A emoção não revelada

Descobri recentemente uma coisa sobre a minha personalidade e decidi compartilhar. Não na intenção de justificar algum fato, mas tenho certeza que vai justificar para alguém próximo. Eu tenho uma dificuldade em expressar uma emoção “esperada” ou “comum” no mesmo instante da ação, e eu passei a refletir sobre isso após alguns comentários.


Lembrei de um amigo que me chamou para ser voluntário em uma mágica, tentei resistir, mas acabei indo. Quando ele abriu a mão e fez vários pedacinhos de papel voar pelo ar, o povo aplaudiu, e eu não sei descrever exatamente a minha expressão facial no momento, porém ele me disse depois em tom de brincadeira: “Cara, tu fez uma cara tão séria. Acabou com a magia”. Em duas entrevistas presenciais, duas pessoas em momentos diferentes comentaram a mesma frase: "Parecia que você estava incomodado com alguma coisa", na hora até tentei colocar a culpa na ansiedade (que não deixa de ser verdade). E teve um colega da faculdade que me fez uma homenagem  linda com um saxofonista e depois alguém comentou: “Nossa! Se fosse eu tinha morrido de chorar”. E nos casos mais extremos, quando uma tia morreu nos meus braços e quando soube que a outra havia falecido, em anos diferentes, alguém comentou: “Como você consegue não chorar? Como consegue ficar calmo como se nada houvesse acontecido?”. Eu posso afirmar que em todas as situações citadas, senti tudo o que uma pessoa chamada “normal” pode sentir: alegria, surpresa, desespero, satisfação. Apenas não reagi externamente como esperavam.


Uma das coisas que costumo repetir é que “eu não gosto falar, prefiro escrever”, isso em situações formais, em gravações de vídeos, em palestras, ou rodas de conversa pública. Gosto muito de pensar no que quero dizer, como quem cava uma verdade mais profunda, e fico meio perdido com perguntas inesperadas. Em uma entrevista gravada, uma pessoa me perguntou: “Você é um escritor marginal?”, eu parei a gravação e disse “espera aí”, porque nunca havia refletido sobre isso e achei leviano dar uma “resposta bonitinha”. Sempre fui de periferia, sempre estive em contextos sociais de “viver às margens”, mas ainda assim eu tive privilégios que muitos não tiveram: casa, colégio, água encanada, casa em rua firme, e etc. Fiquei pensando: se um negócio desses fosse “ao vivo”!? É por isso que gosto de escrever, consigo pensar direito no que quero expressar com verdade.


Quando estou escrevendo ou compondo uma história, para livro ou roteiro, eu choro muito. Sou alguém que escreve a maioria das vezes chorando, porque internalizo a cena, o sentimento da personagem, a mensagem (trama profunda), me arrepio, e recebo muito feedback do quanto isso foi sentido-repassado. Outro dia reencontrei uma pessoa que admiro, mas não temos muita intimidade, e ela me abraçou, disse que estava feliz em me ver, e eu apenas disse “ahh…”, depois fiquei me autojulgando porque eu queria ter dito: “eu te admiro tanto, acho você tão talentosa, de energia linda…”, mas só saiu esse “ahh…”.


O lado bom disso, é que identifico com facilidade pessoas com questões parecidas, e não julgo. Eu sei quando a pessoa não gosta de abraço, por exemplo, de inicio dá uma estranheza, mas depois penso: É o jeito dela! Como ela sente!


Descobri uma palavra na psicologia chamada ALEXITIMIA. E compartilho isso hoje, na esperança de afetar identificações que precisam acreditar que isso não é um problema, no sentido de doença ou inadequação. Talvez seja consequência de uma questão não-tratada, mas por favor, não se autossabotem como eu fiz, e às vezes faço.


Escrever e reconhecer é meu primeiro passo, por mim mesmo. E não vou pedir desculpas por ter sentido algo genuíno, que apenas não foi facial ou verbalmente reconhecido.


Abraços.


Marcos de Sá