Metodologia

1. Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?


Vendo o nascer do sol no mar, escutando música, bebendo chá (prefiro chá a café, gato a cachorro, Platão a Aristóteles).

O ideal seria, depois da cerimônia do chá, todos os dias, escrever. Já fiz isso, mas fiquei cada vez mais atarefado com trabalhos de direção e organização: fui Presidente da Academia Brasileira da Filosofia, organizei um evento para os 100 anos de Clarice Lispector, lancei o dia mundial UNESCO da lógica, sou o atual Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Filosofia na UFRJ, editor das revistas Logica Universalis e South American Journal of Logic, de cinco coleções de livros, responsável da área de lógica da Internet Encyclopedia of Philosophy, organizador de quatro séries de congressos internacionais, de um webinar mundial bimensal de lógica...

Todos esses trabalhos são importantes, mas daqui a pouco vou voltar a escrever diariamente de manhã, é bom para a saúde!

2. Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?


Horários diferentes correspondem a estados psíquicos diferentes, cada um é interessante, tento aproveitar todas essas variações.

Para escrever tem que se concentrar, ficar livre de preocupações, barulhos, e outros distúrbios. Eu escuto música, eu trabalho em função da música.

Os matemáticos geralmente gostam muito de música, James Joseph Sylvester, criador do American Journal o Mathematics, caracterizou essa ciência dizendo: A matemática é a música da razão.

3. Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?

Tento escrever todos os dias, mesmo que seja só por uma hora. Escrevo vários tipos de coisas: artigos de filosofia, lógica, matemática, semiótica, poemas, letras de música, aforismos, contos, verbetes de enciclopédia, textos autobiográficos...

No entanto, o que escrevo mais no momento são artigos de pesquisa de cerca de 15 páginas, o que corresponde ao formato atual do mundo acadêmico. Em média eu escrevo um artigo de 15 páginas em um mês, trabalhando regularmente todos os dias.

Às vezes, eu escrevo simultaneamente dois ou três artigos, trabalhando um pouco sobre cada um, quotidianamente. Acho bom alternar, não trabalhar o dia inteiro sobre a mesma coisa.

O Jean-Jacques Rousseau recomendava fazer isso, sigo o conselho dele desde a minha juventude, ele sempre foi um bom guia para mim.

4. Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?

Para mim é um processo com três fases. A primeira é a fase de gestação, fico pensando e coloco algumas ideias no papel e/ou na tela do computador, faço palestras, dou aula sobre o assunto, converso com colegas e amigos. A segunda é a fase de construção, é a mais difícil: escrever sentenças completas, articulando e formulando as ideias, até chegar numa primeira versão do artigo. Aí começa a terceira fase que é de refinamento, de polimento, de lustragem, aquela que acho a mais prazerosa. Podemos fazer uma analogia com a escultura.

5. Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?

O importante é insistir e não se interromper, especialmente na segunda fase, não deixar a construção parada no meio do caminho. Tem que se obrigar a trabalhar regularmente e sistematicamente, mesmo só um pouco, todo dia se possível.

A derradeira vez que trabalhei em projetos longos foi quando era estudante: escrevi dissertações de filosofia, matemática e cinema (as três disciplinas que estudei na universidade). Não tive muito problema a fazer isso. Em todos esses casos, pesquisei e pensei durante um tempo relativamente longo e depois sentei para escrever num tempo curto.

6. Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?



Reviso pelos menos 3 vezes e até 10 vezes. Gosto muito de fazer isso, sou perfeccionista, gosto de trabalhar os detalhes, achar a palavra certa para a coisa certa (the rigth word for the right thing), a melhora formulação, até chegar ao ponto satisfatório, onde tudo é poliment correct !

Depois eu descanso durante pelo menos uma semana. Eu mando o artigo para alguns amigos que me mandam comentários e aí eu retrabalho um pouco o texto, geralmente não muito, mas são ajustes, pequenos retoques, que são as vezes bem valiosos.

O ano passado (2020) escrevi um artigo - The Mystery of the Fifth Logical Notion (O Mistério de Quinta Noção Lógica) - que eu mandei para mais de cem amigos antes de preparar a versão final. Foi uma experiência interessante, os comentários me auxiliaram a bem melhorar a lustragem do artigo, fazendo ele brilhar mais.