Censura

A Federação publica, em 30/11/1918, determinação de censura sobre a epidemia

Charge da revista Máscara de 16/11/1918 sobre a censura

A censura de 1918

Para a imprensa independente de Porto Alegre, não ligada a partidos políticos, o governo do Rio Grande do Sul demorou muito para tomar atitudes com relação a ameaça que se aproximava. Com as notícias principalmente de casos de influenza espanhola no Rio de Janeiro, a população, por meio dos jornais, cobrava ações como o controle de viajantes, já que as pessoas que chegavam contaminadas em navios era a principal via que espalhava o vírus pelo mundo. 

O Correio do Povo, mais importante jornal da cidade na época, apontava omissões do governo de Borges de Medeiros, Já A Federação, publicada pelo partido que comandava o estado e também com grande relevância, fazia o papel da defesa das ações, mesmo que sempre em resposta ao concorrente. 

Em 1º de novembro de 1918, A Federação publica que o jornal, como se fosse necessário, estaria sujeito à censura policial prévia. Ou seja, a polícia teria de aprovar a publicação de notícias sobre a epidemia que se alastrava pela cidade e fazia as primeiras vítimas. No Correio do Povo, o impacto foi grande e a medida não foi escondida dos leitores, conforme publicou o jornalista Walter Galvani no livro Um século de poder, transcrevendo a ordem de censura:

"Recebemos ontem à tarde, do Dr. Ariosto Pinto, chefe de polícia, o seguinte ofício: 

'Ilmo. Sr. Redator do Correio do Povo - Comunico-vos que, de ordem do Governo do Estado, e a contar da presente data, ficam sujeitas à censura policial as publicações desse jornal relativamente à influenza espanhola, epidemia ora reinante nesta capital e em localidades do interior do Estado. 

De conformidade , pois, com essa determinação, visando à indispensável e recomendada tranquilidade pública, devereis submeter à apreciação desta chefia todas as notícias a respeito, e a qualquer hora do dia ou da noite. 

Saúde e fraternidade

Ariosto Pinto - Chefe de Polícia"

A estratégia adotada pelo Correio do Povo frente à censura foi deixar em branco os espaços nos quais seriam publicadas notícias sobre a epidemia. O jornal classificou a medida determinada pelo governo como cerceamento à liberdade de imprensa. A revista Máscara apresentou a questão da censura em uma charge. 

Capa do jornal Correio do Povo de 5/11/1918, com espaços em branco onde estariam notícias da epidemia

Outras formas de controle da informação

A censura foi extinta no Brasil com a promulgação da Constituição de 1988. A expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação é livre no país, independentemente de censura ou licença - o que há é somente a classificação indicativa por faixa etária.

Mesmo assim, há casos pontuais de proibição de veiculação de reportagens na imprensa. Isso ocorre quando uma pessoa recorre à Justiça questionando o material sob alegação de que a publicação envolve crimes de injúria ou contra a honra, por exemplo. Em geral, essas decisões judiciais acabam derrubadas quando chegam ao Supremo Tribunal Federal.

Mas há outras formas de controlar a informação e o que é publicado pela imprensa. Uma delas é usar o poder político ou econômico. Governos e empresas exercem influência sobre os veículos e têm força para direcionar as publicações ou não de determinadas notícias e reportagens.

Controlar a fonte de dados também é uma ferramenta que vai contra a liberdade de imprensa e foi a estratégia adotada pelo governo Jair Bolsonaro na pandemia do coronavírus. 

O Ministério da Saúde, no início de junho de 2020, mudou a forma como os números de novos casos e de mortes pela covid-19 eram contabilizados e divulgados. Em vez de apresentar todos os registros feitos em um dia, independentemente da data em que ocorreram, a nova diretriz dizia que só seriam incluídos os casos no dia em que aconteciam. Como o registro demora a ser feito, os números cairiam.

Além disso, o boletim diário não seria mais divulgado no final da tarde, como ocorria desde março. O novo horário seria às 22h. Assim, os principais telejornais já teriam sido exibidos - Bolsonaro chegou a afirmar que a intenção era prejudicar o Jornal Nacional, da TV Globo.

A decisão de Bolsonaro provocou críticas de especialistas e também de veículos do mundo todo. Para enfrentar as dificuldades impostas pelo governo, os maiores jornais, sites e emissoras se uniram e passaram a fazer um levantamento diretamente nos Estados, consolidando os dados duas vezes por dia. Como não conseguiu manipular os números, Bolsonaro recuou. 

Reproduções ao lado:

Folha de S.Paulo - 6/6/2020

Estado de S. Paulo - 8/6/2020

Poder 360 - 8/6/20202

BBC Brasil - 8/6/20202