Jornal de Estudos Espíritas 13, 010203 (2025).
Espelhos mágicos: a revisão de Kardec, mas não da Doutrina
Kardec’s revision of his own position, but not of the principles of the Doctrine
Kardec’s revision of his own position, but not of the principles of the Doctrine
1 Campinas, SP
Recebido em 20 de Junho de 2025, publicado em 06 de Setembro de 2025.
Como citar: A. F. da Fonseca, Jornal de Estudos Espíritas 13, 010203 (2025), DOI: https://doi.org/10.22568/jee.v13.artn.010203.
Resumo: A mediunidade é uma faculdade humana que permite o intercâmbio de informações entre encarnados e desencarnados. A Doutrina Espírita descreve e explica as condições essenciais para a ocorrência do fenômeno medíunico. Ela demonstra que a mediunidade se fundamenta na capacidade perceptiva anímica dos seres e na ação dinâmica do pensamento e da vontade dos Espíritos sobre os fluidos espirituais. De raízes orgânicas, a faculdade mediúnica requer a expansão do perispírito do médium. No número de outubro da Revista Espírita (RE) de 1864, Kardec descreve a faculdade de dupla vista de um camponês da região de Berna, na Suíça. Em particular, lhe chamou a atenção o fato dessa faculdade ser induzida por certos reflexos de luz em um copo de vidro. Kardec, então, busca explicar o fenômeno com base no princípio irradiante do fluido perispiritual, mas também argumentando que o copo servia apenas como foco de concentração do camponês, para o qual os fluidos espirituais seriam dirigidos. Um ano depois, na RE de outubro de 1865, Kardec retoma o assunto, esclarecendo que cometeu um equívoco nessa explicação. O equívoco teria sido considerar que objetos como o copo, ou “espelhos mágicos” como esses objetos eram chamados, seriam totalmente prescindíveis e usados apenas por hábito. Ele acreditava que tais pessoas poderiam exercer a visão à distância perfeitamente sem os mesmos, desde que se exercitassem e esforçassem para isso. O reconhecimento deste erro é comumente citado como um exemplo de caráter e honestidade científicos de Kardec. Neste artigo, revisito, discuto e mostro que o equívoco de Kardec não implica em equívoco doutrinário. Isto é, os princípios doutrinários que fundamentam os fenômenos anímicos e mediúnicos permaneceram os mesmos utilizados nas explicações do primeiro artigo da RE. O que mudou foi o reconhecimento de que, para certas pessoas, o uso de objetos como os espelhos mágicos para indução das mesmas à expansão perispíritica, se baseia em razões naturais. Nesse particular, Kardec mostra o paralelo com a então nascente ciência do Hipnotismo.
Palavras-Chave: Espelhos mágicos; Erro de Kardec; Doutrina Espírita; Expansão perispirítica; Mecanismos da Mediunidade; Hipnotismo.
Abstract: Mediumship is defined as a human faculty that facilitates the transmission of information between incarnate and discarnate beings. The Spiritist Doctrine delineates and elucidates the fundamental prerequisites for the manifestation of mediumistic phenomena. This phenomenon underscores the premise that mediumship is predicated on the soul’s capacity to discern external stimuli and the dynamic influence of spirits’ thoughts and wills on spiritual fluids. The mediumistic faculty, with its organic roots, necessitates the expansion of the medium’s perispirit. In the October 1864 issue of the Spiritist Magazine (SM), Kardec presented a case study of second sight in a peasant from the Bern region of Switzerland. Notably, he was intrigued by the observation that this peasant’s faculty was stimulated by specific reflections of light within a glass beaker. Kardec then sought to elucidate the phenomenon on the basis of the radiating principle of perispiritual fluid. Furthermore, he argued that the glass served exclusively as a focal point for the peasant’s concentration, towards which the spiritual fluids would be directed. Subsequently, in the October issue of the 1865 SM, Kardec revisited the subject, clarifying that his initial explanation had been erroneous. It would have been erroneous to presume that objects such as glass, or “magic mirrors”, as they were referred to, were entirely dispensable and solely employed out of habit. He posited that such individuals possessed the capacity to utilize second sight, independent of external tools, on the condition that they engage in regular exercise and make a concerted effort to do so. The acknowledgement of this disposition is often cited as an illustration of Kardec’s character and scientific integrity. In this article, I reexamine, discuss, and demonstrate that Kardec’s revision of his explanation for the phenomenon does not entail a revision of the spiritist principles behind it. In essence, the doctrinal principles underlying the mediumistic and soul-self phenomena remained consistent with those employed in the initial article of the SM. A notable shift in perspective emerged, recognizing that for specific individuals, the utilization of objects such as magic mirrors is founded on natural hypnotic principles. Consequently, these objects have been found to be effective in inducing an expansion of the perispirit, a prerequisite for the occurrence of psychic phenomena. In this respect, Kardec demonstrates a parallel with the then nascent science of Hypnotism.
Keywords: Magic mirrors; Kardec’s error; Spiritist Doctrine; Perispiritual expansion; Mechanisms of Mediumship; Hypnotism.
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Link para o artigo: [PDF (1178 Kb) - DOI: https://doi.org/10.22568/jee.v13.artn.010203].