Capítulo 4 - Dardos, conversas e acordos…


por Zozo


“Às vezes, é bom dormir e descansar antes de aceitar uma missão”. Esse foi meu primeiro pensamento ao perceber que não poderia ter noites longas de sono depois que fui parar no cerrado.


Após cruzarmos um portal aberto pelos Fuemigos de Milio, encontramo-nos nas áridas terras da Chapada dos Veadeiros - Alto Paraíso, Goiás. O calor do cerrado já era esperado, mas a ausência de umidade no ar era uma coisa que eu não estava esperando… não me lembro de o ar aqui ser tão seco assim ou deve ser coisa da minha cabeça mesmo (corpo de preguiçoso é complicado, se acostuma e se desacostuma fácil). Já os outros, exceto Kûara, estavam na mesma, ou até pior, por exemplo, a Centauri, que estava praticamente se arrastando pelo chão.


“Ou, era um calor de matar. Parece que está no período seco [1] aqui, o ar sem um pingo de umidade. Água vai ser um item essencial nessa missão, senão, a gente vai perder energia só caminhando.” - meu subconsciente conversava sozinho.

Eu, Zozo, estava acompanhando outras cinco pessoas, todos unidos por um propósito em comum. Amigos? Não, apenas pessoas com um destino compartilhado.


Enquanto observamos o local, Kûara nota a presença de uma casinha no meio do nada, feita de madeira e com umas árvores em volta, que pareciam ser ipês. Caminhamos em direção àquela construção sem muita cerimônia.


Ao ficarmos parados por um tempo lá, Kûara sofre um ataque. Do nada, DO NADA, sai um dardo, do raio que o parta, atingindo o rosto dela, causando-lhe um leve arranhão. Obviamente, ficamos mais atentos ao nosso redor, e, com um olhar nada perspicaz, vimos um símbolo desconhecido que nos intrigou, que, por incrível que pareça, estava bem na nossa “fuça”.


Nesse meio tempo, se posso julgar assim, surge um novo ataque. Dessa vez, foi direcionado a outra pessoa, da qual eu não me lembro no momento, contudo, se não me falha a memória, não houve estragos por conta desse dardo.


Percebi que a situação ali iria ser complicada, já que estávamos  sendo alvo de ataques cuja origem ainda não havia sido identificada. Todos ficaram em estado de alerta e Kûara notou algo atrás de uma estrutura, que parecia uma torre de observação. Depois de falar sobre, os outros também notaram. Era uma espécie de planta que gerou uma discussão acalorada entre Kûara e Centauri sobre o que era, mas, no final, a maioria concordou que parecia uma babosa (embora Kûara insistisse que era uma samambaia).


Em seguida, um ser feito de madeira e folhas se ergueu diante de nós, usando uma expressão irritada, e nos questionou sobre nossa presença e se éramos inimigos e, para aumentar nossa sorte de finalmente morrer, Centauri resolve atirar uma flecha em direção ao ser desconhecido. O grupo então teve uma difícil tarefa de explicar nossa missão, o que levou a uma intensa discussão para transmitir nossas intenções.


“Não me lembro bem dos nomes, mas um se chamava Solstício e posso dizer que era o mais desconfiado. Ele portava uma coisa parecida com um cajado, sua expressão era de irritação misturada com desconfiança. Já o que estava  acalmando Solstício, eu não me lembro bem, mas também portava consigo um cajado e tinha um escudo de folhas, sua aura transmitia calma.” - Analisei ambos, enquanto os outros tentavam falar algo.


Após termos confundido inicialmente os seres locais, Centauri deu um grito para chamar a atenção deles e compartilhou todas as informações, inclusive as que eram para ser mantidas em sigilo total.


Centauri gritou com clareza:

 

— A rainha está presa dentro de algo que parece um casulo; os Eremitas e seus respectivos Artefatos da Biodiversidade foram sequestrados; o Alvorecer Vermelho invadiu a conferência.


Suas palavras chamaram a atenção dos seres locais, incluindo Damien. 


“Ele era um ser que eu não identifiquei, com uma máscara e borboletas azuis saindo de si. Vestia uma roupa simples, se assim eu posso dizer. Também tinha uma beca curta, que se estendia um pouco abaixo dos ombros com um capuz. O ser exalava um ar de mistério.” - Outra análise rápida e de primeiras impressões.


As informações gritadas induziu Damien a nos convidar a entrar para começarmos a conversar de maneira civilizada. Com surpresa em sua voz, ele questionou a veracidade das informações de Centauri: 


— O Eremita foi sequestrado? – e todos nós confirmamos.


Antes de continuarmos a conversa, Damien nos ofereceu água e pediu a alguém que a trouxesse. Um carinha logo chegou com baldes de água e prosseguimos com nossa conversa.


Não me lembro de tudo, e sim de partes. Lembro-me de que Damien estava falando de que era a primeira vez que o artefato havia saído do local e, agora, o bioma corria sérios perigos.


“O cerrado já era uma ameaça a si próprio com queimadas naturais [2], aí vem uns desocupados e incendeiam por onde passam. Sérios perigos é pouco, sem o Eremita e o Artefato, o bioma pode ser extinto” - pensei comigo.


Depois de citarmos os caras da capa vermelha, o Alvorecer Vermelho, Damien fala sobre registros de seres de capas vermelhas que deixam rastros de fogo por onde passavam nas margens do local. 


“Ah muleque! Aquela capitã não erra nas informações, bichinha esperta. Seu cargo é merecido.” - Pensamentos aleatórios.


Damien também fala que havia tomado o lugar do Eremita apenas pelo tempo que ele iria ficar fora. E eu, com minha vontade, o respondi:

 

— Pois vai ficar por um bom tempo, não que o Eremita tenha morrido e não que eu esteja pressupondo isso, longe de mim, mas, né, até a gente achar ele…


Fui interrompido com a mão de Kûara na minha boca, me impedindo de falar mais alguma coisa.


“Devo aceitar o fato de que eu não sei deixar a situação mais calma, acho que eu me envolveria numa discussão fácil (não que isso não tenha acontecido realmente). Achei que estava tranquilizando Damien, mas sua expressão’  não era convincente, ele estava com uma máscara e a gente quase morrendo'. - pensei.


Depois de muito debate, chegamos a  decisão de que iríamos compartilhar as informações que conseguíssemos e que eles fariam o mesmo, sem manter sigilo em nenhuma circunstância. Logo após nosso acordo firmado, entra um carinha nos olhando torto, como se fôssemos invasores.


Ele questiona Damien sobre nossa origem, mas o mesmo o deixa, aparentemente, mais calmo. Então ele prossegue com seu objetivo e fala algo interessante a Damien:

 

— Senhor Damien, avistei os mesmos sujeitos de capa vermelha de antes, eles deixam rastros de fogo como os anteriores. – ele disse algo parecido a isso.


Damien sem cerimônias fala algo e seis, das várias borboletas que saem dele, pousam em nossa cabeça e, estranhamente, restauram nossa energia. Estávamos prontos para combate, então…


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Referências:


[1] DA SILVA, Fernando Antônio Macena et al. Clima do bioma Cerrado. Agricultura tropical: quatro décadas de inovações tecnológicas, institucionais e políticas. ALBUQUERQUE, ACS, p. 93-148, 2008.


[2] PIVELLO, Vânia R. Os cerrados e o fogo. ComCiência, n. 105, p. 0-0, 2009.