Enculturação matemática é o processo de apropriação pelos alunos dos objetos matemáticos construídos ao longo da História Humana (*Bishop, 1991). Este processo está profundamente enredado com a socialização e abrange a linguagem, os valores, as técnicas e as práticas da cultura matemática estabelecida. A enculturação matemática é, portanto, um processo intencional de envolvimento com a cultura matemática e de interação entre cada aluno e aqueles que partilham desta cultura.
A matemática é uma ciência pancultural, isto é, está presente na história de diferentes civilizações (Bishop, 1991). Assim não é adequado referirmo-nos à matemática como a uma só, mas às matemáticas que as diversas culturas produziram e produzem ao longo do tempo. Os registros históricos revelam-nos a existência de inúmeros sistemas de numeração, diferentes modos de medição, muitas geometrias e assim por diante nos diversos domínios matemáticos. Cada povo concebeu uma matemática com características próprias e para atender às suas demandas específicas. Assim, podemos referir-nos à matemática egípcia, à matemática grega, à matemática hindu, à matemática africana e muitas outras.
Entretanto, não obstante as diferenças, Bishop sustenta que há uma raiz comum às diferentes matemáticas praticadas pelos povos. O autor defende a tese de que o acervo matemático de que hoje dispomos tem origem em seis atividades universais: contagem, localização, medição, desenho, jogo e explicação.
O autor refere que a Matemática que ensinamos nas escolas é o produto de um determinado percurso histórico-cultural: “A matemática não é, portanto, apenas uma parte de todas as matemáticas que diferentes culturas desenvolveram, é uma linha particular de conhecimento desenvolvido que tem sido cultivado por certos grupos culturais até atingir a forma particular que conhecemos hoje " (Bishop, 1991, p. 57)
Assim, a matemática é fenômeno pancultural que teve origem em determinado período da história humana, estendeu-se por diferentes grupos sociais para atender demandas específicas a partir das seis atividades referidas presentes nas diversas civilizações. Estas seis atividades universais, realizadas em interação ou separadamente, são a génese da tecnologia matemática simbólica que hoje conhecemos e continuam dando origem a novos conceitos matemáticos. Elas devem fazer parte do currículo escolar de matemática numa perspectiva de enculturação (Bishop, 1991).
A escola é o ambiente institucional para a enculturação matemática das crianças e dos jovens. Bishop (1991) destaca o protagonismo dos professores neste processo. Os professores são os enculturadores e principais responsáveis pela enculturação dos seus alunos, e não o sistema de ensino.
A estrutura do currículo, numa perspectiva de enculturação matemática, deve contemplar três componentes essenciais: (i) a componente simbólica, que diz respeito à tecnologia simbólica da Matemática, organizado segundo as seis atividades universais – contar, localizar, medir, desenhar, jogar e explicar; (ii) a componente social, que se refere às múltiplas aplicações da Matemática à vida na sociedade; e (iii) a componente cultural, que aborda o fenômeno matemático presente nas diversas culturas humanas (Bishop, 1991).
Neste sentido, propomos a atividade dos jogos para explorar a matemática nesta perspectiva cultural.
* Bishop, Alan. Mathematical Enculturation, A Cultural Perspective on Mathematics Education. The Netherlands: Kluwer Academic Publishers, 1991.