Em 1856, nascia Sigmund Freud que, aos 17 anos, iniciou sua formação médica em Viena, onde destacou-se como um aluno e estagiário brilhante, sendo que muito cedo ele demonstrou a centelha do gênio no campo da investigação, que o levou à descoberta da estrutura gonadal das enguias e, mais tarde, no campo da fisiologia, com seus estudos sobre o sistema nervoso de certos peixes.
Um pouco mais tarde, em 1891, publicou um livro sobre Aphasia e, em 1895, divulgou os seus estudos sobre "paralisias cerebrais infantis", sendo que ambos o conceituaram como pesquisador e neurólogo.
A medicina dessa época era quase que inteiramente assentada em bases biológicas, muito pouco interessada na psicologia que então era entregue aos filósofos, sendo que a nascente psiquiatria não passava de um ramo da neurologia e que, mais tarde, acabou se tornando a especialidade de neuropsiquiatria.
Os neuropsiquiatras de então prestavam um atendimento mais humanista que os métodos anteriores, embora os recursos de que dispunham consistissem unicamente no emprego das ervas medicinais, clinoterapia (repouso no leito), hidroterapia, massagens, estímulos elétricos, dentre outros.
Contemporaneamente, também já estava havendo a utilização da hipnose, não só dirigida para espetáculos teatrais, como era comum na época, mas já como uma busca por fundamentos científicos.
O grande nome no campo da hipnose empregada para fins científicos era do iminente neurologista Charcot, que professava na famosa Salpetrière, em Paris, e cujos ecos das espetaculares descobertas chegaram aos ouvidos de Freud, que conseguiu fundos de uma bolsa para estagiar e acompanhar de perto o carismático mestre francês, no período de setembro de 1885 a fevereiro de 1886. Sobretudo, dois aspectos impressionavam Freud: a existência da histeria em homens e a observação da dissociação da mente, induzida pela hipnose.
Freud mostrava-se incrédulo e descontente com os métodos pretensamente científicos empregados pelos neuropsiquiatras contemporâneos e resolveu empregar o método do hipnotismo com as suas pacientes histéricas, partindo do princípio de que a neurose provinha de traumas sexuais que teriam realmente acontecido na infância por sedução de homens mais velhos, mais precisamente pelos próprios pais.
Muito cedo, Freud se deu conta de que era um mau hipnotizador e por isso resolveu experimentar a possibilidade de que a "associação livre de ideias", conseguida pelo hipnotismo, também pudesse ser obtida com as pacientes despertas. Para tanto, passou a utilizar um método coercitivo, convidando as pacientes a deitarem-se no divã ao mesmo tempo em que, com insistentes estímulos e pressionando a fronte delas com os seus dedos, obrigava-as a associarem "livremente" como uma tentativa de recordarem o trauma que realmente teria acontecido, mas que estaria esquecido, devido à repressão.
Graças à paciente Elisabeth Von R. que repreendeu Freud para que deixasse de importuná-la porque, ela assegurava-lhe, sem pressão associaria mais livremente e melhor, é que ele ficou convencido de que as barreiras contra o recordar e associar provinham de forças mais profundas, inconscientes, e que funcionavam como verdadeiras resistências involuntárias. Isto constituiu-se como uma marcante ruptura epistemológica, porquanto Freud começou a cogitar que essas resistências correspondiam a repressões daquilo que estava proibido de ser lembrado, não só dos traumas sexuais realmente acontecidos, mas também daqueles que foram fruto de fantasias reprimidas.
A partir daí, o conflito psíquico passou a ser concebido como resultante do embate entre as forças instintivas e as repressoras, sendo que os sintomas se constituiriam como sendo a representação simbólica deste conflito inconsciente. Esta concepção inaugura a psicanálise como uma nova ciência, com referenciais teórico-técnicos próprios, específicos e consistentes.
Fonte: Zimerman, David E. Fundamentos Psicanalíticos. Porto Alegre: Artmed, 1999.