-Exposição realizada na ÁRVORE - Pôrto, Portugal, em 2005.
Texto do catálogo:
O encontro com a obra de Chico Dantas aconteceu uns dez anos atrás numa galeria em S. João da Madeira. Pintura de atmosferas de um espaço sem limites, apenas as fronteiras da tela como fim do olhar. Nele vagueavam, etéreas, figuras envoltas numa espécie de véus ou brumas; sensuais e misteriosas, femininas quase sempre
É essa memória que evoco, hoje, ao olhar para as fotografias das pinturas recentes e em elas fui encontrar as semelhanças e as diferenças, que as unem e separam. Levi-Strauss propõe que se distinga as duas proposições seguintes: só as semelhanças diferem, e só as diferenças se assemelham. Nos actuais trabalhos de Chico Dantas essas duas proposições são verificáveis e se podemos encontrar, em semelhança, a mesma pintura de atmosferas, já a diferença se estabelece no espaço, que passa a ter limites e nos encaminha para níveis de profundidade estabelecidos por formas e cores em sobreposições transparentes. As figuras continuam, mas diferem na sensualidade e mistério das anteriores. Agora elas são imprecisas e, os véus diáfanos que as envolviam, transformaram-se em sobreposições de cores informais que se de gladiam na definição do primeiro plano, mostrando e ocultando, simultaneamente, a figura. A linha define contornos, desenha partes das figuras que se perdem numa mancha de cor ou de textura, para mais adiante encontrarem de novo o desígnio perdido.
O artista escreve em dada altura: (…) (Área de Risco é o título) é um trabalho despreocupado com as fronteiras do desenho e da pintura, com imagens que são antes sintomas e não algo propriamente diagnosticado em vista do carácter fragmentário com que o desenho e a pintura se conduzem. (…)
É interessante considerar a ambiguidade significante do título escolhido pelo artista para denominar este conjunto de trabalhos em que a palavra – risco - pode inferir do traço/linha que a liga ao desenho, conotando-os com esse meio de expressão ou o – risco – entendido como: - correr o risco – procurando o significado no verbo que determina a acção dearriscar.
Continuando a recorrer ao texto que Chico Dantas me escreveu para complementar as imagens enviadas, este refere o carácter experimental e de pesquisa que o uso de materiais inusitados conferiu ao próprio processo de construção da imagem/quadro: (…) São execuções em carvão, giz, resina acrílica transparentes ou pigmentada e, em alguns casos, intervenções (cirúrgicas?) com “filmes” moldados em resinas que, sobre os mesmos, desenvolvem-se desenho ou pintura (utilização de elementos pré-elaborados) que esticados e colados sobre partes da obra promovem na figura, se for o caso, distorções naturais pela própria mecânica do processo. (…)
A primeira palavra do título – Área – remete-nos, de igual modo, para um duplo sentido da palavra. Área - o local/espaço/suporte em que se faz, desenha o risco ou tempo/fazer em que se arrisca. E mais uma vez recorro ao texto de Chico Dantas para melhor entendimento da proposição e intenção do fazer destes trabalhos: (…) As intencionais correcções que aparecem nos quadros, mais parecem caiações pelo uso da trincha ou rolo e remetem o espectador a questionar como seria aquela imagem suprimida, mas que insinua-se através das transparências, ou ainda qual o motivo do gesto do artista quando as correcções não demonstram, em absoluto, a preocupação de aperfeiçoar escorços ou quaisquer outros aspectos; tratam-se de actos deliberadamente interventores, ou mesmo sumários, uma vez que são cometidos sem escrúpulo de que isso venha melhorar os resultados subsequentes, mas que apontam para um processo de fazer e refazer quase exaustivo, que desmente a imagem. Se por um lado se cria um desvio desnecessário de leitura, por outro, essas acções interventoras funcionam como instância de discussão dos próprios métodos de construção da imagem. Nesse ponto os méritos devem ser atribuídos ao âmbito das atitudes pela subversão de etapas anteriores mesmo se as conduzir a uma “remissão”que poderá ser bem mais dolorosa. A imagem em processo de transmutação por si só possui seus valores (o significante) adquiridos.
Parece-me que o trabalho de Chico Dantas depois de lido através das suas próprias palavras fica mais clarificado nas suas intenções sem que isso nos impeça de o sentir pelo lado das emoções vividas perante os seus quadros de luz e névoas coloridas de onde emergem silhuetas difusas, angustiadas, que parecem pedir ajuda para delas emergirem ou nelas se perderem para sempre.
Luisa Gonçalves*
Pôrto, 2005
*Formada em Escultura pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto, e professora na Escola Secundária Soares dos Reis Especializada de Ensino Artístico.
Catálogo da exposição na Árvore - Porto, Portugal, em 2005.
Chico Dantas -Texto catálogo – Árvore 2005
O encontro com a obra de Chico Dantas aconteceu uns dez anos atrás numa galeria em S. João da Madeira. Pintura de atmosferas de um espaço sem limites, apenas as fronteiras da tela como fim do olhar. Nele vagueavam, etéreas, figuras envoltas numa espécie de véus ou brumas; sensuais e misteriosas, femininas quase sempre.
É essa memória que evoco, hoje, ao olhar para as fotografias das pinturas recentes e em elas fui encontrar as semelhanças e as diferenças, que as unem e separam. Levi-Strauss propõe que se distinga as duas proposições seguintes: só as semelhanças diferem, e só as diferenças se assemelham. Nos actuais trabalhos de Chico Dantas essas duas proposições são verificáveis e se podemos encontrar, em semelhança, a mesma pintura de atmosferas, já a diferença se estabelece no espaço, que passa a ter limites e nos encaminha para níveis de profundidade estabelecidos por formas e cores em sobreposições transparentes. As figuras continuam, mas diferem na sensualidade e mistério das anteriores. Agora elas são imprecisas e, os véus diáfanos que as envolviam, transformaram-se em sobreposições de cores informais que se de gladiam na definição do primeiro plano, mostrando e ocultando, simultaneamente, a figura. A linha define contornos, desenha partes das figuras que se perdem numa mancha de cor ou de textura, para mais adiante encontrarem de novo o desígnio perdido.
O artista escreve em dada altura: (…) (Área de Risco é o título) é um trabalho despreocupado com as fronteiras do desenho e da pintura, com imagens que são antes sintomas e não algo propriamente diagnosticado em vista do carácter fragmentário com que o desenho e a pintura se conduzem. (…)
É interessante considerar a ambiguidade significante do título escolhido pelo artista para denominar este conjunto de trabalhos em que a palavra – risco - pode inferir do traço/linha que a liga ao desenho, conotando-os com esse meio de expressão ou o – risco – entendido como: - correr o risco – procurando o significado no verbo que determina a acção de arriscar.
Continuando a recorrer ao texto que Chico Dantas me escreveu para complementar as imagens enviadas, este refere o carácter experimental e de pesquisa que o uso de materiais inusitados conferiu ao próprio processo de construção da imagem/quadro: (…) São execuções em carvão, giz, resina acrílica transparentes ou pigmentada e, em alguns casos, intervenções (cirúrgicas?) com “filmes” moldados em resinas que, sobre os mesmos, desenvolvem-se desenho ou pintura (utilização de elementos pré-elaborados) que esticados e colados sobre partes da obra promovem na figura, se for o caso, distorções naturais pela própria mecânica do processo. (…)
A primeira palavra do título – Área – remete-nos, de igual modo, para um duplo sentido da palavra. Área - o local/espaço/suporte em que se faz, desenha o risco ou tempo/fazer em que se arrisca. E mais uma vez recorro ao texto de Chico Dantas para melhor entendimento da proposição e intenção do fazer destes trabalhos: (…) As intencionais correcções que aparecem nos quadros, mais parecem caiações pelo uso da trincha ou rolo e remetem o espectador a questionar como seria aquela imagem suprimida, mas que insinua-se através das transparências, ou ainda qual o motivo do gesto do artista quando as correcções não demonstram, em absoluto, a preocupação de aperfeiçoar escorços ou quaisquer outros aspectos; tratam-se de actos deliberadamente interventores, ou mesmo sumários, uma vez que são cometidos sem escrúpulo de que isso venha melhorar os resultados subsequentes, mas que apontam para um processo de fazer e refazer quase exaustivo, que desmente a imagem. Se por um lado se cria um desvio desnecessário de leitura, por outro, essas acções interventoras funcionam como instância de discussão dos próprios métodos de construção da imagem. Nesse ponto os méritos devem ser atribuídos ao âmbito das atitudes pela subversão de etapas anteriores mesmo se as conduzir a uma “remissão”que poderá ser bem mais dolorosa. A imagem em processo de transmutação por si só possui seus valores (o significante) adquiridos.
Parece-me que o trabalho de Chico Dantas depois de lido através das suas próprias palavras fica mais clarificado nas suas intenções sem que isso nos impeça de o sentir pelo lado das emoções vividas perante os seus quadros de luz e névoas coloridas de onde emergem silhuetas difusas, angustiadas, que parecem pedir ajuda para delas emergirem ou nelas se perderem para sempre.
Luisa Gonçalves*
Pôrto, 2005
*Formada em Escultura pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto, e professora na Escola Secundária Soares dos Reis Especializada de Ensino Artístico.