Guia Conferencista do Ministério do Turismo, da Cultura e Comunicação da França
Palácios, vinhedos e abadias em Dijon, Beaune, Montbard e Vézelay, na Borgonha
Beaune, antiga capital do reino da Borgonha, é uma das cidades mais turísticas da região, no centro da Route des Grands Crus
DIJON, Borgonha - O orgulho de ser cidadão da Borgonha é visível nos sorrisos dos habitantes de Dijon, capital da região que tem uma história peculiar, porque só foi incorporada à França, na segunda metade século XV, após a morte do duque Carlos, o Temerário, também conhecido como o Terrível, ou o Bravo. Enquanto França e Inglaterra se enfrentavam na Guerra dos Cem Anos, o ducado que imperou numa área entre a França e a Alemanha, incluindo parte da Holanda e Flandres (região norte da Bélgica), construiu na Borgonha, um império medieval, com significativa produção cultural, e viveu seu apogeu entre os séculos XIV e XV, fazendo de Dijon sua capital, que hoje conta com 155 mil habitantes.
Para ajudar a contar essa história há o Palácio dos Duques, uma antiga fortaleza que passou por reconstruções a partir do século XIV - a última delas, no estilo clássico, começou no século XVII, e foi planejada por Jules Hardouin-Mansart, o mesmo arquiteto de Versailles. O palácio hoje abriga o Musée des Beaux Arts e a administração municipal.
Atrás do Palácio dos Duques, a Igreja de Notre-Dame é uma das construções importantes da cidade. Em estilo gótico, é ponto de parada para todos os visitantes, que ali se aglomeram, admiram suas gárgulas e tocam a já gasta corujinha - como um amuleto - que fica numa de suas paredes da fachada.
Perto fica o mercado (Les Halles), onde a Revolução Francesa destruiu a antiga Igreja dos Jacobinos. Sob estruturas de ferro que lembram o estilo do Les Halles de Paris, o mercado funciona às terças-feiras, às quintas, às sextas e aos sábados. Há todo tipo de produtos locais, e também de fora, incluindo caças e aves. Os pescados vêm da Normandia e os deliciosos queijos podem ser da Borgonha ou da região vizinha Jura, limítrofe à Suíça.
As principais áreas de interesse turístico da cidade são marcadas pela Trilha das Corujas. São 22 pontos identificados por uma corujinha gravada no calçamento. A pé, o percurso leva uma hora de caminhada para ser cumprido e os visitantes podem acompanhar o roteiro pelo folheto distribuído no centro de informações turísticas da cidade.
Em Beaune, cores de vinhedos no outono
Beaune, antiga capital do reino da Borgonha, é uma das cidades mais turísticas da região, no centro da Route des Grands Crus, e mantém uma programação intensa de eventos culturais e enogastronômicos. Em seu casario medieval, o Hospices de Beaune, que abriga o Musée de L'Hôtel-Dieu, é uma joia arquitetônica e histórica. A instituição foi fundada em 1443 pelo chanceler Nicolas Rolin, que ao lado de sua mulher, Guigone des Salins, decidiram abrir um hospital público para atender aos pobres e desvalidos, muitos vitimados pela Guerra dos Cem Anos. Era uma forma de aliviar a consciência de um casal bem-afortunado, que conseguiu também atrair a cooperação de diversos artistas para ajudar na decoração do local.
O Palácio dos Pobres foi construído inspirado em prédios onde funcionavam hotéis no norte. Com fachadas góticas, as telhas policromáticas formando padrões geométricos indicam referências à Europa Oriental. As cores lembram a paisagem de outono dos vinhedos. O conjunto forma uma obra única da arquitetura medieval. E o melhor ponto para observar a riqueza do telhado é do pátio interno. Em seu interior, que se assemelha a uma nave central de igreja, os enfermos eram cuidados por freiras, em leitos dispostos lado a lado, nas laterais. A fama do local se espalhou rapidamente e não tardaram a bater às portas do hospital não só os menos favorecidos, mas também nobres e representantes de classes mais remediadas - estes eram recebidos numa espécie de ala de primeira classe.
As atividades médicas foram transferidas para um hospital de instalações modernas. Mas a instituição também se inseriu na produção de vinho e organiza desde 1859 o mais famoso leilão de vinhos do mundo, realizado pela Christie's (...). Na visita ao belíssimo prédio, um museu mostra as dependências do hospital, instrumentos médicos usados para cuidar dos doentes, a cozinha mantida pelas freiras e as obras de arte produzidas na época.
O políptico em óleo sobre tela "O juízo final", de Rogier van der Weyden, vale alguns minutos de contemplação. Uma enorme lupa percorre toda extensão do quadro para que se possa observar os detalhes do trabalho. Exposto em duas paredes contíguas, o quadro foi seccionado para que os visitantes possam apreciar simultaneamente, o que originalmente seria a obra fechada e aberta. Quando o Hôtel-Dieu funcionava, a obra era exposta na maior parte do tempo em sua face externa (no modo fechado): a pintura mostra Nicolas e Guigone Rolin, ajoelhados em cada canto da obra. A parte interna só era aberta nos fins de semana para que o povo tivesse acesso: Jesus Cristo ao centro; à sua direita, o caminho para o paraíso, e à esquerda, o fogo eterno.
Com apenas 23 mil habitantes, Beaune afirma sua vocação turística com 42 hotéis e 150 restaurantes (dois deles com estrelas Michelin). Está situada em localização estratégica na estrada A6, que liga o Norte ao Sul da França, além de ser acessível também por TGV. Festivais de música barroca e de jazz, entre outros eventos, garantem a presença dos visitantes o ano todo na cidade, que deverá abrigar também uma escola de cinema de Claude Lelouch.
As abadias e a Revolução Francesa
Nas visitas às construções religiosas da Borgonha ficam claras as marcas da Revolução Francesa. A Abadia de Fontenay, em Montbard, e a Basílica St. Madeleine, em Vézelay, ambas patrimônios nomeados pela Unesco, são ricos exemplos desta herança histórica. Em Fontenay, erguida no século XII e fundada por São Bernardo, a abadia é um dos mais antigos mosteiros cistercienses na França. Desprovida de detalhes arquitetônicos luxuosos, conforme os ideais cistercienses, foi erguida num local voltado para o trabalho intelectual e manual e à contemplação da natureza.
Tomada durante a Revolução Francesa, quando os monges deixaram o local, funcionou durante muito tempo como fábrica de papel e foi comprada em 1820 por Elie Montgolfier (da família que construiu o primeiro balão tripulado e produzia o papel Canson, em Lyon). Hoje pertence à família Aynard, voltada à visitação turística. A nave principal da igreja mostra a austeridade impressionante da construção, as imagens esculpidas no século XIV da Virgem Maria, o dormitório dos monges, o claustro e a oficina, com a prensa e o martelo hidráulico que garantiam o trabalho e o sustento dos monges.
Em Vézelay a Basílica de St. Madeleine integra a parte francesa do Caminho de Santiago. A referência é clara nas conchas gravadas nas ruas e nas entradas de porões à frente das casas que costumavam abrigar os peregrinos, antes da chegada de hotéis como o Le Compostelle, à entrada da cidade que cresceu ao redor da abadia que se impõe no alto de uma colina com uma vista impressionante para o Parque Natural Regional de Morvan.
A basílica românica, erguida no século XII, foi restaurada no século XIX, após quase entrar em colapso depois da Revolução Francesa, e guarda uma relíquia que se acredita ser de Nossa Senhora. Duas datas são especiais no seu calendário de visitas: os solstícios de verão e de inverno, quando a incidência dos raios solares provoca um efeito especial de iluminação, formando um corredor de flores em direção ao coro e altar.
Publicado por Cristina Massari - 27/10/2010
Fonte : O Globo . Boa Viagem
A Virgem do Chanceler Rolin - Jan Van Eyck Hospicios de Beaune
"Beber vinho, é beber gênio" Charles Baudelaire
Benjamin Roffet - Melhor Sommelier da França 2011