Vamos começar o nosso curso com uma breve introdução ao assunto. Thomas E. Brown, PhD é um psicólogo clínico especializado em transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH). Ele é reconhecido por seu trabalho com adolescentes e adultos com TDAH, além de ser autor de diversos livros e artigos sobre o tema. Este vídeo está em inglês, mas você pode acionar a legenda em português. Caso você não saiba como fazer isso, assista a este vídeo onde eu ensino.
O que conhecemos como TDAH, transtorno do déficit de atenção com hiperatividade — ou como alguns ainda chamam de “DDA”, distúrbio do déficit de atenção — vem sendo reconhecido por alguns médicos desde 1902.
Mas, de 1902 até 1980, tudo girava em torno de meninos que não conseguiam ficar parados, não paravam de falar e enlouqueciam todos ao redor. Era apenas um problema de comportamento.
O nome do transtorno mudou várias vezes. Houve diferentes formulações. Mas sempre se tratava de comportamento.
Desde 1980, quando o nome foi mudado para incluir o termo "déficit de atenção", percebemos que o problema não está tanto no comportamento, mas sim no sistema de gerenciamento do cérebro — nas funções executivas.
Também aprendemos que há muitas pessoas com TDAH que nunca apresentaram problemas significativos de comportamento.
Mesmo entre aqueles que apresentaram, isso geralmente é o menor dos problemas. Os maiores são os relacionados à atenção, especialmente à medida que envelhecem e se espera mais deles em termos de autorregulação.
É importante deixar claro, desde o início, que o TDAH não tem nada a ver com inteligência.
Algumas pessoas com o transtorno são extremamente inteligentes. Outras estão na média alta, média, média baixa ou até apresentam lentidão.
Eu trato pessoas com TDAH que são professores universitários, médicos, advogados e empresários de sucesso.
Muitas são pessoas comuns. Algumas têm dificuldade com tarefas básicas.
Você pode estar em qualquer ponto do espectro de QI e ainda ter TDAH.
Outra coisa importante é que o TDAH é um conjunto de problemas com uma ampla gama de características.
Hoje, quero descrever algumas dessas características, dar exemplos e falar um pouco sobre o que sabemos sobre o que acontece no cérebro de quem tem TDAH.
Uma das principais queixas de quem tem TDAH é dificuldade em manter o foco.
Quando estão ouvindo, lendo ou trabalhando em algo, conseguem captar parte da informação, mas logo se desconectam, voltam, se desconectam novamente e assim por diante.
Essa dificuldade em manter a sintonia é semelhante a quando estamos com o celular em uma área de má recepção — a mensagem vai e volta, falha constantemente.
Outra queixa comum é a distração. Assim como qualquer pessoa, eles percebem sons e movimentos ao redor, têm pensamentos passando pela mente, mas enquanto a maioria consegue ignorar e focar, quem tem TDAH tem dificuldade.
Estão na sala de aula, tentando prestar atenção, alguém deixa um lápis cair — eles olham.
Voltam ao foco por alguns minutos, então se lembram de um programa de TV, depois de uma conversa, olham pela janela, observam o esquilo na árvore, o trânsito, as nuvens, o cortador de grama…
E voltam a se perguntar: “O que vai ter para o jantar?”, “O que vai passar na TV?”. Tudo isso ao mesmo tempo, como se estivessem assistindo a quatro canais de TV simultaneamente, o que dificulta distinguir o sinal do ruído.
Pessoas com TDAH têm muita dificuldade em ignorar distrações e focar no que precisam fazer.
Estão na sala de aula tentando ouvir o professor, ou em uma reunião, ou sentados para ler ou escrever…
De repente, alguém derruba um lápis, e eles precisam ver onde ele caiu. Depois disso, até conseguem voltar à tarefa por alguns minutos, mas logo começam a pensar em um programa de TV da noite anterior.
Voltam à tarefa, mas logo se lembram de uma conversa que tiveram há duas horas. Depois olham pela janela — algo que todos fazem de vez em quando —, mas eles ficam observando o esquilo subir a árvore por mais tempo que o normal, analisando o trânsito, as nuvens, o homem cortando a grama.
Retornam à tarefa por mais alguns minutos, mas então pensam no que vão fazer depois da aula, ou no que vão jantar, ou no que passará na televisão.
É como tentar assistir a um programa de TV com quatro canais diferentes transmitindo ao mesmo tempo no mesmo canal. Fica difícil distinguir o sinal do ruído.
O mais confuso é que isso acontece quase o tempo todo, mas não sempre.
Todo mundo que eu já vi com TDAH tem algumas atividades nas quais conseguem prestar atenção perfeitamente.
Por exemplo: um menino de 16 anos que atendi era goleiro do time de hóquei da escola. No dia anterior à consulta, seu time havia vencido o campeonato estadual. Os pais estavam orgulhosos.
Disseram que, durante os jogos, ele não perdia nada. Sabia onde o disco estava a cada segundo. Um goleiro excelente. Inteligente, com QI altíssimo.
Ele queria boas notas, sonhava com a faculdade de medicina. Mas vivia em apuros com os professores.
Os professores diziam: “De vez em quando, você diz algo que mostra o quanto é inteligente. Mas, na maior parte do tempo, parece que está viajando, olhando pela janela, encarando o teto, quase dormindo. Nem sabe em que página estamos.”
E sempre perguntavam: “Se você consegue prestar tanta atenção no hóquei, por que não consegue na aula?”
“Se você consegue prestar atenção tão bem jogando hóquei, por que não consegue prestar atenção na sala de aula?”
Outro exemplo: muitas vezes os pais levam seus filhos para me consultar e dizem: “A professora diz que essa criança não consegue prestar atenção por mais de cinco minutos. Mas sabemos que isso não é verdade. Já a vimos jogar videogame por três horas seguidas sem se mexer”.
“A professora disse que ela se distrai com facilidade. Bobagem. Quando ela está jogando, fica focada na tela como um laser. A única forma de conseguir sua atenção é pular na frente dela ou desligar a TV.”
Então novamente: se consegue fazer isso aqui, por que não consegue fazer ali?
E não é sempre esporte ou videogame. Algumas pessoas com TDAH não gostam disso, mas se dedicam muito à arte, por exemplo, desenhando e criando com concentração. Outras, desde pequenas, fazem verdadeiras maravilhas com blocos de LEGO. Quando crescem, desmontam e montam motores ou projetam redes de computadores.
Todo mundo que já vi com TDAH tem algumas atividades em que consegue manter o foco sem dificuldade, mesmo que no restante tenha muita dificuldade.
Quando perguntamos “como você consegue se concentrar nisso e não naquilo?”, geralmente respondem: “É fácil. Se é algo que me interessa, eu consigo prestar atenção. Se não é, eu não consigo.”
A maioria das pessoas diria: “Isso vale para qualquer um. Todo mundo presta mais atenção naquilo que gosta.”
E é verdade. Mas há uma diferença.
Pessoas sem TDAH, quando sabem que precisam fazer algo importante, geralmente conseguem se forçar a prestar atenção, mesmo que a tarefa seja entediante.
Já as pessoas com TDAH têm uma dificuldade imensa em fazer isso — a não ser que:
seja algo que elas realmente acham interessante (não porque alguém disse que deveria ser);
ou estejam sob pressão intensa (como se houvesse uma arma apontada para elas).
Nesses dois casos, elas se concentram bem. Fora isso, é extremamente difícil.
E o problema não é falta de força de vontade. Parece que é, mas não é.
É um problema na forma como o cérebro está estruturado.
Todas as características do TDAH são coisas que qualquer um enfrenta de vez em quando.
A diferença é que quem tem TDAH enfrenta com muito mais frequência e intensidade.
O TDAH não é como uma gravidez — ou você está grávida ou não está.
É mais como a depressão. Todo mundo fica triste de vez em quando.
Mas só dizemos que alguém está clinicamente deprimido quando os sintomas são persistentes, abrangentes e causam muito sofrimento.
O mesmo vale para o TDAH. Todos enfrentam essas dificuldades de vez em quando.
Mas quem tem TDAH enfrenta com muito mais frequência, e não é algo que se possa controlar pela força de vontade.
Outro ponto comum em quem tem TDAH: dificuldade em se organizar e iniciar tarefas.
Muitas pessoas têm problemas para manter organizados seus materiais: mochila, mesa, cadernos, sistema de arquivos, espaço pessoal — geralmente uma bagunça maior que o normal, a menos que alguém ajude.
Outras pessoas não têm problema com objetos, mas com tempo e trabalho.
Elas dizem: “Se tenho muitas tarefas ao mesmo tempo, é difícil priorizar. Mesmo que eu saiba o que vem primeiro, tenho dificuldade para começar.”
Outro problema muito relatado é com o sono e a energia.
Muitas dizem que não conseguem dormir cedo. Só conseguem pegar no sono quando estão exaustas, porque não conseguem “desligar a cabeça”.
Assim, acabam ficando acordadas até tarde lendo, vendo TV, navegando na internet…
Dormem profundamente, mas depois têm dificuldade para acordar. Se ninguém ajudar, podem perder a hora ou até dormir demais.
Durante o dia, vão bem se estiverem em movimento ou falando. Mas, se precisam ficar sentadas por muito tempo, começam a ficar sonolentas.
Outro ponto comum: dificuldade em manter-se numa tarefa.
Conseguem começar bem, mas têm dificuldade em manter o ritmo até concluir.
Um corredor universitário disse: “Minha mente é ótima para sprints, mas péssima para longas distâncias. Se é algo rápido, eu consigo. Mas se exige esforço contínuo, prefiro adiar até virar uma emergência.”
Outro aspecto comum em pessoas com TDAH é a dificuldade em manter o esforço necessário para concluir tarefas em um tempo razoável. Elas podem começar bem, mas têm dificuldade em sustentar o esforço até o fim.
Muitas vezes, elas se envolvem em atividades que são mais interessantes ou menos exigentes, deixando de lado as tarefas importantes. Isso pode levar a um acúmulo de tarefas inacabadas e a sentimentos de frustração e culpa.
Além disso, pessoas com TDAH podem ter dificuldade em regular suas emoções. Elas podem reagir de forma exagerada a situações que outras pessoas considerariam triviais, como um comentário crítico ou uma mudança inesperada de planos.
Essas reações emocionais intensas podem afetar negativamente seus relacionamentos pessoais e profissionais, levando a mal-entendidos e conflitos.
É importante entender que essas dificuldades não são resultado de preguiça ou falta de esforço, mas sim de diferenças na forma como o cérebro processa informações e regula o comportamento.
Com o apoio adequado, incluindo estratégias de gerenciamento de tempo, técnicas de organização e, em alguns casos, medicação, pessoas com TDAH podem aprender a lidar com esses desafios e alcançar seus objetivos.
Outro aspecto comum em pessoas com TDAH é a dificuldade em regular suas emoções. Elas podem reagir de forma exagerada a situações que outras pessoas considerariam triviais, como um comentário crítico ou uma mudança inesperada de planos.
Essas reações emocionais intensas podem afetar negativamente seus relacionamentos pessoais e profissionais, levando a mal-entendidos e conflitos.
É importante entender que essas dificuldades não são resultado de preguiça ou falta de esforço, mas sim de diferenças na forma como o cérebro processa informações e regula o comportamento.
Com o apoio adequado, incluindo estratégias de gerenciamento de tempo, técnicas de organização e, em alguns casos, medicação, pessoas com TDAH podem aprender a lidar com esses desafios e alcançar seus objetivos.
Com o apoio adequado, incluindo estratégias de gerenciamento de tempo, técnicas de organização e, em alguns casos, medicação, pessoas com TDAH podem aprender a lidar com esses desafios e alcançar seus objetivos.
Mas, para compreender plenamente isso, é importante entender o que está acontecendo no cérebro que está por trás dessas dificuldades que acabei de descrever.
O cérebro pesa cerca de um quilo e meio, mais ou menos deste tamanho. Dentro dele, há cerca de 100 bilhões de neurônios. Essas são as células que compõem a maior parte do tecido cerebral. É difícil imaginar um número tão grande quanto 100 bilhões, mas aqui vai uma comparação: pense em pixels em uma tela de TV. Imagine uma tela de computador de 17 polegadas. Nela, você teria cerca de 200 mil pixels.
Agora, imagine pegar esses monitores de 17 polegadas e cobrir completamente o arranha-céu Freedom Tower, em Nova York — com quase 100 andares — colocando os monitores lado a lado, de baixo até o topo, ao redor de todo o prédio. Se ligássemos todos esses monitores e somássemos todos os pixels, chegaríamos ao número de neurônios que há no cérebro de uma única pessoa.
Esses neurônios são muito pequenos — você só consegue vê-los ao microscópio. Eles têm formas e tamanhos diferentes, mas todos funcionam com um sistema de ramificações, como galhos e ramos. Se isolássemos apenas um neurônio, veríamos que ele tem mais de mil pontos de conexão com outros neurônios ao seu redor.
O mais impressionante é que todo esse sistema funciona com impulsos elétricos de baixa voltagem, e não é fisicamente "conectado" — nem no cérebro das pessoas com TDAH, nem no de ninguém.
Aqui está o que acontece: essas conexões minúsculas parecem duas cabeças de cogumelo encostadas uma na outra, com um espaço entre elas mais fino que um papel. Quando um impulso elétrico chega a essa extremidade, ele precisa “saltar” essa lacuna — como uma faísca. Do outro lado, há receptores que precisam ser ativados. Se o sinal for forte o suficiente, ele continua adiante. Caso contrário, ele se dissipa.
Além disso, há pequenas bolhas na extremidade dos neurônios onde são produzidos os neurotransmissores — substâncias químicas que carregam mensagens de um neurônio para outro. O cérebro produz cerca de 50 dessas substâncias, mas duas delas estão envolvidas na maioria dos sintomas do TDAH. Quando o impulso elétrico chega, ele libera minúsculas quantidades desse químico, que atravessam o espaço e se ligam aos receptores. Se a quantidade for adequada, o sinal é transmitido.
Depois disso, pequenos “aspiradores” celulares recolhem esses químicos para recarregar o sistema — senão, o neurônio ficaria ativado o tempo todo.
Acredita-se que, no caso das pessoas com TDAH, o cérebro produz essas substâncias normalmente, mas tem dificuldade em liberá-las e recapturá-las de forma eficiente.
Além disso, sabemos que, para 8 em cada 10 pessoas com TDAH, o uso do medicamento certo, na dose certa, pode melhorar significativamente esse funcionamento. Para alguns, a melhora é enorme; para outros, é substancial, mas não espetacular; e, para alguns, ajuda apenas um pouco. Em 2 de cada 10 casos, a medicação não tem efeito.
Mas, mesmo sendo um problema químico, os medicamentos não curam o TDAH. Não é como ter uma infecção na garganta e tomar antibiótico. É mais como usar óculos: eu tenho um problema de visão — não enxergo bem sem eles. Quando os coloco, vejo perfeitamente; quando os tiro, volto a enxergar mal. Os óculos não curam meus olhos, apenas me ajudam a enxergar enquanto estou usando-os.
O mesmo vale para os medicamentos usados no TDAH.
Mas também é importante reconhecer que a medicação é apenas um dos aspectos do tratamento para alguém com TDAH. Existem muitas outras formas de ajudar essas pessoas, como ensiná-las habilidades específicas, oferecer estratégias e ferramentas tecnológicas para que consigam lidar com as demandas da escola, do trabalho, da família e das relações sociais.
O mais eficaz é começar com uma boa avaliação — uma avaliação cuidadosa e detalhada — para entender exatamente quais são os aspectos do TDAH que aquela pessoa apresenta. A partir disso, se for uma criança, é fundamental que haja uma colaboração entre a criança, seus pais, o médico e os professores.
Esse grupo deve trabalhar junto para identificar quais são os pontos fortes da criança — esse é sempre o ponto de partida. Quais são as dificuldades? E qual plano pode ser elaborado para ajudar a criança ou o adulto a desenvolver formas de lidar melhor com essas dificuldades, para que eles possam ter sucesso e alcançar todo o seu potencial.
Iniciaremos o curso com uma entrevista exclusiva com um dos maiores especialistas em TEA e TDAH do Brasil, o psicólogo Rodolfo Dib. Assista com atenção — ao longo das próximas semanas, revisitaremos essa conversa para aprofundar nossa compreensão dos temas tratados. Após assistir, pense nos pontos chaves. Criei um resumo em quadrinhos de alguns pontos-chave que julguei que merecem uma reflexão