Relato do experimento Ganzfeld vai a Júpiter
condução de Cila macdowell
participante Luæl
Realizado em 15/08/2021
Por volta das 20h
O experimento consiste em uma adaptação do experimento Ganzfeld, na qual a privação sensorial total (ou parcial) foi substituída por uma condução imaginativa que percorreu o caminho Terra-Júpter. Nesta experiência pude identificar três momentos distintos e em sequência, os quais irei relatar a seguir. A eles dei os seguintes nomes: Multidão Mental, um estado de grande quantidade de pensamentos e diálogo interno intenso, acompanhado de alta capacidade imaginativa que divide seu espaço com as sensações do corpo. Auto reflexão, um estado de baixa quantidade de pensamentos, porém não ausência, foco em poucas vozes de diálogo interno voltadas principalmente à autocrítica e grande potencial imaginativo, sendo capaz de captar parte da atenção que antes era destinada aos sentidos corporais e levá-la para o pensamento abstrato. Exploração, um estado de abstração quase total, onde os sentidos do corpo diminuem a intensidade na percepção, abrindo espaço para uma experiência imaginativa intensa, alto grau de formação de imagens, em momentos apresentando outros tipos de sensações como sons, textura, densidade, imersão, entre outros.
Procuro registrar este relato da forma mais acessível possível. As descrições visuais não são analogias, e sim documentação de visões obtidas de forma extrassensorial.
Fizemos uma preparação, colocamos todos os dispositivos de gravação a postos, um laser vermelho cortava a cena passando pela minha testa enquanto uma luz da mesma cor pairava em frente ao meu rosto acesa, criando a atmosfera. Eu não sabia o que esperar da experiência, mas estava disposta a levá-la com seriedade e aberta às possibilidades. Sentei, tentando manter sempre a postura ereta e confortável da melhor forma possível, ouvi as primeiras instruções me indicando que poderia isolar a minha visão e assim eu o fiz.
Os óculos, feitos de bolinhas de ping-pong, elásticos e bordados deixavam algumas poucas frestas perto do meu nariz e das sobrancelhas, que logo se tornaram o foco principal da minha visão, uma vez que o resto da imagem que meus olhos captavam estava tomada por um laranja leitoso que vinha da luz externa passando pelo plástico da “lente”. Logo me vi imersa em pensamentos, com um diálogo interno intenso composto de variadas vozes as quais já estava acostumada. Elas falavam muito, como uma multidão, sobre os mais diversos assuntos, algumas reconhecendo o experimento, outras apenas reverberando pensamentos recorrentes. Minha visão reconhecia o interior dos óculos, as brechas, o elástico próximo ao meu nariz, mas a minha atenção acompanhava a condução do experimento, o que fazia com que uma apresentação didática, como um vídeo explicativo pensado para o público infantil, ilustrando os dados sobre Júpiter e sobre o trajeto até lá, passasse na tela da minha mente ocupando o espaço esquerdo o como uma pequena sala de cinema na qual as diversas manifestações do pensamento assistiam e comentavam, como personagens vendo um filme.
Sem perceber a tranferência da minha atenção se voltando cada vez mais para a parte imaginativa da visão, os diálogos internos começaram a se dissipar, deixando apenas algumas vozes resistentes que passaram a me trazer pensamentos de autocrítica, as quais questionavam se eu estava em dia com meus afazeres, com as minhas relações, desejos, obrigações e vontades. Este momento foi o de menor duração, pois uma vez que eu pude perceber que estava tranquila com relação a esses aspectos da minha vida, tais pensamentos se dissiparam, me deixando apenas com uma voz que acreditei se tratar da minha voz individual e essencial, “eu mesma” sem interferências internas ou externas.
A partir daí houve uma ruptura sensorial, eu já não ouvia mais a voz que conduzia o experimento, a visão dos olhos abertos sob os óculos se enevoou como se eu estivesse atravessando uma nuvem cinzenta. Os sentidos se modificaram, o que o corpo sentia era anestesiado, enquanto a mente produzia as sensações correspondentes à experiência em outro plano de consciência, como nos sonhos. Ao ultrapassar a névoa cinza, me deparei com a visão de um ambiente diferente que era descrito nas informações de Júpiter. Ele era rochoso e alaranjado, como um deserto. Ao caminhar por este local, me deparei com a figura de uma onça gigante, que flutuava lentamente em minha direção, deitada e tranquila. A medida que ela se aproximava, também crescia. Ao perceber minha presença ela se levantou.
Neste momento a voz da Cila me fez retornar ao corpo, as imagens se dissiparam, aos poucos fui retomando a consciência de cada parte e rearrumando minha consciência de volta aos sentidos materiais.
Após o experimento tive fortes sensações de felicidade e paz, assim como grande surpresa pela intensidade da experiência.
Luæl
18/08/2021