Por: Beatriz Andrade da Silva Pena
A cada 23 horas, uma morte por homofobia é registrada no Brasil. Por andar nas ruas maquiado, com roupas coloridas e unhas pintadas, Adriano já foi ofendido e ameaçado. Isso o fez questionar quão errado era ser quem ele era e por que incomodava a tantas pessoas. Entretanto, hoje em dia, Adriano entende que o problema não está nele, e busca sempre impor e demonstrar aos outros que tem o direito de ocupar o mesmo espaço que eles, independente de sua orientação sexual e de seus trejeitos. “Eu sou assim e sou humano igual você. Tenho meu espaço e meu direito, do mesmo jeito que você está bebendo e dançando aqui eu também posso” declara Adriano.
“Desde pequenas as crianças aprendem a zoar chamando de “viado”. Antes mesmo de eu me entender como gay eu já era chamado de “viado”, e era uma coisa que eu não queria”, diz Adriano Vinturin, 23 anos, que é homossexual e desde os primeiros anos de vida escolar enfrentou preconceito. "Geralmente, a homofobia infantil está associada à imitação, à ação discriminatória de um ou dos dois pais" informa a psicóloga Luzimari Dantas, especializada em psicologia infantil.
Apesar de lembrar unicamente dos ataques sofridos por parte de outras crianças, a mãe de Adriano, Rene, afirma que ela e o pai do jovem tiveram dificuldade em aceitar o comportamento dele desde a infância. “O preconceito começa dentro de casa mesmo. Desde muito pequenininho ele já dava indícios que isso ia acontecer na vida dele. Só que a gente não aceitava, porque o pai e a mãe normalmente esperam ter um filho dentro dos padrões que a sociedade diz que é o certo”, declara a mãe. Os tipos de preconceito que sofreu na infância fizeram Adriano negar a homossexualidade por alguns anos, mas, aos 14 anos, iniciou o processo de autoaceitação.
Adriano na Parada LGBTQIA+ de São Paulo
Reprodução: Acervo Pessoal
Adriano na Parada LGBTQIA+ de Santo André com sua mãe, Rene
Reprodução: Acervo Pessoal
Na adolescência, Adriano vivenciou dois cenários distintos. Ao começar a frequentar ambientes com pessoas da comunidade LGBTQIA+, o jovem foi encorajado a aceitar sua orientação sexual e a enfrentar os preconceitos sem ser intimidado. Mas na mesma época, Adriano entrou para o ministério de dança da igreja que frequentava e, por seu comportamento “afeminado”, o padre que orientava o grupo o proibiu de dançar em meio aos fiéis, uma vez que poderia influenciar crianças e jovens católicos a serem homossexuais também. Além disso, dentro da instituição, ouviu diversas vezes que ser daquela forma - homossexual e afeminado - era errado, e que ele jamais seria aceito por Deus.
A homofobia atinge não somente os jovens dentro das igrejas, mas também aqueles que dedicam as vidas a elas. O polonês Krysztof Charamsa foi sacerdote por 17 anos, contudo, em 2015 foi afastado de todas as atividades religiosas ao declarar sua homossexualidade.
O então sacerdote sofreu ataques de homofobia por parte de membros instituição e declarou “Não há nada o que curar na homossexualidade, não é delito ser homossexual. Não se pode viver toda a vida no armário, numa quase esquizofrenia de não aceitação de si mesmo. Você não pode imaginar o sentimento de culpa de um gay crente! A mentalidade cristã fundiu em nós que ser homossexual é pecaminoso e diabólico”. Após ser excluído do grupo que fazia parte e ser ofendido por representantes da igreja, Adriano deixou de frequentar.
Ao deixar a igreja, o jovem começou a dedicar sua vida à luta contra LGBTfobia, e também a expor sua orientação sexual. Há três anos, Rene teve a primeira conversa com o filho Adriano sobre a orientação sexual dele e, a partir daí, ambos tiveram liberdade para compartilhar dúvidas e angústias relacionadas ao assunto. Após isso, Adriano sofreu um traumático caso de homofobia na Praça da República, em São Paulo. Ao sair de uma festa, ele se perdeu de um grupo de amigas e ficou sozinho na praça às 4 horas da manhã. Por conta da roupa que vestia, um grupo de homens começou a ofender e empurrar o jovem, até que o chutaram e ele caiu no chão. “Eu tive que correr e eu não sabia se eles estavam atrás de mim, mas eu sabia que se eles me pegassem eu estaria morto”, lembra. Com medo de sofrer mais agressões, Adriano correu para a entrada da estação de metrô mais próxima, sentou no chão e começou a chorar. Foi ajudado por uma mulher, que não conhecia, e conseguiu chegar a sua casa, em Santo André.
Ainda neste ano, o jovem esteve em um bar com um amigo gay, e, quando foram ao banheiro, um homem os ameaçou e disse para saírem do local, pois não era lugar para eles. Ambos ignoraram a fala do homem e continuaram na festa, contudo, algum tempo depois o reencontraram no bar e ele jogou um copo de bebida no rosto de Adriano. Ao falar com o dono do estabelecimento, imediatamente os seguranças foram acionados e expulsaram o homem da casa. Após o ocorrido, o dono permitiu que Adriano utilizasse o banheiro dos funcionários nas próximas vezes que fosse ao bar, para que tal situação não se repetisse.
Por: Gisely Alves Sousa
Ao longo da última década, projetos de leis e ações contra a homofobia como o Programa Brasil sem Homofobia (2004), PL 5003/01 (2001) e a PLC 122/2006 (2016) - ambas arquivadas - foram lançados para conscientizar a população e combater esse preconceito. Em 2019, o STF decidiu pela criminalização da LGBTfobia. Contudo, na realidade dos que são impactados pelo preconceito, mudanças práticas não foram percebidas. A dificuldade em reunir provas judiciais somado a falas preconceituosas por parte de figuras públicas reforçam comportamentos homofóbicos e ultrapassam o poder e o alcance da lei, vivência que se enquadra no cotidiano do jovem Adriano.