Capitão Nemo
Missa de 1º Dia e Agradecimento, Galeria São Bento, Lisboa - 2008
Missa de 1º Dia e Agradecimento, Galeria São Bento, Lisboa - 2008
“Era um vasto quadrilátero, tendo dez metros de comprimento, seis de largura e cinco de altura. O tecto luminoso, enfeitado por ligeiros arabescos, distribuía uma luz clara e branda sobre todas as maravilhas amontoadas naquele museu. Era realmente um museu em que mão inteligente e pródiga havia reunido todos os tesouros da natureza e da arte nessa adorável confusão artística que distingue o atelier do pintor.
Em “As Vinte Mil Léguas Submarinas” 1870
O advento das novas tecnologias fez surgir as denominadas exposições on-line. Os Museus e as Galerias tentam adaptar-se, colocando na internet as suas exposições, enriquecendo-as através de informação mais detalhada, propondo viagens virtuais. Os direitos de reprodução digital de algumas das grandes colecções estão a ser comprados. Uma cultura de competição surge no horizonte, entre os velhos museus e galerias que tentam responder na internet, e os museus e galerias virtuais construídos por estudantes como o Le Louvre Museum, posteriormente chamado Le Web Museum. O Museu Guggenheim apresentou o programa CyberAtlas, que consistiu em cartografar terra incógnita, isto é, páginas web relacionadas com arte visual e cultura. Aqui a interface apropria-se da exposição dos trabalhos, estabelecendo uma rede. As exposições já não precisam de espaço físico. Basta serem desenhadas por um comissário que cria conteúdos. As novas galerias são digitais (Zine Galleries). Surgem a partir das Faculdades, realizadas por estudantes, como o CADRE Institute em San Jose State University que apresenta a Leonardo Electronic Almanac Gallery. Arquivos e Livrarias, Galerias Comerciais e centenas de organizações artísticas virtuais representam artistas e projectos, como Adaweb, Digital XXX, Irational.org, Stadium, The Thing, Turbulence, Year Zero One e Zone Zero. Estes web sites são verdadeiras instalações na Internet. São os próprios artistas que apontam a direcção a explorar na Internet: Net.art, arte colaborativa, a própria audiência como comissária, o artista como museu. Os museus e as suas colecções, constituídos de alguma forma na arte flamenga do século XVII, são instituições que preservam objectos do mundo, organizados em colecções que o público pode contemplar. Pode dizer-se que os museus estão no negócio da disseminação de informação, mais do que nos seus objectos. Ao utilizarem os novos dispositivos tecnológicos, as suas colecções alcançam mais público na educação, preservação, pesquisa e comunicação.
Lisboa, Janeiro 2008 | Rodrigo Vilhena
Quem não se lembra das “Vinte Mil Léguas Submarinas” de Júlio Verne, onde o Capitão Nemo, personagem principal da obra que para além de ser um visionário e ter construído algo impensável - um submarino – também no seu interior tinha uma esplêndida colecção de arte à época. O submarino afunda-se com todas aquelas maravilhas no seu interior. Aqui aprendemos algo com Nemo, há algo de trágico nas pequenas colecções, normalmente constroem-se, desenvolvem-se e morrem com o seu mentor. Aquilo para que são pensadas – continuidade – não chega a ser concretizado, são efémeras. Já Susan Sontag em “O Amante do Vulcão” faz desaparecer grande parte da colecção do protagonista no fundo do mar. A ideia que o coleccionador é obsessivo já por demais foi explorada, o que aqui realizamos é dizer que quando se colecciona faz-se num qualquer lugar e num qualquer espaço, o monitor do computador pode ser o receptáculo da minha colecção, posso escolher as obras de arte que prefiro e fazer a minha colecção através de um download via Internet, através dos diversos museus e galerias do mundo inteiro. A questão é quem colecciona, como colecciona e quem se apropria? Quem faz a apropriação física do processo intelectual de outrem. O que é o acervo de uma galeria? Será a acumulação de obras de arte não vendidas ou as escolhas do director da galeria ao longo de anos, na busca do artista, da obra de arte, do novo. Podemos a isto chamar uma colecção? O que Rodrigo Vilhena nos mostra é a exposição e apropriação desse acervo com base no coleccionismo. Questionando o mercado da arte contemporânea e o valor das obras de arte.
Lisboa, Janeiro 2008 | Isabel Vaz Lopes