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Para entendermos mais sobre a importancia de Haydée Nicolussi para a literatura capixaba e brasileira, convidamos pesquisadores da autora para uma breve entrevista.

Anaximandro Amorim

(advogado, professor e escritor capixaba)

Foto do perfil do facebook do autor

“[...] Nicolussi quebra paradigmas: além de se dedicar às Letras, a autora também introduz, em um ambiente fortemente marcado por poetas que reproduziam fórmulas parnasianas e simbolistas, o moderno, com versos livres, brancos, polimétricos, inovando, assim, o nosso cânone literário [...]”

Acompanhe a entrevista completa aqui.

1) Por que Haydée é importante para a literatura capixaba?

Haydée Nicolussi (1905-1970) é figura de grande importância para as Letras brasileiras produzidas no Espírito Santo. Primeiro, por uma questão de gênero: em um período dominado por vozes masculinas, ela, junto a outras mulheres, ousou escrever e publicar, sendo, inclusive, reconhecida publicamente. Mas não só por isso Nicolussi quebra paradigmas: além de se dedicar às Letras, a autora também introduz, em um ambiente fortemente marcado por poetas que reproduziam fórmulas parnasianas e simbolistas, o moderno, com versos livres, brancos, polimétricos, inovando, assim, o nosso cânone literário; Haydée foi a única escritora nascida no Espírito Santo a ser traduzida por Antonio Dias Tavares Bastos na importante Anthologie de la poésie brésilienne contemporaine, lançada em Paris, nos anos 1950, ao lado de poetas como Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade e Manoel Bandeira.

2) Quais são as contribuições da Haydée para a poesia em termos de composição, características, temas ou outros aspectos?

Haydée Nicolussi rompe com a questão formal da literatura, sobretudo, produzida em terras capixabas. Muitas escritoras e escritores repetiam velhas formas parnasiano-simbolistas numa tendência que perdura até, aproximadamente, os anos 1950. Nicolussi escreve poemas modernos nos anos 1920, portanto, três décadas antes. Ademais, pode-se encontrar, na escrita da autora, inovações temáticas, como o direito à sexualidade, ao prazer, ao corpo da mulher, algo impensado em várias de suas contemporâneas.

3) Nos grupos de estudos e leituras do Estado do Espírito Santo dos quais você faz parte, como é a recepção dos leitores em relação a Haydée?

Em geral, existe muito desconhecimento quanto à poética de Haydée. Após introduzir alguns de seus textos, o estranhamento cede lugar a um encantamento. Primeiro, pela modernidade de uma autora da primeira metade do século XX; segundo, pela experiência estética produzida por seus textos que, mesmo um século depois, ainda soam tão atuais. Haydée é, indubitavelmente, uma autora que merece ser mais lida e, tarefa para nós, dos Cursos de Letras, estudada.

Júlia Almeida

(Professora de Letras da UFES, pesquisadora e compositora)

Foto cedida pela autora

“Mas sempre cultivou um modo de pensar altivo e lúcido que a fez superar as “sombras” de seu tempo e, ainda assim, viver a “festa” da sua vida de mulher independente, reconhecidamente escritora, admirada por grandes nomes da literatura brasileira [...]”

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  1. Por que a pesquisa sobre Haydée Nicolussi tem relevância hoje?

R: Haydée Nicolussi foi uma personagem multifacetada que viveu a sua arte (a escrita literária, em vários gêneros) entre duas guerras mundiais e duas ditaduras brasileiras, o que não foi fácil. Muitos amigos morreram, desapareceram, também seus materiais foram confiscados, roubados. Mas sempre cultivou um modo de pensar altivo e lúcido que a fez superar as “sombras” de seu tempo e, ainda assim, viver a “festa” da sua vida de mulher independente, reconhecidamente escritora, admirada por grandes nomes da literatura brasileira. Deixou um legado precioso ainda por ser reunido e publicado.


  1. Por que a Haydée não teve tanta repercussão nacional?

R: Em algumas entrevistas de Haydée, ela fala das dificuldades de publicação de seus livros, das “panelas literárias”. Embora tenha publicado constantemente em jornais e sido considerada por pessoas da época uma jornalista, teve um empecilho maior do que várias de suas contemporâneas no acesso a recursos de publicação de livros. Também era muito exigente com relação a sua produção, o que fez com que retirasse seu livro Festa na sombra de um concurso para publicação, onde tinha chances reais de consagrar-se no cenário nacional. Ser uma mulher de esquerda em uma época machista e autoritária, ter sua vida abalada pela perseguição e prisão política também dificultou sua vida pessoal e a edição e repercussão de sua obra, mas teve o reconhecimento literário de grandes poetas.


  1. Quais caminhos de acesso ao corpus literário de Haydée se fazem presentes hoje?

Durante a pesquisa que fiz em 2019, descobri na Hemeroteca da Biblioteca Nacional, no endereço www.memória,bn.br ferramentas de busca a boa parte do material que ela publicou em jornais e revistas da época. É fascinante acessar os textos com ilustrações, confirmar autoria de textos escritos com pseudônimos, encontrar textos não catalogados, evidentemente há o limite dos jornais disponíveis e da precisão das ferramentas de busca. Muitos textos publicados não são tão fáceis de localizar. O acervo pessoal dela está fisicamente dividido entre Rio e São Paulo, sob guarda de um sobrinho, com quem conversei algumas vezes, ainda com esperança de conseguir uma maneira de viabilizar publicações dos livros inéditos através de editais. Estamos organizando na Estação Ferroviária de Mathilde, no Salão Haydée Nicolussi, um espaço de leitura com uma estante de livros infanto-juvenis para uso da comunidade e também uma pequena exposição de suas memórias. Este blog Poeta e Revolucionária também faz parte dessas ações de divulgação de sua obra que estão atreladas ao Projeto de Extensão Gente do Benevente, que coordeno na UFES.

Francisco Aurelio Ribeiro

(professor, pesquisador e escritor capixaba)

Foto retirada do site do jornal A Gazeta em 23/11/2020

“[...] Amiga de Jorge de Lima, Drummond, Sérgio Milliet, Newton Braga, logo se desprendeu das amarras parnasianas e se pôs a escrever versos livres, buscando novos tons e ritmos para sua poética [...]”

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  1. Por que a Haydée Nicolussi é tão importante para você, para sua época e país que mereceu tanto tempo e esforços de pesquisa?

Haydée Nicolussi (1905-1970) foi uma escritora diferenciada em sua época, por suas atividades políticas e sociais, por sua inteligência e acuidade, por ter aberto caminho para outras mulheres, por sua inquietude sobre o papel da mulher. Foi a primeira escritora capixaba modernista, a primeira museóloga, a primeira a fazer uma pós-graduação em Artes na França, enfim, uma pioneira. Mulher à frente de seu tempo e das outras, traçou um novo percurso para as intelectuais, pagando caro por ser o que era. Presa, em 1935, na ditadura de Getúlio Vargas, teve toda a vida prejudicada por ter-se colocado ao lado do socialismo e dos que lutavam por um mundo melhor.


  1. Quais são os aspectos e características das obras da Haydée que a levaram a ser considerada a primeira autora modernista do Estado do Espírito Santo e, também, neossimbolista?

Haydée foi uma mulher de seu tempo, antenada com as vanguardas ditas europeias e sua repercussão no Brasil. Amiga de Jorge de Lima, Drummond, Sérgio Milliet, Newton Braga, logo se desprendeu das amarras parnasianas e se pôs a escrever versos livres, buscando novos tons e ritmos para sua poética, a partir de 1928, quando se consolidava o modernismo no Brasil, em sua feição futurista, antropofágica ou neossimbolista, como a vejo mais identificada.


  1. Qual é a importância das pesquisas sobre a Haydée para o estudo da literatura capixaba?

Pesquisar Haydée é buscar conhecer o que foi essa capixaba, nascida em Alfredo Chaves, filha de imigrante italiano, que ousou enfrentar os tabus de sua época com relação ao papel da mulher e da escritora. Poliglota, podia ler o que se passava no mundo e vivenciar essas transformações. Não pode mais ser esquecida pelos que estudam as letras capixabas.