"As maneiras de perceber e vivenciar as dimensões e os ritmos temporais sofrem modificações no decurso da vida social e, como não podia deixar de ocorrer, na medida em que novos significados atribuídos ao passado, presente e futuro interferem nas formas de viver, fazer e dar significado ao mundo e à vida, essa constatação tem gerado um conjunto bastante amplo de discussões teóricas e pesquisas empíricas, buscando captar os processos envolvidos e apreender o sentido que assumem.

A auto percepção individual, as concepções elaboradas a respeito das aberturas e fechamentos que essa dinâmica envolve, as concepções sobre o(s) outro(s) que a compartilham e as relações mantidas com eles podem ser uma via de acesso eficiente para o conhecimento do (novo) contexto de sociabilidade em ação."

Maria Helena Oliva Augusto em "TEMPO,  MEMÓRIA  E  IDENTIDADE: Algumas  considerações" 

Realizada pela primeira vez, a ação cultural “Mês da Consciência Negra no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami” promoveu a apropriação de seu espaço por pessoas e realidades extraordinárias, permitindo que a instituição contribuísse para o fortalecimento da luta por igualdade racial.

Suprimir marcas tão profundas deixadas pela escravidão exige, entre outros aspectos, a adoção de medidas concretas de reparação e de elevação da representatividade dos negros em diversos postos-chave na sociedade. Não mais a partir do branqueamento social, mas de uma identidade preta, trabalhando para a destruição dos alicerces de problemas estruturais que se arrastam desde o período colonial.

A realização do “Mês da Consciência Negra no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami”, que integrou  a “Temporada da Cultura Negra” promovida pela Secretaria Municipal da Cultura, tornou-se possível devido ao envolvimento de sua equipe de servidores, de seus apoiadores – VIELAS Espaço cultural, projeto Mosaico na Quebrada, Coletivo Meio, Go Image e Blue Tree Towers – e dos convidados que protagonizaram as atividades propostas, das quais você saberá mais a seguir!

Evento “Escurecendo os fatos: um debate crítico sobre a existência de acervos de culturas não-brancas em instituições de memória”

 “Apropriação dos espaços públicos: o Transatlântico Negro e o Hip Hop no Arquivo Histórico Municipal”

XXI Colóquio no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami, com o tema “Memória coletiva: trajetórias e vozes do Beltrão”

Ecos do "Mês da Consciência Negra no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami"

Saulo Velasco, professor da disciplina de História na E.M.E.F. Alberto Pasqualini, localizada no bairro Bela Vista, planejou atividades voltadas às reflexões propostas pelo Dia da Consciência Negra, instituído no calendário brasileiro no dia 20 de Novembro. Uma iniciativa que poderia ser considerada comum se não fosse a forma como foi desenvolvida: o material utilizado foram as postagens veiculadas ao longo do mês no site do Arquivo Histórico Municipal e compartilhadas nas redes sociais da instituição e do VIELAS Espaço cultural, importante parceiro na ação. 

Segundo o professor Saulo, as atividades tiveram dois pontos-chave: um sobre os Lanceiros Negros, grupos de negros livres ou de libertos pela República Rio-Grandense que lutaram na Revolução Farroupilha, e outro na promoção de um diálogo sobre o Dia da Consciência Negra, considerando a abordagem da exposição “Refrações negras: o Beltrão que eu vejo”, cuja visitação foi feita de forma remota, por meio das imagens disponíveis nas postagens.

O professor e os alunos não puderam visitar as exposições de forma presencial em virtude de dificuldades de deslocamento: “não conseguimos ir no Arquivo, mas os estudantes tiveram a oportunidade de conhecer a realidade da nossa periferia sob uma perspectiva diferente que não a visão do preconceito, mas sim da vida das pessoas no cotidiano. Parabéns pelo trabalho desenvolvido”.

Saiba mais sobre essa participação virtual no link disponível!

Mês da Consciência Negra no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami | Repercussão e envolvimento da comunidade

EBX 1965E14T02: Baile de debutantes realizado no Clube Gaúcho. Caxias do Sul, 16 de outubro de 1965. Autoria: Foto Studio Beux. Fundo: EBX - Studio Beux.

BR_RS_APMCS_15_01_02_01_16_T05_E063: Tira de negativo flexível referente ao Bairro Euzébio Beltrão de Queiróz. Caxias do Sul, dezembro de 1983. Autoria: Antônio Carlos Galvão. Fundo: Arquivo Público Municipal.

“Fazer parte do primeiro evento com a proposta de discutir fontes históricas em Caxias do Sul e população negra, significa, de certo modo, que a discussão crítica acerca dos processos de racialização alcançou um dos lugares mais caros à produção historiográfica, o Arquivo Histórico. Os arquivos têm um compromisso com as pessoas, o de preservar as histórias dos vários grupos sociais, com suas cores, gêneros, sexos e especificidades. Do mesmo modo que não existe produção historiográfica sem fonte histórica, não existe História sem gente, é por esse motivo que o registro de todas as gentes necessitam estar nos arquivos. A História é grande e plural demais para ser contada por meio de uma história única.

Bruna Letícia de Oliveira dos Santos, historiadora


“O Arquivo Histórico de Caxias do Sul protagonizou um debate fundamental e pioneiro no segmento, de modo a

exemplificar e desacomodar outros arquivos pelo Brasil a colocarem-se como parte da luta por igualdade.”

Rafael Diogo dos Santos, o rapper Rafa Rafuagi, da Associação da Cultura Hip Hop de Esteio, que idealizou e administra o desenvolvimento e implantação do primeiro museu da cultura Hip Hop da América Latina 

O livro “Poesia que Liberta”, escrito por Amarildo Rubinei Moreira, foi lançado no dia 16 de março de 2023, nas dependências do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami. 

Amarildo, 60 anos, estreante na literatura e empreendedor da área de reciclagem,  apresentou ao leitor, 77 poesias escritas ao longo de 15 anos, escritas durante os momentos de reflexão sobre as suas diferentes jornadas, lutas e mazela. O autor relaciona o período de criação da obra com uma “caminhada de reciclagem interior". As poesias, escritas com linguagem simples e direta, abordam temas como traição, choro, saudades, coragem, superação, dentre outros.

Na ocasião foi realizada a doação da obra original, manuscrita, para integrar o acervo do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami. O valor arrecadado com a venda dos exemplares foi doado para a APAE - Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Caxias do Sul.

 Obra original manuscrita do livro "Poesia que liberta"

Poesia "Champagne", em formato original manuscrito

"Champagne!

Mente livre

Asas abertas

Fecho os olhos e assisto a minha realidade:


Estou intramuros

É aonde caminho

Com o pé-que-é-um-leque

E sonho de olhos abertos!


Minha alegria está por vir

E estourará como o abrir de champagnes,

E será exibido

Como os pássaros da minha janela;


Não construo e nem desejo castelos intramuros

Castelos de pedra

Nem de areias

Sou apenas um peixe fora d'água;

Um mar sem sereia...


'Ploc'

Está chegando!"

“Champagne”, por Amarildo R. Moreira, o “Poeta Reciclador”

“Quero agradecer ao Arquivo Histórico Municipal por ter nos acolhido no lançamento de meu livro, 'Poesia que Liberta', onde todos foram recebidos com carinho e desprendimento: foi uma honra estar entre amigos neste ambiente de suma importância e significado. Saliento o meu contentamento por ter o privilégio de ter realizado o evento nesta casa centenária, lugar que, certamente, nos possibilita sentir as histórias centenárias contidas nos documentos preservados. Deixo aqui meu apreço a todas e todos que tornaram tão especial e único o nosso evento. Recomendo, inclusive, a todos os caxienses que façam um tour nesta instituição, que preserva nossas raízes.”

Amarildo Rubinei Moreira

"Foi emocionante participar deste momento único, que celebra a realização de um sonho e, sobretudo, promove o reconhecimento de todo o esforço e dedicação investidos pelo autor para que a obra fosse lançada! Agradeço ao Amarildo, em nome de toda a equipe de servidores do Arquivo Histórico Municipal, que nos confiou, não só a preservação histórica do original manuscrito de seu primeiro livro, como também sua disponibilização como documento do acervo, promovendo o acesso de seu conteúdo a toda comunidade e pesquisadores.”

Catiuscia Xavier, gerente do Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami

Na noite de 23 de março, o Arquivo Histórico Municipal foi palco para a roda de conversa “Mulheres insurgentes: interseccionando diálogos no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami.” O evento iniciou com a esquete teatral “Tantas Quantas Somos”, de Tina Andrighetti. 

Em seguida, sob a mediação da servidora Pâmela Cervelin Grassi, as convidadas Allana Ariel Dalla Santa, advogada e professora universitária, Bruna Letícia de Oliveira dos Santos, professora e pesquisadora, Fernanda Rieta, artista e arte educadora, e Tina Andrighetti, atriz caxiense, contaram suas histórias de vida enquanto mulheres que atuam em diferentes áreas. Por meio dos testemunhos e das trajetórias percorridas pelas convidadas,  o público pôde refletir sobre histórias pessoais que são atravessadas, interseccionadas por histórias mais amplas, histórias coletivas que versam sobre os marcadores de identidade e as condições concretas de existência e resistência das mulheres. Foram abordadas histórias de violência, discriminação, intolerância, injustiça, entre outros assuntos. O encontro configurou-se como um compartilhamento de experiências que incentivou os participantes a refletir sobre a prática de culturas políticas que oportunizam autonomia, respeito e vida digna às mulheres.

Nas imagens abaixo, obtenha mais informações sobre a escolha da temática para a roda de conversa!

A (IN)VISIBILIDADE DA MULHER NO ACERVO DO ARQUIVO HISTÓRICO MUNICIPAL JOÃO SPADARI ADAMI

“Compartilhar com mulheres que vem de ambientes tão diferentes ou mais próximos causa um estranhamento, mas ao mesmo tempo nos aproxima. Somos acostumados a transitar dentro de nossas bolhas sem desbravar o externo, furar a bolha é como perceber novos universos, reconhecer no outro dores e  alegrias. É pensar em novas estratégias de enfrentamento e de existência. Ser mulher é trilhar sozinha e em grupo ao mesmo tempo, é ser isolada em sociedade mas ao mesmo tempo quando ouvir a outra perceber que não somos tão estranhas uma a outra. O diálogo veio para nós nos reconhecermos nos inúmeros espaços que ocupamos, mas trazendo o que temos em comum, dores, resistência e esperança.”

Fernanda Rieta, artista e arte educadora

A noite de 27 de abril de 2023 foi marcante para o Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami: cerca de 80 pessoas participaram da roda de conversa "Indígenas e contextos urbanos: apagamento histórico e retomadas na Serra Gaúcha", atividade alusiva à data que rememora os Povos Indígenas do Brasil.

Os participantes tiveram a oportunidade de (re)conhecer a trajetória dos povos indígenas do sul do Brasil, como o ato de retorno aos seus territórios, os processos migratórios para a cidade, a autoafirmação em contextos urbanos e o reconhecimento de suas culturas, por meio dos relatos de Orilde Ribeiro, acadêmica do curso de Pedagogia do IFRS e professora da Escola Indígena Nivo, da comunidade Pãnónh Mág, em Farroupilha (RS), Carol Silva, mulher indígena em retomada e Odériê, artista afro e indígena da etnia ChaYúa que marcou presença por meio de videoconferência online, em virtude de sua participação na 19ª edição do acampamento "Terra Livre", em Brasília (DF). A roda de conversa teve, ainda, a participação de Mônica de Souza Chissini, docente da área de Letras do IFRS/ Campus Farroupilha, e mediação de Ramon Tisott, historiador e professor da rede municipal de ensino.

O público presente mostrou-se muito participativo, por meio de questionamentos, palavras de admiração e também de apoio aos direitos dos povos indígenas.

A realização da atividade tornou-se possível devido ao envolvimento dos servidores do Arquivo Histórico, IFRS – Campus Farroupilha, Comunidade Kaingang Pãnónh Mág, Curso de Graduação em História da UCS e convidados. O evento contou, ainda, com o apoio do projeto Mosaico na Quebrada e com o suporte de infraestrutura do Centro Municipal de Cultura Dr. Henrique Ordovás Filho.

Participação do público presente.

AHMJSA | Divulgação

Acesse mais informações sobre a roda de conversa "Indígenas e contextos urbanos: apagamento histórico e retomadas na Serra Gaúcha" clicando na imagem!

Participação do público presente.

AHMJSA | Divulgação

“O nosso principal objetivo como instituição arquivística, cuja missão é promover o acesso à informação, foi atingido: o debate fez um apanhado sobre o apagamento dos povos indígenas, realidade esta que também notamos em nosso acervo catalogado, escasso de fontes relacionadas a culturas não-brancas. Estamos muito felizes em contribuir para ampliar a visibilidade das trajetórias dos convidados, de retomadas por territórios e da atuação no fortalecimento da cultura indígena.”

Catiuscia Xavier, gerente da instituição.

“Foi uma noite muito importante pra nossa história. O Arquivo nunca mais será o mesmo.”

Ramon Tisott, mediador da roda de conversa, historiador e professor da rede municipal de ensino  

Referências: