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O homem da rádio e do mar-saudade
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Verdadeiramente:
Ninguém poderá viver sem amar.
E quem ama, alguma vez, sentiu saudade.
A saudade é realmente uma constante na vida dos portugueses.
E não será inverosímil afirmar que,
ao dobro,
na vida dos açorianos,
isolados, distantes, perdidos no meio do mar...
Os olhos e o coração na vastidão do oceano que nos rodeia,
na distância dos horizontes que nos limitam.
E é por isso que
por uma estranha magia,
nessa constância idiossincrática da saudade ,
a presença do mar é contínua e total.
Pois bem, estimado ouvinte,
os versos que hoje vou recitar em
A Vida é Para Ti,
são mais um testemunho dessa constância de mar e saudade,
postas numa porção de redondilhas maiores,
que, há dois dias, me vieram num jacto de maré cheia:
MAR E SAUDADE.
Atirei pedras ao mar
Sem o mar me fazer mal.
Quanto mais pedras atiro
Mais o mar se fica igual.
Quantas pedras atirei
Todas se foram ao fundo.
Só não lhes posso atirar
Pedras que me atira o mundo...
Neste jogo de pedrada
Cada pedra cai na água.
Umas caem sobre o mar
Outras nas ondas da mágoa.
Mas o mar é sempre o mesmo
Por mais pedras que a onda leve.
Porém, eu, de tanta pedra
Sinto já a vida breve.
Também um dia quiseram
Atirar pedras a Cristo.
Ele era Deus e fugiu,
Eu não sou Deus... não resisto.
Não aceito como Estevão
As pedras com que me firam.
É sobre o mar que me vingo
De quantas pedras me atiram.
Atirei pedras ao mar
Sem o mar me fazer mal.
Quanto mais pedras atiro
Mais o mar se fica igual.
Mas o mar me respondeu
Certo dia em maré cheia;
Cada pedra que me atiras
Não é mais que grão de areia.
E por mais areia junta
Nunca a praia terá jeito
Que se iguale ao areal
Que trazes dentro do peito.
A tua alma é um mar
Muito maior do que eu.
Quanto mais pedras me atiras
Mais pedras ficam no teu.
Escuta pois meu amigo:
Não vale a pena atirar...
Se este jogo não acaba
Porque te estás a cansar!
Tu já não és o primeiro
A jogar dessa maneira.
Pedra que vem logo volta,
Aumenta sempre a pedreira...
É melhor deixar ficar
a pedrada em nossa alma.
Pedra que vem e que fica
É alicerce da calma.
Este princípio operou
Em meu seio maravilhas.
São pedradas que ficaram,
Os continentes e ilhas.
Calou-se o mar e ficou
tanta pedrada retida
Junto a mim de dia a dia
que de pedras fez-se a vida.
E nunca mais atirei
Pedras ao mar sempre igual.
Só ao meu atiram pedras
Por ser bem e por ser mal.
Pois que atirem pedras tantas
Para martírio da gente.
Há-de vir depois a calma
Com ilhas e continente.
Nem muito ao mar... nem à terra
Diz o ditado... é verdade:
Mas nisto de saudade
O ditado não se encerra...
A saudade me atormenta
Como atormenta qualquer.
É um mal que não se quer
Quando é um bem que se ausenta...
Neste jogo do sim e não
A saudade joga a vida...
Em ficar alma retida
Quando parte o coração.
É chorar de olhos enxutos
Os sonhos mais os desejos.
Morrer no lábios os beijos
Sempre vivos...já sepultos.
Pôs-se a saudade a rezar
Os mistérios dolorosos.
Jamais rezou os gozosos!
Gloriosos nem pensar!
A saudade, ave exangue,
Macerada e sempre viva.
Ave liberta e cativa
No voo e asa de sangue
Pelicano, o peito aberto
Outra Fénix renascida...
Imolação pela vida
Que ao longínquo torna perto..
Essa distância é de mar
Onda a onda o amargor,
Infindo, imenso o amor
Sem a presença tocar...
A saudade não termina
Como não se acaba o amor...
É mar, é sal-amargor
Esta saudade mofina.
Indesejável que seja,
A saudade ou a censura,
Não a quero... Mas procuro
Como um bem que se deseja.
E fica a vida um duelo,
Um tormento sem proveito
Campo aberto, o ser desfeito
Amargo amor e desvelo.
Ah! se ao menos eu soubera
A saudade sublimar!
Era o céu em vez do mar
E a vida só Primavera!
Saudade, tanta saudade!
As saudades que eu senti
Da "vida que é para ti"
E será felicidade!
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O homem da rádio e da poesia do mar-espelho
Créditos: Dionisio Sousa contactos dionisiomendes@gmail.com