Publicações Jornal Gazeta da Serra

Gerson Helmann Lisboa

A partir desta edição (01 de julho de 2022), a Academia Centro Serra de Letras terá a responsabilidade e o prazer de escrever textos para esta coluna. Cada semana um membro da Academia escreverá sobre algum tema voltado à literatura, língua portuguesa ou cultura em geral. Teremos aqui reflexões aprofundadas sobre temas relevantes à edificação do ser humano, bem como reproduções de trabalhos de membros da Academia. Agradecemos ao Jornal Gazeta da Serra pela disponibilização deste espaço, fato que reflete que os motivos do crescimento cultural de nossa região são resultados de incentivo.

 

Fundação

Doze amigos apaixonados pela literatura portuguesa reuniram-se no dia 17 de julho de 2019, na antiga cafeteria Mistura Fina Café, para sacramentar o que havia sido construído depois de muitos outros encontros e debates: a fundação de uma entidade voltada para estimular o apreço pela literatura e língua portuguesa como forma de desenvolvimento mais completo do ser humano. Naquele dia foi criada a Academia Centro Serra de Letras, que iniciou seus trabalhos tendo como primeiro Presidente o escritor Miguel Limberger.

Muitas pessoas ficaram impressionadas pelo fato de a região ter uma Academia de Letras. Teria sido uma ousadia?

Passada mais de uma década, podemos afirmar que, possivelmente, era ousadia, mas a decisão foi, sem sombra de dúvidas, acertadíssima.

Olhando ao longo dos anos, podemos ver que estamos construindo alternativas para os jovens de nossa região. 

 

Atualmente

A Academia possui vinte cadeiras para membros efetivos, sendo que atualmente dezoito delas estão ocupadas. Também tem quatorze membros correspondentes e um honorário. Todos os membros da Academia são voluntários e abnegados nas tarefas definidas pelo colegiado.

 

Projetos em andamento

1-Projeto "Sementes":  tem como objetivo a identificação de crianças e jovens com talento para escrever. O projeto vai selecionar trabalhos literários produzidos por jovens de até 18 anos, nascidos ou residentes na região Centro Serra. Os melhores trabalhos farão parte de um livro que a Academia pretende publicar ainda no ano de 2022. Serão destacados neste livro, além dos jovens autores, o estabelecimento de ensino e o professor que incentivou e orientou os trabalhos.

 

2-Livro "Gente e História 3: seu objetivo é homenagear pessoas já falecidas que tiveram destaque na região Centro Serra. O projeto selecionará biografias e as publicará num livro que deverá ser lançado até o final deste ano. A memória de uma pessoa se perpetua no coração de seus familiares. A personalidade cidadã desta pessoa se perpetua através das páginas de um livro. Para a construção de uma biografia será necessário, além dos dados básicos, contar algum fato curioso ou pitoresco que transmita o perfil de envolvimento com a comunidade. Ou seja, fatos que mostrem algum tipo de pioneirismo ou destaque, assim como fotos representativas de algum momento importante. A Academia se coloca à disposição de parentes ou amigos que tenham interesse em escrever a biografia de alguma pessoa que tenha sido protagonista na região.

 

3-Projeto "Semeador Cultural": este projeto foi elaborado com o nobre interesse em reconhecer publicamente e dar destaque aos professores, pessoas da comunidade ou entidades de ensino ou particulares que, de alguma forma, tenham algum trabalho ou atividade voltada ao incentivo da leitura e escrita, principalmente entre jovens. Qualquer pessoa da comunidade pode sugerir e justificar quem tenha algum trabalho de incentivo à leitura e escrita que mereça ser destacado e premiado. As inscrições podem ser feitas através do e-mail academiacsletras@gmail.com ou diretamente com os membros da Academia. 

 

Mensagem

Temos o papel de motivar as pessoas, temos que acreditar no potencial do ser humano, temos que ser entusiastas, temos que ser exemplos. Ir ao encontro daqueles que procuram o saber como fonte de evolução, despertar o senso crítico, fazer com que o discernimento faça parte do cotidiano.  

 

Gerson Luiz Helmann Lisboa

Presidente 

Academia Centro Serra de Letras


UMA CERTA RUA CAPITÃO VERÍSSIMO (publicado Jornal Gazeta em 10 de março de 2023)

 

“Se essa rua, se essa rua fosse minha, eu mandava, eu mandava ladrilhar...” Partindo dessa cantiga popular, vou tentar dimensionar a importância das memórias afetivas...

Nasci e me criei na Rua Capitão Veríssimo e é dela que tenho as melhores recordações da minha infância, nos anos 70, quando construí minhas referências pessoais.

Guardo com muito carinho algumas imagens e fatos que ocorreram naquela época.

Hoje mesmo, fecho os olhos e facilmente me vem à memória o cheiro de uma fornada de pães tomando conta da rua. O cheiro vinha da padaria da Dona Frida e do Walmor Siqueira, que era o local mais agradável da cidade, com os balcões cheios de doces e salgados maravilhosos, tudo um guri guloso, como eu, poderia querer. A Padaria havia sido construída tijolo por tijolo por meu avô paterno Ivo Gomes Lisboa e depois vendida para o Ponciano (Walmor).  A melhor hora do dia era quando eu recebia ordem de meus pais para buscar um pão d'água ou pão de bico, como era chamado antigamente o pão francês, pelo fato de ter nas extremidades pontas ou bicos que eram a parte preferida da maioria das pessoas. Abrir aquele pedaço de pão e rechear com mortadela, queijo e margarina, ou simplesmente encher de melado batido, para acompanhar uma caneca de café preto era uma tradição em minha casa. 

Lembro-me claramente da figura do bodegueiro Bortolo Bernardi, um gringo de cara feia, mas de coração enorme, que tinha um bar uma quadra abaixo da minha casa, bem no meio do caminho para minha Escola Lindolfo Silva. No turno inverso da escola, eu me oferecia para limpeza de pátios na vizinhança e, além de ganhar alguns trocados, já vendia o material retirado destes locais. Era ferro velho, vidros, jornais velhos, até osso era vendido. O dinheiro apurado tinha como destino certo a compra de caramelos coloridos, acondicionados em um grande pote de vidro Bar do Seu Bortolo. É lógico que eu não tinha ideia que estava comendo puro açúcar. 

A "Venda" mais perto da minha casa era a do "Carlin" ou Mercadão Cereais Muller. As coisas que faltavam em casa eram buscadas por mim que, como bom mandalete, ia num pé e voltava no outro, sem deixar de pegar um chiclé ping pong de troco. O trajeto da venda até em casa eu ia de olhos fechados, sentindo o gosto de Tutti fruti ou hortelã da mais tentadora invenção para uma criança. Na esquina desta venda, havia a placa de um refrigerante chamado Grapette com os dizeres: "Quem bebe Grapette, repete", e, de vez em quando, eu fazia um investimento naquela bebida.

Outro lugar para onde eu fazia questão de ir era a Churrascaria do Bolfe. Lá os meus olhos brilhavam ao ver em cima do balcão uma grande baleira de vidro, onde eu tinha opções de comprar as balas castanhas, baianas, azedinha, hortelã e também as "assassinas" balas soft. Dentro do mesmo balcão, na altura dos meus olhos, eu via sorvete seco, teta de nega, merendinha avulsa, merengue quadrado, Maria Mole, rapadurinhas e os meus preferidos Juriti (hoje Prestígio) e Bastão de Leite. Havia, também, chocolates e, com o passar do tempo, muitas novidades. 

Na churrascaria, as mesas ficavam tomadas de homens jogando cartas, o que era muito comum naquela época.  Eu ficava observando de longe as pequenas mesas de jogatina e cada jogador com seu copinho de trago cuidadosamente apoiado bem no cantinho da mesa. Talvez seja por isso que crianças não podiam chegar muito perto.  E sobre o famoso churrasco do Bolfe? Ah, isso fica para outra ocasião...


Clara Luiza Montagner 

FOME DE TERRA (Publicado dia 08 de julho)

Estou imersa há cinco anos em pesquisa sobre os imigrantes italianos e seus descendentes na região Centro Serra do RS. Percebi uma constante mobilidade espacial entre eles: nasciam, casavam e morriam em diferentes locais.  O que os movia? Cheguei à conclusão de que um dos motivos, talvez o principal, era a fome de terra.

Vivendo durante séculos sob o regime de mezzadria, entre outras razões, os camponeses italianos vislumbraram na imigração a possibilidade de, enfim, tornarem-se proprietários. “Lá éramos servos, aqui somos senhores”, do imigrante Paulo Rossato, define, em boa medida, os fatores clássicos push-and-pull (empurrar-e-atrair) postulados por Ravenstein na decisão de migrar. A servidão na Itália (push) e a possibilidade de ser proprietário no Brasil (pull) foram fatores determinantes na mobilidade causada pela fome por terra dos colonos imigrantes.

Claro, de início, não era a propriedade ideal. Há, ainda, uma crença de que os imigrantes italianos preferiram as terras montanhosas. Não! Eram assim as terras que lhes foram oferecidas e nem todo o lote era aproveitável. Quando os filhos cresciam e casavam, o ciclo se repete porque a terra era pouca para tantas bocas. Era necessário partir ou deixar o ninho em busca de novas regiões de colonização em vazios demográficos.  De novo, seguindo uma já tradicional cultura migratória de sobrevivência entre os contadini (agricultores) italianos.

Alguns partiam de uma serra à outra. Foi o caso daqueles que vieram para a Colônia São Paulo (Ibarama) e a Colônia Sobradinho.

Em artigo publicado no Jornal do Dia, de Porto Alegre, Edição 00771, de 18.08.1949, sobre os primórdios de Ibarama, o Padre Júlio Sachet descreve a região de forma quase poética: “Era uma porção de terras cobertas de matas selvagens, terras montanhosas em quase toda a sua extensão. Não eram montes muito elevados, porém uma cadeia sucedia à outra. [...] verdadeiros recantos da Suíça”.

Continua o Padre Júlio Sachet em outro trecho: “Aos poucos vieram novas levas de imigrantes vindos não só das imediações de Caxias, mas também de Novo Treviso e Silveira Martins. Essa turma de colonos de Vale Vêneto tentaram também estabelecer-se, mas desanimaram diante das dificuldades e voltaram para suas terras, até perdendo as panelas pelo caminho”. Essa doeu, Padre Júlio! Não foi bem assim. Meu avô materno estava entre eles e aqui ficou, como muitos outros, e muito bem. E houve, sim, quem esteve apenas de passagem. Como meu avô Trevisan, muitos deles eram “imigrantes sem-terra”. Na literatura pertinente, sequer são mencionados porque não adquiriram um lote já que todos estavam ocupados nas primitivas colônias, fato constatado em minhas pesquisas.

O que aconteceu nas primitivas colônias vai se repetir em nossa região. Os “verdadeiros recantos da Suíça” não são mais atração (pull) porque a subsistência (push) ou outro motivo está em jogo. Logo recomeça a peregrinação por terra. Novas fronteiras agrícolas se abrem no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso... Qual é a família da região que não tem um membro migrado para estes estados?

Os fatores push-and-pull também interferiram (e continuam interferindo) no desenvolvimento das cidades de Sobradinho, Ibarama e Arroio do Tigre. Isso fica para outro momento. O que me moveu aqui foi a fome de terra  daqueles que viveram e vivem da terra, a boa terra, que sustenta também aqueles que moram nas cidades.

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ESTÁ CORRETO, MAS NÃO É VERDADE (publicado Jornal Gazeta em 24 de fevereiro de 2023)


Na série chinesa Eternal Love, o Senhor Celestial está extremamente incomodado por não conseguir dar uma resposta plausível aos imortais celestiais após Mo Yuan (Deus da Guerra) morrer e seu 17º discípulo desaparecer junto com o corpo dele. Que humilhação para o Reino Celestial! Consulta, então, Dijun, imperador celestial aposentado. O que fazer?

- Você não tem vários historiadores? Escreva uma história.

- O que quer dizer?

- Encontre um motivo digno para o sumiço do Deus da Guerra.

- Que motivo convenceria todos?

- No ano 63.082 do reinado de Hao De, a rebelião foi contida. Mo Yuan, filho do Pai Celestial, e seu 17º discípulo, Si Yin, desapareceram juntos e ninguém sabe para onde foram.

Quantos fatos históricos nos foram repassados desse modo? Não é necessário ir muito longe. Basta ver os históricos de municípios ao nosso redor. Como não há espaço suficiente, vou comentar apenas sobre três deles. “Em 1934 chega a Lagoão a família de Tomás Costa e dá-se início ao primeiro núcleo de moradores da localidade”. Uau! Engoliram mais de um século de história, pois Lagoão é citado desde 1798. O autor do texto, evidentemente, partiu de fatos recentes, via transmissão oral de quem viu ou ouviu dizer.

Para Jacuizinho, uma “versão aponta o nome como origem indígena, que significa o hibridismo de ‘Jacú’ (sic) = ave galinácea + ‘Y’ = rio com sufixo luso acrescido ao nome guarani”. Quem escreveu isso não sabe o que é hibridismo, pois tanto ‘jacu’ (a ave) como ‘y’ (rio) são termos indígenas. Indo para a história do município: “Jacuizinho, uma história que começou em 1877. O início da colonização deu-se no ano de 1877, quando fixaram residência as famílias descendentes de açorianos, alemães, espanhóis, italianos e negros, provenientes de localidades vizinhas, como Santa Cruz do Sul, Cruz Alta, Soledade, Cachoeira do Sul e outras”. Sobre os termos sublinhados: 1877? Existem documentos que comprovam posses em Jacuizinho (município) desde 1829. Descendentes? Nem todos, alguns eram, comprovadamente, originários de Portugal e da Alemanha. Açoriano é quem nasce no Arquipélago dos 

Açores, pertencente a Portugal; portanto, usar “açoriano” como sinônimo de “português” não é correto. Negros? Não se pode ignorar as inúmeras e antigas posses locais, cujos proprietários tinham escravos, tanto em Lagoão como em Jacuizinho. Um desses proprietários tinha 17 escravos! Já pensaram de onde vieram os quilombolas de Arroio do Tigre? Certamente não eram originários deste município. “Os primeiros dados sobre a história de Arroio do Tigre datam do século XIX, quando Antônio Bento Pereira, subindo a serra, seria, pelo que consta, o primeiro morador de Arroio do Tigre, que ergueu juntamente com sua família um pequeno carijo (espécie de baú feito de varas) para fabricação de erva-mate”. O problema é que esse dado pertence à história de Sobradinho, não à de Arroio do Tigre. O abate do “tigre”, “os tiros certeiros, sob os latidos furiosos da cachorrada”, mais parecem uma narrativa fantasiosa, similar a uma lenda urbana. Com isso não estou querendo dizer que não houve o abatimento do tal tigre/onça. Houve sim, não uma, mas várias. “Por volta de 1875, chegaram outras (a 1ª foi de Bento Antônio Pereira?) famílias, de origem germânica”. A Colônia Sobradinho, da qual a Linha Tigre era uma das linhas, foi fundada em 1901. Parece que alguns colonos se precipitaram e chegaram antes de 1901, mas falta comprovação. Mas em 1875? “Vergonha alheia” pela reprodução de históricos criados ao acaso, que se cristalizam na memória do povo e se repetem em inúmeros sites, como associações de município, IBGE e até mesmo em Planos Plurianuais de Educação. Rever esses históricos seria um serviço de utilidade pública.


Clara Luiza Montagner

Membro fundador da Academia Centro Serra de Letras, cadeira 3

montagnerclaraluiza@gmail.com

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A magia de certos livros

 

         Você acredita em magia? Na magia de um livro?

Se a resposta for não, vou dar motivos para que você comece a acreditar na magia dos livros.

Existe magia nas palavras. “A palavra inglesa spell ainda hoje significa tanto “soletrar” quanto “fórmula de encantamento”. A velha palavra germânica runa não designava somente as letras do alfabeto rúnico, mas também “feitiço” ou “encantamento mágico”. A palavra inglesa glamour, que significava antigamente “bruxaria” e “palavra mágica”, era uma corrupção popular da palavra grammar (gramática): para o povo, o conhecimento da gramática era evidentemente um saber mágico” (Winfried Nöth (1996). Percebeu como o domínio das letras foi associado à magia?

Saber ler é o primeiro passo para entrar na magia dos livros. Quanto mais você ler, maior é a possibilidade de encantamento. Após ler um livro, você não é mais o mesmo. Você mudou, mesmo sem perceber, porque seu mundo interior ficou maior com mais uma camada de saber acumulado. E é por isso que a leitura de um livro não é a mesma para todos os leitores. A magia permite a mistura do que sabemos com as páginas de um novo livro.

“Um leitor vive mil vidas antes de morrer. O homem que nunca lê vive apenas uma” (George R. R. Martin). Com seu poder, a narrativa permite que entremos no livro, ora nos identificando com um personagem ou acompanhando-o em sua trajetória. A subjetividade nos permite o acesso aos sentimentos e a visões de outros mundos. Por exemplo, pela empatia, você se identifica com a insatisfeita Emma (Flaubert, “Madame Bovary”), com a desesperada deusa Tétis procurando um meio de salvar seu filho mortal (Moreno, “A guerra de Troia”), com Zarité e sua “z’étoile” (Allende, “A ilha sob o mar”).

A magia faz de você um personagem invisível no livro. Porém, quando a leitura termina, você está só, os personagens partiram. Você chora. Você curte uma espécie de ressaca. Está em luto. Está com saudade dos personagens. Enfim, ficou um vazio. Isso é magia. Se você for como eu, vai procurar outras obras daquele escritor para, talvez, preencher o vazio que ficou. Se o escritor for do seu agrado, vai ler todas.

Entre um filme baseado em um livro, prefiro o livro, pois somente as palavras podem atuar sobre a nossa imaginação. Esta é, de fato, a mágica da criação literária. Você cria as imagens através da leitura, ao contrário da tela.

Amo os livros com “vazios”. Como escreveu Clarice Lispector: “Mas já que se há de escrever, que ao menos não se esmaguem com palavras as entrelinhas. O melhor ainda não foi escrito. O melhor está nas entrelinhas”. Ou seja, o que não foi dito. Capitu traiu ou não Bentinho? A ambiguidade, característica marcante das obras de Machado de Assis, é própria de uma obra aberta, que permite que personagens atravessem os tempos, instigando os leitores de qualquer época, propondo charadas ou escolhas.

Bem, parece que o que escrevi até aqui só vale para romances, contos e afins. Não. Se você lê para pesquisa, a magia ou o encantamento também podem estar presentes. Quando você encontra (ufa!) ou entende (ah!) o objeto intenso do seu desejo, você entenderá o grito “Eureka!” de Arquimedes.

Um leitor passivo não vê magia num livro. Sendo um leitor ativo, você poderá viajar (e como!), imaginar (sem limites...), criar (sem restrições!), sorrir (acredite, faz bem!), chorar (por que não?) e se inspirar (como é bom ter motivação!).

Os livros - “fórmulas de encantamento”, “feitiços” ou “encantamento mágico”, “palavras mágicas” – estão aí. Deixe-se levar pela magia do livro!

 

Clara Luiza Montagner

Membro fundador da Academia Centro Serra de Letras, cadeira nº 3. 


Hélio Scherer

A arte de “domar” as letras (Publicado dia 15 de julho de 2022)

Hélio Scherer - membro fundador da Academia Centro Serra de Letras 

            Em 1963, após receber uma boa alfabetização e cursar até a quinta série na Escola Rural de Vila Gramado-Sobradinho, ingressei no Instituto de Educação Rural de Osório, educandário que formava professores. Além das disciplinas básicas, estudei diversas matérias da área técnica, mas foi em Língua Portuguesa que concentrei meus esforços, no firme propósito de me libertar dos vícios de linguagem e do sotaque característico de um neto de imigrantes, nascido e criado no interior. A biblioteca da escola foi meu local de leitura, com pesquisas mais frequentes no dicionário. Quando me encontrava sozinho, lia em voz alta para aprimorar a dicção. O meu histórico na escola primária, onde participei de um Clube 4S da ASCAR, chegou ao conhecimento dos meus novos colegas e professores e logo fui convidado a participar do Grêmio Estudantil, do qual mais tarde fui presidente, participei também da União Municipal de Estudantes. Essas agremiações editavam um jornalzinho e tinham um programa na Rádio Osório.

       A experiência desse período foi determinante para que fosse contratado como locutor na Rádio Sobradinho em janeiro de 1968. Esse foi o meu primeiro emprego após servir ao Exército em 1967. Os meus conhecimentos e práticas de redação me proporcionaram atuar na elaboração de notícias, avisos e outros trabalhos na rádio. E foi na base do “fazendo e aprendendo” e com o apoio de alguns cursos que adquiri o aprimoramento na arte de escrever e me comunicar. Os hábitos de leitura e escrita resultaram em prática e experiência que me conduziram a novos desafios. A criação de um jornal, em 1975, junto como outros colegas da Rádio Sobradinho, foi uma iniciativa marcante. Tive a parceria deles apenas no primeiro ano, na sequência, a possibilidade de atuar no jornal sem me desligar da Rádio Sobradinho, onde permaneci como funcionário até 1979. O jornal era chamado inicialmente de Paladino Serrano e, depois, Jornal da Serra. Com muito trabalho eu o dirigi até 1984, quando transferi para o Grupo Gazeta de Comunicações. O antigo Jornal da Serra, para a minha satisfação, permanece circulando com outra denominação e está se aprimorando ao divulgar os principais fatos da nossa região, inclusive alguns em que tive a oportunidade de participar, nas diversas atividades que desenvolvi com o passar dos anos.

       Dessas iniciativas, destaco a minha experiência na arte de escrever adquirida ao longo dos anos. Assim, me tornei radialista e jornalista, profissões que abracei com seriedade e paixão e que me proporcionaram conhecimentos gerais e muitas realizações. Após fazer rádio, jornal, editar revistas, criar o primeiro site de notícias da região, agência de publicidade e pesquisas de opinião, em 2006, fui homenageado como Patrono da Feira do Livro de Sobradinho, fato que me despertou o interesse pela Literatura. Acostumado e brincar com as letrinhas e domar as palavras em diversos tipos de textos, aceitei o desafio de fazer poesia. Em 2009, fui convidado por outros(as) amantes das letras e fundamos a Academia Centro Serra de Letras, entidade que tive o prazer de presidir por dois períodos e que hoje atua em vários projetos, inclusive este, de escrever uma coluna semanal.

       Portanto, nesta minha primeira participação, reitero o que tenho falando em algumas palestras para estudantes: a minha experiência pessoal e profissional está intimamente ligada ao hábito da leitura e da escrita. Comunicar-se com proficiência parte, inicialmente, do uso da língua portuguesa com toda a sua potencialidade, tanto na oralidade quanto na escrita. Espero que esse texto tenha contribuído para incentivar mais pessoas a construírem a sua própria história, pois nunca é tarde para ler, escrever e “domar” as letras.

Luciano Tiaraju Turcato 

UM LUGAR TRADICIONAL

Nesta semana na coluna destinada a Academia Centro Serra de Letras no Jornal Gazeta da Serra, coube a mim escrever sobre o que eu achava de interessante para brindar os leitores. Quando estudava em Santa Maria na UFSM, os colegas de Medicina Veterinária querendo menosprezar o lugar de onde vinha, perguntavam onde ficava Sobradinho e o que tinha de importância. Eu sempre defendi minha terra e lhes dizia que Sobradinho era uma mini Nova York, pois tinha tudo que uma grande cidade possuía e várias tribos que viviam em harmonia e pacificamente.

Para contextualizar os meus relatos sobre minha cidade, eu reforçava que havia um café no centro que lembrava os grandes cafés de Paris. Este local que agora passo a descrever é o ponto mais tradicional de nossa Cidade: Lancheria Laçador. Seu nome se originou de uma gravura na parede no estabelecimento que até hoje ainda se mantém, pintada por Álcia Damasceno Louzada, cópia da escultura feita pelo Pelotense Antonio Caringi servindo de modelo Paixão Cortes, e que pela obra representativa do Povo Gaúcho que venceram um concurso em 1954 na exposição do IV centenário de São Paulo.

O Povo Gaúcho reivindicou essa obra pela sua beleza e representatividade para a Capital Gaúcha. Sendo inaugurada em 20 de setembro de 1958 e escolhida no de 1991 como símbolo de Porto Alegre. Muitos foram os proprietários deste tradicional estabelecimento, mas coube a Jorge Kirschke, a honra de ter sido o primeiro proprietário no ano de 1968 com a foto da inauguração que a está exposta no mural, contando com a Benção do Padre Benjamim Copetti na época Pároco da Cidade. Em nossa cidade a Lancheria Laçador poderia sim ser tombada também como patrimônio histórico de nosso município. Lugar que remete aos tradicionais cafés das grandes cidades polos quais passavam todos os tipos de frequentadores desde intelectuais aos mais humildes para exporem suas ideias. O nosso Futebol seja de salão ou de Campo obtinha suas mais fortes manifestações ali naquele reduto.

A lancheria possui um mural de fotografias com seus frequentadores mais assíduos que representam a história de nossa cidade e o quanto já foram discutidas ideias e críticas para melhorar o nosso País, Sobradinho e Região Centro Serra. Mas a rotina diária dos Proprietários Jeferson e Fernanda é muito desgastante, pois acordam sempre ás 5:30 da manhã para estar no local fazendo pastéis torradas e o café passado no modelo tradicional. Ao meio dia servem um almoço caseiro que agrada muito bem aos frequentadores. A tarde continuam os lanches normais para o café da tarde encerrando suas atividades por volta de 6:30. Na quinta recebem os frangos que são preparados e temperados, bem como elaborada a polenta para serem servidos no domingo faça chuva ou faça sol iniciando assar no caminhão encostado ao lado da rua apartir das 6 horas da manhã. Nas datas especiais como o Natal a casa oferece Chester recheado e com todos os ingredientes para se fazer uma festa Natalina. Em sua retaguarda servindo os clientes se encontram Dica e Elizete. Na área de divulgação postando fotos em ferramentas modernas como o instagram a Giovana. Todos os sábados pela manhã os amigos que moram em outras cidades do País e até fora dele vem ao local para matar a saudade e contar suas façanhas recordando os velhos tempos. Se você ainda não frequenta a tradicional Lancheria Laçador não sabe o que está perdendo. Um lugar agradável contando sempre com seu atrativo maior o cafézinho e o bate papo com os amigos. Venha que será bem recebido. Eu recomendo.

Eda Piscinin Bridi 

A arte de escrever é vida! (publicado Jornal Gazeta em 05 de agosto de 2022)


Tenho a lembrança gratificante de infância quando meu pai, Guilherme, nos reunia – meus irmãos Fortunata, Alarico e eu – para a leitura do jornal Correio do Povo. Ele dizia-nos que precisávamos exercitar a leitura e tomar conhecimento do que ocorria no mundo.  Era o período da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Eu estava me alfabetizando. Estudava no então Grupo Escolar Lindolfo Silva. Concluído o curso primário, prestei exame de admissão ao curso ginasial no Ginásio Sagrado Coração de Jesus, das Irmãs Franciscanas, em Santa Cruz do Sul. (O Ginásio Pio X, em Sobradinho, somente foi criado em 1957). Minha redação foi bem classificada. E isso foi um grande estímulo para mim. Minha professora de Língua Portuguesa, Irmã Cleophe, foi minha grande referência. Cobrava conteúdo, através de muita leitura (a biblioteca do colégio era o nosso “paraíso”) e domínio de análise sintática. Dizia ela: “É preciso saber trabalhar corretamente os termos da oração para uma boa redação”. Tive bons professores também no Curso Normal e no Superior.

O fascínio pelo livro me levou a organizar a Primeira Feira do Livro em Sobradinho quando secretária municipal de Educação e Cultura, no governo do Prefeito Marci Nardi. Trabalhava comigo a entusiasta professora de Língua Portuguesa, Teresinha Sperling, que tomara conhecimento da realização da Feira do Livro em Candelária. Pedimos à Prefeitura desse município que nos emprestasse os estandes (eram seis). Os livros eram obtidos em consignação, nas livrarias de Porto Alegre, e vendidos ao preço de custo, pois nosso objetivo era incentivar, entre o público infantil e juvenil, o gosto pela leitura. À sombra das árvores na Praça Três de Dezembro, entre momentos de arte organizados pelas escolas, acontecia a “Festa do Livro”. Seguiram-se outras feiras, porém com estandes adquiridos pela Prefeitura de Sobradinho. Houve um período em que não foi realizada a Feira do Livro. Quando retornei à Secretaria de Educação, no governo do Prefeito Adolfo Brito, foi retomada a realização das Feiras do Livro.

Na Feira do Livro de 2003, no Governo do Prefeito Lademiro Dors, fui agraciada com o título de “Patronesse”. Também na Feira do Livro de Passa Sete de 2019, no Governo do Prefeito Bertino Rech. Homenagem que defino como uma valorização às ações que despertam o interesse, desde a infância, pela leitura e escrita. No ano de 2009, o diretor de Cultura de Sobradinho, Gerson Lisboa, convidou-me para participar da fundação da Academia Centro Serra de Letras. Ocupo a cadeira 2. E iniciei uma caminhada de criações literárias que as defino, no bom sentido, minhas “cachacinhas” literárias. Participei das coletâneas Vertentes, Vertentes 2 e Vertentes 3, do Livro Gente & História: Protagonistas do Centro Serra, Volumes I e II, e em elaboração o Volume III.

Em 2012, participei do II Concurso Rovílio Costa, “Construtores de História 2 – Famílias Italianas do Brasil”, em que narro a história de meu pai: “Desafios, vitórias e marcas de um imigrante”. Ainda, sobre a imigração, tenho participação na obra “Raízes italianas da região Centro Serra”, da Associazione Culturale Italiana di Sobradinho, Org. Clara Luiza Montagner, em 2017.

Desde 2013, a convite do Editor e Gerente da Gazeta da Serra, Laerson Rigon, escrevo a coluna Letras & Fatos. É imensurável o prazer do contato com o leitor semanalmente! E nesse mesmo ano, durante a Feira do Livro de Sobradinho, concedeu-me o título de “Confreira Honorária” a Senhora Joyce Krischke, presidente fundadora da Confraria Artistas e Poetas pela Paz – CAPPAZ. Entidade que tem sede na cidade de Balneário Camboriú / SC. Participo da Antologia Interfaces de Amor e Paz, editada anualmente, e das Cirandas Temáticas mensais (virtuais). Por que eu conto esse encanto “para mim” de trajetória literária? Porque letra é vida! Letra é a arte de escrever inspirações; de expressar sentimentos, desejos, emoções, alegrias, dores, amores!

A arte de escrever sublima as mentes; revela um mundo interior; dá vazão à espiritualidade; ao encanto das belezas da natureza; das construções humanas. (Eda - Interfaces de Amor e Paz – Antologia CAPPAZ Vol.6 – 2015).


Educandário é referência histórica no município de Sobradinho

Salve, meu Lindolfo Silva/Tu és a escola do coração/Toda vida que se viva/Viverás na recordação.

Estribilho do Hino da Escola Estadual de Ensino Fundamental Lindolfo Silva - letra da professora Suely Nery de Bauer, música do Padre Gil Guadalupe Rodrigues. Foi entoado pela primeira vez em 1979 pelo Coral Infantil da Escola, dirigido pela professora e musicista Maria da Graça Lazzari Bernardy, nas comemorações do Cinquentenário do então Grupo Escolar Lindolfo Silva quando diretora Lourdes Piccinin Pacheco (minha saudosa irmã). Maria da Graça dirigia também a Banda Marcial que muito brilhou nos desfiles da Semana da Pátria.  E nesse período, foi criado o Logotipo da Escola – design da professora de Artes Orilde Alves Miotto.

Em 1984, ampliado o prédio e instaladas gradativamente a 6ª, 7ª e 8ª séries, o Estabelecimento passou a ser denominado: Escola Estadual de 1º Grau Lindolfo Silva e mais tarde Escola Estadual de Ensino Fundamental Lindolfo Silva.

“Viverás na recordação”. Realmente, recordo-me com muito carinho do então Grupo Escolar Lindolfo Silva. Esta Escola me alfabetizou. E, abriu as portas para eu iniciar minha vida dedicada ao Magistério, em 1960. Sou grata à recepção acolhedora pela diretora, D. Selma Wietzke Drachler, que me confiou uma turma de 32 alunos do 5° ano primário, “ávidos por conhecimentos”, para prepará-los para o exame de admissão ao curso ginasial, no Ginásio Pio X, na época.

“Tu és a escola do coração”. Quem por ela passa, para sempre a guardará no coração. E, são muitos, ao longo de mais de 90 anos - diretores, professores, funcionários, alunos, CPMs e, atualmente sob a direção de Marciano Rubert, são, todos, construtores de uma história de aprendizagens, tendo “o educando como sujeito de sua educação, no contexto social em que vive”.

A história da Escola Lindolfo Silva confunde-se com a do município de Sobradinho, emancipado no dia 3 de dezembro de 1927. E a Escola foi criada no dia 19 de outubro de 1929, com a denominação de Grupo Escolar de Jacuhy, sendo a primeira diretora Marina Martins de Souza, vindo especialmente de Pelotas. Funcionava num casarão de madeira, na Rua Itália, atual Capitão Veríssimo. Depois, na Av. João Antônio e na Rua Júlio de Castilhos, em prédios alugados, enquanto era aguardada a construção do prédio próprio, com ampla área de recreação, na Rua Pernambuco, conforme fora projetada pelo Engenheiro Militar Lindolfo Silva que demarcou e planificou a cidade de Sobradinho.

Em sua homenagem, o Grupo Escolar de Jacuhy, a partir de 1940, passou a denominar-se Grupo Escolar Lindolfo Silva. Foi-lhe dedicado um poema, de autoria da professora Suely Nery de Bauer. A 5ª estrofe: Prezado Doutor Lindolfo Silva / por tua obra e dedicação / há muito gravamos teu nome / no memorial da recordação.

A inauguração do prédio próprio ocorreu no dia 21 de março de 1954 e contou com a presença do governador do Estado, Ernesto Dorneles.

Retrocedendo um pouco no tempo, vamos encontrar que a primeira escola pública municipal, na Vila Jacuhy, já município, foi criada em 25 de janeiro de 1928. Teve como professora Felícia Almeida Forzen Vidal – patrona da Biblioteca Pública Municipal. Estava localizada na Rua Rio de Janeiro, atual Rua José Mainardi. Os alunos desta escola foram transferidos para a escola estadual, o Grupo Escolar de Jacuhy, quando de sua criação.

Um pouco da história da educação nos primórdios de Sobradinho, ainda como 4º Distrito de Soledade: a primeira escola era particular e localizava-se no bairro “Baixada”, na residência de Humberto Dei Svaldi (presidente da Comissão de Emancipação do Município) que foi também   o primeiro professor, em 1918. Portanto, seguindo a ordem natural, a Escola Lindolfo Silva é sucedânea da primeira escola de Sobradinho.  A da “Baixada”.

“Salve, meu Lindolfo Silva! Toda vida que se viva ...”



Cesar Brixner 

    Publicado em  12 de agosto de 2022.

No início era o verbo e o verbo se fez verso. O verso se fez melodia e a canção habitou o tempo e espaços. E hoje sinto que nascemos e morremos na poesia. E vivemos na poesia que  em si se alucina e perdura.                                                                    

  Sentir é difícil para as palavras e a coisa mais fácil que existe é não escrever.                                                                 Ser convidado para ingressar na Academia Centro Serra de Letras em março de 2010 é o começo da jornada e a aceitação foi uma escolha pessoal e inegavelmente corre    Escrevo porque não sei as respostas. Escrever é uma prática de conversar com as perguntas.                        

   Nesse tempo que convivo e compartilho com amigas e amigos da nossa brava Academia  ocupando a cadeira número 10, nesse tempo que estava presidente, 2017/19 e também em 2019/21, penso que muitas perguntas ainda me esperam. Quero encontrar os caminhos e as palavras que expressem meus sentidos e me conduzam para as respostas mais gratas e justas possíveis. Agora já são 13 anos de existência da nossa Instituição Literária e de certa forma digo ser também uma diversa e solidária família acadêmica. E por ora ocupo essa coluna na sequência e na responsabilidade que cada um faz valer. A escrita é a libertação da palavra. O voo. A leitura é o aprisionamento. O pouso da mesma palavra e tão livre quanto sua origem. O homem que escreve é como chuva que derrama. O homem que lê é como lavoura que brota. Liberdade é a licença que temos para criar algo novo. E o novo é sempre surpreendente porque não existia e como se fenômeno fosse, estamos diante do estranhamento. É a gênese e seu encanto. Pois bem.                                                                                                                                                               

   Revisando os conteúdos dos Acadêmicos que me antecederam, consigo dimensionar a ação coletiva de nossa Instituição. Cada colega ao seu alcance entrega o que tem de melhor. E todos os presidentes já usaram dessa oportuna e valorosa abertura que o jornal Gazeta da Serra nos possibilita. O Miguel, o Helio, o Luciano, e esse que ora escreve. A Clara na condição de atual vice-presidente também expressou seu talento e conhecimento. E ainda, por último, a nossa Eda, a mestra dos mestres que por sua sabedoria  e bagagem curricular dispensa  apresentações. E por aqui vai passar o pensamento e a palavra escrita de todos os membros integrantes de nossa briosa e dinâmica casa acadêmica.

   O atual presidente Gerson tem um robusto histórico junto à Cultura da nossa região. E está e segue comprovando com projetos e ações que nos eleva e leva para os diversos núcleos da comunidade seja escolar ou social. É a Academia Centro Serra de Letras atuando voluntariosa e destemida na missão maior que é incentivar a importância da leitura e a fundamental prática da escrita. Ao nosso livre arbítrio e criterioso pensar e semear, a Academia vem somar à Cultura e a comunidade regional, uma colaboração de resultados imediatos e também de plantios de ideias que serão colhidas ao justo tempo e ao entendimento de cada indivíduo sempre inseridos no contexto plural enquanto sociedade e cidadãos responsáveis. E de minha parte e compromisso, sigo fértil e confiante e aviso que a poesia não cansou. Não desistiu e corajosamente pulsa e vibra. Ando com papel branco nas mãos e a cabeça nas possibilidades. E a caneta carregada entre os dentes. Afirmo que a poesia não precisa ter a razão. Ela, a poesia, só precisa ser o sentido e ser sempre caminho. Quero levar poesia onde ela se sinta abraçada. Salvar a poesia é guardar os versos além de nós. E ainda: só existe o que escrevemos. Só sobrevive o que de nós é escrito.                                               

   Vida longa para os Acadêmicos. E para a Academia, a imortalidade.        

Darliana França - Jornal Gazeta da Serra 

A imortalidade (Publicado em 19 de agosto de 2022)

Há muito persegue-se a imortalidade. O desejo de tornar-se eterno levou cientistas, filósofos e outros estudiosos à pesquisa, à busca incessante por um elixir, um remédio, uma técnica que possibilite o prolongamento do viver. Encontramos meios de nos tornarmos imortais? De certo modo, sim!

Como? Pelas marcas que deixamos na pedra, que vão perdurar além do nosso corpo. Conhecemos Camões, Machado de Assis, Shakespeare pelas marcas que deixaram na pedra, as suas escritas. Suas histórias os tornaram imortais.

As palavras são levadas pelo vento, já dizia Graciela Montes[1], escritora argentina que há muito me encanta. Talvez tenha sido isso, a fugacidade da voz que nos levou a buscar por algo sólido, a pedra pareceu mais duradoura, incarnar-se nela, quiçá, meu corpo também viverá, foi por meio dele e com ele que dei acalento aos meus sonhos.

Para derrotar a morte e o tempo, recorremos à escrita, talvez não escrevemos só para comunicar, mas também para lembrar, para tornar vivo aquele que poderia ser esquecido, findado com o passar do tempo, nossa infância cronológica, por exemplo.

 Marcadas na pedra, anterior a uma escrita sistematizada, a Pintura Rupestre persevera desde a pré-história, conhecida porque alguém ou muitos, corajosamente, optaram por registrar seus feitos, suas histórias, conservar uma memória.

Com o passar do tempo, os povos sumérios desenvolveram um código por meio de sinais cuneiformes que possibilitava o registro da língua falada, nasceu a escrita cuneiforme. Eram em torno de 2.000 símbolos, feitos da direita para a esquerda em placas de argila. Com o seu surgimento, tem-se a oportunidade da imortalidade, anos depois, intensificada pela máquina de impressão tipográfica do alemão Johann Gutenberg. Hoje, a escrita conquistou novos espaços, adentrou no ciberespaço, na virtualidade, no reino do possível. As possibilidades multiplicam-se, os caracteres flutuam na tela, não há dia e nem noite, o tempo e o espaço são, de certa forma, anulados. Estou aqui e lá ao mesmo tempo, aqui pode ser dia, lá noite.

Este alvoroço de vozes, que em mim ecoam e que transcendem até esse singelo texto, é resultado de inúmeras escritas, de pessoas que desbravaram a si mesmas e com a potência da palavra deixaram suas marcas por onde peregrinaram, Bachelard, Octavio Paz, Capparelli, Graciela Montes. Vejam bem, não nenhum dos supracitados, conheci, nem tive a honra de estar em suas companhias, porém as suas palavras escritas chegaram até mim, foram ressignificadas, agora são minhas e poderão estar imortalizadas na perenidade de um código.

Minha mão escreve, mas o escrito torna-se independente da minha mão. Ele chega até onde, talvez, eu nunca me faça presença, adentra recintos e vidas desconhecidas por mim, da mesma forma será ressignificada pela experiência advinda das leituras de mundo e de palavras que cada um fizer. A escrita parte de mim, migra, tornar-se presença e parte de outros que se nutriram de seus vocábulos.

Se quiser deixar marcas, escreva. A palavra escrita ousa mais do que jamais ousou a palavra falada. Inicie devagar, cambaleando, assim como o fez no princípio de seus primeiros passos, arriscando, caindo, levantando, mas seguindo. A escrita é uma construção diária. Compartilhe suas buscas e achados, os enigmas que o surpreendem e permita-se viver a imortalidade por meio das palavras.

 

 [1] MONTES, Graciela. Buscar indícios, construir sentidos. 1.ed. Salvador: Selo Emília e Solisluna Editora, 2020.


O sentir poético (publicado em 14 de abril de 2023)


O que é poesia? Como podemos conceituá-la? Inúmeros estudiosos buscam defini-la, senti-la deveria ser o bastante...Ela é a intensidade da linguagem humana, o arrepio na alma, o aperto no peito, o riso da criança, o mar no olhar, um enigma. Octavio Paz (1982)[1] acrescente que a poesia é conhecimento, salvação, poder, abandono. Operação capaz de transformar o mundo, um método de libertação interior, um convite à viagem, regresso à terra natal, inspiração... E assim, o poeta segue divagando buscando traduzir em vocábulos, algo que é experienciado na totalidade do ser.

A complexidade apresentada por Paz, afirma o quão a poesia deveria ser mais sentida do que explicada, ela é uma experiência vivenciada pelo corpo que dele ressoa por meio de sua voz. Quiçá, a justificativa esteja na etimologia da palavra, o verbo grego que originou o termo poesia, poien, que significa fazer, criar. Sob este viés, vocalizar uma poesia nunca é lê-la como uma ação passiva; os verdadeiros leitores são recriadores e mesmo criadores do que leem.

Em outras palavras, contempla o que sentes ao vocalizar o trecho da poesia de Casimiro de Abreu “Meus oito anos”[2]: “ Oh! Que saudades que tenho/ Da aurora da minha vida, / Da minha infância querida/ Que os anos não trazem mais! / Que amor, que sonhos, que flores, / Naquelas tardes fagueiras/ À sombra das bananeiras, / Debaixo dos laranjais! [...]. Alguns respiraram fundo e serão arremessados para cenas de sua infância, na casa de seus pais, de seus avós; sentiram o cheiro do pão quentinho, do bolinho de chuva, do perfume da flor de laranjeira, do jasmim ou do manacá; ouviram os gritos da disputa de bola, do pega-pega ou esconde-esconde; o correr na chuva, ferindo as poças de barro com os pés; o banho de rio ou açude... Não temos como saber o que sentirás ao estar diante das palavras do poeta, no entanto, sabemos que elas são suas, lhe pertencem, pois você as recriou para si e só você sabe onde elas o levaram e o que sentiu ao decifrá-las.

Observando o trecho poético supracitado, o mesmo seria de uma poesia ou de um poema? É Paz que novamente responde, conforme ele, nem todo o poema, isto é, nem toda a obra construída sobre as leis métricas, contém poesia. Assim, um soneto, considerado uma forma literária com dois quartetos e dois tercetos (quatorze versos), só será poesia se ela o tocar. Notamos então, que há máquinas de rimar (google, por exemplo) e não existem ferramentas que poetizam. Neste confronto referido pelo poeta e chancelado pelo enigma da linguagem, temos poesias sem serem poemas, um momento, um lugar, uma pessoa, uma paisagem, tocou tão profundamente, que se tornou poético, uma poesia.

A linguagem poética adentra a dimensão do sensível, do sentimento, da emoção, ao seu toque tudo se transforma. Os poetas, fios condutores e transformadores da corrente poética, jogam com a possibilidade de multiplicar os sentidos e alargar a polissemia, por isso, o que você sente ou as imagens desencadeadas pelo discurso poético, serão únicas, só suas, originárias nas experiências vividas. Sendo assim, por mais simples ou rara que seja, as palavras que compõem o emaranhado de termos, eles arrastam uma multidão de derivas sonhadoras, criando nos vocábulos mistérios, de modo a desencadear várias interpretações, encerrando, dessa forma, inúmeras tentativas particulares para a solução de enigmas. Sugerimos então, apenas sentir o poético em toda a sua imensidade e amplitude.

 

[1] PAZ, Octavio. O arco e a lira. 2.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982.

 

[2] ABREU, Casimiro de. As Primaveras. São Paulo: Ática, 2004 (primeira edição:

1859)



Louraci Cremonese Pozzati 

                           Superando obstáculos no caminho da leitura (Publicado dia 26 de agosto de 2022)

       Leitura, um assunto sempre presente pela sua importância.  Também tem  no seu incentivo e desenvolvimento, especialmente com público mais jovem, um dos principais objetivos da Academia, tarefa que desempenha em visitas a escolas e diálogos com alunos.   Enquanto ainda  nos  debatemos  com a formação do hábito, surgem, com o avanço da tecnologia e proliferação das mídias,  novas questões e desafios.  O futuro da leitura preocupa estudiosos e especialistas, principalmente com relação ao modo como estamos lendo hoje. Sobre esse assunto, porém, há ainda muita controvérsia.    

      Além dessas questões, somos  um país com baixos índices de leitura e  com grandes desafios a vencer  no livro impresso. Essa falta de interesse traz   prejuízos ao aprendizado em idade escolar, ao crescimento integral do indivíduo e suas futuras conquistas.  Haruki Murakami, escritor japonês, em seu recente livro, Romancista como Vocação, salienta: ”Especialmente quando se é jovem, deve-se ler o maior número possível de livros. Os excelentes, os não tão excelentes e até aqueles insignificantes”.  Um  volume significativo  de leitura vai impactar a vida escolar, a visão de mundo e formar uma  bagagem na qual poderá se apoiar para escrever.

      Queixa quase generalizada hoje é a dificuldade de concentração para a leitura, falta de foco, paciência e persistência para textos longos. Pessoas afirmam que não conseguem mais ler com a mesma frequência e volume que  liam, e  pais angustiados, ao constatarem que os filhos preferem passar as horas vagas na internet e redes sociais, indagam sobre como fazê-los se interessar mais pela leitura.

      Mas há caminhos para vencer as dificuldades.  Muitos já implementados em nossas escolas, como aulas regulares de leitura literária , contação de histórias, entre outros. Há ainda outras atividades  para treinar o foco e  ajudar a formar o hábito da leitura. Trata-se de atitudes simples e do conhecimento de todos.    

    Tudo começa com a criação de  uma rotina  de leitura, ler todos os dias , preferencialmente à mesma hora. A rotina leva ao condicionamento   e, aos poucos, desenvolve  o foco, aumentando gradualmente a capacidade de leituras maiores e mais complexas. Creio que o ideal seria  se a rotina de leitura fosse um hábito da família e se prolongasse na escola. Não se trata aqui de fazer aquela leitura fragmentada e superficial que é feita nas telas dos computadores e celulares, mas que se leia uma obra maior um pouco por dia.

   Também é necessário estabelecer  metas.  Para começar, 15 minutos ou determinado número de páginas por dia. As metas precisam ser alcançáveis para que a motivação seja mantida e, gradualmente,  devem ser ampliadas. A falta de empolgação pode significar que  o assunto não é do interesse do leitor, portanto encontrar o livro certo pode ajudar. Para propiciar a concentração, o local deve ser bem iluminado e, principalmente, afastado de distrações como telefone, TV, etc.  O velho bloco de anotações, lápis e marca texto, ajudarão a manter o foco, tornando o leitor agente ativo, atento ao que é mais importante para sublinhar ou copiar.  Pode-se  também lançar mão dos audiobooks e ouvir concomitantemente com a leitura do livro físico (ajudaria a manter o ritmo). Há ainda músicas para  estudar, que podem ser escolhidas de acordo com a estética do livro e transformar a leitura em algo muito mais empolgante.

     Leitura,  um  desafio para todos, que requer para a sua consolidação, políticas públicas eficientes e de nós, pais e professores, atenção especial.

                     Louraci Cremonese Pozzatti - membro efetivo, cadeira nº 14.   

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                                      Nossas histórias -  Memórias literárias (Publicado no Jornal Gazeta em 20/04/23)

         Você tem histórias para contar? Lembrou de alguma passagem marcante da sua vida nessa região? Que fato é esse? Por que ele foi marcante?   Se  está na faixa dos 40 anos,  tem  muitas histórias ; se dobrarmos a aposta da idade, elas transbordam .  Por que não as escreve?

    Você pode pensar naquele velho adágio popular “santo de casa não faz milagres” e acreditar que poucas pessoas iriam  se interessar pelos seus escritos.    Também, que as  pessoas comuns do seu cotidiano  têm poucas chances de se tornar heróis de suas memórias. 

     A ideia de  que o que está perto de nós não merece atenção no trabalho literário é bastante forte. Érico Veríssimo  aponta para a  necessidade de superar essa tendência através de uma reflexão   feita pela     personagem  Floriano  em “O Arquipélago” – segundo tomo.  A  personagem, que era escritor, tenta justificar por que a sua  gente , a sua terra  sempre foram os grandes ausentes  em seus livros, demonstrando muita frustração com esse fato.  Para Floriano, “era inconcebível que o homem da casa vizinha, ou o da sua própria casa, o peão de estância [...] pudessem ser heróis de novela”.    Achava que  “ pessoas, animais, coisas e paisagens que o cercavam estavam  embaciadas pelas cinzas do não-novelesco, azedados pelo ranço do cotidiano.”  Dizia-se “contaminado” com essas ideias e desejava superá-las. Também, na mesma obra,  o nosso Grande Escritor, retratando nossa gente e nossa cultura,   nos brinda com personagens como Ana Terra, Bibiana, Capitão Rodrigo , entre outros, demonstrando que pessoas comuns do nosso cotidiano podem ser heróis de nossas histórias.           

     Embalados nessa crença  e aterrissando na nossa realidade, textos curtos de memórias poderiam fazer  um importante resgate das vivências das pessoas mais velhas, valorizando suas experiências, relatando  valores, hábitos de vida, acontecimentos, costumes interessantes e pitorescos do passado para que fique o registro  antes que   caiam no esquecimento. É uma espécie de reavivar o passado,  o que é um ganho para a cultura local, trazendo conhecimento do que somos,  algo  que nos identifique e nos una como povo.

     Uma boa opção seriam textos do gênero Memórias Literárias, em que o ponto de partida são experiências vividas pelo autor em épocas passadas, mas contadas da forma como são vistas no presente.  O dicionário Houaiss define memórias como   “Relato que alguém faz muitas vezes na forma de obra literária, a partir de acontecimentos históricos dos quais participou ou foi testemunha, ou que estão fundamentados em sua vivência particular”. O relato deve trazer o olhar particular do autor sobre aquilo que viu ou viveu. Portanto, não revelará apenas os fatos, mas também sentimentos, sensações e impressões.  

     Muitos escritores importantes escreveram e publicaram memórias, Tatiana Belinky (Transplante de Menina); Zélia Gattai (Anarquistas, Graças a Deus); Manoel de Barros,  Fernando Sabino, entre outros. Aqui em nossa região, já temos livros de memórias e pessoas que gostam de escrever esse gênero.

     As memórias podem ser escritas também por outra pessoa a partir do relato do autor através de entrevista. Mas caso queira estrear na escrita , é  simples, comece assim: “Se bem me lembro”, “Naquele tempo...”, “Vivi uma época em que...” ou do seu jeito e deixe escritas suas memórias,  contribuindo para que as gerações mais novas conheçam a história do lugar onde vivem por meio do seu olhar,  ajudando a guardar a identidade do povo da nossa região.

                Louraci Cremonese Pozzatti - Membro efetivo.

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                                                          Mudanças  (Publicado no Jornal Gazeta em 20/10/23)

           É ideia  corrente  que  antigamente perdíamos nossas crianças em ruas movimentadas, praias lotadas e que agora estamos perdendo quando ficam por longo tempo  trancados no quarto com  o smartphone. Aí perdemos para a obesidade, para o isolamento e   tantos outros problemas  advindos do excesso  de  uso desse equipamento. Com o tempo,  o mundo  virtual vai ocupando mais  espaço e o contato com o mundo real se torna cada vez mais raro.

          Essa problemática levou-me a pensar na infância  vivida no início da segunda metade do século passado. Nós, do interior,  corríamos o risco de nos perder  nas grandes lavouras de milho onde colecionávamos bonecas verdes com lindas cabeleiras avermelhadas, ou garimpávamos cristais em várias tonalidades , aos nossos olhos, verdadeiros diamantes.

       Como não lembrar  também as brincadeiras aos finais de semana , após a aula de catequese     e a  reza do terço na capela , quando a criançada, predominantemente meninas,  se reunia na casa de algum vizinho para brincar de “se esconder”, de bicho, ovo choco , cabra---cega.

       Às vezes,  fazíamos  verdadeiros arrastões em um dos pomares de nossos  familiares para os quais tínhamos “passe livre”.  Havia fartura de figos, pêssegos, bergamotas, caquis e uvas, entre outras.  Também conhecíamos uma variedade de  frutas silvestres ,como guabiju, guabiroba, sete capote, pitanga, essa última, abundante nos potreiros perto  dos pequenos córregos. Na verdade, conhecíamos a riqueza da biodiversidade do entorno -plantas, animais, insetos, polinizadores, etc.

       Também “fabricávamos” nossos brinquedos,  caminhõezinhos , patinetes, carrinhos de lomba e confeccionávamos as vestes para nossas bonecas. Além disso, participávamos de todas as atividades da propriedade junto com nossos pais.

        Ler revistinhas em quadrinhos também fazia parte do encontro com as amigas aos domingos. Mickey, Pato Donald, Tio Patinhas eram nosso  conhecidos, e os Irmãos Metralha,  os únicos desonestos de que tínhamos notícia.  Nossos medos, além da escuridão da noite, eram os mistérios que  envolviam os sótãos dos casarões cujas escadas não ousávamos subir e os porões escuros e úmidos com cheiro de vinho.

       Havia sempre o cuidado dos familiares sobre nossas ações e quando extrapolávamos um pouco nossa alegria  ou praticávamos  uma pequena travessura, a nona balbuciava a frase: “Madonna mia, il mondo  è perduto”.   Não, nona, ele não estava perdido,  tampouco nós.  Éramos crianças em contato com o mundo real. Nas atividades do dia a dia, nas brincadeiras, no faz de conta, nas pequenas tarefas, encontrávamos a nós mesmos.

       Este é  um mundo que parece  já ter se perdido no tempo,  talvez ele exista somente na nossa memória. A tecnologia trouxe uma nova realidade  na qual precisamos aprender a viver com sabedoria.  Não se trata aqui de  negar a importância do desenvolvimento tecnológico que nos possibilita entrar em contato com o mundo em questão de segundos, com um simples toque  em um equipamento eletrônico. Também não podemos esquecer que a maioria das crianças e jovens já estão  envolvidos e viverão nesse universo, cuja  ampliação  irreversível e acontece a passos largos.    No entanto,  é necessário estabelecer  um  equilíbrio,  buscando  viver de modo mais integrado com as pessoas e a Natureza, sob pena de uma ruptura   com nossas origens.  

 

Louraci Cremonese Pozzatti, cadeira nº 14 da Academia Centro Serra de Letras.


Christiane Branco Amadeu Barbosa

PARABÉNS, Cavaleiros da Serra (Publicado dia 02 se setembro de 2022)


Meu primogênito mal havia largado a chupeta e já vestia bombacha. Rômulo aprendera a caminhar e desde então fora colocado no lombo de um cavalo, ora pelo pai, ora por amigos. Todos cavaleiros. E lá iam eles, “desbravando estes rincões, tão irmanados a pialar sem clemência.” Meu caçula já nasce predestinado: Filipe significa ‘amigo dos cavalos’ e a escolha de seu nome já anunciava que teríamos mais um cavaleiro que logo, logo se juntaria àqueles “que vêm da serra nas patas de cavalos, abrindo espaço para buscar remanescências”.

Esse é um trechinho da história de uma família. Da minha. Mas no próximo dia 06 de setembro, haverá grande festa para comemorar os 30 anos dos Cavaleiros da Serra, visto que muitas outras famílias abraçaram o mesmo ideal “ destes homens tão bravios daqui da serra”. Tudo teve início no ano de 1991, quando os professores José Nilo Cassamalli e Derli Regis Carniel idealizaram o grupo, após conversa informal acerca da afeição que tinham por cavalos. Nico Fagundes teria, então, dado o pontapé inicial ao indagar: “ gostam de cavalgar? por que não criam um agrupamento para este fim?”

No ano seguinte, fundava-se a entidade e em 05 de fevereiro de 1992 a primeira cavalgada se realizou, quando então percorreram 7 munícipios da nossa região. “Rio Grande, Rio Grande abra os braços, nestes cascos lembra a história desta terra”. Ao longo destas três décadas , “quanta estrada, quanta saudade quando se fazia lembrar os ranchos”. Tendo o “bate cascos como acorde”, cruzaram fronteiras, integraram o Centro Serra, escreveram e contaram histórias, confraternizaram, discordaram, aprenderam e seguiram até aqui “ de peito aberto nesta ânsia de chegar”, pois desistir não rima com cavalgar.

Desde a fundação, seguem no grupo Carlos Cassamalli e Roque Rohers, tendo Rogerio Y Castro, João Paulo Pereira, Lissauer Barbosa, Celso Souza , Robson Luiz Dracler, Decio Antonio, Luiz Bolzan, entre outros, entrado logo após a criação do mesmo. E a eles, muitos novos nomes vêm se juntando ao longo do tempo ,fazendo com que, somados à imprescindível turma do apoio, o ato de cavalgar se mantenha vivo, atravessando décadas.

“Grita uma piazito ao alto comandante:

- O meu cavalo já não quer mais andar!

- Pegue o outro, cabestreie, meu amigo. O caminho é longo e não podemos parar.”

Fica a lição: que nada nos impeça de seguir sempre em frente.

Minha convivência com os cavaleiros é de longa data e me sinto imensamente grata por ter acompanhado a construção de mais um pilar de uma tradição que aprendi a honrar. Especialmente hoje, quando busco os bons momentos na minha memória, me encontro emocionada mas vou confidenciar que nosso convívio nem sempre é pacífico kkk : nas confraternizações, quando a comida é ‘de panela’ eles já sabem que ‘a Chris fica indignada’ mas logo me defendo: comida de gaúcho é churrasco, grita meu lado carioca!

Daqui deste rincão, nasceram os Cavaleiros da Serra. Por outras querências, conduzem o nome deste pago.

“ Não tem chuva, não tem sol e nem canseira.

Lá vão eles, os cavaleiros, a trote largo para abrir novas fronteiras.”

Parabéns, Cavaleiros da Serra, pelos 30 anos de existência.

E tenham a certeza de que hoje, a história do tradicionalismo gaúcho não mais se escreve sem que haja um capítulo destinado a vocês. Os trechos em negrito foram retirados da música/hino ‘Cavaleiros da Serra’, de autoria de Celso Souza.

Titular da cadeira nº 16 da Academia Centro Serra de Letras

Lizandro Rocha 

Origem Farrapa - Publicação em 16 de setembro de 2022.

No dia 20 de setembro de 1835, um piquete de liberais chefiados por Onofre Pires e Vasconcelos Jardim acampou em Porto Alegre na Lomba da Várzea atual Azenha, data que marca o início da nossa Revolução Farroupilha. Essa guerra que durou por dez anos foi motivada pelo descaso do Império para com sua província, desde infraestrutura até as questões econômicas com os preços baixos do charque que favoreciam a importação platina. No primeiro momento os farrapos não pregavam a separação da Província de São Pedro do Brasil, queriam somente que o Império resolvesse os problemas da elite rural gaúcha.

Em abril de 1836, em Pelotas, os farrapos tiveram sua primeira grande vitória comandados por Lima e Silva. No entanto, sua maior vitória e a batalha que ficou marcada foi em 10/09/1836 o combate do Seival (margem esquerda do rio Jaguarão). Liderados por Antônio de Souza Neto após a vitória no dia seguinte foi proclamada a República Rio Grandense com base nos ideários do partido liberal exaltado ou Partido Farrapo. O partido Farrapo alimentava-se das ideais que haviam inspirado a Revolução Francesa principalmente a questão da República e o abolicionismo. Dessa posição política que herdamos o nome Farroupilha.  Pouco dias depois em 04/10/1836 no combate da Ilha do Fanfa os farrapos foram derrotados e o seu líder Bento Gonçalves e outros chefes presos e levados ao Rio de Janeiro e depois Bento ficou na prisão do Forte do Mar na Bahia. Com ajuda dos maçons, Bento Gonçalves consegue fugir e voltar ao Rio Grande. A Maçonaria teve papel importante na Revolução Farroupilha, já que foram em suas Lojas traçados os planos de nossa revolução. Inspirados na maçonaria, quando nossa bandeira ganha seu brasão, vemos as duas colunas do templo maçônico.

Quando pensamos nos símbolos do Rio Grande do Sul, sabemos que nossa bandeira tem origem nessa Revolução em 1839, no primeiro momento somente com as três listras diagonais amarela, vermelha e verde, sem o Brasão. O Hino que cantamos com tanto fervor nasce depois de uma grande vitória farrapa que tomam Rio Pardo em 30/04/1838. Criada pelo Maestro Joaquim José Mendanha com letra de Francisco Pinto da Fontoura, nosso Hino Farroupilha tinha mais uma estrofe: “entre nós reviva Atenas/para assombro dos tiranos/Sejamos gregos na glória e na virtude, romanos”, que foi suprimida por força da lei estadual nº 5.213 de 05 de Janeiro de 1966. Essa lei que regulamenta todos os nosso símbolos da bandeira ao Hino. Outro símbolo muito relacionado ao farrapos é o lenço vermelho, no entanto, essa simbologia vem da Revolução Federalista de 1893/95, conflito ocorrido entre os Federalista gaúchos, os Maragatos lenços vermelhos e os Chimangos, lenços brancos.

Nossa simbólica semana farroupilha nos remete ao passado de lutas que forjaram esse povo que vive aqui nas bandas do sul, assim como nos chama a sermos fortes no presente e manter viva a luta para um futuro cada vez mais grandioso.           


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Nosso Obelisco

 

Desde os primórdios a humanidade busca nas construções formas de expressar sua cultura, poder, representações e o belo. O obelisco surge como um monolítico de homenagem e adoração a Rá, deus do sol na mitologia egípcia e também como sinônimo de proteção e defesa no Antigo Egito; encontrado antes das grandes pirâmides. Essa herança arquitetônica egípcia está representada no topo deste monumento, trazendo  geralmente a forma de uma pirâmide.

Nesse contexto a comunidade sobradinhense constrói o nosso obelisco em 1935, em alusão aos 100 anos da Revolução Farroupilha. Fixada ao monumento temos duas placas homenageando Duque de Caxias, a primeira com sua imagem e a inscrição: “Homenagem do Município de Jacuhy aos Gloriosos Farrapos 1835-1935”. Enquanto a segunda, também representa sua imagem, com a inscrição: “Ao grande brasileiro Duque de Caxias homenagem do povo do Município de Sobradinho 25-8-1940”. Nosso Obelisco é um monumento histórico, tombado pela lei municipal de tombamento nº 1.967, de 20-07-1999, com a inscrição: 04, de 13-02-2008. Está localizado no centro da cidade no largo Deputado Ivo Mainardi e foi inaugurado no dia 12 de Outubro de 1935, conforme nota do jornal Paladino Serrano de 10-03-1976, na seção Recordando: “ Inaugurações- no dia 12 de outubro do mesmo ano (sábado), às 10h, realizou-se a inauguração da herma do general Bento Gonçalves da Silva, na Praça 3 de Dezembro,onde, para esse fim, reuniram-se as autoridades locais e grande massa de povo. Coube ao capitão Felisbino Monteiro, prefeito municipal, descerrar a Bandeira Nacional que cobria o busto do valoroso farroupilha, discursando, na ocasião, a diretora do Grupo Escolar local, professora Alda Capaverde de Matos, referindo-se à vida e aos feitos heróicos do homenageado. Isto posto, efetuou-se, também, o ato inaugural da Praça 3 de Dezembro. O Sr. João Francisco Magalhães, funcionário municipal, proferiu longa oração alusiva ao evento. Findas essas duas cerimônias, a multidão dirigiu-se a um capão adjacente, onde teve lugar um suculento churrasco. Os Srs. Clemenciano da Silveira e Dr. Mário Espindola discursaram nessa oportunidade, tendo este último feito uma belíssima saudação ao belo sexo ai presente, A noite, no salão nobre da Prefeitura, realizou-se um concorrido baile, prolongando-se as danças até o alvorecer do dia seguinte.”. Com o passar do tempo, já temos dificuldades de responder algumas perguntas, como por exemplo quem foi o construtor? Conversando com familiares, levantamos duas hipóteses: segundo Benhur Luiz Maieron foi seu avô paterno João Maieron, construtor das Igrejas Católica e Luterana de Sobradinho. Outra hipótese,segundo Leopoldo José Guarenti, poderia ter sido José Benvenuto Guarenti, o Bepe Guarenti que construiu a Igreja católica do município do Segredo. A comunidade precisa preservar sua história, para isso principalmente as entidades e comunidades devem escrever e registrar suas realizações, para que gerações futuras possam responder seus questionamentos. Fica a dica para quem quiser preservar nossa História, entrar em contato com a Casa da Cultura com a nossa competente diretora Ingrid Hermes.

                                                                  

Scheila Simone Secretti

E-S-C-R-E-V-E-R (Publicado em 23 de setembro de 2022)

Rabiscos, desenhos, sinais, gravuras, hieróglifos e letras. A inteligência humana passa constantemente por mudanças e evoluções com o passar do tempo. Desde a pré-história o homem imprime nas paredes das cavernas e rochas, símbolos e desenhos como forma de manifestação e registros das suas atividades. E assim, o advento da escrita aconteceu com todo os povos, em todas as civilizações, cada uma de acordo com suas culturas e conhecimentos. De fato, a escrita é a forma de registro que o ser humano encontrou para comunicar e para estabelecer sentido aos pensamentos e compartilhar com outras pessoas.

         Assim, podemos reconhecer grandes esforços dos povos primitivos até os romanos pela construção da língua portuguesa, oriunda do latim. Também devemos reconhecer que a construção da escrita demandou tempo, muita reflexão e envolveu questões políticas, históricas e geográficas dos povos. Portanto, entendemos que esta construção não foi fácil e nunca estará concluída. Continuamos adequando a língua portuguesa às nossas necessidades, alterando as formas de acentuação, suprimindo acentos e incluindo novos verbetes resultantes das evoluções tecnológicas.

         E mesmo com gigantesca parafernália tecnológica, E-S-C-R-E-V-E-R continua sendo tarefa complexa, que exige reflexões e tomadas de decisões dos escritores. Organizar o pensamento e utilizar as palavras certas para produzir o sentido desejado, é registrar com letras, o subjetivo do ser humano. Pode ser difícil para alguns e nem tanto para outros! O exercício e a repetição podem tornar o ato de escrever, mais fluente. Também podemos adotar estratégias para o exercício da escrita, como iniciar escrevendo em diários, relatando fatos, reescrevendo histórias conhecidas, etc, e seguir ampliando os desafios para escritas a partir de pesquisas, artigos científicos, crônicas e outros. O apoio dos pais e educadores é muito importante na consolidação do gosto pela escrita! O gosto pela escrita vem sempre depois da paixão pela leitura! A habilidade de escrever será tanto mais refinada quanto for a bagagem de leitura realizada, pois a leitura precede a escrita. Então, todo bom escritor é bom leitor!

         Outra forma de incentivar a escrita, que pode se tornar prazerosa e proporcionar realização ao ato de E-S-C-R-E-V-E-R é a produção coletiva. Em duplas ou grupos, a união de ideias e palavras pode dar origem a lindas obras.

         O poema a seguir é um exemplo de obra construída em grupo, durante uma manhã de trabalho no Polo Regional de Ensino Superior a Distância, quando convidei as colegas Kétrin Drescher, Marieli Rigon Pereira e Marta Bernadete Tavares para construir com palavras, uma homenagem ao Polo e à Sobradinho. O resultado pode ser avaliado por você, caro leitor, mas podemos afirmar que o processo de construção foi lindo e de grande realização para cada uma de nós!

 

Polo de Sobradinho: 15 anos de imPLANTAção

Da Terra do feijão

Germinando um local de formação

Sobradinho abriga um polo de educação.

O acesso ao ensino superior

Gratuito e de qualidade

Para toda a população.

Foi num julho de 2007

A implantação desta boa nova

Trazida por duas Marias

A Josefina e a Medianeira que

presentearam a região com esta alegria,

trazendo ao povo muita sabedoria.

Cultivando esta boa semente

A administração Municipal apoiou este ideal

Que segue fomentada por todas as gestões.

O polo regional recebe apoio nacional

E com as parcerias institucionais,

Capacitam e formam muitos profissionais.

De norte a sul de leste a oeste,

A educação a distância chega a todos

Do rural ao urbano

Minimizando as diferenças geográficas e econômicas

Enriquecendo a cultura e todo ser humano

Que busca melhorar sua vida futura.

Qualifica a educação, que constrói a nação,

Trazendo benfeitorias para toda a população.

No aniversário de 15 anos

Nossa alegria é imensa,

Muita colheita já foi feita,

E muitas ainda virão,

É um ciclo que não cessa,

Do plantar ao colher, o aprendizado recomeça,

O esforço coletivo é permanente, 

Sigamos cultivando esta semente!

Contudo, trago para esta coluna do Jornal Gazeta, a importância do ato de escrever. Como membro da Academia, mas também como professora e como mãe (pais), um das responsabilidades que nos cabe é essa, de incentivar as futuras gerações a ver na escrita uma possibilidade de externar a visão de mundo, de usar as letras para registrar os pensamentos e contribuir para a disseminação da cultura, do estudo e das boas ideias. E-S-C-R-E-V-E-R também é uma terapia, ao concentrar os esforços, organizar os pensamentos e sentimentos para “colocar pra fora” o que pretendemos. Experimente esta terapia! Você é capaz!

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Volta às aulas (publicado dia 16 de fevereiro de 2024)

Embora 2024 tenha iniciado no primeiro de janeiro, sabemos que o ano realmente inicia em fevereiro, após o carnaval. Mas, o que efetivamente demarca o início das atividades e retomada da vida social é a volta às aulas, o início do ano letivo. Precisamos entender e aceitar que a escola é o carro chefe da sociedade, e isso fica evidente quando ela é fechada, a comunidade em torno dela se enfraquece, perde a essência e o engajamento nas atividades que realizavam, porque os professores atuam também como líderes comunitários.

A pandemia deixou muito evidente a importância da escola, muito além do seu compromisso com relação ao ensino e desenvolvimento intelectual das crianças e adolescentes, mas também no aspecto emocional e psicossocial. Para além disso, o ambiente escolar é visto pelas famílias como local seguro para deixar seus filhos, e isso é positivo porque reforça o seu valor, embora algumas demonstrem o contrário, porque apenas “desovam seus filhotes” nesses espaços, tendo apenas direitos a exigir e cobranças a fazer  da escola, de responsabilidades que são delas.

Para iniciar um ano letivo, é preciso planejamento e foco nos objetivos pretendidos, por parte dos administradores escolares (tanto poder público como particulares) e famílias dos estudantes. A opção pela escola e a compra dos materiais escolares deve estar atrelada à preparação da criança/adolescente por seus responsáveis, com relação aos propósitos dela ir à estudar e como deve ser seu comportamento. Nós, professores, estamos vivenciando experiências inusitadas, em todos os sentidos, desde receber alunos em sala de aula sem seus materiais, numa mesma sala de aula com colegas que trazem um arsenal de objetos decorativos com personagens que agregam custos aos materiais escolares, gerando disputas e humilhações entre crianças de famílias diferentes economicamente, atrapalhando o processo de ensino-aprendizagem. Paralelo a despreparação dos estudantes para iniciar o ano letivo, o professor precisa dar conta de infinitas obrigações e nem sempre tem condições adequadas para o trabalho.

Podemos comparar o trabalho do docente com sua turma na volta às aulas a uma viagem aérea, motivo de alegria e que aparentemente é muito segura, mas pode oferecer riscos fatais se não for devidamente planejada. Para a viagem tranquila/protegida, a companhia aérea precisa averiguar as condições de voo da aeronave, relacionar um piloto e copiloto com habilitação adequada e experiência prática para a atividade. Igualmente, necessita organizar a equipe de comissários de voo para garantir o atendimento adequado aos tripulantes durante a viagem. Além disso, também é necessário que o avião esteja abastecido de combustível suficiente, equipamentos de emergência, água e alimentação. Neste caso, os professores são os comissários de voo, que terão dificuldades de êxito se a aeronave estiver com problemas ou se os tripulantes não estão preparados para voar.

E tal qual uma viagem, todos queremos que a volta às aulas seja acolhedora, alegre, feliz e construtiva. Para isso, cada envolvido deve fazer a sua parte, com ética e responsabilidade! Assim, a escola é capaz de cumprir sua função social sem esperar que o educador faça milagres.

Que nosso país/estado/município tenha uma feliz volta às aulas e que os professores tenham reconhecimento e condições adequadas para o trabalho. É preciso ressignificar, acreditar, colaborar com a escola!

“- Senhores responsáveis e tripulantes, preparados para a decolagem do voo escolar de 2024?”

      Scheila Simone Secretti

      Membro da Academia Centro Serra de Letras, cadeira 18.

 



Cléo Oliveria

Drogas - um submundo às claras.

O ano era 2007...estava trabalhando na Operação Golfinho, setor de policiamento de uma das mais tradicionais praias gauchas, quando minha viatura 

foi acionada para atender uma ocorrência em um conhecido parque náutico junto a estrada do mar. Ao chegarmos no local, a equipe de segurança

 privada que monitorava as câmeras de vigilância informou que estavam acompanhando a movimentação de três adolescentes em atitude suspeita e

 verificaram que os mesmos haviam cometido vários furtos, subtraindo objetos dos usuários do local: Carteiras, câmeras fotográficas ou qualquer

 objeto de valor, do qual os proprietários tivessem alguns segundos de distração e se descuidassem dos citados objetos. Abordados, verificou-se que

 detinham em seu poder uma chave do guarda volumes, colocado à disposição dos frequentadores, e no seu interior, centenas de objetos subtraídos, 

assim como uma considerável porção de cannabis sativa, popularmente  conhecida como maconha. Encaminhamos os três para a delegacia, 

uma moça e dois rapazes, sendo um deles, menor de idade. Realizamos os procedimentos, e como parte  deles, chamar um familiar do menor, para

 libera-lo sob sua responsabilidade. Veio a mãe dele, uma conhecida médica de um dos maiores hospitais de Porto Alegre, começou a questioná-lo

 dos “porquês”, até a mesma ser informada, que além dos furtos, havia envolvimento com drogas.

-Maconha?... Fulano, maconha? - Berrava ela

-Ah mãe, normal, né? Todo mundo fuma maconha...

Esse fato me vem a memória sempre que vejo na mídia, nas ruas, nas redes sociais esse conceito de uma sociedade doente que confunde “comum” com

 “normal”. Mas onde está o nosso erro, enquanto sociedade?

Grande á a relação de fatores, mas, em um mundo em que as pessoas se dizem tão evoluídas e inteligentes, fechar os olhos por conveniência,

 em absoluto, não é opção. Um movimento crescente de artistas e pseudo-intelectuais, na grande mídia pedem pela liberação das drogas, 

antes financiam campanha de políticos, a drogadição corre solta em estádios de futebol e grandes eventos, e todos se fazem de cegos, pois é

 mais cômodo. Nos acostumamos a assistir todos os dias, reportagens sobre assassinatos, confronto entre facções e presos liberados, e no final

 o repórter fala, para nosso alívio: Tinha envolvimento com o tráfico de drogas...

(Ufa, ainda bem)

Na contramão da lógica e do pensamento do cidadão de bem, está uma legislação cada vez mais benevolente com traficantes e usuários,

 pois geram lucro para alguns  profissionais, que não se importam em sustentar suas famílias com dinheiro sujo de pó e com cheiro de sangue.

 Não nos comove ver nossa policia enxugando gelo, enquanto na grande mídia, algum “especialista” em segurança, fica a analisar cada abordagem 

policial, mas sempre toma o cuidado de não culpar ou ofender os traficantes e criminosos. Não temos o hábito de cobrar dos nossos legisladores

 uma legislação mais rigorosa e eles também não fazem questão de se envolver em pautas dessa natureza, pois não rende votos. Ainda,

 é tão mais ”lucrativo” tratar um dependente quando seu estado de saúde o torna um verdadeiro zumbi, daqueles que perambulam pelas ruas

 pedindo esmolas ou furtando para manter seu vicio. Dos políticos, só ouço o degradante e pra eles, tão conveniente, SILÊNCIO. 

Trabalho, família, estudo, lazer, musica, leitura, paz na alma e  Deus no coração, é  o que desejo a todos. Um grande abraço.

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Pega-Pega

 

Sempre fui “cachorreiro”...sempre tive cães, pois sua fidelidade e amizade são indescritíveis. Quando morava no campo tinha cães que ajudavam na lida, parceiros de aventuras, caçadas e pescarias.

Já na cidade, não mais do que um, fêmea, de pequeno porte, pois o espaço é limitado e a urina de cachorro macho causa mau cheiro.

Atualmente, temos uma cadela com cerca de sete anos. Pequena, peluda e parceira, daquelas que só falta falar: a Lilica. Conhece o barulho do nosso carro a distancia e já se coloca de prontidão no portão a espera. Conhece quando estamos carregando o carro para viajar e se “soca” pra dentro e dali ninguém tira.

Em uma de nossas idas para nossa terra natal, Cachoeira do Sul, estávamos no interior, onde mora minha mãe, onde ela se juntou aos outros cachorros da casa e saíram a correr pelo campo, voltando algum tempo depois “tapada” de pega-pega.

Sentei-me a sombra do arvoredo, peguei um pente com dentes grandes, e comecei, pacientemente, a limpeza, arrancando tufos de pelos cheios de pega-pega...foi nesse exato momento que me veio a memória uma cena da adolescência, que na solidão da minha tarefa, me fez rir muito...

Cena esta, que passo a relatar agora:

Meu pai era capataz de uma fazenda na localidade de Pedreira, interior de Cachoeira, cujo proprietário era o Sr Werner Nestor Schlabitz.

Seu Werner era pecuarista, dono de um considerável rebanho bovino, do qual meu pai tomava conta. Morava na fazenda também um dos filhos de seu Werner, João Carlos Schlabitz.

Na sede da fazenda, além das casas,  havia um tambo, serraria, oficina, secadeira de grão e galpões onde eram guardados o maquinário. Havia um que era especial... o que chamávamos “galpão dos arreios”, onde eram guardados todas as encilhas e utensílios de montaria e lida com o gado. Era neste galpão que a peonada se reunia na hora do almoço, pois havia ali um fogão a lenha onde cada um aquecia seu almoço.

Após o almoço, alguns se escoravam num lugar ou outro para a sesta, mas a maioria se reunia em torno de uma caixa de madeira onde eram guardados os laços e se “atracavam” no jogo de pife.

João Carlos gostava de se juntar a peonada no carteado com meu falecido pai “Zé do Campo”, seu “Tijo”, seu Antônio Silveira, seu Abilio Cavalheiro e tantos outros, onde eu me incluía, tendo na época não mais do que meus quinze anos.

Certa feita, durante o intervalo do almoço, enquanto uns estavam no carteado, um dos peões foi até um capão de mato atrás do galpão dar uma “volteada”, e voltou de lá com as bombachas cheias de pega- pega, pois havia passado por um trecho de grama e macega alta.

Estava ele com uma faca, esticava o tecido da bombacha com uma das mãos e com a outra, utilizando a faca, raspava os pega-pegas. João Carlos, homem estudado como era, ao ver a cena comentou que pega-pega era um dos melhores alimentos para ovelhas.

-Pega-pega? Questionei

- Sim, é uma leguminosa, parente da soja e do feijão...

(Essa “leguminosa” soou estranho para mim, que só mais tarde fui entender... DESMODIUM INCANUM leguminosas, fixação de nitrogênio, etc...)

De pronto perguntei: - E por que ninguém planta??

-Porque é praticamente impossível“coletar” a semente...

Aquele “coletar” ficou ecoando na minha mente...

Estava eu, cerca de quarenta anos depois, passando um pente na minha cadela para tirar os pega-pegas quando me veio a memória o “coletar”...

Olhei para o céu e ri, falando sozinho: Se tu tivesses uns três ou quatro cuscos iguais a essa tu iria “coletar” pega-pega pra encher caminhão...


Eliana Weber

Da (in)tolerância ao Respeito (Publicado dia 08 de julho de 2022)

Divagando sobre as duas últimas eleições presidenciais, foi possível identificar - a olhos largos-, que as escolhas de voto se justificavam por lutas temáticas e pontuais: de um lado, bandeiras pulsantes contra a corrupção; de outro, bandeiras erguidas em nome das defesas de direitos e prerrogativas. Mas a verdade é que cada cidadão precisou “escolher” uma luta; até aí, tudo dentro dos limites do aceitável.

O problema aumentou quando cada um achou que sua bandeira era mais importante que a outra: neste momento, as lutas passaram a ser pessoais, afastando os homens dos princípios da Fraternidade e do Respeito. Em meio a este turbulento caminho, muitas bandeiras se rasgaram ou se perderam, de ambos os lados.

Entristece ver que a maioria dos litigantes ignoram a mais clara verdade: a de que TODAS estas lutas são dignas - indignos são alguns dos "representantes" que empunham os mastros.

Tenho ouvido, repetidamente, que as pessoas estão sendo “intolerantes”; ouso promover uma correção: tolerar significa suportar, ser indulgente, o que me leva a crer que não é apenas tolerância que está faltando, mas sim uma das maiores virtudes dos seres humanos: o RESPEITO!

 O Respeito vai além da tolerância, pois significa tratar o outro com consideração e deferência. O resgate destas qualidades morais - que parecem ter sido esquecidas nos tempos modernos - merece ter sua própria bandeira sustentada por nossos braços, olhos e corações, trabalhada e fomentada com afinco, de forma a respingar seus efeitos não só na política, mas sobre todas as diferenças.

Quando o Respeito for o baluarte das relações interpessoais, os maiores males humanos serão superados, pois não haverá mais disputa por motivos de credo, não haverá mais preconceito e discriminação e não haverá mais mundos divididos por meras opiniões. Ao agir com Respeito o homem se coloca no lugar do próximo e, assim, será muito mais fácil estender a mão a quem necessita o pão – tanto da carne quanto da alma.

A verdade é que o Brasil, após as eleições, continuará a ser o mesmo (independentemente do resultado), mas o mesmo não acontecerá com as relações humanas. A população, até mesmo a família, parece ter sido dividida em eixos cartesianos extremos, sem qualquer espaço de intersecção. Que triste constatação em um país de múltiplas realidades e, principalmente, de múltiplas necessidades.

Hoje, convido a todos a pensar que podemos erguer ambas as bandeiras, pois a mudança de nosso País inicia pelas nossas próprias e pequenas atitudes. Acredito que as lutas continuarão e que sempre será tempo de nos unirmos às boas batalhas. Assim, quando todos levantarmos uma única bandeira que, "embelezada" pelas cores da diferença, seja capaz de representar a idoneidade e a fraternidade, estaremos acabando com a corrupção e com as desigualdades, conjuntamente!

Utopia, ou não, o maior desejo é o de que possamos defender nossas melhores causas e enfrentar os mais honoráveis combates de mãos dadas e respeitados pelos nossos pares, com o único e comum objetivo de trabalhar na construção efetiva de um futuro melhor!

Índio Cândido

A PROFESSORA QUE MAIS INFLUENCIOU MINHA VIDA (Publicado em 11 de novembro de 2022)

Quando eu era bem jovem, no momento de começar a ser alfabetizado, ainda não existia o sistema de enviar para a escola as crianças antes de seis anos de idade, o Jardim da Infância. Eu morava em Sobradinho, minha terra natal. No início de março de 1949, fui levado, por minha mãe, ao Grupo Escolar Lindolfo Silva (nome da época), para ser matriculado no primeiro ano do Curso Primário para ser alfabetizado.

      Conheci minha primeira professora nesse dia, 2 de março de 1949, uma quarta-feira, quando tinha seis anos e quatro meses. Era a professora Emma Gil Carniel. Eu estava com muito medo e não queria ir para a escola, apesar dos agrados de minha mãe. Mas, logo ao chegar, quando fui apresentado para a professora que teria a incumbência de minha alfabetização, olhei para a ela, e a empatia ocorreu instantaneamente, foi como amor à primeira vista; amei a professora. Já se passaram 73 anos desde esse encontro e eu jamais esqueci da professora Emma.

A partir da decisão de escrever algo para uma publicação em um jornal, um trabalho de conclusão de curso, iniciar a escrita de um livro, compor um verso ou escrever algo, eu não esqueço de tudo o que ela representou em minha vida. Outras professoras e professores tiveram destaque na minha formação, mas a professora Emma foi a mais importante. Ela ter me conduzido para a sala pela mão e me acalmado, indicando a carteira, nome da época, no local de estudar em aula com assento para dois colegas em cada uma; marcou muito.

Recebi um caderno e um lápis para desenhar várias rodinhas, sem sair da linha, uma ao lado da outra, exemplo “O”, “O”. A professora pegou na minha mão e me orientou como pegar o lápis e desenhar as rodinhas. Assim começou, academicamente, minha vida. Depois do desenho da rodinha, foi a vez de colocar uma perninha na parte de baixo, à direta da rodinha, o que caracterizou a letra A. As outras letras vieram a seguir “E”, “I”, “O”, “U”. Com seis meses de aula eu já escrevia muita coisa e lia outras. Estava praticamente alfabetizado, escrevendo meu nome e o nome dos meus pais, tios e avós.

Quem era a Professora Emma? Era filha de Jesus Gil e Rosa Mayor Gil. Nasceu em Santa Cruz do Sul em 16 de setembro de 1925. Ela se formou professora no Colégio Santa Catarina em Novo Hamburgo. Adotou o nome Carniel quando se casou com Luiz Carniel, que estudou no Colégio São Luiz de Santa Cruz do Sul, onde se conheceram e se casaram em 21 de dezembro de 1945. Em janeiro de 1946 vieram residir em Sobradinho. Luiz Carniel era advogado, e ela passou a ser professora no Grupo Escolar Lindolfo Silva, onde se destacou como alfabetizadora.

      Ao longo de minha vida, tive inúmeros encontros com a professora, em visitas a Sobradinho, em eventos e em feiras, como por exemplo, na Feira do Livro de 2013, quando fui lisonjeado com o título de escritor Homenageado da Feira. A Professora Emma veio até a praça para me abraçar e dizer do seu orgulho de ver um ex-aluno homenageado. Essa foi a maior homenagem que recebi, principalmente ao ver seus olhos mareados de lágrimas quando me abraçou.

Meu último encontro com a professora Emma foi em 28 de novembro de 2018, quando fui visitá-la em sua casa pela última vez. Já com idade avançada e quase em coma, não me reconheceu de imediato, mas na hora em que falei junto de seu ouvido quem era eu, ela abriu os olhos, sorriu e falou: Meu aluno! O espírito de professora nunca a abandonou, nem mesmo em seu final de vida, com 96 anos.

      Minha querida professora nos deixou em 1º de janeiro de 2019, para minha tristeza e de muitos outros ex-alunos, tenho certeza. Ela foi especial. Obrigado, meu Deus, por ter colocado a professora Emma Gil Carniel no caminho de minha vida!

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CRISTO ACOLHEDOR E O TURISMO (Publicado no Jorna Gazeta em 25/07/23)

 

      Ao receber o convite para escrever um artigo para ser publicado na Gazeta, veio a pergunta. Escrever sobre qual tema?

      A resposta veio rápida, lembrei como em um relâmpago as visitas que já fiz a outras grandes imagens de Cristo e de santos diversos em algumas cidades do Brasil como turista.

Pensando no futuro do fluxo turístico/religioso que se formará em Sobradinho, apesar do ceticismo de alguns, em função da imagem do CRISTO ACOLHEDOR, ainda em construção, e já está suscitando curiosidades que logo se transformarão em visitas de romeiros.

      Ao todo são 112 cidades brasileiras que ostentam estátuas de Cristo em 14 estados. Tive a oportunidade de visitar algumas destas cidades e suas belas estatuas de Cristo e, também, de outros santos e santas, como foi o caso de São José de Ribamar, no Maranhão, que nos apresenta uma linda imagem de São José que leva pela mão uma estátua menor do Menino Jesus. Este símbolo deu o nome da cidade que fica bem perto da capital São Luiz, no Maranhão e anualmente recebe uma grande quantidade de turistas que vêm especialmente para visitar São José do Ribamar e participar das muitas festividades anuais realizadas em função da imagem de São José.  

      Outra imagem que visitei e senti uma imensa emoção foi em Juazeiro do Norte, no Ceará, considerada a capital da fé, quando ao me ajoelhar frente à imagem de Padre Cícero. Esta imagem tem 27 metros de altura e está localizada no alto do morro do Horto e recebe 2,5 milhões de visitantes anualmente, segundo o IBGE. A cidade tem 255.648 habitantes, e o turismo é sua maior fonte de renda.

      Nesta mesma ocasião visitei a estátua de Santa Rita de Cássia em Santa Cruz, no Rio Grande do Norte, com 42 metros e está sobre um pedestal de seis metros. Essa é uma das estátuas mais lindas do Brasil, atrai inúmeros romeiros e é difícil não se emocionar ao olhar e rezar para Santa Rita de Cássia, junto de sua estátua.

      Uma das imagens de Cristo mais marcantes do Brasil está em Balneário Camboriú, em Santa Catarina, o Cristo Luz com 33 metros de altura, instalada sobre um morro de 150 metros que é visto de quase toda a cidade, pesando 528 toneladas, e a principal atração está na variada iluminação que durante a noite destaca a imagem. As variações de tonalidades de luz estão caracterizadas em cada dia da semana: segunda-feira, amarelo – Paz e Energia: terça-feira, verde – Paz e Natureza: quarta-feira, azul – Paz e Saúde: quinta-feira, lilás – Paz e Reflexão: sexta-feira – vermelho – Paz e Amor: sábado, rosa – Paz e Felicidade.

      Mais recentemente foi finalizada a construção do Cristo Protetor da cidade de Encantado, no Rio Grande do Sul, com 43,5 metros, é maior que a imagem do Cristo Redentor do Rio de Janeiro. De imediato à sua inauguração os turistas começaram a visitar a cidade em função do Cristo. Diga-se que na cidade muitas pessoas foram contra a implantação do Cristo, fato que ocorreu em diversas cidades brasileiras, inclusive em Sobradinho, onde houve a necessidade de um plebiscito para garantir a implantação do Cristo Acolhedor.

      O Cristo Acolhedor de Sobradinho ainda não está pronto e muitas pessoas de diversas localidades já estão interessadas em saber algo sobre a imagem, vias de acesso, e inclusive, planejando visitas à cidade em futuro próximo.

      Pela experiência que tenho em turismo, afirmo com certeza de que haverá uma grande surpresa pelo interesse que a região vai despertar quando o Cristo Acolhedor estiver pronto.

      O turista religioso e peregrino é um visitante diferente; ele não é levado a grandes festas e bebidas. Quer um local calmo para dormir: Hotel, Pousada, Hostel ou Cama Café, e local para uma boa alimentação e visitas a eventuais pontos turísticos existentes. No caso do Centro Serra Gaúcho: Roteiro dos Casarões, festas ocasionais, como Feira do Livro, Festa do Colono, Festa do Pinhão, Festa do Peixe e outras que podem ser melhor divulgadas junto às Operadoras que já demonstram interesse em visitar Sobradinho.

      Certamente novas unidades habitacionais de hotelaria serão necessárias. Algumas excursões, que já circulam na região: Santa Cruz do Sul, Candelária, Quarta Colônia e outras, aqui vão chegar, inicialmente de passagem, para conhecer o CRISTO ACOLHEDOR e passarão a se interessar para visitas mais frequentes. Essa é uma certeza que minha experiência afirma sem medo de errar.

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CRISTO ACOLHEDOR E O TURISMO

 

        

         O que escrever para a coluna da Academia Centro Serra de Letras na Gazeta? A resposta veio rápida. Lembrei-me das visitas que já fiz a outras grandes imagens de Cristo e de santos diversos em algumas cidades do Brasil como turista.

         Ao todo são 112 cidades brasileiras que ostentam estátuas de Cristo em 14 Estados. Tive a oportunidade de visitar algumas destas cidades e suas belas estátuas de Cristo e de outros santos. Uma delas é São José de Ribamar, no Maranhão, com uma linda imagem de São José que leva pela mão o Menino Jesus. Este monumento deu o nome à cidade, que anualmente recebe uma grande quantidade de turistas que vêm especialmente para visitar São José do Ribamar e participar das muitas festividades anuais aí realizadas.  

         Outra imagem que visitei foi a do Padre Cícero, em Juazeiro do Norte, no Ceará, considerada a capital da fé. Esta imagem tem 27 metros de altura e está localizada no alto do morro do Horto e recebe 2,5 milhões de visitantes anualmente, segundo o IBGE. A cidade tem 255.648 habitantes, e o turismo é sua maior fonte de renda.

         Na mesma ocasião visitei a estátua de Santa Rita de Cássia em Santa Cruz, no Rio Grande do Norte, com 42 metros, que está sobre um pedestal de seis metros. Essa é uma das estátuas mais lindas do Brasil, atrai inúmeros romeiros e é difícil não se emocionar ao olhar e rezar para Santa Rita de Cássia, junto de sua estátua.

         Uma das imagens de Cristo mais marcantes do Brasil está em Balneário Camboriú, em Santa Catarina. O Cristo Luz, com 33 metros de altura sobre um morro de 150 metros, é visto de quase toda a cidade. A principal atração está na iluminação que durante a noite destaca a imagem. As variações de tonalidades de luz estão caracterizadas em cada dia da semana: segunda-feira, amarelo – Paz e Energia: terça-feira, verde – Paz e Natureza: quarta-feira, azul – Paz e Saúde: quinta-feira, lilás – Paz e Reflexão: sexta-feira – vermelho – Paz e Amor: sábado, rosa – Paz e Felicidade.

         O Cristo Protetor na cidade de Encantado (RS), com 43,5 metros, é maior que a imagem do Cristo Redentor do Rio de Janeiro. Logo após a inauguração, os turistas começaram a chegar.

         O entorno no Cristo Acolhedor de Sobradinho ainda não está pronto, mas muitas pessoas, de diversas localidades, já estão interessadas em saber algo sobre a imagem, vias de acesso, inclusive planejando visitas à cidade em futuro próximo.

         Pela experiência que tenho em turismo, afirmo com certeza que haverá uma grande surpresa pelo interesse que a região vai despertar quando o Cristo Acolhedor estiver pronto.

         O turista religioso e peregrino é um visitante diferente; ele não é levado a grandes festas e bebidas. Quer um local calmo para dormir: hotel, pousada, hostel ou cama/café, e visita a outros pontos turísticos existentes no local. No caso da Região Centro Serra do RS, há o Roteiro dos Casarões, festas ocasionais, como Feira do Livro, Festa do Colono, Festa do Pinhão, Festa do Peixe e outras que podem ser melhor divulgadas junto às Operadoras que já demonstram interesse em visitar Sobradinho.

         Certamente novas unidades habitacionais de hotelaria serão necessárias. Algumas excursões, que já circulam na região: Santa Cruz do Sul, Candelária, Quarta Colônia e outras, aqui vão chegar, inicialmente de passagem, para conhecer o CRISTO ACOLHEDOR e passarão a se interessar para visitas mais frequentes. Essa é uma certeza que minha experiência na área afirma sem medo de errar.


 

ÍNDIO CÂNDIDO – Sócio Honorário da Academia Centro Serra de Letras 

Larissa Scherer 

A sensibilidade, o encantamento e a diferença na educação (Publicado dia 04 de novembro de 2022)

         Nasci em Sobradinho, estudei em Porto Alegre, cursei Letras, trabalhei na área de Comunicação, fiz especialização, mestrado e hoje sou professora no IFSul, campus Pelotas. Quando criança, lia muito e gostava da escrita. Como a arte imita a vida ou vice-versa, também vivi muitas histórias. Li e inventei mundos para respirar em meio ao cotidiano por vezes cansativo e caótico. A literatura salva. Das narrativas e poesias que me fizeram crescer como pessoa, dos textos que pari com muita dificuldade, nasceu uma aprendiz de escritora e uma professora sensível.

         Como estrangeira na terra de Fernando Pessoa, nutri a convicção de que sou “eterna aprendiz”. Nada me desconcerta mais do que ter o “pasmo essencial” de que é possível nascer “nova” e “diferente” a cada momento. A “eterna novidade do mundo”, do heterônimo Alberto Caeiro, inspira-me a perseguir o olhar nítido de um girassol direcionado sempre à luz.

         Outro heterônimo, Álvaro de Campos, diz assim: “Não sou nada / Nunca serei nada / Não posso querer ser nada / À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo”. Como o eu-lírico, me vejo em constante processo, atenta ao outro, afetando e sendo afetada, buscando incentivar os outros a viverem seus próprios sonhos. Concordo com Antonio Candido, em “O direito à literatura”, quando ele defende que essa última é ou deveria ser um direito básico do ser humano, pois tanto a ficção quanto a fabulação atuam no caráter e na formação dos sujeitos.

         Nesse percurso como leitora e mulher, ser docente tem passado, sobretudo, por ensinar e aprender, ser sensível aos movimentos das aulas, atenta aos aprendizados que aparecem alheios aos planejamentos, em meio às rotinas exaustivas de repetições e obviedades, ou seja, procurar produzir conhecimentos. Para ser sensível e encantar, é necessário primeiramente ser encantado(a). Eu fui encantada pela ficção e pela fabulação, por professores incríveis, especialmente quando fui aluna da rede federal de ensino.

         Nesse caminho, descobri que o presente é tudo o que temos, com a coragem de ser imperfeita. Somos seres melhores se amarmos uns aos outros: “Honrar a nós mesmas, amar nossos corpos, é uma fase avançada na construção de uma autoestima saudável”, diz Bell Hooks. Sonhos são possíveis ao encarar a vida com "vontade de potência", conceito cunhado pelo filósofo Friedrich W. Nietzsche. Com um “realismo esperançoso”, como dizia Ariano Suassuna, sem perder de vista a criança criativa que vive dentro de cada um de nós.

         Nesses últimos meses, tenho vivido lembranças que, por serem memórias narradas, produzem acontecimentos. O desejo, de ser sensível, de encantar e ser encantada, de sonhar com dias melhores, passou por momentos difíceis. Pensa comigo: se fôssemos todos iguais, tivéssemos os mesmos anseios e buscássemos seguir o mesmo caminho, a diversidade, com todas as suas cores, não estaria garantida.

         A vida é colorida quando: escutamos, respeitamos e toleramos o outro; observamos o singular e o plural no cotidiano e nos deixamos influenciar por uma existência mais poética e fabulada. A vida-docência, portanto, pode ser sensível, encantadora e diferente para quem ousa ser o que é, busca autoconhecimento, mesmo que isso ilumine a sombra de quem ainda tem receio de “sair fora da caixa”. Com a licença poética de Adélia Prado, “Mulher é desdobrável. Eu sou”.

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Sobre o prazer de ensinar

 

                     O educador da atualidade busca mais consciência sobre sua prática e encontra os seus próprios métodos. Identifico-me com bell hooks, quando afirma: “[...] o prazer de ensinar é um ato de resistência que se contrapõe ao tédio, ao desinteresse e à apatia onipresentes que tanto caracterizam o modo como professores e alunos se sentem diante do aprender e do ensinar, diante da experiência de sala de aula”,  (“Ensinando a transgredir: educação como prática da liberdade”, 2013, p. 20)

         No que se refere às aulas de língua portuguesa e de literatura brasileira, acredito que devem acompanhar o cenário de mudanças e incertezas da atualidade, ou seja, é necessário “refazer-se na/pela pesquisa” em consonância com a educação pela pesquisa proposta por Pedro Demo. O ensino de gramática, quando realizado, é acompanhado de discussões relacionadas à língua efetivamente em uso e atento à perspectiva sociointeracionista da língua. Quanto ao ensino de literatura brasileira, mais vale a leitura e interpretação de textos curtos, tais como contos, crônicas e poesias, inter-relacionando períodos literários com outras artes e linguagens. Costumo criar materiais didáticos autorais, às vezes, sigo a sequência básica do letramento literário, constituída por quatro passos: motivação, introdução, leitura e interpretação, proposta por Rildo Cosson.

         Ler em sala de aula é um dos métodos mais efetivos para incentivar a leitura, além de pesquisar referências interessantes. É salutar fazer curadoria de obras, propor leituras comentadas, mediar círculos de leitura e frequentar bibliotecas. Para entender o Brasil, costumo ler autores e pensadores indígenas e negros, tais como Ailton Krenak, Davi Kopenawa, Eliane Potiguara, Sueli Carneiro e Lélia González.

         Em âmbito institucional, tenho colaborado pelo cumprimento da Lei 10639/2003 que estabelece a obrigatoriedade do ensino de "história e cultura afro-brasileira" dentro das disciplinas que fazem parte das grades curriculares dos ensinos fundamental e médio. Nesse sentido, proponho leituras de autores negros e abordo temas antirracistas, além de defender o ensino público, gratuito e acessível para todos.

         Mais recentemente, tenho buscado compreender a aula como uma matéria-pensamento em movimento, à luz de Gilles Deleuze. Um dos principais objetivos da filosofia de Deleuze foi restituir ao pensamento a sua potência criadora, que estava sufocada pela hegemonia da perspectiva representacional. De certo modo, o pensar não é visto como uma atividade voluntária, reflexiva e universal, qual seja, está ligado ao comprometimento com o viver. Em Proust e os signos (2003), Deleuze faz uma modificação dos principais conceitos do modelo de representação, mostrando que o pensamento tem relação com algo que afirma um estilo criador. Portanto, meu interesse de pesquisa na atualidade, nas relações entre literatura, filosofia e educação, passa por reafirmar a aula como um encontro, uma matéria musical movente que nos entrecruza, ou seja, algo pode acontecer enquanto nos movimentamos, mais atentos ao processo e menos aos resultados. Desse modo, o prazer de ensinar pode ter relação com esse encontro, essa emoção, essa alegria de viver.

 

Larissa Scherer é professora de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira no ensino médio integrado, graduação e pós-graduação lato sensu em Linguagens Verbo-Visuais e suas Tecnologias no Instituto Federal Sul-rio-grandense em Pelotas, doutoranda em Educação e membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras.


Uma viagem pelos “Brasis”


Tivemos a oportunidade de fazer uma viagem em família, cruzando alguns estados do Brasil, totalizando 6836 km, ida e volta de Pelotas (RS) a Vitória da Conquista (BA). Ufa! Partimos no dia 7 dezembro para a praia da Pinheira (SC), pegamos chuva, mas não desanimamos, pois a ideia era “viver o processo”. Chegamos em Curitiba e curtimos a organização da cidade, a arquitetura do Museu Oscar Niemeyer, além da exposição “Extravagâncias” da artista portuguesa Joana Vasconcelos. Após uma viagem demorada, o primeiro dia foi em Sampa: vimos a Estação da Luz, a Pinacoteca de São Paulo, caminhamos pela Rua 25 de Março, tomamos um chopp no Mercado Municipal de São Paulo (não recomendo) e fizemos umas comprinhas na Galeria do Rock. No dia seguinte, curtimos um café no Museu de Arte de São Paulo, onde vimos obras de artistas consagrados como Vincent Van Gogh, Pablo Picasso, Anita Malfatti, dentre outros, e a Exposição Histórias Indígenas, contando diferentes pontos de vista sobre as narrativas dos povos originários da América do Sul, da América do Norte, da Oceania e da Escandinávia, com curadora de artistas indígenas. Levamos uns sustos na exposição “Terror no Cinema” no Museu da Imagem e do Som e, à noite, comemos a tradicional pizza paulista na casa de um primo. No dia seguinte, conhecemos o belíssimo Museu da Língua Portuguesa e o Aquário de São Paulo. Nesse último, o “auge” foi presenciar a alimentação dos tubarões. Finalizamos a visita com uma caminhada pela charmosa e tradicional Vila Madalena e pelo Beco do Batman.

Pegamos a estrada em direção a Paraty (RJ) e nos encantamos com as paisagens... nem tanto com o apartamento do Airbnb. Viagem é feita também de perrengues. Então, “bora” resolver e “partiu” para uma pousada charmosinha de última hora. Dia seguinte, fizemos uma trilha espetacular, saindo da praia da Trindade para conhecer uma piscina natural na praia do Cachadaço e interagimos com peixinhos nadando no mar. Subimos um trecho da Estrada Real, por uma estrada asfaltada íngreme por onde escoava a produção mineira de ouro. Os ares da Serra de São José, a temperatura amena, o cafezinho, o pão de queijo, a manteiga mineira doada pela anfitriã, a calmaria... a decoração de Natal, as igrejas, quantas belezas! Tiradentes é mais calma que a cidade de Ouro Preto. Para ver as esculturas de Aleijadinho, o ideal é visitar Congonhas, então, vimos o triunfal Santuário de Bom Jesus de Matosinhos, com 13 imagens dos profetas, esculpidas em pedra-sabão, retratadas na indumentária da ala das baianas pela Mocidade, no Carnaval do Rio de Janeiro neste ano.

Após passar o Natal e o Ano Novo em Vitória da Conquista, viajamos para Arraial d´Ajuda (BA), uma vila com um clima agradável onde o sol nunca deixa de aparecer, com muitas opções gastronômicas para todos os gostos. Sol, mar azulzinho e quente: uma delícia. Porém, o que me desconcertou foi a privatização da área da praia: paga-se uma taxa específica de consumo para sentar em qualquer área, com exceção de algumas mais isoladas, como a praia de Pitinga a qual recomendo. Também fizemos o passeio de balsa para conhecer a Rota do Descobrimento em Porto Seguro com o apoio de um guia.

De Arraial fomos a Vitória, um destino pouco conhecido e lindo, talvez porque suas correntes marítimas sejam mais frias, mas para quem tomou banho no Oceano Atlântico em Lisboa, o banho gelado é “fichinha”. A beleza da capital do Espírito Santo é comparada ao Rio de Janeiro, excetuando-se a violência e a “muvuca”. Então, partimos para Belo Horizonte (MG), local com cultura e povo acolhedores, além de culinária inesquecível. No primeiro dia, fomos à Praça da Liberdade e visitamos o Memorial Minas Gerais Vale, almoçamos no Mercado Municipal, fomos ao Museu da Moda e apreciamos a exposição de Arte Contemporânea Mundial NOW, no Museu Inimá de Paula. No segundo dia, visitamos o Espaço do Conhecimento da UFMG e o Museu das Minas e do Metal, almoçamos no bairro Lourdes; à noite, visitamos a exposição “Hélio Oiticica – Delirium Ambulatorium”, no Centro Cultural Banco do Brasil, com instalações, pinturas e manifestações que influenciaram gerações de artistas plásticos, músicos e pensadores.

Dessa viagem inesquecível, retornamos no final de janeiro, mais confiantes da ideia de que: “ao chegar a uma nova cidade, o viajante reencontra um passado que não lembrava existir: a surpresa daquilo que você deixou de ser ou deixou de possuir revela-se nos lugares estranhos, não nos conhecidos”.*

Larissa Scherer, professora de língua portuguesa e literatura do IFSul, campus Pelotas, membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras.

* O passado do viajante muda conforme é narrado, assim como Marco Polo narra suas aventuras a Kublai Khan em “Cidades Invisíveis” (escrito por Italo Calvino, p. 28).



Benhur Maieron

O Brasil de Bombachas (Publicado dia 28 de outubro)

 

No dia 11.1.2011 eu recebia o e-mail de um amigo informando sobre reportagem do jornal Zero Hora refazendo viagem de 1995, que resultou no livro “O Brasil de Bombachas”, do Carlos Wagner, lançado naquele ano, relatando a odisseia da gauchada que migrara do sul para o oeste do Brasil entre as décadas de 1950 e 1980 e que poderíamos acompanhar a viagem pelo Facebook, rede social da qual eu não era membro, mas entraria duas semanas depois. Abaixo, um resumo do e-mail:  

“O Brasil de Bombachas é uma região que se estende pelos países vizinhos e por estados brasileiros ao norte do Rio Uruguai, povoada por gaúchos que saíram em busca de melhores dias para suas famílias. Muitos foram abatidos por doenças tropicais, fome e conflitos por terra. Os sobreviventes ajudaram a erguer uma das regiões mais desenvolvidas da América do Sul. Essa história foi contada por Zero Hora em 1995, quando percorremos mais de 30 mil km em dois meses de estrada. Mais de 200 pessoas foram ouvidas, resultando no livro O Brasil de Bombachas. Agora estamos refazendo a viagem para conversar com a geração que herdou o legado deixado pelos “velhos”. Se você é um desses gaúchos que deixou o Rio Grande em busca de um sonho, mande aqui seu relato; ele poderá ser usado na reportagem”.

No dia 24.1.2011, acontecia minha primeira participação via internet nessa nova viagem, sendo um resumo do meu comentário publicado na página 94 do livro impresso em 2011: “Sou militar, natural de Sobradinho (RS). Entre os anos de 1979 e 1997, servi em Manaus (AM), e nos anos 2007 e 2008, em Humaitá, também no Amazonas. Nesta cidade, tive a oportunidade de ler seu livro O Brasil de Bombachas, edição de 1995, e de conhecer o gaúcho da capa, o João Röhleder, que atualmente apresenta o programa Integração em uma emissora de rádio. Conheci muitos outros gaúchos ou descendentes: Onei Rossato, de Tucunduva; Altemir Gallina, de Tuparendi; Leonardo e Eduardo Röhleder, de São Borja; João Pedro Ciscato, de Jaguari, e tantos outros. Escrevi alguns artigos sobre essa nobre gauchada que tanto tem contribuído para o desenvolvimento do país, publicados em jornais aí do Rio Grande”.

Nas semanas seguintes, à medida que os repórteres seguiam na direção norte, eu ia postando meus comentários, sempre informando que eu conhecia quase todas as cidades por onde estavam passando.

Detalhe: não se trata de um livro com duas edições, mas sim de dois livros com o mesmo nome e assunto, mas com datas e personagens diferentes. O livro de 1995 é facilmente encontrado nos sites de venda na internet; o de 2011 é mais raro. Aos residentes em Sobradinho informo que ambos estão disponíveis na nossa Biblioteca Pública/Casa da Cultura.

Benhur Luiz Maieron, membro correspondente da ACSL, cadeira nº 23, residente em Brasília desde 1997. benhurmaieron@yahoo.com.br


As matinês do cine Guarani


O objetivo aqui não é registrar a história das sessões de cinema nas tardes dos sábados e domingos no cine Guarani, em Sobradinho-RS, mas sim o que acontecia na calçada em frente. Lógico que o escrevinhador aqui assistiu a muitos filmes naquelas agradáveis tardes. Os filmes de guerra, de aventura e os épicos não perdia um sequer.

Então, vamos ao objetivo: antes das sessões cinematográficas, um grupo de meninos (só meninos, coisa de macho!) se reunia na calçada em frente ao cinema, próximo ao atual quiosque da Praça 3 de Dezembro, para a troca de revistas em quadrinhos, ou gibis. Gibi, que significava moleque ou negrinho, era o título de uma revista em quadrinhos lançada em março de 1939 pelo grupo Globo. Os quadrinhos, no entanto, começaram no Brasil bem antes, em janeiro de 1869, com histórias escritas e desenhadas pelo imigrante italiano Ângelo Agostini e publicadas no jornal Vida Fluminense (Rio de Janeiro-RJ).

Voltando a um tempo mais recente e à calçada do nosso cinema, lá pelas décadas de 1960/70, aquela meninada ia chegando com um maço de revistas debaixo do braço, colocava na calçada e as trocas começavam. Havia normas que não eram escritas, mas que todos cumpriam: revistas coloridas valiam muito mais que as preto e branco e o mesmo se aplicava às revistas em bom ou mau estado; uma revista com capa poderia ser trocada por até 10 sem capa; revistas femininas, como Luluzinha, Mônica ou fotonovelas, nem pensar. Aquilo era coisa de menina. Para aqueles machinhos, só interessavam os grandes heróis: Batman, Capitão América, Fantasma, Flash Gordon, Homem de Ferro, Hulk, Príncipe Submarino, Quarteto Fantástico, Tex, Thor, Vingadores, X-Man, Zorro e tantos outros, ou então os bichinhos falantes: Mickey, Pateta, Pato Donald, Pica-Pau, Tio Patinhas, Zé Carioca... A lista é grande.

Mas o tempo, esse malvado, faz a voz engrossar e aquele grupinho foi aos poucos diminuindo, sem que aparecessem novos membros. No meu caso, já adolescente, fui aos poucos me desfazendo das centenas de revistas que possuía, doando todas elas à criançada da vizinhança. Não lembro quando começaram e terminaram aquelas trocas e nem quem eram os meninos. Infelizmente, não há nenhuma foto daqueles encontros. Restou daquilo tudo apenas uma imensa saudade.

Benhur Luiz Maieron

Membro correspondente da ACSL, cadeira nº 23

benhurmaieron@yahoo.com.br

 


Luiz A.L. Baggiotto

REFLEXÕES (Publicado em 06 de dezembro de 2022)

         Se quisermos ter uma noção exata dos termos a serem utilizados quando desejamos nos expressar com propriedade, mesmo que inconscientemente, vamos utilizar técnicas que na sua origem se mostram bastante complexas e que só quem as estudou domina. Se eu disser que sou humano e todo o humano cedo ou tarde vai morrer, evidente que estou dizendo uma verdade e não utilizei figura alguma de linguagem para justificar essa afirmação. Porém o filósofo Aristóteles que viveu no século IV a.C. foi além. Desenvolveu uma técnica eficaz para provar se uma sentença tem ou não nexo causal: o silogismo. Em tempos recentes surgiu outra ferramenta eficaz para aperfeiçoar ainda mais o raciocínio lógico: a semiótica. Claro está que na prática a aplicação com propriedade dessas técnicas só é acessível aos iniciados. Porém o seu alcance é universal: utiliza tanto o leigo de maneira instintiva como o literato de forma consciente. Trata-se, portanto, de uma regra universal que vai muito além de uma simples argumentação acadêmica.

         Mas, afinal, o que tem isso a ver com o tema proposto? Simplesmente que existem verdades absolutas e também verdades relativas. E também instrumentos adequados para identificá-las. Faz-se necessário, portanto, sermos seletivos e eficazes em nossas escolhas ao construirmos uma tese. E o significado da palavra sucesso presta-se muito bem para tais considerações.

             Para a nossa vida o que realmente interessa é identificar qual a premissa maior do significado que o termo sucesso no seu sentido amplo sugere. Logo, faz-se necessário limitar a abrangência do universo global para o meu universo particular como integrante de uma sociedade multicultural. Por conseqüência, não interessará em nossas considerações tratar o assunto do ponto de vista puramente de sucesso financeiro, por exemplo, embora possa ser até subentendido como uma conseqüência lógica do sucesso pessoal, mas que se nos afigura ser apenas uma parte da equação a ser considerada. Premissa que surge devido ao fato de que a grande mídia costuma fazer uma analogia entre riqueza e poder para situar uma pessoa como sendo bafejada ou não pelo sucesso.

             É obvio que se esposarmos a tese proposta pela visão midiática o sucesso seria uma realidade para um público muito reduzido. Contudo, dentro da lógica ditada pela filosofia judaico-cristã, base da civilização ocidental, o sucesso vai além de uma visão simplista baseada apenas na posse de bens materiais. Complementam o mix de necessidades para chegar ao sucesso uma gama de valores intangíveis, espirituais, capazes de moldar o caráter do indivíduo tornando-o uma pessoa proativa e útil para a sociedade onde vive e atua. Veja bem. Essa é uma visão macro do mundo ocidental sujeita a interveniências e passível de relativismos se cotejadas com outras culturas. 

             De modo que, para a nossa realidade, devemos ter em mente sempre que o livre arbítrio deve prevalecer para fazermos as escolhas mais pertinentes observando os ditamos da ética e da moral vigentes na comunidade onde o individuo se insere.  Daí que enquanto para alguns o sucesso está em acumular bens materiais, já para outros possuírem o suficiente para levar uma vida tranqüila e digna já será o suficiente. Significa, portanto, que o conceito de sucesso é muito relativo.  Depende tanto das ambições pessoais como das oportunidades que o mercado oferece. 

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RELEMBRANÇAS DO PASSADO (Publicado no Jornal Gazeta em 28/08/23)

 

         Quando jovem ficava extremamente vexado ao ouvir alguém de mais idade apelar para o clássico chavão: “Ah! No meu tempo ...” para justificar ou reforçar um argumento ou opinião. Para começar, amigão, o tempo é o mesmo. Apenas foram as pessoas que mudaram na sua forma de agir e pensar.  Portanto, não foi o tempo que mudou e sim as pessoas que mudaram em função dos avanços tecnológicos. Daí que nós, os mais vividos, não temos mais o direito de incorrer no mesmo erro.  Pode, pois, o leitor ficar tranqüilo que a presente abordagem não será preconceituosa nem invasiva. Apenas pretende expor alguns aspectos do quotidiano que, com o passar dos anos, sofreu variações conceituais ou ressemantizações. Isto porque a palavra chave para que as diferentes gerações se entendam e se complementem continua sendo e sempre será a cultura da relativização.

             Pois bem! Partindo dessa premissa é óbvio que os usos e costumes sofreram mudanças estruturais já que todos sabem que os ciclos na transmissão dos conhecimentos humanos se estreita e se aperfeiçoam continuamente com o passar do tempo. Assim, tudo o que a humanidade faz ou produz parte sempre de onde um agente anterior parou. Essa é a característica básica que diferencia um humano de um animal. E a prática dessa metamorfose atinge cedo ou tarde todas as atividades exercidas no universo terráqueo. Um exemplo clássico para comprovar essa tese pode ser buscado na religião católica. Tracemos um paralelo entre o que aconteceu com os seculares ritos canônicos antes e depois do Concilio Vaticano II para nos certificarmos de que até eles foram contaminados pela modernidade.

             Então, na esteira dessas considerações podemos deduzir que o homem agindo no meio ambiente enseja um eterno devenir.  Logo, seria enfadonho enumerar tudo o que mudou ao longo dos últimos anos. Ou seja, de quando nascemos, mesmo que tenhamos apenas 20 ou 30 anos e os dias atuais. Assim, poderíamos discorrer sobre a física quântica, a evolução dos meios de transporte terrestres, aéreos, fluviais, lacustres e marítimos, nos armamentos convencionais e atômicos, nos meios de comunicação social através do rádio, do jornal e da TV, do ultramoderno ChatGPT atrelado a IA (inteligência artificial) e por aí vai. Para exemplificar fixemo-nos apenas no “patinho feio” das comunicações de poucas  década atrás, o telefone. Oficialmente surgido no dia 10 de março de 1876 quando Graham Bell convocou o seu auxiliar Thomas Watson através de um fio metálico: "Senhor Watson, venha cá. Preciso falar com o senhor". Seguiram-se alguns melhoramentos pontuais. Contudo, sem alterar a estrutura do invento até a chegada do ano de 1969 quando se iniciou uma revolução mediante a utilização do satélite como estação para a irradiação das mensagens sonoras e iconográficas em nível global. Na seqüência, em 1978, surgiu no Japão a telefonia móvel celular. Daí para cá as aplicações dessa tecnologia se disseminou no contexto social de todas as classes em progressão geométrica independente do seu poder econômico. Hoje é o equipamento mais utilizado globalmente. Tem-se na palma da mão qualquer informação que se queira graças a utilização dos sinais enviados via satélites. Se até pouco tempo atrás era um aparelho destinado a transmitir e receber mensagens, hoje se constitui em um banco de dados que substituiu praticamente todas as mídias. E, certamente, novas aplicações ainda surgirão.

             Apenas para nos situarmos convém lembrar que em tempos não tão distantes, ou seja, na década de cinqüenta, a maioria das escolas interioranas se compunha de um espaço unicelular onde uma única professora lecionava para todos os níveis de aprendizado, que o normal era cada família comprar o tecido para confeccionar o seu próprio vestuário, que ao invés de supermercados existiam “vendas” de “secos e molhados”, que os veículos além de raros eram todos importados e movidos à gasolina, que a iluminação na área rural era feita com lampiões a querosene, etc., etc. Exemplos que servem para ilustrar como o progresso caminha a passos largos e atinge todos os públicos.

             Resumindo. Tempo bom é aquele no qual se vive. Nunca se aplica tão bem o adágio que o futuro só a Deus pertence. Passam os anos, mudam-se os costumes, porém a humanidade perseguirá sempre o mesmo objetivo; buscar melhorias para conseguir um nível de vida melhor para a sua geração.         

Luiz A.L. Baggiotto - Membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras – Cadeira 24


Catiani Renata Salvati

A EDUCAÇÃO COMO ESTRATÉGIA NA LUTA ANTIRRACISTA (Publicado dia 18 de novembro)

Falar sobre racismo é um tanto complicado. Escrever sobre também não é tarefa fácil. Imaginem então escrever sobre a influência da escola na formação étnica dos alunos. O fato é que a questão que envolve o preconceito racial ainda é muito tênue na sociedade. Pois bem! Vamos partir do princípio de que o ambiente escolar envolve uma variedade enorme de possibilidades. Entre elas as que se destacam são o fortalecimento de habilidades específicas em cada componente curricular e a oportunidade de integração e trocas de experiências e vivências. Neste sentido, analisar como a identidade afro-brasileira se desenvolve tem no contexto escolar campo expressivo, sobretudo em tempos onde o preconceito racial toma proporções nunca vistas anteriormente. A educação, portanto, é considerada estratégica nas propostas de combate ao racismo e às formas correlatas de preconceito. Sendo assim, uma nova perspectiva de debate acerca da identidade nacional e, especialmente, do papel do negro na sociedade alcança espaço no ambiente escolar. Dentre as questões relacionadas a essa temática, problematizar a produção de discursos sobre etnicidade e racismo no ambiente escolar e a forma como a nova legislação curricular é percebida e implementada nas escolas ganha destaque.

A institucionalização de propostas oriundas do Movimento Negro, como a legislação de cotas e a Lei 10.639/2003, que instituiu no currículo a obrigatoriedade do ensino da História e Cultura Afro-Brasileira na Educação Básica de escolas públicas e privadas veio trazer uma nova forma de perceber o negro na sociedade. Esta última, especialmente, trouxe a necessidade de formação docente para que a lei fosse de fato implantada.

A Lei 10639/2003, em especial, como legislação que obriga as escolas promoverem a implementação de ações sobre a história e cultura africana, desperta um emaranhado de questionamentos. Há os que questionam a necessidade, outros manifestam estranheza por ser uma lei que de certa forma beneficia apenas os negros e há os que lamentam a existência de uma lei que para ser implementada necessita de formação para os docentes, fato este que ainda deixa muito a desejar por parte do governo. Nesta perspectiva é importante salientar que a lei tem como fundamentação em sua origem diminuir a distância entre África e o Brasil. É necessário haver uma desconstrução da visão sobre o negro desde o período escravocrata até os dias de hoje, que inferioriza a cultura africana, que por sinal é tão presente no nosso cotidiano. Neste sentido organizar estratégias para desenvolver tal lei no âmbito escolar é fundamental e a possibilidade de trabalhar com questões que envolvem a história, cultura e manifestações de origem africana são inúmeras e fáceis de serem trabalhadas como, por exemplo, a simples interpretação de um poema, como o abaixo, que pode trazer diversas análises e desencadear diálogos importantes sobre esta temática. Aproveitemos o dia da Consciência Negra que ocorre no dia 20 de novembro para dinamizarmos ações neste sentido.

Ser negro…

Não se resume à questão de pele

Não se resume à questão dos cabelos crespos.

Ser negro é

Sentir-se negro num país miscigenado.

Assumir as suas raízes.

Ser negro é ter

Coragem.

Atitude.

Ser negro é

Lutar para ser igual nas diferenças.

Acreditar que não é inferior a ninguém.

Ser negro

Ter princípios.

Valorizar a beleza.

Ser capaz.

Fazer acontecer neste país onde pessoas

ainda são influenciadas por ideias pré-concebidas.

Enfim

Ser negro é “ser humano”!

Robélia Aragão

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PROFISSÃO PROFESSOR

         Durante a infância, por influência especial de meus pais pensava que ter uma profissão era algo certo na vida de todas as pessoas. Mal sabia eu o quanto difícil era escolher a profissão a seguir quando adulta, mas penso que brincar de aulinhas na sombra dos pés de bergamoteiras com minhas irmãs, já era um indício de que seguiria o magistério.

         Emociona-me recordar meus ex-professores que foram de certa forma minha inspiração. Lembro-me daquela que caminhava quilômetros até chegar à escola e brincava conosco na geada perguntando quem de nós havia espalhado farinha na grama. Lembro-me também daquela que me ensinou tricotar, daquela que defendia os menos favorecidos, daquela que conversava sobre a vida e sobre a possibilidade de realizarmos qualquer sonho. Inesquecível também foi aquela que me alfabetizou. Essa foi mais do que especial, pois transmitia carinho ao mesmo tempo em que era enérgica. Na época era mais que natural chegar à escolinha e encontrar atrás da porta uma vara de vime que era usada como uma das muitas ferramentas auxiliares na “educação”. O que hoje seria visto como violência, na época era simplesmente algo tido como normal em uma escola e, inclusive com aprovação dos pais dos alunos. Confesso que nunca vi nenhum colega provar dessa ferramenta “educacional da época”, mas por vezes era o que garantia o silêncio em uma turma multisseriada com mais de 30 alunos. Na verdade as lembranças mais marcantes são aquelas deixadas pelos professores que mais cobravam resultados, mas que ao mesmo tempo nos acarinhavam quando necessário. É essa a real função docente onde o ensinar com amor é também inspirar, afagar e compreender.

         Hoje não me vejo como no incíco de minha carreira. Já passou a época em que o professor era o responsável pela elaboração da merenda, pela limpeza da escola e tinha domínio total sobre o contexto escolar. Hoje quase não vemos mais essas ações entre os professores. No presente a marca se concentra nas incontáveis demandas burocráticas que aumentaram muito, sobretudo após o período pandêmico Covid 19 onde cursos online e plataformas digitais tomaram conta do nosso cotidiano. A docência continua sob a responsabilidade técnica do professor, mas a forma como é desenvolvida mudou consideravelmente. Além disso, a forma como o professor é visto pela sociedade e pelo governo também não é mais a mesma. Não se trata de uma questão social, mas está muito próximo de ser, visto que pesquisas já indicam a falta de professores num futuro bem próximo. Não há o que negar que o professor é imprescindível no desenvolvimento da educação. Porém verdade seja dita que pais desejam bons professores para seus filhos, mas é restrito o desejo de que seus filhos sejam professores.

         Apesar deste cenário, o amor dedicado à educação e ao ato de educar ainda resiste às marcas e às mudanças que se solidificaram com o passar do tempo. Cito aqui a colega da Academia Centro Serra de Letras e amiga Eda Piccinin Bridi que por ocasião do jantar baile da premiação Destaques 2022, esteve ao meu lado. Lindo de ver todo o carinho a ela designado pelas várias pessoas paravam para abraçá-la e manifestar carinho e prosas saudosas da época em que foi professora e secretária de educação do município de Sobradinho. Emocionante ver uma pessoa que esteve à frente da secretaria de educação por oito administrações, receber tanto afeto. Penso que ela é a prova de que a educação pode ser sim tratada com respeito e amor e que as marcas de como cada um se faz presente na vida de outras pessoas dá esperança para acreditarmos que nosso trabalho, apesar de muitas vezes ser desvalorizado, pode frutificar e fazer a diferença onde menos percebemos.

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QUANDO O DISCURSO ESCRAVIZA

 

Tanto o  medo quanto o discurso podem escravizar. Quantas falas você já ouviu e por medo não tomou partido?  Nos tempos antigos, pessoas eram privadas de sua liberdade pela escravião. Dominadas, eram sujeitadas à crueldade e impedidas de serem livres. Hoje em dia, instituições humanitárias lutam pela erradicação da escravidão, contudo ela ainda vigora em nossos dias. Muitos discursos ainda carregam preconceitos e ocorrem em vários contextos.  O discurso racial pode ser entendido em sua dimensão histórica, pois está relacionado com a dinâmica de sua repercussão iniciada no período colonial.  Falar sobre racismo requer conhecimento, uma vez que se trata de um assunto muito complexo e está inserido no nosso cotidiano de forma  camuflada  seja em nosso vocabulário, seja em nossas ações ou até mesmo no racismo velado que é tão comum em nosso meio.

Segundo Lilia Schwarcz, nosso vocabulário é permeado de preconceitos raciais. Tais palavras e expressões  possuem origem ligada a escravidão e precisam ser banidas. Cor do pecado, cabelo ruim, criado mudo, mulata, doméstica… A relação com a herança escravista pode ser verificada em seus significados. Quem nunca ouviu ou pronunciou as seguintes expressões?

A coisa tá preta - Associa algo ruim a cor preta. Reflete na associação entre “preto” e uma situação, desagradável, difícil, perigosa.

Denegrir - Tornar escuro. Usamos de forma desclassificatória dando uma conotação negativa.

Mercado negro - Negócio feito a partir de meios ilícitos. O mercado negro é aquele que promove ações ilegais, e mais uma vez é a palavra negro sendo usada com conotação desfavorável.

Serviço de preto - É uma frase usada para remeter a um serviço mal feito, ou realizado de maneira errada, mas associa isso ao trabalho feito pelos negros, colocando a palavra “preto” como a representação de algo ruim.

Disputar a nega - Expressão usada para se referir a "desempatar um jogo". Na época da escravidão, era comum ver os senhores de escravos colocando como prêmio em jogos ou apostas uma mulher negra escravizada"

Inveja branca - Associa o negro ao comportamento negativo. Inveja é algo ruim, mas se ela for branca é suavizada.

Não sou tuas negas - Escravas negras eram literalmente propriedade dos homens brancos e utilizadas para satisfazer desejos sexuais, em um tempo no qual assédios e estupros eram ainda mais recorrentes. Portanto, além de ser profundamente racista, o termo é carregado de machismo.

Feito nas coxas - Tem origem na "época da escravidão brasileira, quando as telhas eram feitas de argila, moldadas nas coxas de pessoas escravizadas. Como o tamanho e o formato variavam, a expressão remete a algo mal feito"

Essas expressões foram mantidas junto com a segregação do povo negro no Barsil. “Numa sociedade racista, não basta não ser racista, é necessário ser antirracista”. A conhecida frase é da filósofa Angela Davis e o antirracismo pode começar comigo, contigo, na escola, em casa.  lembrando sempre que o anirracismo não é apenas tarefa do negro mas sim tarefa também do branco, do amarelo de todos. Cabe a toda a sociedade se engajar nesta luta. Enfrentar o racismo é urgente, exige atenção, empenho cotidiano e atenção de todos. O combate a intolerância pode iniciar mudando expressões usuais em nosso cotidiano por palavras que não tenham a conotação do preconceito racial.

Concluo registrando que os caminhos são diversos mas o papel comum é  o respeito  sendo o conhecimento  a arma mais eficaz contra qualquer tipo de preconceito. 

 

 CATIANI RENATA SALVATI   Membro da Academia Centro Serra de Letras,  Cadeira nº 11

 




 

 

 

         Por Catiani Renata Salvati

Professora Mestre em Educação

Escritora e Membra Efetiva da Academia Centro Serra de Letras


Ezequiel Redin 

ChatGPT: a inteligência artificial acabará com a sua profissão? (Publicado dia 21 de outubro de 2022)

 

Autor: Ezequiel Redin

Membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras

Professor de Extensão Rural do Departamento de Ensino do Colégio Politécnico da UFSM

 

Você já ouviu falar em ChatGPT? No final de 2022, a OpenAI disponibilizou para acesso público uma inteligência artificial que constrói textos e respostas com alto nível de detalhamento para muitas interrogações realizadas pelos usuários. O que deixou muitas pessoas surpresas foi a sua velocidade na produção textual e o seu grau de precisão.

A tecnologia é mais um sinal de alerta para os profissionais da Educação no mundo. O cenário educacional, após a pandemia, demonstra evidentes problemas de aprendizagens, aliado as dificuldades de relacionamento dos alunos, os problemas de saúde mental, além de uma inquietude incrível em um mundo do aceleramento, ou seja, da velocidade 2, acostumados a aumentar a velocidade dos vídeos, em um contexto cada vez mais híbrido. Da antiga crítica dos 140 caracteres do Twitter para os 15 segundos de vídeos (ou, talvez, 7 segundos). Informação rápida, sem reflexão, sem checagem de veracidade e, muitas vezes, sem nenhuma base científica. Os problemas do mundo contemporâneo estão imersos na sociedade e a chegada do ChatGPT apenas complementa uma série de inteligências artificiais que estão disponíveis no mundo virtual, mas ainda menos conhecidas.

O jogo dos problemas sociais, aliados a chegada massiva das inteligências artificiais, coloca ainda mais em xeque a ética profissional. A Nature, revista científica britânica, publicou um artigo informando que os cientistas usaram o ChatGPT para criar um artigo inteiro completamente do zero. A inteligência artificial gerou o manuscrito com uma boa análise de dados, no entanto, longe da perfeição. Os pesquisadores identificaram que o ChatGPT preenchia as lacunas do trabalho com citações falsas e informações imprecisas, um fenômeno identificado como alucinação.

Portanto, a ferramenta também não é inteiramente confiável. E o que está por trás desse debate envolve a ética, ou seja, as práticas desonestas para criar alguma vantagem no mundo da vida, da literatura, do trabalho ou das atividades empresariais. No entanto, para opinar sobre algo é preciso compreender. Junto a demais pesquisadores, realizamos todo dia testes com o ChatGPT para compreender como ele trabalha com informações da nossa área de estudo e seu grau de precisão. Realmente, a ferramenta possui uma boa capacidade de produção de textos, mas está longe da precisão em identificar as principais pesquisas e pesquisadores, de criar com precisão conteúdos que sejam verdadeiramente poderosos em revolucionar uma área científica. É uma boa ferramenta para agilizar questões cotidianas ou ainda para aprender algo novo que você não sabe por onde começar.

A ferramenta impacta a educação, os meios de comunicação, a produção literária e científica e demais áreas que trabalham com a produção intelectual. No entanto, o principal debate envolve as questões de como a sociedade está se apropriando. Em âmbito educacional, os professores precisarão se reinventar na forma como trabalham com os alunos em suas atividades extraclasse. No âmbito da comunicação social, por exemplo, como esse jornal, nada substitui o trabalho perspicaz do jornalista em busca de fontes primárias, da opinião das pessoas engajadas na notícia e do enredo que a reportagem merece. A tecnologia não substituiu até hoje os livros, não será ela que substituirá você no mercado de trabalho, mas claro que é preciso provar que possui boa competência para ocupar o seu espaço no mundo profissional. A tecnologia é massiva, mas você é único!


A rejeição social do Davi

 

Autor: Ezequiel Redin

Membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras – Cadeira n. 21

Professor de Extensão Rural do Departamento de Ensino do Colégio Politécnico da UFSM

 

Certamente, muitos estão acompanhando o BBB 24. Os apaixonados pelo reality show vibram pela história de Davi. Rejeitado pela casa e atacado por participantes do grupo do camarote. Sua personalidade forte aliada as estratégias que adota no jogo, bem como sua história de vida fora do programa lhe renderam muita popularidade e milhões de seguidores na rede social.

Não é nada fácil lidar com a rejeição social, mesmo dentro de um programa. Somos seres sociais, queremos ser aceitos em grupos sociais. Quando encontramos nosso espaço e nos sentimos confortáveis para expressar nossas opiniões há uma possibilidade de ser mal-interpretado.

Davi é nordestino, pobre e preto, ou seja, possui todas as características da desigualdade social. Pierre Bourdieu, sociólogo francês, atrela que a reprodução social das famílias ao longo do tempo é causadora da desigualdade social. Davi, motorista de aplicativo, apesar de pobre, realiza ações sociais para as pessoas carentes na periferia de Salvador. É a solidariedade entre os pobres, mas isso não elimina ou reduz a desigualdade social. Por isso, o Estado é convocado a intervir nas distorções negativas do capitalismo. Se todos na riqueza não é possível, todos na extrema pobreza causará prejuízos sociais a segurança pública. Eis o dilema.

Davi entrou no BBB com o sonho de conseguir dinheiro para cursar medicina. Curso que, aliás, é regalia para poucos em função do alto investimento econômico, cultural e intelectual. Em uma dinâmica do BBB, Davi foi coroado com o curso. A expansão do ensino superior com mais vagas nas universidades públicas e a criação de políticas educacionais como o Prouni ampliaram as oportunidades para o ensino superior no Brasil. Amartya Sen, economista e filósofo indiano que recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 1998, sustenta que o desenvolvimento como liberdade envolve a ampliação das oportunidades, ou seja, está vinculada a capacidade das pessoas de fazerem escolhas reais e de terem a liberdade de realizar essas escolhas. Logo, mais vagas nos cursos superiores públicos, mais opções de liberdade.

Nessa mesma linha de raciocínio, John Rawls, filosofo político americano que se dedicou na elaboração de uma teoria da justiça como equidade, sustenta que para minimizar a pobreza é preciso de políticas públicas que reduzam as privações dos mais carentes quanto ao acesso à educação superior pública (caso de Davi), à saúde e oportunidades de emprego digno. Rawls irá repudiar a teoria meritocrática de justiça com base nos talentos naturais, ou seja, não aceitaria o fato de que Wanessa Camargo, oponente de Davi na edição, é merecedora porque é uma cantora dedicada desde pequena. Para Rawls até o esforço pode ser produto de uma educação favorável. Portanto, tanto no BBB quanto na vida real, Wanessa não tem mais mérito que Davi, seja para ganhar o programa ou para viver em sociedade. Essa diferenciação econômica de Wanessa, somente teria sentido, em uma sociedade capitalista, caso fizer parte de um sistema de taxação e redistribuição de renda que beneficie os menos favorecidos. Rawls atribuiria a Wanessa uma mera sorte em nascer em uma família de posses que, sem dúvida, faz toda a diferença no seu sucesso profissional.

Concorde ou não com John Rawls ou com as posições de Davi dentro da casa, cujo não são unânimes, tanto um quanto outro se destacam pela sua atuação seja na construção de uma teoria da equidade seja na popularidade fora da casa.

Tudo isso é sobre rejeição social. Na vida real não temos pessoas e câmeras assistindo por 24h para avaliar sobre as possíveis injustiças que pessoas criam contra outras pessoas. Que bom que no BBB isso é possível, porém no mundo real, muitas pessoas passam uma vida sendo rejeitadas porque o grupo é sempre mais forte, como é no caso dos integrantes do BBB na casa nesse momento.

E aí, vocês gostaram desse texto, seus “calabresos”?



Luiz Hugo Burin

Retornar é preciso   

Véspera de feriadão. Meu colega de trabalho, em Porto Alegre, parecia uma das maiores autoridades em desconhecer quaisquer assuntos do interior do Estado. Nascido na capital, para ele, não haviam motivos que o levassem a ter maiores interesses sobre lugares interioranos. Vou para o Segredo, disse a ele. Município de Sobradinho. Vou rever familiares e as coisas simples de minha infância. Parece que voltar pra lá é sempre uma obrigação natural, algo que me faz sentir como se nunca deveria ter saído. É lá que regamos a saudade bebendo vinho no porão, direto da pipa. E sempre tem um copo pronto a servir os que chegam. Se for visita estranha, provar é no mínimo uma obrigação. O contrário é uma desfeita quase imperdoável. Ah, o cheirinho de porão... É lá onde ainda se encontra enfileirado o salame de carne de porco. Pendurado em varais de taquaras, curado na fumaça de um fogo brando ‘espanta moscas’. Sem nenhuma cerimônia, se levanta a cabeça e se tira um pedaço para comer como acompanhamento do vinho. E tem mais: o pão de forno, daqueles que só a mãe da gente sabe fazer. Aí é como uma fiel reprodução da Santa Ceia do Leonardo da Vinci.

O colega interrompeu minha descrição para lembrar que não havia salame na Santa Ceia. Desde 1967, quando adolescente, ficou algo cutucando, me chamando de volta. Um sentimento de que minha saída fora apenas por um intervalo rápido. Assim, como se alguma professora tivesse tocado a sineta pra hora do recreio e a gente sabe que tem que voltar para evitar o castigo. Diante do interesse, descrevi a viagem com mais alguns pormenores.

Até Santa Cruz do Sul, vamos pelo asfalto. Depois, muda o tranco. É estrada de chão, ao som do pedregulho, comendo poeira temperada com o cheiro adocicado das cores da primavera. Nunca viajaria por estrada de terra, ele falou. Sacoleja e suja o carro. Mas o prazer em voltar apaga qualquer desconforto, respondi. As obras de pavimentação vão em passos de tartaruga. Mas a gente vê os homens e máquinas trabalhando, e isso dá esperança que um dia chegaremos lá pelo asfalto. Enquanto a mulher e as filhas vão beliscando algumas guloseimas, eu procuro me concentrar dirigindo o carro. E para espantar o cansaço, vou falando da paisagem que muda a cada instante. Que é do que a terra produz que nos alimentamos. Vou ensinando às filhas. Olhem, aquelas plantas baixinhas, é lavoura de feijão. Estas, do outro lado, são de milho. Seus pés são altos e elegantes. Vejam os pendões floridos. As abelhas aproveitam as flores para colher o pólen de onde fazem mel. Assim vamos encurtando a estrada, registrando os detalhes do que somos feitos.

Um dia, nos pés do cerro escurecido pela mata, uma lavoura de fumo chamava os olhos da gente. As fileiras eram alinhadas e as folhas largas pareciam braços abertos colhendo a luz do sol. As filhas, cinco anos, queriam saber que gosto tinham, e porque nós nunca havíamos dado fumo pra elas comerem. Isso não é alimento, respondemos. Aí choveram perguntas sobre a utilidade dessa planta e não foi fácil mudar o rumo da conversa. Mostro as árvores. Algumas dão frutos que alimentam os animais silvestres. Outras têm propriedades medicinais. Chamo atenção para as flores e seus perfumes, ajardinando as barrancas. Carregam em si um simbolismo na direção do paraíso. Para as crianças, a viagem é longa. O colega ouviu tudo e me desejou boa viagem.

Após algumas horas, chegamos aos pés dos cerros de Candelária. Parecem uma barreira intransponível. As sombras das árvores que escurecem a estrada são agrados à soneca que silencia as conversas.  Lentamente, vou guiando cerro acima.  Abro a janela e não me importo com a poeira. Quero ouvir o silêncio da mata, mas ele não existe. A paisagem é encantadora. A brisa mansa rege uma grande orquestra nestas montanhas. Ninguém perde, acaso queira ver e ouvir. É o palco da natureza com os mais belos atores. Com meus botões, penso em mil detalhes que ainda faltam serem apresentados ao meu colega da capital. Vencidas as curvas e sobes e desces, paro o carro para aplaudir o sabiá que canta junto às pitangas maduras. Dez e meia da manhã. Alguém acorda. Chegamos, pai? De pronto, o cheiro de pão de forno nos acolhe com a mais agradável resposta.

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Tudo por amor

 

É farto o acervo de histórias que os professores colhem ao longo da carreira. A sala de aula é campo fértil a todas as disciplinas. Poderíamos classificar essas histórias em várias categorias, ou resumi-las em engraçadas e tristes. Chegam na escola dentro das mochilas dos alunos e aguardam o momento para se apresentarem. As engraçadas são de fácil convívio. As doloridas, são desafiadoras. Muitos alunos em cada sala e muitas aulas, manhã e tarde.     

Uma escola não é linha de montagem em que, no final de um período de aulas, todos os alunos tomam uma forma homogênea. O ser humano é único em sua maneira de ser e pensar. Essa diversidade é a grande riqueza, com uma margem muito larga de erros e acertos, para mais e para menos.  É prudente que os professores sejam portadores de uma excelente formação humana. Significa ir além do domínio técnico da disciplina que lecionam. E haja psicologia.

Iniciei lecionando na década de 1970. A paz no pátio da escola, ao menos no Ensino Fundamental, era de deleite, traduzida nas brincadeiras, jogos e correrias infinitas. As lágrimas por um joelho esfolado não revelavam grande tragédia. Havia sempre uma professora travestida de médica. A sala dos professores era o melhor ambulatório do mundo. No Ensino Médio, o futebol na quadra de esportes fazia revezamento com os sussurros traduzidos no tamanho das primeiras paixões. Versões amorosas carregadas de inexperiências e medo de levar um fora. Mas caminhar se aprende caminhando. E floresciam coloridos namoricos com juras eternas. 

Dias atrás, visitei uma escola onde fui feliz como professor. É visível a presença do celular roubando os olhares dos alunos e os novos efeitos comportamentais. Estranho, também, é olhar a galeria de fotos nas paredes. Numa sequência lógica dos anos, deixei lá, presos no passado os meus cabelos pretos. Alisei com a direita meus cabelos brancos e escondi o riso na mão esquerda. A vida que segue é quem pinta as cores que carregamos. Num embrulho de recordações, fui abordado no corredor. Ele se apresentou como Prof. Ricardo, o Diretor. Contou que iniciara o curso de Direito, mas mudou, por culpa de um amor antigo. Formou-se em Pedagogia. Esticamos a manhã com lembranças. Fora meu aluno e falou de uma prova de História. De dez questões, sabia responder só duas. Prometera à colega Maria que retribuiria com um beijo cada resposta que ela lhe desse. Seriam oito beijos, festejava ele. Era o jeito de declarar seu amor. Na época, Maria era a moça bonita da escola. A dona de todos os olhares. Mas detestava seu nome. Rimos frente à preguiça da fumaça do cafezinho.

O Diretor chamou a professora que passava e dividimos a conversa. Era Maria que festejou minha visita. Fui sua aluna, disse. Hoje sou a Psicóloga da escola. Com um sorriso aberto de orelha a orelha, o Diretor abraçou-a e revelou não ter recebido nenhuma resposta naquela prova de História. Mas a conquistara quando mudou seu nome, passando a chamá-la de “Santa”. Na escola, todos adoram a Professora Santa. Continua esbelta. São pais das gêmeas Maria Clara e Maria da Graça, nomes escolhidos por ela. Logo ela que não gostava de ser chamada de Maria. Mas o Prof. Ricardo jura ser ele o verdadeiro psicólogo da escola. Trocou o curso de Direito por Pedagogia e o nome da colega para conquistá-la. O que não se faz por amor! Toca a campainha. Fim do recreio. Nenhum joelho esfolado e as salas voltam a ameninar-se.  

(Luiz Hugo Burin – Mestre em Educação - Membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras – Cadeira 35)

Andressa Bandeira Santana

Visite bibliotecas: você não vai se arrepender (Publicado dia 25 de novembro)

Um lugar em que é possível conhecer e visitar muitos outros locais. A biblioteca, qualquer biblioteca, pública ou privada, gigantesca ou muito pequena, é um portal mágico, eu diria até, sagrado. Eu gostaria que todas as pessoas tivessem a oportunidade de visitar uma biblioteca. Mas visitar mesmo, de experenciar uma biblioteca. Sentir a aura, a energia e o conhecimento que elas emanam. Toda biblioteca é diferente da outra, mas elas tem algo em comum, uma sabedoria, uma calma.

Talvez parecidas com as bibliotecas sejam as livrarias, mas aí já começa a se embrenhar entre os livros os interesses comerciais. Quem sabe os sebos lembrem bibliotecas porque mesmo comerciais há a troca de livros, edições seminovas que já pertenceram a outros donos, já tiveram outras histórias em outros locais... Não, nada se compara com uma biblioteca. Por favor, visite uma biblioteca. Fique o tempo que puder entre os livros, entre as prateleiras, leia uma página, duas, cinco. Não leia nada ali, retire os livros e leve pra casa. Leia no conforto da sua cama ou numa cadeira na sua sala. Mas, por favor, visite uma biblioteca.

Aos que já tem o hábito de frequentar bibliotecas eu tenho um apelo diferente: doe livros para uma biblioteca. Contribua para que esses lugares já tão mágicos fiquem ainda mais incríveis e com edições mais atualizadas.

Eu sei que temos a internet, eu sei que e-books também são uma experiência válida de leitura. Mas é que em mundo tão digital, talvez o que precisemos seja do palpável. Do papel. Da biblioteca. Então, por favor, depois de terminar essa leitura, que tal visitar uma biblioteca? Você não vai se arrepender.

Alda (Publicado dia 09 de dezembro de 2022)

 A FORÇA E O PODER DOS NÚMEROS

 

Como todo conhecimento deve ser compartilhado, gostaria de compartilhar o que li em algum lugar, no passado

 

A FORÇA DO NÚMERO 3

      A Bíblia nos diz que Deus é triúno; Pai, Filho, Espírito Santo.

Deus criou o homem a sua imagem e semelhança: corpo, alma, espírito.

Na anatomia humana temos a pele como maior órgão do corpo, que tem 3 camadas: derme, epiderme e hipoderme.

Há 3 estados da matéria: sólido, líquido e gasoso

A água, substância mais abundante na natureza, tem 2 átomos de hidrogênio e 1 de oxigênio

Há 3 dimensões no mundo físico: comprimento, largura e profundidade.

As cores primárias são 3: amarelo, vermelho e azul.

O tempo tem 3 visões: passado, presente e futuro.

Existem 3 reinos da natureza: mineral, vegetal e animal.

A menor partícula da matéria, o átomo tem 3 componentes: elétrons, prótons e nêutrons..

A terra tem 3 camadas: crosta, manto e núcleo

 

O PODER DO NUMERO  7

O número 7 (sete) representa a totalidade, a perfeição, a consciência, o sagrado e a espiritualidade. O sete simboliza também conclusão cíclica e renovação.

Tem uma grande importância simbólica para o mundo cristão e para muitas outras mitologias.

      Segundo a Bíblia, Deus criou o mundo em seis dias e descansou no sétimo, fazendo dele um dia santo. E o número 7 passa a simbolizar a perfeição e, a conclusão.

No sétimo dia Deus já havia concluído a obra que realizara, e nesse dia descansou. Abençoou Deus o sétimo dia e o santificou, porque nele descansou de toda a obra que realizara na criação.” (Gênesis 2:2-3)

 

É justo por causa desse fato que os judeus guardam o sábado ou shabbat, que é o sétimo dia, considerado o dia de descanso, o dia para entrar em harmonia com Deus.

Cabe aqui lembrar que, depende do dia em que começamos a contar os dias da semana, para chegarmos no sétimo dia, considerado para o dia do descanso.

Um dos principais símbolos do judaísmo, o Menorá, é um candelabro de sete braços, o qual representa os sete dias da semana, além de simbolizar a luz que nunca se apaga e a existência de Deus.

Também por conta Bíblia, esse número ganha o simbolismo de perdão e cura. Quando Jesus fala:

“Então Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou: "Senhor, quantas vezes deverei perdoar a meu irmão quando ele pecar contra mim? Até sete vezes? Jesus respondeu: "Eu digo a você: Não até sete, mas até setenta vezes sete.” (Mateus 18:21-22)

      São sete os pecados capitais e sete são as áreas de purgação do purgatório.

A besta do Apocalipse, associada ao anticristo, apresenta 7 cabeças”

                Outros simbolismos do número 7

O   número 7  tem o simbolismo de ciclo completo e de perfeição dinâmica. Cada fase da lua, que são um total de quatro, apresentam 7 dias de ciclo, então fazendo a multiplicação (4x7) são 28 dias para o ciclo lunar se completar, remetendo também à mudança e à renovação positiva.

O número 7 também é considerado um regulador de vibrações, como se pode notar nas sete cores do arco-íris e nas sete notas da gama diatônica (Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si).

Sete são os dias da semana, os graus da perfeição, as esferas celestes, as pétalas de rosas e os ramos da árvore cósmica.

 

A tradição hindu atribui ao sol sete raios, sendo que seis correspondem às direções do espaço e o sétimo corresponde ao centro. Ou seja, o número remete à totalidade, assim como no arco-íris a sétima cor é o branco, que também é a junção de todas as cores.

E VIVA A NATUREZA


Catiléia Ferraz Dreher

Leitura de Mundo…

 

         Ler e escrever é um processo cognitivo desenvolvido neurologicamente através de sinapses estabelecidas e construídas nas funções executivas do cérebro. Escrever exige conhecimentos de códigos e associações entre fonemas e símbolos gráficos inerentes ao contexto social em que estamos inseridos. Ler corresponde às conexões visuais e de memória que decodificam a escrita para a compreensão da palavra ou informação.

Estamos vivendo um momento histórico em que este processo de leitura é massivo, porém líquido. “Lemos” muito e compreendemos pouco. E/Ou. “Lemos” o tempo todo (mensagens, publicidade, redes sociais…) que quase em nada acrescentam para nossa informação ou formação humana. E a escrita? Escrevemos abreviadamente, incorretamente, usamos corretor, editor… Contudo, escrever tornou-se algo restrito, pois ainda há os defensores de vídeos ou áudios em detrimento ao ato de redigir algo.

Todavia, em dias de fechamento de ciclo como datas festivas de final de ano, propõe-se que façamos uma leitura diferente: uma Leitura de Mundo!

Nosso consagrado educador brasileiro, Paulo Freire, em seu imenso legado, alfabetizava sujeitos levando como metodologia de ensino, palavras que tivessem sentido na vivência de cada aluno. Em seu livro, A importância do Ato de Ler (1988), Freire afirma: “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”. Neste contexto, quais palavras prioritariamente estariam em seu cotidiano para serem escritas, lidas, relidas e profundamente discutidas? Esse é o verdadeiro significado da leitura, um letramento reflexivo daquilo que se lê, que se vê e que se vive…

Especificamente neste ano de 2022 é possível fazermos diversas e interessantes leituras… Há muitos acontecimentos a serem “lidos”: (pandemia, vacina, guerra, economia, política, meio ambiente, copa, entre os mais enfáticos).

É preciso nos abastecer com uma bagagem de leituras que não apenas sejam decodificadas superficialmente, mas que contribuam significativamente para nossa individualidade, quiçá para nossa sociedade. Nesta perspectiva, estaremos preparando-nos para uma escrita que tenha o mesmo propósito. Ao realizarmos uma “boa leitura de mundo”, estaremos desenvolvendo capacidades para a uma coerente “escrita” de 2023.

 Membro Correspondente - Município de Osório/RS

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Você se comunica em Girafês?

 

         Não. Não é um novo idioma! Trata-se de uma comunicação não violenta ou também, a chamada linguagem do coração, cujo símbolo remete a este magnífico mamífero, a girafa, que traz consigo o maior coração entre as espécies de seres vivos terrestres.

         Sim! Nós nos comunicamos o tempo todo, não é mesmo? A comunicação é uma habilidade fundamental à humanidade e apresenta-se nas mais variadas formas. É através do comunicar-se que expressamos pensamentos e sentimentos, que falamos, de maneira oral ou escrita, que conhecemos e compreendemos, e que, sobretudo, “escutamos” a comunicação do outro.

         Esta tarefa, porém, exige uma inteligência emocional, com responsabilidade e equilíbrio. Uma conversa nutrida com um vocabulário genuíno e sincero, que desperta uma consciência rica e eficaz, conectando com facilidade as relações interpessoais, sensível ao contexto em que está inserido seus interlocutores.

A obra “Comunicação Não-Violenta: Técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais”, publicada em 1999, do psicólogo Marshall B. Rosenberg, tornou-se referência para mediação de conflitos e processos de paz em mais de 60 países. Em seus estudos, desde 1984, no centro de comunicação não-violenta, que deu nome ao seu livro, Rosenberg afirma que existem quatro passos para tornar a comunicação clara, adequada e acolhedora, a fim de efetivamente aproximar as pessoas de forma respeitosa. Primeiramente, o mediador deve assumir uma postura neutra de observação. O segundo passo refere-se a uma escuta ativa sobre sentimentos, sem julgamentos ou críticas. Em seguida, é imprescindível levar em consideração as necessidades e emoções não atendidas no conflito e por último, compreender os pedidos e intenções de conciliação desta comunicação. Assim, acontece de forma não violenta, a negociação ou o acordo que decorre de um bem comum a todos.

Este anseio por uma comunicação compassiva, empática e solidária é urgente numa sociedade com formas agressivas de inter relação, onde emergem intensas e extremas acusações, opiniões, posições, medos, punições, imposições, submissões, rebeliões, dominações, provocações… Tanto sofrimento desnecessário pelo uso de palavras que desprezam, criticam, manipulam, desrespeitam… por palavras que violentam…

Estabelecer uma comunicação harmônica e significativa é obrigação e responsabilidade coletiva! A empatia afetiva, que conecta sentimentos, e cognitiva, que compreende tais emoções, media relacionamentos saudáveis, acolhe com pertencimento as pessoas envolvidas, proporcionando confiança, cura e paz. 

Todos estes atributos estão representados na girafa, inerentes à linguagem do coração. Anatomicamente, com seu pescoço longo, a girafa pode ver “além” dos julgamentos. Suas grandes orelhas são propensas a uma escuta atenta. Seus cascos lhe dão autenticidade frente às necessidades. Seu coração, que pesa cerca de 12 kg,  43 vezes mais forte que o humano, além de conduzir a atividade sanguínea para o alcance do cérebro, transmite gentileza e profundidade.

Aprendizes somos, neste processo de comunicação não violenta. Precisamos modificar nossa postura e forma de comunicar conectando pessoas com auto responsabilidade e compreensão mútua. Pois, “Podemos tornar a vida miserável ou maravilhosa dependendo de como pensamos ou nos comunicamos.” (Rosenberg)

Então, como você se comunica? Vamos aprender girafês?

 

Catiléia Ferraz Dreher

Membro Correspondente - Osório/RS


Teomar Benito Ceretta

SAINT-EXUPÉRY NA ARGENTINA

  FRAGMENTOS LITERÁRIOS

        

         Antoine de Saint-Exupéry tornou-se um escritor de renome mundial após publicar sua obra máxima, “O Pequeno Príncipe”, em 1943. Aos 26 anos de idade, publicou seu primeiro romance de aviação, quando, na condição de aviador das Linhas Aéreas Latécoère, chefiava o aeródromo de Cap Juby, ao sul do Marrocos, de 1927 a 1929.

         De sua experiência como aviador do Correio Aéreo Francês, surgiram outros romances: Voo Noturno, Terra dos Homens, Piloto de Guerra, inclusive O Pequeno Príncipe que, de acordo com estudiosos, trata-se de uma denúncia. Segundo a ótica do leitor, cada personagem reflete os dramas sociais da época do mundo em guerra.

         Em 12 de outubro de 1929, Saint-Exupéry desembarcou em Buenos Aires, transferido da África para a América do Sul. Uma nova função foi-lhe atribuída para administrar a abertura de novas rotas aéreas na Patagônia argentina, a cargo da nova empresa Aéropostale, sucessora das Linhas Latécoère.

         De suas experiências em território argentino, em 1931, lança seu segundo romance, Voo Noturno, publicado pela Éditions Gallimard. “Voo Noturno” é uma narrativa em que o autor retrata a trágica aventura do pioneirismo da aviação em tempos heroicos. O personagem Fabien, aviador que faz um voo à noite procedente da Patagônia com destino a Buenos Aires, acompanhado de seu telegrafista, penetra em uma tempestade. Perdidos em meio ao caos, luta contra a turbulência, e desorientado clama por uma posição. Buscam as estrelas sem sucesso. Sua esposa, que o aguarda na capital, como expectadora, faz parte do enredo. Vê com preocupação o atraso do voo do marido, que ultrapassa o tempo de autonomia do avião. Ela não perdoa a intransigência do diretor que cobra dos pilotos “o correio antes de tudo”. Seu lema era “o correio deve passar, custe o que custar”. Conforme seu editor, “Voo Noturno descreve a trágica aventura de um desses pioneiros do ar que toma naturalmente um tom de epopeia”.

         Em seu terceiro romance, “Terra dos Homens”, publicado em 1938, no capítulo Oásis, Saint-Exupéry registra uma curiosa experiência vivida em território argentino. Depois de estabelecer as rotas da Patagônia, coube a ele a missão de localizar terrenos para pistas de socorro ao longo da rota Buenos Aires - Assunção, no Paraguai.

         Ao cruzar pela cidade de Concórdia, na Província de Entre Ríos, percebe do alto um campo natural, o que sugere um bom local para estabelecer um aeródromo. Ao aterrissar com seu monomotor Laté-25, atinge uma vala oculta. Uma das rodas do trem de pouso sofre sérios danos, que o impede de continuar sua missão. Devido a esse contratempo, foi acolhido no velho casarão da propriedade, onde vive momentos divertidos com as duas adolescentes da família Fuchs Valón. Dessa curta vivência, ao retornar para a França em 1931, escreve um artigo na revista Mariane com o título, As Princesinhas Argentinas. Em Terra dos Homens, no capítulo 5, o “conto de fadas” vivido em Concórdia será publicado com o título Oásis. Atualmente, o velho casarão, conhecido como Castelo de San Carlos, faz parte do roteiro turístico daquela cidade. Nele se preserva a memória de Saint-Exupéry, onde os visitantes, acompanhados de um guia turístico, podem rememorar uma bela história que gira o mundo em seus escritos. Para o leitor que se interessar em conhecer o “conto de fadas”, pode acessar no Youtube o documentário, “Oásis em Concórdia de Danilo Lavigne”.


Giana Diesel Sebastiany

Ainda sobre a Feira do Livro - publicado no Jornal Gazeta em 27 de janeiro de 2023


Penso que é sempre importante utilizarmos os espaços que temos para expressar nossa gratidão. Assim, decorridos alguns meses da Feira do Livro de 2022, trago trechos do meu discurso de abertura. Sinto a necessidade de reiterar o meu agradecimento a honraria que me foi concedida, enquanto patrona. Fica difícil colocar em palavras o sentimento de gratidão em estar numa posição de destaque que já foi de alguns amigos da Academia Centro Serra de Letras, também foi do brilhante e gentil escritor Luís Fernando Veríssimo. Dentre tantos nomes a serem lembrados com imenso carinho, quero trazer aqui a memória do meu tio Lauro Carlos Sebastiany (patrono em 2005). Com ele, também trago a memória do meu tio Narciso, ambos com uma sensibilidade e uma habilidade muito grande de lidar com as palavras e as pessoas.

Deles, além de livros e crônicas escritas, guardo o exemplo ético, respeitoso e simples de viver. Ainda quero registrar a felicidade de conviver com o meu tio Alencar, sempre alegre ao rever sua sobrinha! E o meu pai, Gilson Sebastiany. Talvez a grande maioria conheça o “oculista”. Eu tenho o privilégio de conhecer um ser humano gigante, inteligente, amoroso, carinhoso e, tal como seu pai, “um médico humilde que vive para os humildes”. Obrigada, pai! Se hoje eu estou aqui como Patrona da Feira do Livro, é porque cresci te vendo ler e me incentivando a ler... Sobradinho é o meu lugar do coração! Quando estou subindo a serra, chego no topo das curvas e já tenho a sensação de estar chegando em casa, no meu ninho, onde todo o amor da minha mãe Leni me espera. Mesmo quando não consigo vir fisicamente, é para esse ninho que venho em pensamento. Meu profundo respeito aos meus avós Adolpho e Hulda Sebastiany. Aliás, em uma das minhas crônicas já publicadas, falo que foi ela quem me mostrou, muito antes de eu entender a palavra feminismo, o quanto eu poderia ser protagonista da minha própria vida. Lembro de todo amor que sempre recebi do meu avô Bino e da minha avó Chica! Tenho ainda meus outros tios, tias, primos, primas, irmãos, sobrinhos e, especialmente, meu querido filho Arthur, a quem eu admiro e amo incondicionalmente. Aqui nessa pequena e linda cidade, eu vivi minha infância e adolescência. Tenho amigos especiais dessa época. Guardo, ainda, um profundo agradecimento aos meus professores. Vocês transformaram vidas! Transformaram a minha! Escolhi ser professora seguindo os bons exemplos que tive aqui. E estudei muito, trabalhei muito, escrevi textos científicos, artigos acadêmicos, livros infantis e crônicas. A escrita, assim como a leitura, me constitui como pessoa. Agora, enquanto desenvolvo o Pós-Doutorado, volto à essa comunidade como pesquisadora, mas também como parte dela. Por fim, buscando emprestado um trecho do discurso de Martin Luther King, eu tenho um sonho! Sonho com uma humanidade que acredita no seu futuro, no futuro do planeta e de todas as espécies! Sonho com o dia em que as pessoas reconhecerão que todos tem direito à uma vida digna! Sonho com um mundo onde não haja fome e discriminação, onde todos tenham acesso à cultura e à liberdade de expressão! Sonho com um mundo onde todas as crianças possam ler e ter acesso aos livros! Ainda, recorrendo às palavras de Paulo Freire, sonho com a possibilidade de a leitura do mundo preceder a leitura das palavras! Tenho a esperança de que posamos viver uma sociedade democrática, solidária e ética! É essa esperança que me faz seguir sendo professora!

Viviane Luchese

Carta à minha senhora!

Há décadas, mais de um século, foste tomada como propriedade. Ora escrava dos desejos mais imundos num disfarce de desposo. Seria ingênuo de minha parte crer que tua história fora como um romance de Ceci e Peri, ou se convertera no amor de Ayres e Diacuíe. Ó senhora! Seria fútil, no mínimo arrogante, dizer que posso, no verdadeiro sentido da palavra, sentir compaixão da tua dor. Em verdade, não posso minimamente sequer mensurar como fora o teu sofrimento e o teu pavor quando, então caçada como um animal selvagem, lhe foram tirados a pureza e o viço de criatura que era livre por nascença. Tu que tinhas apenas os ciclos naturais, a chuva, o frio do sereno da noite invernal ou ardor do sol, como obstáculos aos teus passos, e que então presa, desposada, agora senhora de alguém, fora sujeitada aos caprichos dos costumes além-mar e da falsa cristandade, que subjugava ou aniquilava tudo que era diferente. Catequisada, provavelmente “renascera” de fato entre os santos forasteiros que te impuseram, contudo, para isso, separada da sua essência, do seu verdadeiro eu, o mais crível é que morrera em teu batismo, assumindo tão-somente uma casca cativa, complacente.

Minha amada senhora, hoje me dei conta que não sei teu nome. Nem sei qual era tua língua, ou qual era o teu povo, se jês, pampeanos ou guaranis 1 . Se ainda cultuava algum dos seus costumes, ou se às escondidas invocava os deuses dos teus ancestrais. Talvez às escuras, na boca da noite, suplicasse para que Nhanderuvuçu(?!) 2 libertasse teu espírito. Não sei se era afável ou esquiva pela óbvia vicissitude que te foi infligida. Se lutou enquanto pôde ou aquietar-se foi tua forma luta. Ou talvez, desistindo de brigar contra o teu tortuoso fado, tenha tido a sorte de se afeiçoar ao teu carrasco. Talvez tenha amado tua prole e, por ela, tenha mantido sanidade. 

Não sei de ti nada além da tua raça e do teu destino. E como me parece triste o teu destino, minha senhora! Parte de mim se assombra ao pensar nos teus temores, chora e envergonha-se de ser o fruto da tua desgraça. Outra parte, confesso, se orgulha de ter teu sangue correndo nas veias. Sim, sou tua cria, minha senhora. Cria e consequência do teu destino, que transcorrido o tempo, desejo sinceramente que te tenha sido ao menos um pouco mais gentil. Mas sim, sou tua cria, minha senhora, e com os olhos cheios de lágrimas, e alma, muita alma, posso dizer que ninguém mais da minha linhagem passada tem tanto minha admiração e apreço. Quando o vento sopra e emaranha meus cabelos negros sinto teu sussurro e, quando meus pés nus tocam a terra e sentem vibrar todos os elementos me experimento vinda de ti. Sou tua cria de modo inescusável minha eterna e amada senhora!

(homenagem a todas as índias que não sabemos o nome, mas que carregamos em nossa

linhagem desde sempre)


1 Havia três principais grupos indígenas no Rio Grande do Sul: os Guaranis, os Jês ou Gês, e os Pampeanos.

2 É o grande criador do mundo segundo a mitologia Guarani e, por sentir-se sozinho, criou os outros deuses, Yara

(senhora das águas), Tupã (guardião do relâmpago), Curupira (espírito das matas), e Kayuá, (o dom da palavra).

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Faites-les lire! Pour en finir avec le crétin digital

 

Sempre me orgulhei de ser professora, entretanto, acabei me afastando do magistério. Muito em decorrência das modalidades de EAD que, adotadas como temporárias em resposta a pandemia recém vivida, se firmaram como uma solução barata às instituições de ensino.

Tanto como professora de EJA, quanto como monitora pedagógica em universidade, me parecia que as tecnologias que deveriam trazer certas facilidades, por tão facilitadoras, acabavam sim prejudicando drasticamente o estudo em si. Sempre tive em mente que o conhecimento deve ser construído, é um processo que depende de etapas, é cumulativo, e não apenas informação oferecida como algo a ser decorado para uma avaliação, sob pena de ser descartada instantaneamente.

Assim que me chamou a atenção a obra “A Fábrica de Cretinos Digitais”. De Michel Desmurget, diretor de pesquisa no Instituto Nacional de Saúde da França, especializado em neurociência cognitiva. O título é forte assim como seu teor!

No estudo, o neurocientista trouxe dados conclusivos sobre como os dispositivos digitais estão contrafazendo o desenvolvimento neural de crianças e jovens. O pior é que não se trata de sensacionalismo, pois no mesmo ano de sua publicação, 2019, a própria OMS divulgou uma série de recomendações sobre uso de aparelhos eletrônicos por crianças de até 5 anos.

Ora, também somos partes do problema. Viemos de gerações que presenciaram a evolução da tecnologia e se encantaram com ela como marinheiros hipnotizados pelo canto da sereia. E com essa fascinação por ela, que se expandia à nossa frente, esquecemos que o canto poderia nos afogar.

Acontece que, como analfabetos ou semianalfabetos tecnológicos, achávamos bonitinho uma criança “nascer sabendo mexer no celular”. Confundimos “destreza” motora com inteligência. Não nos apercebemos que uma coisa é mexer em um equipamento, e que outra bem diferente é saber como construí-lo. Certa estava a profe Mari ao indagar, quando lhe falavam “que não precisavam aprender matemática, pois já existia a calculadora”: "- E se a calculadora quebrar?"

Estamos emburrecendo nossas crianças!

Anos atrás li uma reportagem de meninas que estavam criando tecnologias de ponta sem ter acesso à Internet. Não me recordo sobre a matéria em si, mas manchete provocava no sentido de o que poderiam ter feito se tivessem acesso a rede. Lembro que pensei justamente que provavelmente estariam só navegando nas redes.

Fui irônica, contudo, essa ironia dizia algo a mais, talvez não entendido na época: a criatividade e a inventividade vêm de explorarmos o mundo e os desafios que ele apresenta, isso é que compõe nossa inteligência. Piegas, porém, verdadeira a frase: “as melhores ideias surgem da crise”.

Infelizmente, diversos estudos apontam que estamos vivendo tempos em que, pela primeira vez da história, as novas gerações surgem com o QI menor do que as antecederem.

Talvez seja a maternidade que me fez retomar esses pensamentos, já que, também provocada pelos algoritmos, tenho lido muitas coisas que, aparentemente, estão relacionadas ao uso abusivo da tecnologia, como o aumento dos diagnósticos de autismo, TDHA, isolamento social, perda da motricidade fina, para referir só os mais recentes.

Ser inteligente não tem nada a ver com saber ligar algo, ou mexer em joguinhos coloridos. Alguns macacos fazem isso! Inteligência tem a ver com processar informações e não apenas decorá-las momentaneamente.

Claro que só o tempo dirá com mais precisão os efeitos de tudo isso, porém a resposta aparente é que o excesso de informação e de facilidades prejudica o desenvolvimento (e isso serve para os brinquedos também).

Deixe que as crianças brinquem na terra e fomentem o faz de conta. Crie ambientes em que possam exercitar a criatividade, a inventividade e, especialmente, conforme Desmurget fala em sua última obra: “Faça-os ler! Para acabar com o idiota digital”.

 


Giancarlo Montagner Copelli 

Como eu sei que o Leão de São Marcos “é” o Leão de São Marcos?

 

         Giancarlo Montagner Copelli[1]

copelli.filosofia@gmail.com

        

Quais são as condições para dizer que algo é ou existe? Durante mais ou menos uns 2.500 anos de Filosofia (ocidental) houve basicamente duas respostas para essa banal – mas, ao mesmo tempo, incômoda – pergunta. O sentido das coisas estava ou numa espécie de essência dessas mesmas coisas, ou na consciência do sujeito que via o objeto – atribuindo sentido a ele, portanto. Explico. Nos paradigmas contidos nestes dois milênios e meio de Filosofia, quando olhamos para o Leão de São Marcos no alto de uma coluna, no centro de Sobradinho, por exemplo, das duas uma: ou o monumento é/existe independente do sujeito que o vê, ou, ao contrário, só é/existe a partir do sujeito que o vê. Mas, afinal, como funcionam essas epistemologias? De outro modo, quais as “verdadeiras” condições de possibilidade para dizer que algo é/existe?

A primeira hipótese corresponde à Filosofia Clássica. Nesse caso, pensemos nos pré-Socráticos, em Platão e Aristóteles, entre tantos outros, no Hall da Fama da Antiguidade. Embora com proposições em boa medida rupturais entre si, todas essas escolas antigas podiam ser resumidas mais ou menos assim: o mundo está posto. É o que é. E ponto final. Há um objetivismo que engessa os sentidos. E justamente por isso o Leão de São Marcos é o Leão de São Marcos. É o que é. Aquele conhecidíssimo objeto no centro da cidade não pode ser “interpretado” de outro jeito. Simples assim. Não há o que discutir. Certo?

         Errado. No século XVII, um filósofo chamado René Descartes propôs um paradigma diametralmente oposto à Metafísica Clássica, inaugurando a Modernidade Filosófica. Seu pensamento poderia ser resumido em uma frase: “Penso, logo existo”. Mas, afinal, que diabos ele quis dizer com isso? Nas suas inquietações filosóficas, Descartes não acreditava na essência das coisas. Na coragem de discordar da longa tradição que se punha antes dele, pensava que o sentido dos objetos estava na consciência do sujeito, e não nas coisas mesmas. Deu início, assim, ao que hoje chamamos de Filosofia da Consciência. E, nesse caso, o nosso Leão de São Marcos só é o que é porque você, leitor, acha que é. Você – ou qualquer pessoa – atribui seu sentido. Alguém anda pelo centro de Sobradinho, olha para aquelas asinhas no bicho fincado no alto da coluna, aponta o dedo indicador e sentencia: “Leão de São Marcos”!

         Claro, é possível questionar: “Esse jeito de ver e explicar o mundo pode dar certo com nosso Leão, mas quero ver funcionar com bicicletas. Ainda que eu aponte o dedo para a minha e diga ‘avião’, ela continuará sendo uma bicicleta. Esse tal de Descartes não sabia de nada”. É bem provável. Como todo homem de seu tempo, carregava consigo muitos equívocos. Mas e se eu perguntar, agora, não se o objeto no centro da cidade é ou não o Leão de São Marcos, ou se a bicicleta é um avião, mas questionar se o Leão é bonito ou se a bicicleta é boa? Há uma essência que responde, objetivamente, essas interrogações? Ou a resposta está na consciência do “sujeito que interpreta o mundo”? Em outras palavras, quais são as condições de possibilidade para dizer o que algo é? E aí? Metafisica Clássica ou Filosofia da Consciência?

         Ficou em dúvida, não? Talvez a melhor resposta seja: nenhuma delas. Muitos filósofos do início do século XX, como Gadamer, Heidegger ou Wittgenstein, discordaram de ambos os modelos. Para eles, o sentido das coisas não estaria nem no objetivismo da Metafisica Clássica, nem na subjetividade que caracteriza a Filosofia da Consciência. O sentido das coisas estaria – para resumir esse texto que já vai longo – numa espécie de meio termo entre os antigos modelos.

Mas o que seria esse “meio termo”? Correndo o risco contido em todas as simplificações, uma resposta mais ou menos aceitável seria: uma certa “fusão de horizontes”, informada por uma dada “tradição”, compartilhada entre nós através de um determinado “jogo de linguagem”. Complexo? Para clarear esse terceiro modelo filosófico, pense novamente no Leão de São Marcos no centro de Sobradinho. No paradigma contemporâneo, independente da consciência das pessoas que passam pelo local, ele está lá. Mas não está “como” Leão de São Marcos. Ou seja, não há, também, uma essência que objetifica seu sentido. Como sabemos, então, que aquela tão conhecida peça é o Leão de São Marcos? Como alcançamos seu verdadeiro sentido? A resposta passa pelo que nos informa uma “autêntica” tradição (o caminho das pedras para diferenciar das “inautênticas” fica para outro dia). Em miúdos: a correta atribuição de sentidos seria desvelada por um horizonte de sentido compartilhado por um determinado grupo de indivíduos. E essa fusão de horizontes – entre a objetividade que congela sentidos e o subjetivismo que permite impor nossos mais egoístas posicionamentos – é a condição de possibilidade para dizer que algo é ou existe.

Política, estilo de vida, religião, futebol, arte, moda e outros tantos temas a atravessar nosso dia a dia são “lidos e significados” por esses modelos. Ainda que você não saiba, está filiado e comprometido até a medula com um ou outro. Ou um mix deles, como uma espécie de mapa da mina para atribuir sentido ao mundo. Mas e aí? Agora que você conheceu os três grandes momentos da História da Filosofia em 4.429 caracteres, com qual deles você se identifica?  O modelo clássico, o moderno ou o contemporâneo?



[1] Membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras.

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Democracia em números!

 

Giancarlo Montagner Copelli[1]

 

Quando aceitei o convite para ser correspondente da Academia Centro-Serra de Letras, intuí que uma das contribuições possíveis – talvez a única – fosse aproximar – ou urbanizar – determinados assuntos da minha cotidianidade, mais especificamente, junto a Programas de Pós-Graduação em Direito, não apenas no Rio Grande do Sul, mas, como agora, também em Vitória, no Espírito Santo. Os assuntos? Alguns atravessamentos – ou “costuras”, como eu gosto de dizer – aproximando o Direito da Filosofia desenvolvida na Europa e nos Estados Unidos no início do século XX, o diálogo entre o Direito e a Literatura – perspectiva ainda pouco desenvolvida no Brasil – e a relação, às vezes tensa, entre o Direito e a Política.

Muitos desses temas, desenvolvidos como seminários para mestrado e doutorado, pesquisas, palestras e cursos de curta duração – como ocorrerá na capital capixaba na última semana de outubro – possuem um certo hermetismo. Quero dizer, “nossos” assuntos ficam mais ou menos blindados dentro do ambiente das universidades, e talvez isso tenha mais relação com o (legítimo) amplo desinteresse das pessoas em geral que com o nível de sofisticação das discussões. Se eu estou certo – e sinceramente acho que estou – isso significa que virar a chave dessa blindagem é não apenas desejável, como possível.

Entre os assuntos que têm consumido meu tempo ultimamente, está traçar uma espécie de cartografia da democracia no Brasil, observando os muitos influxos do Direito nessa forma de organização social e política. Trocando em miúdos, o que quero saber é se o Direito tem funcionado mais como uma teoria do poder, ou seja, como um instrumento que legitima certas práticas, ou se é uma espécie de ferramenta garantidora de liberdades, pressupostos emancipadores e por aí vai... Complexo? Não. Com certeza. Há uma série de indicadores que ajudam a formatar o argumento numa ou noutra direção, e é isso que quero compartilhar, hoje, com os leitores desta Gazeta.

Pois bem, vamos lá, por “tópicos”.

Segundo estimativas de uma força-tarefa encabeçada pela Universidade de Gotemburgo, na Suécia, pela primeira vez em duas décadas o mundo tem mais regimes políticos fechados – como a Rússia, a China, a Venezuela ou a Coreia do Norte – que democracias liberais. Isso significa que cerca de 72% da população mundial – ou 5.7 bilhões de pessoas – vivem nesses regimes. Tomando um chimarrão no centro de Sobradinho, numa roda de amigos, é difícil imaginar, mas em quase dois terços da população global as reuniões sociais, como as que gostamos de fazer, são vigiadas ou proibidas.

Essa onda autoritária, se assim podemos chamar, tem alterado o equilíbrio do poder econômico. Agora, os regimes fechados representam 46% do PIB mundial. Esses percentuais, por sua vez, também influenciam as relações comerciais. Se, em 1998, 74% do comércio internacional era entre democracias, agora apenas 47% de todas as transações são entre democracias. Isso significa que, mais cedo ou mais tarde, negociaremos com ditadores? Sim.

E o Brasil? Com um pé lá e outro cá, nosso país parece surfar uma espécie de onda regional. Na América Latina, 83% dos habitantes está em democracias (pelo menos) eleitorais, em que você tem eleições livres, mas uma vez escolhido o governante, ele pouco presta conta de seus atos (inclusive ao Judiciário). O México é um exemplo. Por outro lado, 12% dos latino-americanos vivem em regimes autoritários fechados, como Cuba ou Venezuela.

E aí, meus caros leitores, o que vocês acham? Como estará o mundo daqui a dez anos? Os conflitos entre russos e ucranianos, ou entre Israel e o terrorismo do Hamas, influenciam essa discussão ou não? Mais importante: num futuro, talvez próximo, todas essas coisas terão reflexo nas nossas vidas, aqui no Brasil? A resposta é com vocês!

 

Giancarlo Montagner Copelli

Membro correspondente da Academia Centro Serra de Letras.

 [1] Professor. Mestre e doutor em Direito. Especialista em Filosofia Política. Filósofo.


Marúcia Degli Sgualdi

Não é sobre homens e mulheres. É sobre gente.


Vamos falar sobre o óbvio que tentamos , a muita força, esconder.Que homem, pasme, sente. Que mulher, pasmem também, sente.Que homens e mulheres, são gente. Este tanto de força que fazemos para parecermos fortes e onde tudo que conseguimos demonstrar é nossa maior fragilidade: a necessidade de aceitação alheia!Esta, que esfrega na nossa fronte o quão distantes de nós mesmos estamos. Ora, por que precisamos de tanta aceitação se, ao não saber quem sou direito, não poderia saber quem quero que seja aceito por alguém?De onde vem o cabimento de que alguém, que por sua vez, também está longe de si, teria condições de, primeiro, captar quem eu sou e, segundo, dar-me “aprovação”? A cada bebê humano que nasce um destino é traçado de acordo com um exame de ultrassom. Se for menino, tal destino.Se menina, outro, então?E seguem-se as determinações sem considerar a vontade do que nasceu eximindo-o de Ser numa trajetória pré-determinada onde, talvez, a única coisa que ele não consiga fazer é selar o próprio “nascimento”! Sim, tudo por amor!Tudo com as melhores das intenções!Nossas “crias” levam nosso gene, cultura adiante e é necessário que isso seja protegido.Somos nós que vivemos neles e precisamos ser perpetuado nessa corrente sem fim...da qual não lembramos quem são nossos tataravós. O que tem que ser porque sempre foi assim não é o que está sufocado em nós. “Seja feliz quando crescer meu filho! Você precisa ser alguém quando crescer!” Quando crescer?E quem somos nós que dizemos? 

Temos coragem de olhar pra criança no mais profundo de seu olhar e apenas encarar o que surge dentro de nós sem nada dizermos a ela? Temos a decência de sair de trás das cortinas do palco que nossas vidas sempre foram para assumir a simplicidade que tanto pregamos como atitude diária que nos levaria a uma paz com a qual não sabemos lidar? Meninos e meninas...têm brincadeiras próprias.Cores.Gestos.Formas de sentar.Roupas. Riso e choro.Ah, perdão: meninos não podem chorar! Quando teremos a integridade de nos escondermos num quarto e olharmos no espelho pra que quando saiamos possamos na vida nos colocar? 

Ledo engano, meus amigos, não fazer isso querendo manter aparências, pois o fato é que ninguém está a nos visualizar. As crianças e adolescentes são a lembrança de que existe essência em nós.Adultos, sabedores do que não queremos experimentar, mais do que daquilo que gostaríamos de vivenciar. A revolta que tentamos sufocar neles, chamando de rebeldia e frescura da idade são os instrumentos da vida querendo se expressar, se debatendo num sistema que há séculos impomos a todos e está a nos degradar. Observar! Recriar a comunicação! Desarmar-se de tanta “razão”!Recuperar o toque, os olhares, o riso, a descontração! Coisas de menino e de menina são coisas de homens e mulheres que hoje choram quietos porque não souberam dizer sim nem não!Aos bons momentos, menos ainda aos de opressão. Somos os restos de uma falha, no mais alto dos graus, da educação!Posto que nela, mesmo com a melhor das intenções, havia menos de amor e mais de projeção! Projeção de quem queriam que fôssemos jogados como última esperança soterrando quem nossos filhos são!Criando monstros, muitas vezes, afogados em mimos quando precisavam sentir segurança por parte de quem deveria guiá-los numa firme direção! Em amorosidade severa, no caminho de comprometimento, não de negação! 

Se algum dia, sairmos da inércia, desta zona de desconforto e abrirmos este caminho de expressão, quem sabe seremos lembrados pelos nossos tataranetos através das virtudes que neles atuarão! Homens e mulheres,pasmem,sentem! Tanto quanto crianças têm capacidade de compreensão. Assuntos de adulto e assuntos de criança deviam ser assuntos de gente! E a vida...ah, a vida!Essa,um dia,será um caminho onde haja desafios sim, mas respeito e compaixão! Agora isso, meus amigos, só quando o humano descobrir que antes de sermos homem ou mulher, pai, mãe, filho, neta...antes dos títulos, somos gente! Quem sabe então, respeitaremos uns aos outros, gente ou não!

Miguel Carlos Limberger

A AGRICULTURA DAS ANTIGAS (publicado Jornal Gazeta em 24 de março de 2023)

         Hoje deixo meu lado escritor para adentrar no lado sindicalista ou de agricultor que foi minhas origens e pelo qual me orgulho até hoje. Na verdade uso como profissão agricultor, pois estou presidente do Sindicato pelo fato de ter sido agricultor que nasceu a algumas décadas na localidade de Serrinha Alta-Segredo, na beira do mato.

         Muitas vez digo, igual aquela música, sou do fundo da grota. Mas graças a Deus que é lá do interior que o nosso agricultor empunha suas ferramentas e máquinas para produzir o alimento pra toda população.

         A atividade mais vulnerável, e mais braçal, cansativa, é a agricultura, pois o produtor compra os insumos e defensivos, com seus elevados preços, mete o braço na lavoura para o preparo do solo, embaixo de um sol de 35 graus, depois vem o plantio, os tratos culturais, e daí fica rezando para que chova normalmente ou no tempo certo.

         Em nossa região é plantado de agosto a outubro e neste período não pode faltar chuva. Mas, fazem quatro safras que tem dado estiagem e muitos agricultores não conseguiram ou conseguem colher nem a metade do previsto. E mais outra questão que deixa muitos sem dormir: como pagar os bancos e outros compromissos. E o agricultor é fiel aos seus compromissos. Muitas vezes o agricultor traça seus planos e sonhos, ou metas, e acaba na frustração e até caindo na depressão.

         Mas o tema desta coluna é para ser dos tempos de antigamente. Nos meus tempos de menino, anos 70 e 80, não existia trator para plantar, tudo era feito a braço com o arado de bois para preparar o solo, gradear com bois para emparelhar, com as matracas ( maquininhas a mão) para plantar. Levava-se dias para plantar uma lavoura de milho manualmente.

Minha família, plantamos algumas safras de soja, tudo de matraca e cortado de foiçinha, depois aos feixes nas costas era empilhado num grande monte no meio da lavoura. Um irmão pegava o cavalo e ia atrás de uma trilhadeira pra trilhar a soja. Era assim.

         O arroz era plantado a mão, carpido de enxada, cortado de foiçinha e batido a mão encima de uma tábua sobre um pano estendido. Depois juntava tudo, limpava meio a mão e levava para casa esparramar em cima do assoalho no galpão para secar. Só depois era colocado nas tuias, mas tinha que fechar muito bem para os ratos não tomarem conta.

         O trigo, quase todos os agricultores plantavam trigo naquela época, era derrubado um pedaço de mato (naquela época era permitido) para naquela roça-nova plantar o fumo em corda. Na segunda safra era semear o trigo, no meio da imensidade de tocos e torras que restavam, para quando maduro cortar de foiçinha e trilhar com as trilhadeiras.

         Em se falando de fumo em corda, na música do Iedo Silva, ele canta "fumo bom de Sobradinho, e palha de Encruzilhada". Na verdade o fumo era produzido a maioria no distrito de Segredo, inclusive pelo meu pai e meus irmãos. Meu mano Ivo produz até hoje.

Para o milho, as lavouras eram feitas de arado com uma junta de bois, ou dois arados, que se levava até uma semana para fazer uma lavoura, depois gradear com bois, plantar com as matracas, capinado de enxada, ( lembro que fiquei uma semana sozinha capinando em uma lavoura na divisa com o Dirceu Ceolin), depois quebrado as espigas a mão em pequenos montes no meio da lavoura,  depois se buscava as espiga de carroça para armazenar no paiol. E lá vinham os ratos e carunchos para destruir parte do produto. Também se usava a capinadeira puxada a bois, ou até com um cavalo, que a gente passava no meio das careiras de milho para dar menos serviço de enxada. Passava-se no fumo também.

         O Segredo, quando ainda pertencia a Sobradinho, era o que mais plantava feijão, pelo que motivou a festa da FEJAO. Também tudo a braço, mas naqueles tempos dificilmente dava estiagem e se produzia bem. Tudo batido manualmente a manguá em cima de um pano. Lá nos anos 80 o Idalino, vizinho do pai, comprou uma batedeira, que era um implemento acoplado no trator, para trilhar o feijão.  Bem mais fácil e rápido.

         Vale ressaltar que naqueles tempos não existia os herbicidas, conhecidos como secante para matar os insos, como exemplo o glifosato, era na enxada mesmo. Hoje os tratores têm uma avançada tecnologia, até ar condicionado, alguns com som, de onde uma lavoura que levava uma semana lavrando com bois se faz em menos de meio dia.

         E as colheitadeiras, muito modernizadas, que colhem o soja, o milho, trigo e até o feijão. Até drones estão sendo usado na tecnologia de hoje. Quanto mais tecnologia mais produção. E é preciso evoluir e fazer com que tudo seja mais rentável. E graças ao agricultor que planta, que o povo almoça e janta. ( Miguel Limberger- membro fundador da Academia Centro Serra de Letras).


Luiz Carlos Lopes Bastos

O R G U L H O (Publicado no Jornal Gazeta em 19/09/23)

 

Deve-se, inicialmente, fazer uma diferenciação entre os dois sentidos que a palavra possui. Em primeiro plano, sempre que se fala em orgulho, nos lembramos de uma pessoa vaidosa, presunçosa, cheia de si. Logo, este tipo de orgulho não é bom, pois é danoso para o espírito humano. Também existe um outro conceito, que é aquele em que a pessoa sente verdadeiramente orgulho de si, de seus familiares, de seus amigos, etc. Este tipo ou sentido de orgulho é bom, é saudável, realizado em prol do bem comum ou para engrandecimento do ser humano.

Logo, orgulho é uma palavra de sentido ambíguo. Pode ser bom, assim como, pode ser mau. O sentido dessa palavra está vinculado ao verbo que o acompanha. Ser orgulhoso dá uma conotação negativa, ao passo que, ter orgulho ou  estar orgulhoso é positivo.

      Definidos os dois sentidos maiores da palavra Orgulho, passo a tecer alguns comentários sobre um e outro.

      No primeiro conceito, as igrejas cristãs condenam o orgulho como um dos sete pecados capitais por ser um tipo de sentimento que conduz o ser humano a um estado de amor-próprio muito acentuado; faz com que a pessoa se sinta o centro de atenções, estimula, assim, a vaidade e dá importância demasiada para sua aparência pessoal ou posição social. Este é um sentimento que impede a possibilidade de se aceitar os próprios erros, posto que não admite nunca haver cometido enganos e, assim, jamais pedirá desculpas por algo feito. A pessoa possuidora desse tipo de  orgulho, geralmente, também é debochada e desrespeitosa para como seus semelhantes. O orgulhoso costuma viver num ambiente falso, o que faz com que evite a aproximação de pessoas humildes, mesmo aquelas que pretendam ajudá-lo a se livrar de tal pecado capital.

      No decorrer da história universal se verificou muitos fatos e situações em que reis, imperadores e outras pessoas de importância, prejudicaram os seus governos e seus súditos por excesso de orgulho e vaidade.

      Já, o outro sentido da palavra nos dá a entender que possuir, ter orgulho é bom, pois incentiva a permanecer na prática de atos que nos deem alegria, felicidade, satisfação. Este tipo de sentimento nos enche de amor-próprio e nos faz elevarmo-nos tanto no conceito de nossos semelhantes como no nosso próprio.

      Geralmente, os pais têm muito orgulho de seus filhos diletos, aqueles que lutaram em prol de sua liberdade, de sua independência social e econômica, enfim, do bem-estar de todos os seus compatriotas.

Sentir essa modalidade de orgulho, de si ou de alguém, não fere sentimentos, não melindra ninguém, mas, pelo contrário, enaltece e engrandece os feitos de alguém.

      A pessoa que vive dentro das regras da boa convivência, dentro das normas sociais, é, sempre, bem vista pelos seus iguais e, por conseguinte, se torna bem quista. Tanto ela, como seus familiares e seus amigos, sente muito orgulho pela sua maneira de se portar. Esse tipo de orgulho é saudável, é bom e traz muita dignidade para si.

      O Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa é muito claro em suas definições de ambos. Senão, vejamos: 1. Sentimento de dignidade pessoal; brio, altivez. 2. Conceito elevado ou exagerado de si próprio; amor-próprio demasiado, soberba.

      Assim, a pessoa orgulhosa pode ser aquela que tem orgulho; altiva, briosa, ou, aquela que é vaidosa, soberba. São conceitos totalmente antagônicos.

      Logo, posso afirmar que não sou uma pessoa orgulhosa (vaidosa) mas, tenho orgulho de ser quem sou.

 

Luiz Carlos Lopes Bastos, Membro correspondente, cadeira nº 31 da Academia Centro Serra de Letras.

Marta Bernadete Tavares

Educação: um ato atemporal

 

 

O trato com as palavras é um trato delicado, arraigado, precioso, repleto de vidas e guardares, como os dos colegas que a mim antecederam em seus registros. Entretanto ocupar esse espaço é uma honra, um desafio, uma responsabilidade e um compromisso para além do pessoal e profissional.

Desta forma que olho para o mundo; questionando-me: torná-lo “melhor” é tarefa de quem? De quem habita? De quem gestiona? Dos que estão aqui hoje? Dos que virão?

Parece clichê, algo pouco evoluído esses questionamentos, no entanto são os primeiros que por ora passam pela cabeça da maioria das pessoas. Mas o conjunto da obra a “que” e a “quem” se destina?

Assim, diria que é efervescente o ofício de educar que habita em mim, pois ele analisa quem somos, onde estamos e o que construímos. Nossa obra precisa ser física?

Nesse borbulhar é um tanto trivial pensarmos na educação como compromisso social, da mesma maneira na etimologia da palavra atemporal, diante da conjuntura em que nos encontramos, educadores formais e informais que somos. O que fazemos como família, escola, comunidade, sociedade para buscarmos através da educação as mudanças e transformações sociais necessárias para evoluir, transpor e fomentar a formação de sujeitos, na inteireza humana, onde o amor e a empatia possam ser a base de nossas ações?

Na formalidade desse processo de educação atemporal, peço licença para com carinho recordar e demonstrar minha gratitude, à minha família, aos mestres que me antecederam, aos que comigo seguem, pois como diz o querido poeta Mario Quintana “A vida é um dever que trouxemos para  fazer em casa”. Para trocadilho com o poeta, pensa-se que para alçar grandes voos só se é possível em grandes e majestosas aeronaves, mas sabe-se que de pequenos gestos que o mundo se constrói e se transforma.

Sendo eu, uma destas “pequenas”, lá pelos meados da década de 70, a poderosa, o Pequeno Príncipe versão feminina, quando pelo ato de educar, assim me tornei ao descobrir o sabor da leitura e da escrita. Nem mesmo a falta do que ler e onde escrever tosquiaram esse despertar, haja visto que há alguns registros nas paredes de madeira que habitam os galpões da chácara de meu pai. Diria que cá, na minha memória atemporal, há um olhar ímpar em meus primeiros arquivos de leitura, estes formados dos jornais desamparados, os quais envolviam as pencas de bananas que meu Dindão Baldoque enviava-me de presente pelo meu pai Nilo, quando se encontravam pela cidade.

Minha humilde essência emerge dessas raízes e não menos valiosas buscam exemplificar que educar é um ato universal, que transcende a essência do indivíduo; é um ato perene e ancestral, de construção individual e também coletiva; porém de incumbência compartilhada.

Na transparência dessa construção contínua, há de se assumir que somos responsáveis e co-responsáveis pelo cenário que nos encontramos, visto que o ato de educar tem como responsabilidade primordial a constituição familiar e por conseguinte a escola, pois percebe-se que em alguns contextos  desviaram-se os papéis, em busca de alguns avanços e superações que esvaziaram nossas memórias do guardar como cuidar, zelar, preservar, como também nossos ofícios de educadores, o quê cabe a quem, em que momento?

Nessa conjuntura somos todos marinheiros, num mesmo barco, independentes das viagens, escolhas e renúncias, agrados e desagrados, posições contraditórias, rupturas e continuidades, tudo isso sempre movimenta-se para a transformação.

Portanto, sejamos melhores educadores, como família, escola, gestores e sociedade, para evoluirmos como humanidade. Nossa vida é um compromisso social que se edifica para além de nosso umbigo. Isso nem sempre é algo bom de falar, ouvir, ler ou escrever, mas não é isso que devemos nos propor como educadores, mas sim o que podemos contribuir para o mundo onde estamos. Que não sejamos como o Pequeno Príncipe em seu planeta sozinho, mas que aprendamos nas atitudes da personagem que somos responsáveis por cada um que cativamos.  Cative sua família, cative em seu lugar social, sejamos seres cativados, promovendo educação e a cultura atemporal. O futuro é  agora, a responsabilidade também é sua!

 

Professora estadual e municipal; Pedagoga; Especialista em Metodologia de Ensino (FACULDADES INTEGRADAS DE AMPARO); Especialista em Pedagogia Gestora: Ênfase em Administração, Supervisão e Orientação (FACVEST); Especialista em Tecnologias da Informação e da Comunicação Aplicadas à Educação (UFSM).


 

ComunicAção:  Do  diaLogar ao conectar

 

Nessa tríade já intitulada, proponho uma plausível e sutil escrita refletindo sobre hábitos e conexões decorrentes ao olhar os ecossistemas da humanidade. Partindo do pressuposto que toda premissa tem seu fio condutor, que ao pensar nas capacidades humanas construídas ao longo da existência nos traz a célula vital, a capacidade de comunicAção que estabelecemos desde o tempo das cavernas. Quisera reconhecer que o sinal de fogo já comunicava nossos ancestrais que algo estava por vir, assim como ao deixar um local de abrigo algumas inscrições registravam a estada ou passagem nos mais longínquos territórios.

Como aponta John C. Maxwell, na obra Todos se comunicam e poucos se conectam: “De acordo com especialistas, somos bombardeados com trinta e cinco mil mensagens por dia. Todos os lugares aonde vamos, todos os lugares para onde olhamos, alguém está tentando chamar nossa atenção. Todos os políticos, publicitários, jornalistas, membros da família e conhecidos têm algo para falar para nós. Todos os dias, deparamo-nos com e-mails,  mensagens de texto, outdoors, televisão,filmes,rádio,twitter,Facebook e Blog. Acrescente aí jornais, revistas e livros. No nosso mundo é um amontoado de palavras. Como escolhemos a que mensagens devemos prestar atenção e a quais não devemos? Mas quantas de suas palavras seriam importantes? Quantas fariam a diferença? Quantas chegariam aos outros?”

Nesse ritmo a vida segue. Recordo felizmente parte de minha infância, onde a comunicAção chegava via ondas do rádio, se tinha tempo para causos, histórias, serões, visitas e trocas, as pessoas olhavam nos olhos umas das outras e realmente se comunicavam, havia afinidade, caso a “prosa” não fosse de interesse, o respeito e a conexão se estabelecia.

Inquieta-me refletir sobre como estamos caminhando nessa construção. Temos a habilidade da comunicAção? Alcançamos a competência da conexão com nossos semelhantes? Sobre que essência está o daiLogar, restrito às conexões tecnológicas? Qual espaço para o diálogo olho no olho em nossa vida? Você se lembra com quem e sobre o que foi sua recente conversa?

Cabe a cada um de nós olhar para dentro, compreender a quantas anda o mundo aqui fora, deixar a estranheza de lado e buscar a si para encontrar a forma efetiva de comunicação, pois o sucesso de nossa relação para conexão centra-se aí, em diaLogar e conectar-se com o outro em todas as esferas.

James Clear em sua obra Atomic Habits registra que: “Todas as grandes coisas vêm de pequenos começos. A semente de todo hábito é uma decisão única e minúscula. Mas, à medida que essa decisão é repetida, um hábito brota e se fortalece.”  Acredita-se estar aí o desafio para as transformações da humanidade.

Pergunte-se, como  posso saber se me conectei? Simples, na relação recíproca,  você e o outro, se ambas inteirezas importam, estão conectados. Afinal, pequenos passos podem gerar resultados notáveis e grandiosos se estiveres disposto a insistir neles.

Percebe-se então, que as habilidades pessoais fomentam mudanças e produzem resultados em qualquer organização e devem estar ligadas ao uso da capacidade de fazer conexões produtivas e duradouras com as pessoas. Saiba comunicar-se, dialogue para conectar-se, para deixar um pouco de si e levar um pouco do outro, afinal, somos imperfeitos, inacabados e é nas interações que nos construímos, transformamos-nos e evoluímos.

A propósito, como você tem estabelecido sua comunicação, seus diálogos e suas conexões?

 

Marta Bernadete Tavares- Cadeira 15.


João Marcos Adede Y Castro

É O PRECONCEITO E A CRUELDADE

Me dói, fisicamente, no peito e na alma, ouvir autoridades dizerem que a presença de deficientes físicos ou mentais junto a alunos não deficientes, ATRAPALHA a educação!

É muita crueldade.

O que ATRAPALHA a educação é gente que não se dispõe a respeitar as diferenças e as dificuldades dos deficientes, não se dispõe a amar, acolher, acarinhar e a crescer com a convivência.

Os deficientes têm muito a ensinar, pois nascem e crescem nas dificuldades, na discriminação odiosa, no olhar "enviesado", no comportamento nojento dos "normais" que se acham melhores, mais capazes e merecedores da melhor educação, dos melhores empregos e funções por terem tido a sorte de nascer sem "defeitos" físicos ou mentais.

Dizer que o deficiente ATRAPALHA a educação dos não deficientes como justificativa para segregá-las em turmas especiais é o primeiro passo para isolá-las em guetos e, não se espantem, em voltar a chamá-las de "retardados" que devem ser eliminados fisicamente para não atrapalhar a sociedade linda, limpa, perfeita, ideal, com pernas torneadas, cabeças ovaladas, mãos e dedos longos, caminhar reto e seguro, cérebros pensantes e produtivos.

Porque vamos gastar nossos recursos financeiros com gente que só dá despesa, que produz pouco ou nada?

Não é preciso dizer que fazem pouco mais de 70 anos que o mundo se livrou desse tipo de governo que não aceitava o feio, o torto, o diferente.

Sim, a exclusão de alunos deficientes, a segregação deles em turmas especiais é forma criminosa de justificar a morte civil, uma forma "legal" de eliminar os indesejados, social e fisicamente, deixar de gastar dinheiro com "essa gente inútil, improdutiva"!

Num mundo altamente competitivo, que sentido tem ficar gastando dinheiro com doentes mentais e incapazes fisicamente?

Ah, o Adede é exagerado! Vai achando, e quando nos dermos conta, tudo que construímos em termos de humanidade terá virado pó, em nome da "pureza da raça".

Povo que não conhece a história está fadado a repetir os mais terríveis crimes contra a humanidade!