Segundo informações da guarda de FortVille, policiais estão investigando se um disco encontrado por caçadores é, de fato, composto por Daniel Pacco, palhaço desaparecido na década de 1990. O material estava enterrado ao lado de uma árvore, há 25 km da antiga casa de Pacco. “A gente começou a cavar pra fixar a barraca do acampamento, quando sentimos algo mais sólido, desenterramos para ver o que era. A gente sempre pensa que pode ser algo valioso, né, e realmente era”, contou Paulo Mendes Filho, o caçador. Mesmo antes do fim da operação, Fernando, primo de Daniel, garante que as músicas são da autoria do palhaço: “Eu nunca tinha escutado essas músicas, mas tenho certeza, são dele. O timbre de voz é inconfundível".
Daniel Pacco foi um palhaço, humorista e músico na década de 1990. Ganhou notoriedade com suas apresentações nas casas de show de FortVille. Com seu humor ácido, crítico e autodepreciativo, influenciou uma geração de humoristas no mundo todo, cunhando um estilo único de humor na Ilha das Incertezas.
Amante de Drewskys e dependente assumido de remédios tarja preta, o uso excessivo de drogas sempre esteve presente na vida de Daniel Pacco. São incontáveis as suas aparições públicas em estado alterado, arrumando confusão em bares ou simplesmente cambaleando pela rua. O seu primo, Fernando Pacco, comentou a situação na época: “Era uma coisa de adolescente, a gente sempre gostava de tomar uns Drewskys, mas foi saindo do controle. Pra ele era segunda, terça, quarta. Isso tudo ainda associado aos remédios. Ninguém gosta de ver uma pessoa que a gente ama desse jeito. A família tentava ajudar, mas ele se afastava”.
Pouco se tem certeza sobre o contexto das músicas ou se Pacco tinha a intenção de lançá-las eventualmente. A qualidade das gravações, que parecem ter sido feitas num pequeno gravador que também foi achado na caixa, indicam que o projeto era algo bem mais pessoal para Pacco, contendo ruídos estranhos, pausas e até mesmo erros. Especialistas e "paquetes" (como são chamadas as fãs do palhaço) por toda a web têm tentado conectar as letras aos momentos de sua vida conturbada. Tudo o que se sabe com certeza são os nomes das faixas, que apareceram escritos junto ao disco. São eles:
Dois Drewskys e Um Cigarro
Pôr-do-sol das Incertezas
Respeitável Público
Pacco era um inimigo declarado do governo vigente (ainda o regime secretamente autoritário de Rogério). Foi um militante pela legalização dos Drewskys e teve até seus shows proibidos durante o ano de 1994. Essa música, no entanto, parece datar ainda da metade da década de 1980, quando Pacco ainda não era tão famoso e os Drewskys eram, enfaticamente, proibidos.
“Com meu copo cheio
Nada me tira do sério
E lá pro terceiro Drewsky
Vi Posaro dançar com Rogério.”
A segunda faixa do álbum é a mais clara de todas, Pacco quis fazer uma homenagem à sua esposa. No dia 4 de abril de 1990, Lilian Pacco sofreu um acidente de carro ao se chocar com um caminhão que vinha em alta velocidade na rodovia II-144. “Foi muito difícil pra ele, o Daniel nunca soube lidar.” relatou um amigo. Pacco não voltou aos palcos por três anos após o acidente.
“E nessa ilha inteira, eu sei
Ninguém vai entender
O pôr-do-sol das Incertezas
Não é o mesmo sem você.”
A relação de Pacco com a plateia sempre foi muito notável e sincera. Ele jamais escondeu seus problemas, normalmente eles eram os motivos de suas piadas. Quando retornou aos palcos em 1993, Pacco estava determinado e cresceu rapidamente no circo e nas casas de show. Essa música parece se encaixar nesse contexto: uma explicação, um acordo de paz, o retorno.
"Respeitável público
Estou na sua porta
Fui embora sem aviso
Mas estou de volta."
No dia 3 de março de 1996, Pacco fazia sua última apresentação no circo de Fortville. A casa estava lotada e Pacco parecia extremamente à vontade. Após o espetáculo, recebeu algumas pessoas do público no backstage e arrancou elogio de todos. "Eu fui no último show do Pacco e falei com ele depois. Foi muito bom. Ele estava irreconhecível. Estava... feliz." disse Luciana Posarin, uma paquete. Depois disso, Pacco partiu para sua primeira turnê em todas as regiões da Ilha das Incertezas, todas já esgotadas. A próxima parada seria em 25 de março daquele mesmo ano em Tranquilópolis. Infelizmente, o espetáculo de Tranquilópolis nunca aconteceu. No dia 23 de março de 1996, o Pacco foi dado como desaparecido pela Polícia de FortVille. Depois de 10 dias sem responder mensagens de familiares e produtores culturais, a família decidiu chamar a polícia para invadir a casa. Porém, ele nunca foi encontrado. O seu desaparecimento foi marcado pela negligência policial. Não houve grande mobilização de equipes na busca, as florestas ao redor não foram revistadas e o caso foi dado como encerrado 7 dias depois do desaparecimento. Pacco foi declarado como morto sem suspeitos interrogados. Na época, outros artistas de menor expressão também desapareceram.
A quarta gravação de Pacco traz mais dúvidas do que respostas acerca do seu desaparecimento. As buscas na floresta foram negligenciadas, Pacco não havia falado com ninguém nos últimos dois dias e o trem que ele pegou jamais chegou em Tranquilópolis.
"Ninguém perde a razão
Não é a tradição
Em Tranquilópolis."