Caro estudante, na Lição 1, você será apresentado à importância da negociação no mundo contemporâneo. Pode parecer que a negociação tem seu papel apenas no mundo dos negócios, mas não é bem assim. Você já se deparou com um conflito na sua família, ou até mesmo na escola, e se saiu dele usando o famoso “gogó”, ou seja, a lábia?
Pois bem, a negociação pode ser utilizada nos mais diversos espaços da vida pública. Todos os profissionais, sejam eles policiais, vendedores, padres ou políticos, utilizam a negociação para atingir seus objetivos. Por isso, nesta lição, você conhecerá o processo de negociação. Além disso, compreenderá como a negociação deve ser iniciada. Assim, ao final desta aula, você estará apto a iniciar um processo de negociação de maneira sólida e assertiva.
Nós vivemos em sociedade. Isso não é uma novidade para você. Todos os dias, acordamos, tomamos nosso café, saímos de casa, vamos à escola etc. Em nossa rotina diária, cruzamos com uma infinidade de pessoas. Muitas delas são agradáveis, algumas têm os mesmos objetivos e querem o mesmo que você. No entanto, outras são desagradáveis, às vezes grossas e, em alguns casos, explosivas e violentas. Como você acha que nossa sociedade se desenvolveu tanto, com pessoas tão diferentes?
Sem a negociação seríamos levados por nossos instintos, poderíamos ter ações violentas, perigosas para nós e para os outros. Por isso, é tão importante compreendermos a relevância da negociação em nossas vidas. Você poderia, por exemplo, tomar à força o brinquedo do seu irmão, mas isso seria violento. Você ficaria de castigo e, provavelmente, seu irmão ficaria muito chateado. Mas e se você negociasse? Imagine que, ao invés de tomar um brinquedo do seu irmão, você buscasse convencê-lo a trocá-lo por algo seu. Todos ganhariam. Ele teria algo novo, você teria o brinquedo, não haveria briga e nem necessidade de castigo. Essa é a magia da negociação. Por meio dela, podemos superar obstáculos sem violência, grosseria ou prejuízos.
Vamos imaginar uma cena interessante. Em 2022, houve a Copa do Mundo e, como tradicionalmente ocorre a cada quatro anos, lançaram o álbum da Copa. Grande parte das pessoas, das mais diversas idades, começaram a comprar seus álbuns, bem como pacotinhos de figurinhas. O problema é que, com o tempo, vão sobrando figurinhas repetidas. Outras delas, no entanto, são tão raras, que é muito difícil de se encontrar. É preciso procurar por dias. Há até pessoas que pagam por algumas figurinhas dada a sua dificuldade em encontrá-las.
Mateus tinha pouco dinheiro para conseguir preencher seu álbum, restavam-lhe algumas apenas muito repetidas, que todos já tinham. Um dia, ele foi ao clube e reconheceu uma menina de sua escola. Na escola, ela era reconhecida por ser ótima no “bafo”, aquela brincadeira de bater em figurinhas em que elas ficam em um monte e ao bater com a mão, o jogador fica com as que viram com a face para baixo.
Naquele dia em questão, ela havia esquecido suas figurinhas e, por isso, não estava participando das rodas de brincadeira. Mateus teve uma ideia. Foi até a menina e se apresentou. Ele descobriu que o nome dela era Lúcia. Ele então perguntou se ela gostava de figurinhas e se estava fazendo o álbum, como uma forma de quebrar o gelo, ou seja, para aproximar-se dela, já que ainda não eram conhecidos. Ela disse que sim. Além disso, falou que o seu álbum já estava quase completo.
Ela demonstrou estar triste, pois percebeu que várias das figurinhas de que precisava estavam sendo batidas nas rodas de brincadeira. Mateus faz a seguinte proposta: ele emprestaria as figurinhas para ela poder tentar pegar as aquelas de que precisava. Em contrapartida, ele ficaria com as restantes. Ela então faz uma contraproposta: eles separariam as figurinhas em 50% para cada, sendo que cada um dos dois ficaria com aquelas de que mais necessitava, dividindo igualmente, depois, as repetidas. Mateus topa, mas acrescenta mais uma condição ao acordo: caso os dois precisassem de uma mesma figurinha, ela iria para quem ganhasse num jogo de “par ou ímpar”. Lúcia topou.
Resultado: a menina conseguiu “rapelar”, ou seja, ganhou muitas figurinhas. Mateus quase completou seu álbum naquele dia, e os dois se divertiram muito. Veja como a negociação ajudou Mateus e Lúcia a atingirem seus objetivos. Ou seja, ambos deram um pouco de si e ganharam muito por conta disso.
Já falamos sobre a importância da negociação no dia a dia de todos nós. No entanto, é importante frisar que sem ela, com certeza, o mundo seria muito mais conflituoso. Nesse momento, um empresário fecha uma grande venda, um político negocia a aprovação de uma lei e um diplomata evita que uma guerra seja deflagrada. Ou seja, todos eles necessitam negociar de alguma forma.
Mas como podemos definir o que é negociação? Segundo Alto, Pinheiro e Alves (2009), negociação consiste no processo dinâmico por meio do qual duas partes buscam um acordo mutuamente satisfatório, em que cada parte procura obter um grau ótimo de satisfação. Ou seja, em uma negociação temos duas ou mais partes com objetivos diferentes. À primeira vista, esses objetivos podem parecer inalcançáveis sem que uma parte prejudique a outra. No entanto, quando essas partes decidem colaborar para que ambas ganhem, percebem que é possível que ambas se beneficiem.
A negociação pode ser utilizada no mundo dos negócios para vários fins. Alguns deles são:
Negociação comercial: a negociação comercial é aquela em que um vendedor quer convencer seu cliente a comprar um determinado produto. Por meio dela, a empresa busca seu faturamento e seu lucro.
Negociação estratégica: para planejar é preciso negociar. A estratégia da empresa é realizada por meio de um conjunto de pessoas que precisam decidir qual caminho deve ser tomado para que uma empresa cresça e se desenvolva. Assim, é preciso que as pessoas cheguem em um consenso para que a estratégia possa ser estabelecida.
Negociação operacional: para uma empresa poder funcionar é muito importante que todos cumpram suas funções. O setor de comprar deve negociar com os fornecedores; o líder deve convencer os liderados etc. Diariamente, todos os funcionários estão inseridos em algum processo de negociação, que viabiliza o trabalho.
Alto, Pinheiro e Alves (2009) defendem que existem elementos básicos para haver uma negociação, quais sejam: informação, tempo e poder. Vejamos como essas variáveis estão relacionadas à negociação.
Informação: quanto mais dados você tem, mais fácil é ganhar uma negociação. Quanto mais você sabe sobre a outra parte de uma negociação, mais você consegue conduzir as tomadas de decisões para um ponto em que sejam favoráveis a você e à outra pessoa. Além disso, ao conhecer a outra parte, você pode determinar suas forças e fraquezas, bem como os momentos em que ela mente ou emite alguma informação. A informação está intimamente relacionada com o poder de se conhecer as necessidades do outro. O ponto-chave é a busca pelas necessidades dos envolvidos.
Tempo: é um recurso muito limitado. Algumas oportunidades duram apenas dias ou até mesmo horas. Assim, toda a negociação tem um prazo, estabelecido no início do processo de negociação, para haver um momento específico em que o ponto ótimo para ambas as partes seja atingido.
Poder: representa o grau de influência que uma determinada parte tem sobre o processo de negociação. O poder entre as partes tende a ser desequilibrado. Ou seja, é possível que uma das partes influencie a outra no momento em que a negociação está acontecendo. Por exemplo, uma marca como a Coca-Cola tem muito mais poder econômico que uma marca local de refrigerantes. O poder das organizações é utilizado de maneira positiva, isto é, para afirmar a sua posição, garantindo que suas ofertas sejam atendidas.
A negociação está atrelada à tomada de decisão. Você, provavelmente, toma algumas decisões importantes todos os dias. Nas organizações, ocorre de modo parecido. Para tomar a decisão, na verdade, é preciso considerar um conjunto de ações. Chamamos esse conjunto de processo decisório.
O processo decisório pode ser entendido como um conjunto de princípios, regras e procedimentos que permitem selecionar a melhor opção dentre as existentes. Falaremos desse processo mais à frente. Para o momento, é importante salientar que a negociação é realizada por meio de etapas, nas quais algo é decidido. Assim, ao final de uma série de etapas, a negociação se encerra.
Bem, agora você já conhece um pouco mais sobre como a negociação funciona! Mas, ainda precisamos tratar das etapas do processo decisório. Nesta lição, falaremos apenas sobre o processo de início da negociação.
Você sabe como uma negociação se inicia? Farei uma pergunta um tanto quanto estranha, mas ao final, você entenderá. Quando você deseja comer um bolo, você coloca os ingredientes diretamente no forno? Não. É preciso preparar a massa, deixá-la no ponto de ser assada. Caso contrário, a receita não dará certo.
Por isso, o primeiro passo para uma boa negociação é a preparação. Preparar-se significa compreender em que situação as partes da negociação se encontram. Lembre-se de que quanto mais se sabe sobre a outra parte, maior serão as chances de você conseguir influenciá-la.
Depois de se preparar, é a hora da rodada de abertura. Primeiramente, é preciso criar um “quebra-gelo”, ou seja, preparar uma apresentação ou um momento com alguma atividade simples para pacificar os ânimos e ampliar a confiança de que, ao final, a melhor decisão será tomada.
Se o “quebra-gelo” for realizado de modo correto, possivelmente, as partes envolvidas na negociação serão mais amistosas e tenderão a colaborar melhor para a resolução do problema. Um bom exemplo de quebra-gelo é uma apresentação das pessoas para que se consiga criar laços, descobrindo pontos em comum.
Segundo Ximenes et al. (2016), o “quebra-gelo” se trata de uma ferramenta muito comum em situações em que negociações possuem maior número de partes, ou naquelas em que o objetivo final exija maior integração entre os membros. O quebra-gelo pode ser utilizado como um suavizador para a negociação.
Como negociador, você deve sempre manter a calma, analisando as diversas expectativas das partes envolvidas. É muito importante que você seja cordial no momento do quebra-gelo e em todos os outros momentos, que envolverão a negociação. É corriqueiro que os ânimos se alterem e que as pessoas acabem brigando durante a negociação. Lembre-se de não cair em provocações e mantenha-se sempre receptivo.
Chamamos esses momentos de crise de “objeção”. Geralmente, a objeção ocorre quando as pessoas envolvidas em uma negociação não conseguem entrar em um consenso do que precisam deixar para seguir com a negociação. Ou seja, quando uma das partes não quer renunciar a algo para que um acordo seja realizado, a negociação trava e os ânimos começam a se exaltar.
No entanto, existem formas para que essa objeção não se torne tão problemática a ponto de inviabilizar a negociação. Uma das maneiras é o alinhamento de expectativas e objetivos. Antes das negociações começarem, após o quebra-gelo, as partes envolvidas devem enumerar seus objetivos, bem como suas expectativas.
Objetivos representam aquilo que a parte deseja atingir ao final da negociação.
Expectativas são características ligadas à negociação. Por exemplo, uma das partes pode exigir que as rodadas de debate tenham, no máximo, uma hora.
A fase de abertura da negociação é muito importante. Por meio dela, as partes criarão um vínculo. Ou seja, é preciso que as partes estejam dispostas a se relacionarem de modo muito sincero e honesto. Portanto, não trate as outras partes como inimigas, mas como parceiras importantes para que você atinja um determinado fim.
Espero que você tenha compreendido a importância desses conceitos para sua negociação. Lembre-se de que uma abertura que não corresponda aos padrões aqui apresentados pode levar toda a negociação ao término antes mesmo dela iniciar. É preciso começar com o pé direito e sem a pretensão de que todos os seus objetivos e expectativas sejam atingidos.
Vamos colocar em prática os conhecimentos adquiridos? Imagine que você é um vendedor de créditos imobiliários e, para fechar a meta do mês, precisa vender uma residência no valor de R$ 120 mil. Você recebe, via site, um e-mail com a simulação de um casal que precisa de um crédito de R$ 90 mil. Você então liga para a pessoa cadastrada e descobre que ela está interessada em uma casa. Você a chama para uma reunião.
Quando ela chega na filial em que você trabalha, você se levanta, vai até ela e, com um grande sorriso, oferece um aperto de mão. A pessoa em questão é um homem, que aparenta ter cerca de 30 anos e está usando uma camiseta de time de futebol.
Você começa com um quebra-gelo, pedindo para que ele se sente, diz que assistiu ao último jogo do time em questão e que gostou bastante da atuação de um dos atacantes. O homem, então, começa a conversar com você sobre o esporte e vocês parecem se aproximar.
Após esse momento inicial, você puxa o momento de alinhamento das expectativas e objetivos, perguntando o que o cliente pretende fazer com o dinheiro. Ele explica que quer comprar uma casa para morar com sua esposa, já que se casaram recentemente.
Ele explica que possui o objetivo de comprar uma casa, e tem como expectativa fechar um negócio em que possa dar até R$ 60 mil na entrada. Sabendo disso, você faz a primeira rodada de negociação, propõe a ele um crédito de R$ 120 mil, explica que, com esse dinheiro, poderia comprar uma casa com dois quartos e já garantir o espaço para o quarto das futuras crianças, e, caso sobre dinheiro, poderia devolver a quantia restante para pagar parte das parcelas finais ou, ainda, deixar a documentação em ordem, e afirma que, dando os R$ 60 mil de entrada, poderia ganhar um bom desconto.
Com essas condições, o cliente fecha o negócio, atinge o objetivo dele, e você consegue bater a meta. Veja, esse é o grande poder da negociação.
ALTO, C. F. M.; PINHEIRO, A. M.; ALVES, P. C. Técnicas de compras. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009.
XIMENES, M. M. S. et al. O quebra-gelo como forma de unir e promover a sinergia de um grupo de formação em aprendizagem cooperativa. In: ENCONTRO DE APRENDIZAGEM COOPERATIVA, VIII, 2016, Fortaleza. Anais […]. Fortaleza: Encontro de Aprendizagem Cooperativa, 2016.