passar fico com o sentimento de esperança e penso que isto tudo vai terminar e vamos poder finalmente estar com os nossos amigos e aproveitar a vida.
É um bocado triste ver as ruas vazias enquanto podíamos estar a viver a vida. Já que só temos uma, mais vale vivê-la a sério. Mas esta quarentena não está a facilitar lá muito.
Apesar de não se ver ninguém na rua, sei que a vida não parou e as pessoas estão a fazer todo o tipo de coisas, quer seja trabalhar em casa ou simplesmente ver um filme ou a fazer coisas que gostam.
Por outro lado, há outras pessoas que heroicamente continuam a ir para os seus postos de trabalhos e arriscam a sua vida, como os bombeiros, os médicos, os farmacêuticos, os funcionários dos supermercados e outros mais.
Por volta da hora de almoço há mais movimento, ainda que longe do normal pois as pessoas vão as compras, alguns aproveitam o tempo para correr ou vão passear os seus animais de estimação.
Passa a tarde e não se vê ninguém na rua, voltando a haver algum movimento quando regressam pessoas do trabalho, nas suas viaturas, mas normalmente são muito poucas.
Entretanto cai a noite e não se vê movimento, apenas as árvores a abanarem e as folhas a caírem por causa do vento.
Depois cama e sonhar que o dia de amanhã nos traga melhores notícias sobre isto tudo.
Desculpa os meus desabafos e fico a aguardar ansiosamente o momento em que possamos voltar a jogar futebol juntos.
Gonçalo Abreu
Da minha janela vê-se…
Das minhas janelas vejo dois mundos diferentes: o mundo do lado direito transmite-me um misto de sensações, já o do lado esquerdo transparece-me um conjunto de desejos, o que dentro de mim cria uma panóplia de emoções que me coloca a pensar no mundo exterior.
A minha janela direita está repleta de campos verdes, uma paisagem calma e serena, com vários animais a passearem de um lado para o outro, sem se aperceberem do que está a acontecer no mundo dos humanos. Estes animais voam, correm e descansam a apanhar sol, são seres livres. De um dia para o outro, a natureza com a sua força inóspita, dá uma lição aos seres humanos: só precisamos do essencial para viver.
Ao observar tudo o que me rodeia, apercebo-me de que também sou livre como eles… posso ir respirar o ar puro que está do outro lado da janela mas tudo isto mexe comigo: sair de casa sem colocar os outros em risco; sinto-me como se fosse um suricata, que só sai da toca em segurança. É em momentos como estes que dou valor ao convívio com os outros, à partilha de experiências, porque no fundo nós não seríamos ninguém se não tivéssemos alguém ao nosso lado.
Na minha outra janela, a do lado esquerdo, vejo a nossa cidade, Lisboa. Está deserta, são poucas as pessoas que passam de carro para irem trabalhar. Cada um está em sua casa, por vezes já não se sabe o que fazer, até as árvores da rua estão melancólicas.
Sinto falta dos meus amigos, quero ir para a rua, caminhar pelas avenidas e comer um gelado à beira-mar. Apesar de podermos estar em contacto permanente, não é a mesma coisa, faltam as expressões faciais, o contacto físico.
Quando vou à janela do lado esquerdo, vejo as escadas do prédio e fico a pensar. Existem dois caminhos possíveis: se subirmos as escadas podemos alcançar uma sociedade mais equilibrada, mas se as descermos iremos perder tudo aquilo que criamos, a nossa sociedade ficará muita mais individualizada, cada um vai pensar em si, em vez de pensar naquele que está ao seu lado.
Quando voltar tudo ao normal, espero ir à janela e ao olhar lá para fora, ver o melhor das minhas duas visões, observar uma sociedade que consegue distinguir o importante do supérfluo, consegue aproveitar todas as oportunidades ao máximo, porque a qualquer momento tudo pode desabar aos nossos pés…
Salvador Pais Gonçalves
Da minha janela vejo muitas coisas. Vejo inclusive o que os olhos não veem e o que a imaginação me permite ver.
Através da minha janela vejo pessoas do outro lado das suas. Vejo pessoas a passar o seu tempo. Todas as vezes que vou à janela para apreciar a vida fora das paredes da minha casa, vejo sempre uma rapariga colada ao computador, sempre. É jovem, bonita, de cabelos loiros e compridos. Provavelmente deve estar a fazer os trabalhos da faculdade; ou talvez é mesmo só viciada no computador. Não lhe consigo ver bem a cara, mas a sua expressão corporal nunca muda. Sentada na sua cadeira com rodas, inclinada para a frente com as costas ligeiramente tortas. Aparenta ter uma postura melancólica, aborrecida. Está à janela também; deve ter saudades do mundo lá fora. Tem as persianas meio abertas, ou meio fechadas, o sol bate-lhe de frente e às vezes vira-se para beber o café que deixa no parapeito.
Mas porque é que ultimamente tenho olhado tanto para as janelas? Não o costumava fazer com tanta frequência. Quando tenho a possibilidade de estar na rua só me apetece estar em casa. Deitar-me na cama, sossegada; ver um filme, comer umas bolachas e estar na minha própria companhia. Agora que não posso ir lá fora, parece que isso é tudo demasiado aborrecido! Acho que a única maneira de estar, de alguma forma, em contacto com o mundo exterior, para além das fotos que vejo nas redes sociais, é olhando para a janela. Vejo o sol, distraio-me da vida entediante que tenho cá dentro.
Nas traseiras da minha casa vejo os terraços dos meus vizinhos. Quem me dera ter um, fazia tudo lá! No outro dia tomei o pequeno almoço junto à janela a imaginar-me num daqueles terraços, a comer um iogurte num dia soalheiro. Ia para lá estudar provavelmente. Ia para lá treinar e brincar como uma criança nos tempos livres, que é exatamente a situação do momento. Embora tenham uma oportunidade magnífica de ver o sol fora de casa e fazer mil e uma coisas que eu imagino através da minha janela, a única coisa que eu vejo é o desperdício, a falta de uso daqueles pavimentos que nos dão um pequeno acesso ao mundo real e que nos permitem ficar um pouco menos enlouquecidos por estarmos fechados dentro das nossas próprias habitações.
Ao pé do meu prédio há um supermercado que observo através da janela. Vejo as pessoas a deslocarem-se até lá. Se virem alguém no mesmo passeio deslocam-se até ao outro. Caras sempre fechadas, não partilham sorrisos. Fazem o que têm a fazer com a maior rapidez possível e evitam tocar em tudo. As pessoas estão tristes, preocupadas. Quero dizer, a maior parte das pessoas. Desta janela não vejo só o supermercado, vejo a rua inteira e, infelizmente, vejo algumas almas mais despreocupadas que passeiam pelas ruas como se se tratasse de um dia completamente normal em que as lojas e os cafés estão abertos ao público.
Da minha janela vejo tristeza, solidão, desejo e vontade de voltar tudo ao normal. O reflexo dela sente o mesmo.
Rafaela Lopes
Quarta-feira, 15 de abril de 2020
Mais um dia em que acordo com o pensamento lá fora, imagino onde e como é que eu estaria neste momento, como estaríamos todos se este vírus nefando não tivesse aparecido. Teria eu conseguido tudo aquilo a que me prometi aquando da minha ida para Lisboa?
Muitas dúvidas pairam na minha cabeça… Porém, perante esta situação pela qual todos estamos a passar, somente tenho uma certeza. Apenas sei que tenho de me proteger e elucidar os meus, para que também eles se protejam . Pois, nesta altura das nossas vidas todo o cuidado é pouco e o mais importante é cuidar da nossa saúde, visto que temos de ter todas as forças do mundo para enfrentar o que nos espera após esta nefasta pandemia…
Mas bem, já está na hora de me levantar… Levanto-me lentamente, ainda sonolento e com muita preguiça à mistura, dirijo-me à janela e levanto os estores… Começo a olhar para a rua e deparo-me mais uma vez com a triste realidade de se ter tornado tudo num enorme vazio e sem alegria nenhuma… Hoje, o café da frente que a esta hora estaria cheio de pessoas a conversarem entre si, a trocarem gargalhadas, a tomarem o seu pequeno-almoço, a discutirem os mais variados assuntos, encontra-se fechado e completamente dominado pelo silêncio, transparecendo a enorme tristeza em que se tornou esta rua que, em tempos, tão alegre era…
O bom desta quarentena tem sido o tempo e os bons momentos que tenho passado em família, que, por vezes, no dia a dia não temos muito tempo para os ter…
Estou a olhar quase há quinze, vinte minutos e nem uma pessoa passa … começo, então, a divagar no meu subconsciente e dou por mim a pensar na incerteza do nosso futuro… Milhares e milhares de pessoas que trabalham arduamente para assegurar o seu futuro e do nada tudo fica em risco?
Toda esta situação faz-me questionar o propósito da vida. O que realmente importa nesta nossa curta passagem pela terra? Tenho refletido imenso sobre estas questões e muitas outras que a pouco e pouco me vão surgindo…
Fecho os olhos e encho-me de esperança e vejo, então, num futuro próximo, tudo a voltar à normalidade… Ponho um sorriso na cara e enfrento mais um dia fechado em casa com a esperança que tudo se irá resolver e que nos tornaremos melhores seres humanos , com mais compreensão e amor pelo próximo!
Fabião
Memórias da quarentena.
5:50- Já se ouvem os pássaros indicando o início de um novo dia, ou seja o final de uma noite mal dormida.
Os dias agora são sempre iguais e, como resultado disso, a minha rotina também. Levanto-me às seis da manhã para ir tomar o pequeno almoço com a minha mãe. Depois saio de casa para ir passear o meu cão e consigo escutar os pássaros, após uma noite no silêncio. Assim que chego a casa (após lavar as mãos) vou dormir.
13:30, é a terceira vez que o meu pai me diz para me levantar e ir almoçar; finalmente tenho energia suficiente para me levantar. A primeira coisa que faço é utilizar o meu telefone e responder às mensagens que fui recebendo enquanto estava a dormir. Meto música nos fones e vou pela segunda vez à cozinha para ir buscar o meu almoço.
Assim que tenho o almoço, volto para o quarto e ligo o computador, onde fico o resto da tarde.
19:00 , a minha mãe chega a casa, é aqui que a minha rotina muda, dependendo do dia: ou vou às compras com ela, ou fico simplesmente em casa.
Hoje foi um dia em que fui às compras com ela, por isso vesti-me, arranjei o cabelo e meti uma máscara no bolso e lá fomos nós.
Enquanto estamos a caminho do Oeiras Parque (centro comercial) costumo ver um número elevado de pessoas na rua e hoje não foi exceção.
No Continente fizemos as compras o mais rápido possível e voltamos para casa, para fazer o jantar.
De madrugada.
Ontem, depois de jantar, fui-me deitar por volta das onze da noite; esperava adormecer instantaneamente, claramente não foi assim, hoje vai ser mais uma noite como as outras, nada mudou como sempre.
5:50 - Já consigo ouvir os pássaros, está na altura de fazer tudo outra vez.
Raquel Jesus
Olá Diana,
Como estás? Espero que esteja tudo bem contigo e com os teus familiares. Como está a situação no [1] teu país em relação ao Covid- -19?
Por aqui está tudo bem connosco, apesar da situação do país se ter agravado desde a última vez que falei contigo e encontrarmo- [2] nos todos em quarentena obrigatória. Queria desabafar precisamente sobre isso contigo. Ontem fui às compras para comprar o que necessitava para casa e encontrei a Marta, que já não via há bastante tempo. Ficámos sempre a uma distância segura e [3] senti falta do nosso abraço [4] que costumávamos dar quando nos encontrávamos. A partir daí, vi o quão importante é o contacto humano e a necessidade que temos de utilizá-lo[5] para exprimir algumas emoções.
Olho pela minha janela e não há [6] movimentação nenhuma, o que torna tudo sem vida; as [7] pessoas isolam-se em casa com um medo terrível de um inimigo invisível, e sem saber quando é o fim. As poucas pessoas que têm necessariamente de sair de casa têm na face uma expressão de preocupação e quando ligamos a TV é a única coisa de que se fala. Enfim, apesar de tudo isto, só nos resta retirar o que pudermos como aprendizado e ter esperança de que iremos ultrapassar esta fase assustadora.
Espero que possamos estar juntas em breve, depois de tudo isto.
Muitos beijinhos!
Taíssa Andrade
Memórias de quarentena – dia… já perdi a conta
(Página de um diário)
Quarta-feira, 15 de abril de 2020
Olá diário. Cá estamos nós outra vez, não é verdade? Até te perguntava se está tudo bem e se há novidades desde ontem mas duvido que obtivesse resposta… como se uma folha de papel me fosse responder… Estou mesmo a começar a endoidecer, mas também o que é que se podia esperar de alguém que está em casa há mais de um mês?
Quando tudo isto começou, eu ainda lia, via filmes e séries mas honestamente estas coisas são cada vez mais cansativas. Acabei de ver todas as séries da minha lista, já vi e revi todos os filmes que tinha curiosidade e eu sei o que podes estar a pensar… Carolina, ler é sempre bom! Pois, eu concordo. O problema é que já acabei os livros que tinha cá em casa. “Então e porque é que não encomendas mais?” Foi exatamente isso que fiz mas queres saber? Demoram duas semanas a chegar… DUAS SEMANAS!! Enfim…
Relembrar tudo aquilo que tomávamos com garantido: um abraço ou um beijinho dos nossos amigos, passar tempo a passear na rua nem que seja só para ir até à Baixa beber café, ir aos treinos só para desanuviar a cabeça e até mesmo andar pelos corredores da escola; tudo isto desapareceu quase num piscar de olhos.
Pior que ter desaparecido, foi trocado pela imagem da minha janela, uma imagem que só realça o período péssimo que estamos a passar. São poucas as pessoas que se veem na rua e são ainda menos as que saem sem máscara que, infelizmente, se tornou um acessório mais usado que aqueles chinelos com meias que se viam em todo o lado. Tenho tantas perguntas, tal como acredito que toda a gente tenha: Quando é que isto vai passar? Quando é que o mínimo de normalidade vai voltar? Embora ninguém tenha respostas para estas perguntas continua a ser algo que cruza as nossas mentes todos os dias. Continuo a acreditar que a normalidade, pelo menos num futuro próximo, não é irmos a locais cheios de pessoas, festas e idas à praia porque sei que essa coisas levam tempo, se bem que eu também acredito que nem todos pensem assim. Bom, por esta altura o melhor a fazer é ter esperança que todos juntos vamos conseguir ultrapassar esta fase complicada (mas atenção, não da forma como o primeiro ministro inglês diz – que acabou por se revelar não muito apropriado e eficiente…).
De qualquer das formas, aqueles dias em que está um sol radioso e o tempo parece formidável são os que custam mais ficar em casa; ao menos hoje choveu e fez trovada, o que facilitou a tarefa. Só de pensar que reclamávamos de coisas mínimas e banais… neste momento saíamos de casa sem qualquer tipo de objeção porque a única coisa que podemos protestar de momento é estarmos fechados em casa.
Bom, volto amanhã para escrever mais um pouco que, como já deves ter percebido, é o melhor que tenho a fazer…
Beijinhos ;)
Carolina Lopes
Cada vez mais a atualidade é feita de novas experiências e critérios em função da crescente volatilidade com que nos é apresentada. A partir dela surgem inúmeros progressos, ocasionados a favor de novas metodologias. Não obstante, determinados processos reformulados do nosso dia a dia encontram-se revestidos imutavelmente por outros, no que lhes concerne.
Nesta altura, principalmente, tem-se vindo a assistir ao pronunciamento generalizado de um em particular – a associação conformada entre o isolamento e a reflexão. Embora ambos possam coexistir distintamente a relação definida traduz-se numa complementação do seu associado. Por assim dizer, através do isolamento é possível obter a reflexão ou o mesmo reciprocamente. Tendo, no entanto, o isolamento sido imposto a todos, a presente relação, pela qual nos estamos a associar, é a primeira.
O processo inerente à reflexão é, por certo, muito particular. A sua relativa eventualidade vai a par de uma premeditada singularidade. Tal característica assim é definida em resultado da peculiaridade que lhe é atribuída pelo pensamento de cada um. Ademais, por se tratar de um processo, a sua posição fundamental que tem na imaginação, na idealização ou até na superstição permite abrir um vasto leque de diferentes possibilidades e hipóteses concebidas.
Mediante as atuais circunstâncias, a reflexão por que toda a gente tem passado relaciona-se mais com uma ponderação sobre a influência que o exterior tem na formação da nossa individualidade. No caso de alguns, à laia de exemplo, o sentimento alicerçado na sua é a saudade, aquele que mais nos tem afetado desde o início. Noutros, é a esperança e a aspiração de uma nova etapa. Todos eles em conformidade com a janela definida por cada um.
Num sentido figurado, a mesma constitui um meio para revelar o que está do outro lado. Por outras palavras, concebe uma abertura para o exterior. Nestes termos, essa abertura é limitada em função do propósito escolhido. Cabe-nos a nós determinar o que se encontra do outro lado.
João Oliveira