2024

19/02 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

Contextualização da obra de Ludwig Wittgenstein.

Discussão do primeiro e segundo parágrafos do livro Wittgenstein’s Philosophy of Psychology de Malcolm Budd (1989).

Objetivo geral de Wittgenstein: dissolução dos problemas filosóficos

O objetivo da filosofia da psicologia para Wittgenstein: delineação da gramática de frases psicológicas (querer, pensar, pretender etc.)

Gramática dos verbos psicológicos – “Gramática superficial” x “Gramática profunda”.

Possibilidade de dissolução de problemas filosóficos como: a relação entre corpo e mente; a possibilidade do livre arbítrio; o problema da existência de outras mentes.

Investigação conceitual x Investigação factual

A filosofia se ocupa de investigações conceituais, que apontam similaridades e diferenças entre conceitos. Essas investigações se dão através da linguagem.

Questões em aberto: 

o Como a delineação de uma gramática dos verbos psicológicos pode fornecer representações perspícuas? 

o Qual é a distinção entre explicação e descrição?


26/02 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

Leitura e discussão de trechos relacionados ao segundo parágrafo do livro de Budd – Wittgenstein’s Philosophy of Psychology. 

Problemas filosóficos surgem pois não dispomos de uma visão panorâmica/sinóptica da gramática dos conceitos empregados na linguagem. 

O objetivo da filosofia é obter essa visão perspícua de conceitos cotidianos, como os conceitos psicológicos. A tarefa filosófica é a de construção de representações perspícuas, que por sua vez dissolvem os problemas filosóficos. Esses problemas são fruto da má compreensão da estrutura da linguagem.

Filosofia – Investigações conceituais (distinta de investigações factuais).

Representação perspícua x Notação perspícua

A notação perspícua faz parte da linguagem. Por exemplo, ao invés de descrever através da fala um trajeto metroviário, pode-se anotar o caminho em um mapa das linhas de metrô, substituindo a gramática da linguagem e suas regras por uma notação. 

A representação perspícua faz parte da metalinguagem, é um instrumento/ferramenta que se utiliza para entender a gramática e suas regras. A representação perspícua permite distinguir de aqueles usos da linguagem que fazem ou não sentido, algo que na forma cotidiana de expressão não se manifesta de maneira tão clara.

“1º Wittgenstein” (Tractatus) x “2º Wittgenstein” (Investigações Filosóficas etc.)

(Tractatus) Partindo da linguagem comum, a tarefa da filosofia é de desvelar a estrutura das proposições elementares, ou seja, chegar em uma linguagem completamente analisada. 

Proposições elementares e operações de verdade entre essas proposições. Esta é uma descrição geral do objetivo que a investigação da essência da linguagem almeja. De outra forma mais geral: o que a linguagem precisa para ser linguagem? Quais regras deve obedecer? Quais as propriedades constitutivas de toda e qualquer forma de linguagem? É a busca por uma forma mais exata de expressão do que a presente na linguagem comum. 

Iluminar a gramática da linguagem não seria uma análise lógica ou conceitual, uma vez que W. entende análise enquanto uma atividade que desvela algo oculto sobre o que é investigado. A tarefa da investigação filosófica acerca da linguagem é uma tarefa descritiva que se atenta não à fatos ou fenômenos efetivos, mas sim à possibilidade dos fatos ou fenômenos.

Noção de análise enquanto decomposição.

Questão em aberto: O que significa uma expressão ser mais exata que outra?


04/03 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

1º Wittgenstein - Tractatus: As formas usuais de expressão não revelam de maneira clara quando usos da linguagem fazem ou não sentido. Wittgenstein aposta na análise lógica das formas usuais de expressão, de modo a produzir uma conceitografia/notação perspícua, um modo de expressão mais exato que o modo ordinário. Assim, busca um modo de expressão no qual a essência da linguagem seja aparente, permitindo a percepção imediata de se algo faz parte da linguagem ou não, algo que na superfície da linguagem comum não se revela imediatamente.

2º Wittgenstein – Investigações Filosóficas: Não tem mais em vista o projeto do Tractatus. O autor não procura mais um modo de expressão mais exato que o da linguagem comum. Busca tornar mais clara a gramática dos conceitos psicológicos, que engendram problemas filosóficos. A representação perspícua dos conceitos psicológicos, contudo, não implica na análise desses conceitos. Está interessado nas similaridades e diferenças entre os conceitos.

Tarefa científica X Tarefa filosófica

Natureza da filosofia: investigações conceituais. Não significa a análise de conceitos, uma vez que análise implicaria na descoberta de novos fatos sobre aquilo que se investiga. Todos os fatos relevantes sobre o conceito são supostos como dados. A filosofia aparece então como tendo caráter descritivo e não explicativo: uma explicação é uma dedução de um fenômeno a partir de uma teoria que o explica. Wittgenstein quer evitar essa atitude teórica em filosofia, uma vez que as tentativas em filosofia de criar teorias da realidade revelam-se como dogmáticas, com fundamentos não fundamentados. Cabe a filosofia, portanto, realizar suas investigações com aquilo que já se tem, a saber, a partir dos usos que já fazemos da linguagem. 

“Filosofia é a luta contra o enfeitiçamento de nosso entendimento por meio de nossa linguagem” – PI 109

Sabemos usar nossa linguagem, mas ao tentar descrever o uso que fazemos, por exemplo, de conceitos psicológicos, somos levados a descrições errôneas. Nesse sentido, a introdução de representações perspícuas desses conceitos poderia nos livrar desse tipo de mal-entendido.

Dogmatismo revisionista x Dogmatismo justificacionista

3º parágrafo Budd. “Se não é uma análise, então o que é? É uma tentativa de descrever o uso das palavras nas quais o conceito sob exame se manifesta. É, assim, uma investigação da gramática das palavras.”

O conceito se manifesta na linguagem: se não há manifestação na linguagem, não há conceito. 

Palavra x Conceito

Diferença entre dizer “a gramática da palavra intenção” e “a gramática do conceito de intenção”. Diversas frases e palavras manifestam o conceito de intenção, mesmo se a palavra em si não apareça explicitamente na frase. A gramática é uma atividade descritiva, que descreve o uso dos sinais sem explicar esse uso, e essa atividade não estipula um ideal a qual a linguagem deve se conformar. 

Confusão entre investigações factuais e investigações conceituais na filosofia. Investigação psicológica da mente (explicações causais) X Investigação do conceitual do uso da linguagem

Questão em aberto: a ciência pode produzir desencaminhamentos filosóficos?


11/03 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

“O nome “filosofia” também pode ser dado ao que é possível antes de todas novas descobertas e invenções” – PI 126 

A filosofia, portanto, enquanto atividade descritiva, não busca a explicação de fatos linguísticos ou a construção de novos fatos acerca do uso da linguagem. Sua tarefa é de construção de uma representação perspícua da gramática da linguagem, visando a dissolução dos problemas filosóficos que surgem quando se tenta descrever usos da linguagem que envolvem conceitos psicológicos, tais como a mente, a intenção, o sujeito etc. Em alguma medida, estes problemas têm sua origem no próprio maquinário da linguagem.

Se os fatos linguísticos estão a mostra, como podemos então nos confundir ou cometer erros ao tentar descrever o uso da linguagem? O uso da linguagem possui recursos ou aspectos capazes de nos enfeitiçar e levar a mal-entendidos?

Que tipo de descrição do uso dos termos psicológicos Wittgenstein procura (Q1), e qual a sua importância (Q2)? 

Resposta preliminar para a Q1: não se trata de uma descrição que busca por exatidão, mas que tenta alcançar uma visão sinóptica por meio de uma representação perspícua. [PI 122; RPPI 895]

Resposta preliminar para a Q2: A importância de uma representação perspícua (que permite uma visão panorâmica do domínio linguístico) reside no fato de que essas confusões são por ela removidas ou desencorajadas. Ela fornece um arranjo daquilo que já temos. [PI 109*, 132; RPPI 950*]

O que é uma representação perspícua do uso das palavras? Exemplo: octaedro das cores: “O octaedro das cores é gramática, pois ele diz que podemos falar de um azul avermelhado, mas não de um verde avermelhado etc. (PR 39).

A falta de perspicuidade de nossa gramática leva a mal-entendidos a respeito do uso das palavras.

Tentativa de fornecer perspicuidade da nossa própria gramática: jogos de linguagem. Os jogos de linguagem não são um modelo de nossa linguagem, mas servem como comparativo para nossa forma de usar a linguagem. Segundo Budd, o jogo de linguagem é um método para a criação de representações perspícuas, com o objetivo de iluminar a nossa própria linguagem através de semelhanças e diferenças. Jogo de linguagem enquanto polo de uma descrição perspícua da gramática: não é ele mesmo uma representação perspícua.

Sentido X Contrassenso: o sentido é uma função de duas variáveis, a saber, a expressão e o contexto de enunciação. Assim, o sentido e contrassenso não podem ser determinados absolutamente a priori, mas também não se fundamentam absolutamente a posteriori. Dependem do treinamento/aprendizado da linguagem. 

Recolocação da Q2: Por que uma representação perspícua e uma visão sinóptica da gramática de nossos usos linguísticos é uma meta desejável?

Resposta inicial para Q2: Wittgenstein busca uma visão da totalidade. Para tanto, a luz jogada em um conceito nos indica o tratamento correto para os demais conceitos.

Descrição incorreta de usos linguísticos: erro convencional, por exemplo, usar a palavra “desdém” como significando “carinho”. Não implica em problemas filosóficos.

O segundo tipo de erro apresenta problemas filosóficos: uma pessoa erra na descrição do próprio uso de certas palavras, por exemplo, ao tentar descrever sua intenção ao realizar determinada ação, dizer que houve um ato mental que precedeu a ação.

Os problemas filosóficos surgem a partir da tentativa de descrição de usos linguísticos: é um problema, portanto, metalinguístico. Aqui aparece a questão: o que significa a linguagem girar em falso/não trabalhar?

Questão em aberto: o que significa estabelecer uma ordem possível do nosso conhecimento do uso da linguagem ao invés de estabelecer a ordem desse conhecimento gramatical, tal como é o projeto de Wittgenstein no Tractatus?


18/03 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

Por que é difícil descrever o uso de uma palavra corretamente, se não há dificuldades em usá-la corretamente? Nossa maestria prática da palavra não assegura que não iremos errar quando tentamos descrever esse uso? (Q3)

Resposta Q3 (primeira razão): A maestria da técnica do uso de uma palavra e a habilidade de explicar corretamente essa técnica são capacidades distintas, não havendo, usualmente, razões para pensar que se alguém adquiriu a maestria de uma técnica ele deva estar preparado para dar uma explicação dessa técnica. Por exemplo, saber os caminhos de uma cidade muito bem, mas ser incapaz de desenhar um mapa da cidade [RPPI 556]. 

Resposta Q3 (segunda razão): a tentativa de descrever o uso das palavras vêm associado à certas pressões que distorcem as descrições, por exemplo, tornando-as simplórias, ou modelando-as segundo certos paradigmas. Por exemplo, digo que algo é belo, mas o que é a beleza? Essa pergunta nos leva a hipostasiar um objeto como sendo a forma da beleza, transformando a beleza em um substantivo. 

No caso dos termos psicológicos, encontramos além disso a tendência à atitude teórica, dificultando a mera descrição do uso das palavras: somos tentados a uma inclinação teórica. A razão para isso é que a descrição muitas vezes nos parece obviamente incompleta, tornando necessário “completar” os fatos para entendê-los. Se completamos os fatos, contudo, acabamos alterando-os. [RPPI 257, 723]. O filósofo tradicional, por exemplo, muitas vezes acaba postulando sensações, processos ocultos, atividades mentais subterrâneas etc. para dar conta de certas explicações. Esta é a primeira dificuldade que encontramos na descrição de palavras psicológicas.

Segunda dificuldade: o uso de palavras psicológicas é frequentemente intricado, pouco claro, irregular, ramificado e fluido [RPPI 554, RPPII 218, 220-1, 730]. O filósofo tradicional é tentado a procurar nos conceitos psicológicos um conceito genuíno e unitário, que permita o uso adequado do conceito. A realidade, contudo, não necessariamente corresponderá a esse objetivo. Como exemplo, pode-se tomar a palavra “pensar” ou “pensamento”, que dispõe de um uso emaranhado, sendo um conceito com múltiplos significados.


25/03 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

Continuação da discussão sobre a segunda dificuldade encontrada na descrição do uso das palavras psicológicas. Este uso é intricado, pouco claro, ramificado, fluido. Poderia haver uma linguagem que causasse menos confusão do que o nosso uso cotidiano das palavras. Por exemplo, poderia haver uma linguagem que utilizasse termos distintos para se referir aos diferentes sentidos no qual empregamos o conceito “pensar”. Wittgenstein está preocupado, contudo, com a descrição do uso que de fato fazemos da linguagem, abandonando o projeto de construção de uma forma mais exata/menos ambígua de expressão. Seu interesse na linguagem que de fato utilizamos se dá em vistas ao objetivo de dissolução dos problemas filosóficos, que surgem na tentativa metalinguística de descrição do uso das expressões.

Distinção entre semântica (o que as palavras querem dizer) e a pragmática (circunstâncias, implicações, contexto de uso). Essa distinção, aponta Wittgenstein, é uma atitude teórica, que engendra problemas filosóficos, uma vez que impõe uma teoria de como a linguagem funciona. A descrição de nossa linguagem deve ver a diferença de contextos de uso não como efeito meramente superficial da linguagem: ao invés disso, deve-se compreender que os diferentes contextos promovem significação distinta para as expressões utilizadas. Por exemplo, pode-se expressar o conceito de estar com medo em diferentes contextos, com cada um apontando para certa significação, como em “estou com medo, mas não tanto quanto antes” ou “me tormento com todo tipo de pensamento medroso”.  Assim, nossa linguagem, tal como é, não tem um privilégio frente a outras possibilidades linguísticas; poderia haver formas de linguagem mais aptas para clarificar os conceitos psicológicos.

Fatos da natureza e sua relação com a fundamentação de nossa estrutura conceitual. De forma geral, os fatos da natureza oferecem algum tipo de fundamento para a unificação das diferentes significações de um termo em um só conceito, por exemplo, no conceito de “sentir”. Se os fatos gerais da natureza fundamentam, em alguma medida, nossa estrutura conceitual, deveria a filosofia realizar uma ciência natural desses fatos? Essa correspondência interessa à filosofia, mas não se trata de uma investigação factual pois: 1. Não se intenta predizer algo sobre os fatos linguísticos e 2. Pode-se inventar fatos da história natural para os propósitos descritivos da filosofia, como para elucidar uma representação perspícua da gramática dos conceitos psicológicos. Contudo, até aqui mantém-se em aberto uma questão: qual a relação entre os fatos gerais da natureza e a nossa estrutura conceitual? Em que sentido pode-se dizer que esses fatos gerais da natureza fundamentam a nossa estrutura conceitual? (Continuação na ata seguinte)

01/04 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

Os fatos da natureza podem ser tais que impeçam/dificultem o aparecimento de certos jogos de linguagem. De outra maneira, os fatos da natureza tornam certos jogos de linguagem mais naturais que outros. Se a gravidade fosse mais forte, por exemplo, talvez certos esportes não existiriam ou seriam muito mais penosos. Ou, se ao juntar e separar as coisas elas sumissem repentinamente, talvez o conceito de “soma” que utilizamos não pareceria tão natural quanto é para nós. Os fatos gerais da natureza, contudo, não são condições suficientes para o aparecimento ou não de um jogo de linguagem. Destaca-se aqui o caráter convencional da linguagem, aspecto que não deve ser entendido enquanto processo natural. Nossa rede conceitual retém um aspecto arbitrário, portanto. Qual efeito dos fatos da natureza em nossa estrutura conceitual e na prática de nossa linguagem?

Resposta inicial: o efeito dos fatos gerais da natureza em nossa estrutura conceitual torna algumas significações semelhantes a outras, de tal modo que reunimos essas múltiplas significações em um só conceito. A esse semelhança induzida pelos fatos gerais da natureza que Wittgenstein chamará de semelhança de família, tal como, analogamente, identificamos pessoas da mesma família como tendo uma semelhanças faciais entre si. Há aqui uma relação dupla: nossa unidade conceitual é sólida, por um lado, pois se baseia em fatos gerais da natureza que não são questionados em geral; por outro lado, é frágil, pois é contingente a certas convenções linguísticas.

Introspecção e Definição (2ª parte da introdução de Budd). 

Não seria possível observar o que ocorre em nossa mente quando um conceito psicológico se aplica, tal como a intenção ou a expectativa, e descrever essa instância, produzindo assim uma definição do conceito a ser investigado? E, dessa forma, não se produziria uma representação perspícua do conceito, em relação a qual as descrições do conceito poderiam ser comparadas?

Budd aponta algumas objeções a essa compreensão.

A primeira objeção é que definições não são representações perspícuas. Uma definição pode não prover o tipo de elucidação que buscamos do uso de uma palavra na linguagem, e, assim, pode não ser suficiente para a dissolução de problemas filosóficos. Ainda, a busca por uma definição pode ser desencaminhadora para a produção de uma representação perspícua de conceitos psicológicos. Por exemplo, porque a tentativa de definir nos leva a postular outros indefiníveis, criando um regresso pouco produtivo. Como exemplo, pergunta-se “o que é o tempo?”. A isso, responde-se: “O tempo é uma medida do movimento”. Nos vemos obrigados a definir, então, o que é a medição e o movimento, e assim sucessivamente. 

A segunda objeção é que a introspecção nunca pode levar a uma definição, mas somente a um enunciado psicológico sobre o sujeito que realiza a introspecção. A introspecção pode mostrar o que é verdade sobre o sujeito naquele momento, mas a questão de saber o que se é essencial naquela definição parece irresolúvel através do método introspeccionista. (Continuação na ata seguinte)


08/04 – [Malcolm Budd, 1989] Wittgenstein's Philosophy of Psychology

“Meu uso da introspecção só pode me mostrar o que é verdade sobre mim, e somente o que é verdade sobre mim na ocasião que faço a introspecção. Pois não importa o quão cuidadoso eu seja, seja lá o que for que estou ciente quando realizo uma introspecção, levanta-se a questão de se é essencial que esse algo deve ocorrer em alguém quando o predicado psicológico que estou definindo se aplica.” (Budd, p.8)

Se, portanto, não sei o que é essencial a determinado conceito psicológico antes de realizar a introspecção, corro o risco de imputar ao conceito aspectos não-essenciais a ele. Por exemplo, poderia acontecer de, quando realizasse uma introspecção enquanto esperava a chegada de outra pessoa, aparecesse como necessário a ocorrência de uma imagem mental da pessoa esperada em minha mente. A ocorrência de uma imagem mental, contudo, não é necessariamente parte da definição de “esperar alguém” ou da “expectativa”. A definição, feita a partir da introspecção, não mostraria isso, podendo assim ser desencaminhadora na descrição desse conceito psicológico. “Encontro-me, assim, no seguinte dilema: ou já sei antes da introspecção que é essencial, ou não. No primeiro caso, a introspecção é supérflua; no segundo, a introspecção não me ajuda a separar o que é essencial do que não é.” (Budd, p.8). Com isso, a introspecção não revela o essencial ao conceito, pois revela um “misto” de aspectos essenciais e acidentais.

Terceira objeção ao método da introspecção, que se aplica a muitos, mas não a todos, conceitos psicológicos. Há predicados psicológicos que não designam absolutamente um estado de consciência, por exemplo, dizer “sei que há um carro estacionado na frente de minha casa”. Para “saber” isso, o carro deve de fato estar estacionado ali, algo externo ao estado de consciência. Há, portanto, predicados psicológicos que possuem fundamentos externos para sua aplicação correta. Aquilo que apenas se encontra diante da mente é, em alguns casos, insuficiente para que certos predicados se apliquem.

Quarta objeção: a introspecção não seria um método geral para se chegar a uma representação perspícua. Ao aplicar tal método, as palavras utilizadas para formular definições seriam palavras que designam o que acontece em nossa consciência. Essas palavras, contudo, seriam elas mesmas palavras psicológicas, que necessitam de definição tanto quanto qualquer predicado para cuja definição elas foram empregadas, implicando em uma certa regressão infinita e desencaminhadora. 

Quinta objeção: não se pode chegar a uma definição de alguns conceitos psicológicos, como a “dor”. A introspecção, nesse caso, mostraria o conteúdo de experiência que é a dor, e não outros conceitos que auxiliariam na definição do que seria a dor. 

Com isso, torna-se claro que Wittgenstein é um opositor do método introspeccionista, na medida em que este é utilizado para atingir os objetivos da filosofia.

Parte 3 da introdução de Budd: A classificação dos conceitos psicológicos.

Oferece dois esquemas rascunhados por Wittgenstein: são tentativas de representações lúcidas da gramática dos termos psicológicos, mas ambos são gerais e incompletos. Aqui, há a caracterização dos verbos psicológicos a partir da assimetria entre a primeira e a terceira pessoa no emprego desses verbos (no presente do indicativo). Assim, na terceira pessoa se expressam conceitos psicológicos baseando-se na observação, tal como quando dizemos “ele está com dor”. Na primeira pessoa, esse tipo de asserção não é feita em base à observação de comportamentos. Relação com a distinção entre expressão e informação, destacada no segundo esquema oferecido por Wittgenstein.