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O homem da rádio e o poeta da condição cristã(II)
Não se calar...pode ser uma das exigências da condição cristã.
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O outro rosto de Coelho de Sousa na internet:Alamo Esguio
E não podia calar-se
Jamais o tinham visto na Judeia.
Espadaúdo e alto, ardente e forte,
Trazia o rosto seu a cor da areia
E tinha o braço erguido para o norte.
O mel silvestre fora o seu sustento
E gafanhotos deram seu petisco.
Na sua voz trazia agora o vento
A porta aberta para o grande aprisco.
Caminhos da cidade não sabia.
Palácios e salões, ao seu desprezo...
Só vinha para ensinar o sol ao dia;
Trazer no fogo, o mundo todo preso.
E corre a pisar seu rio Jordão
Que as águas também falam
do abismo
A desaguar virão do coração
As águas do amor pelo baptismo
Nas suas mãos erguidas como atleta,
Aa vara do arrimo e do poder.
Na sua boca o verbo do profeta
rogando o mundo todo ao Verbo ver.
E mais que tudo na alma arde um vulcão,
Abrindo a treva densa ao seu fulgor...
Espadaúdo e alto, São João,
Clamando, ardente, ao homem: Eis o Amor.
Quem sabe donde vinha tanta gente?
De Bersabeia ao Sul, Jerusalém,
De Jape e Cesareia no poente,
E muito perto Siquem e Efrem?
Talvez de Jericó, Betânia e Pela;
Talvez de Tiberíades e Magdala;
Quem sabe quantos olham uma estrela;
Quem sabe quantos ouvem uma fala....
Das bandas de Belém vinha um segredo,
Que Nazaré guardou sem compreender...
E novamente o encontro que o rochedo
de Hebron pela visita pôde ver...
Quem sabe donde vinha tanta gente
Para escutar o Verbo novo, aberto,
No inspirado grito, eloquente
Que ao mundo fala no meio do deserto:
Oh! Gentes, aplanai vossos caminhos...
Endireitai veredas de paixões...
Sabei que não estais aqui sózinhos,
Erguei bem alto os vossos corações...
Que não se cale a vossa e minha voz!
Eu sei que já nasceu do mundo a vida...
Já se avizinha... está no meio de nós...
E toda a lei será nele cumprida...
Olhai em derredor, que os cegos veem,
Aprontai todo o ouvido para ouvir...
Eis o Cordeiro... Já chegou... aí vem!
Que aos homens bem dissera: Eu hei-de vir!
Eu nada valho, eu nada sou, meu Deus!
Areia do deserto e pouco mais!
Beijar os seus sapatos... rastos seus!
Quem poderá, oh! gente que escutais!
E no entanto, eu vejo que ele chega,
Traz no olhar o lume do amor,
E vem como o cordeiro para a entrega,
do sacrifício a Deus, Nosso Senhor...
João!... - Senhor! Deitai na minha fronte
as águas deste rio mansamente...
E desde aqui há-de nascer a fonte
Que gera os dons de Deus, eternamente...
-Senhor, assim será como quereis...
Cumprida eu sinto já minha missão...
Lançai ao mundo todo as vossas leis..
Eu volto para o deserto, à oração!...
-Espera, escuta ainda: Este é meu Filho
Em quem eu pus amor e complacência!
- Senhor, quem fala é luz de intenso brilho.
- Meu Pai, do seu Espírito a Ciência!
E tu, João, vai testemunhar
a luz que se acendeu dentro de ti...
Não terminou ainda o teu pregar.
Irás morrer porque me viste aqui!
Ah! Ah! Ah!
Comei! Bebei à farta sem receio!
Aos meus celeiros ninguém vê o fundo!
Que nem tão pouco se veria o meio
Embora aqui jantasse todo o mundo!
Bravo! Mais vinho! Salvé, Grande Herodes!
Só tu nos compreendes! Salvé, oh! Rei!..
- É claro que estou triste... e só tu podes
Fazer-me alegre... - Diz e te darei:
- Já tantas vezes foi que me prometeste...
Mas o profeta ainda não morreu...
Nos baixos do palácio o prendeste...
Mas quem está presa sou somente eu!
Enquanto a sua voz sempre gritar,
Julgando no pecado o nosso amor,
Hei-de ser triste... manda-o calar..
- Mas como hei-de calar o precursor,
Se o Verbo que lhe sai da boca é fogo?
Se o seu olhar a mim primeiro cala?
Vamos querida, alegra-te e mais logo
Havemos de afogar a sua fala!...
(Herodíades)
- Ninguém assim dançar ainda vi...
Coroa do jantar! Oh! Maravilha!
Repara, meu Herodes, reluziu
a tua grande glória em minha filha...
- Senhoras e senhores, atendei:
Por este bem dançar, que igual não vi,
Metade do meu reino até darei...
Que queres tu, menina, para ti?
- Senhor, nada mais quero pela dança
Que aquilo que a sua arte lhe engrandeça...
Das tuas mãos de rei, aceito a herança.
Na minha taça eu quero uma cabeça...
Essa cabeça aqui deixai tombar..
Que nada me contenta mais que isto...
E, depois desta, anseio só cortar...
Aquela do que dizem ser o Cristo!...
E terminou assim, na terra, a luz
Que, à beira do deserto se acendeu!
Exacta a profecia de Jesus...
Mas se João Baptista assim morreu,
O verbo seu ainda não calou...
O fogo do amor não se extinguiu...
Na ara do martírio, ao céu voou,
E muito mais luz no céu fulgiu.
Quem morreu assim, não perde nunca a vida...
E encontra em Deus a fronte coroada.
Que embora o mundo a julgue ter perdida...
A vida em Deus se tem assaz guardada...
Ouvinte açoriano, é hoje o dia
Que a Igreja lembra o drama desta vida...
Que estalem os foguetes da alegria...
Mas viva toda a gente a Vida... A Vida!
A vida que há-de ser verdadeira,
A vida que ninguém termina aqui...
Escuta inda outra vez: Voz da Terceira,
Por Deus, a vida! A vida é para ti!
(23-VI-954)
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créditos:Dionísio Sousa contacto dionisiomendes@gmail.com