Estórias Curtas para Pais Cansados

Resultado de um prolongado estudo, esta criteriosa selecção de lendas e contos tradicionais portugueses, “Estórias Curtas para Pais Cansados” é uma obra única e incontornável de valor etnográfico, antropológico, sociológico e pedagógico discutível.

Esta peça é apresentada em formato de colecionável e é composta por dez (10) cábulas em formato cartão com 80X130 mm para facilitar o manuseamento. Cada um é ilustrado na frente e contém, no verso, um texto curto, baseado em contos pescados em várias regiões do continente e ilhas, re-escritas e condensados a pensar nos pais e na penosa tarefa de ler, vezes sem conta, as chatíssimas histórias do costume aos seus filhos, à hora de deitar.

As dez "Estórias Curtas Para Pais Cansados" incluídas nesta colecção de dez exemplares assinados e numerados, não podem ser lidas "ipsis verbis". Escritas numa linguagem despreconceituosa e próxima da oralidade actual, alguns destes contos podem conter gíria, calão ou insinuações de cariz, racial, sexual ou até mesmo religioso. Mesmo em casas mais progressistas, devem os pais adaptar a linguagem à idade da criança, obrigando-se a exercitar assim, a sua imaginação, capacidade interpretativa e narrativa. Estas condicionantes devem-se ao facto de, apesar das adaptações estilísticas com vista à condensação dos textos, o autor querer manter-se fiel à história e personagens que a compõem.

Especificações da obra

Exterior: Caixa de cartão forrada a papel Craft com 140X90X30 mm · Rótulo fac-similado a laser a preto e colado na tampa · Número de série no interior

Interior: 10 cartões de 2 mm, com frente (ilustração) e verso (texto) fac-similados a laser a preto e contracolados · Memória descritiva/Certificado de autenticidade assinado e numerado

Texto adaptado de “A lenda do Rei Orelhão”

Lamas De Orelhão · Mirandela · BRAGANÇA

Havia há muito tempo, um rei mouro muito mau e muito feio. Vivia também na zona uma pastora muita boa chamada Comba que se fazia sempre acompanhar de seu irmão Leonardo.

O rei Orelhão, como era chamado, gostou do que viu e tentou dar-lhe a volta dizendo-lhe ao ouvido que queria que ela lhe catasse os piolhos. Com medo, assim o fez e sentada num calhau, catou-o.

Confortável e aliviado da comichão, o rei acabou por adormecer. A gaja aproveitou, fugiu e ao encontrar uma rocha muita grande berrou: - Abre-te fraga bendita e salva Comba catita!

O penedo mágico abriu-se e a pastora nele entrou. Em desespero, o rei ainda lançou um pilão na sua direcção que não lhe acertou mas deixou uma racha na rocha que ainda hoje se pode ver.

O irmão Leonardo veio em seu socorro e o rei, vingativo, estripou-o e mais tarde, outros pastores encontraram-lhe as tripas atrás de um juncal.

Nesse sítio nasceu uma fonte de águas milagrosas chamada “Fonte de S. Leonardo” e no grande calhau onde Comba desapareceu, a carneirada construiu uma capela, que tem o nome de Santa Comba dos Vales.

Texto adaptado de “O Milagre das Rosas”

Tavira · FARO

A rainha Dona Isabel era uma pessoa muito caridosa e tinha muita pena dos pobrezinhos, que era toda a gente menos a família dela. Os desgraçados passavam muita fome e iam lá bater à porta do castelo a pedir uma esmola. E ela então, como era tipo, o banco alimentar da altura, dava pão aos pobres e eles, mandriões, abusavam.

O rei, zangado e ferido no seu neo-liberalismo, não queria, e ameaçou-a de porrada. Ela cagou no rei e continuou a distribuir pão à porta, refundido no regaço para não se topar.

O rei, um dia fez-lhe uma espera, apanhou-a com a boca na botija e confrontou-a: “O que levais enrolado na saia, ó Isabel?”

E ela disse: - São rosas, pá.

E então ele disse: “Rosas, com este briol? ‘Tás a gozar comigo?”

E ela retorquiu: “São rosas, caraças!”

O rei, lixado por a gaja o ter tratado por “pá”, espetou-lhe um beliscão no rabo. Assustada, deixou cair as cenas que tinha escondidas e... em vez de pão eram rosas!

Com remorsos de lhe ter desobedecido, Isabel resolveu dar-lhe dez mil réis para ele ir comprar um jogo p’rá consola.

O Rei, sensibilizado respondeu-lhe: - És uma Santa, Isabel.

Texto adaptado de “A Lenda das Sete Cidades”

Ponta Delgada · Ilha de São Miguel · AÇORES

Há um milhão de anos havia um reino no meio do mar onde um rei vivia com uma filha loira, de olhos azuis e podre de gira.

Alimentada a pepino, ela era o único palminho de cara naquelas bandas e o rei não a deixava sair do castelo, não fosse ela comida por algum mitra.

Um dia, farta de pepino, pirou-se pela porta da cozinha e a caminho da vila, encontrou um pastor de lindos olhos verdes.

Quando os seus olhos se encontraram, subiu-lhes uma cena pela espinha acima. Não tinham passado cinco minutos de conversa e o pastor mostrou-lhe que havia mais vida para além dos pepinos.

O rei soube e furioso, meteu a filha na pildra para o resto da vida. Mas uma pneumonia atirou-a abaixo e o rei mandou-a para uma casa de campo, numa antiga cratera de vulcão onde os ares eram melhores para a recuperação. Chorou tanto que encheu um buraco que lá havia e acabou por esticar o pernil.

Entretanto, o pastor, que já andava a precisar de desabafar há uns meses, foi informado por um bufo qualquer onde ela estava enterrada e para lá correu.

Frustrado por ter perdido o que, à partida, estava seguro, chorou também, enchendo o buraco ao lado dela. Por isso é que há duas lagoas. Uma é verde e outra é azul... por causa dos olhos. Pronto!

Texto adaptado de “As Três Irmãs Encantadas”

Sobral da Adiça · Moura · BEJA

Esta estória envolve, nódoas, uma prenha e marmelada com animais.

Era uma vez um rei que foi p’rás cruzadas e antes de bazar, deu às três filhas vestidos iguais e disse-lhes que, se elas fizessem merda uma nódoa apareceria no vestido da prevaricadora.

Enquanto o rei estava fora, a filha do meio levou do namorado, um valente pontapé nas costas.

Quando o rei voltou, as filhas tentaram trocar-lhe as voltas, trocando de vestidos entre elas. O gajo, desconfiado, chamou-as ao mesmo tempo e lá confirmou que afinal, não era no meio que estava a virtude.

Como castigo rogou-lhe uma praga e transformou-a em serpente.

Ninguém sabe ao certo o que aconteceu ao rebento, mas a maluca, transformada em serpente, foi exilada p’rá Serra da Adiça onde todos os anos, no dia de São João, uma das irmãs lhe serve um almoço...

Diz a lenda que o enguiço só acabará quando um homem com tomates se deixar beijar no céu da boca três vezes, pela cobra.

Ora. Isto não tem nada a ver com tomates, porque um gajo, só obrigado é que embarca numa badalhoquice destas. Gajas boas, ricas e fáceis há p’raí ao pontapé. Não é preciso fazer sacrifícios.

Texto adaptado de “A Truta de Celorico”

Celorico da Beira, GUARDA

Um dia, o Papa lixou Dom Sancho. O irmão dele ,D. Afonso III, teve de se chegar à frente e correr o país a dar tangas aos senhores feudais para que lhe jurassem obediência.

Ao chegar a Celorico, o manda-chuva do castelo mandou-o ir dar uma volta. Afonso cercou o castelo à espera que as febras acabassem e a guarnição abrisse as portas para pedir tremoço.

Ora. Dentro do castelo já a traça fazia doer os estômagos há uns tempos. Era uma questão de um par de horas até que os gajos baixassem as calças e deixassem Dom Afonso entrar.

Quis o destino que uma águia largasse uma truta do tamanho de uma ovelha dentro das muralhas. O gerente do castelo, em vez de rachar a truta pela malta que estava esfomeada, resolveu cozinhá-la e mandou oferecer a Afonso, convencendo-o que lá dentro era só fartura e que até se davam ao luxo de desperdiçar a truta com ele.

Confrontado como salmoniforme, Dom Afonso desistiu e pôs-se a andar porque já eram quase quatro e meia e naquele tempo, não se pagava horas extraordinárias na função pública.

Esta história não faz sentido nenhum porque aquele monte de pedras foi tomado pouco tempo depois...

Não sei se foi pouco tempo, mas para o caso, não interessa.

Texto adaptado de “A Estalagem das Mestras”

Aldeia da Foz · Abrantes · SANTARÉM

Havia uma estalagem perto da aldeia da Foz onde, quando faltava a comida, limpavam o sebo a uns hóspedes para servir os restantes.

Uma vez, faltou tanta comida que a dona da estalagem acabou por cortar o pescoço ao marido.

Um gajo da confiança do rei Dom Luís que por ali passava, resolveu bater uma sorna no sítio e depois de se banhar, perguntou à filha da dona se havia alguma coisa para morfar, ao que ela respondeu que só havia cabeça de pai.

Enojado, o homem fugiu e foi bufar-se ao Dom Luís que, perante tamanha monstruosidade, traçou um plano para desmontar o esquema e castigar o raio da velha.

Mascarou-se de cliente mistério e foi lá jantar, enquanto a divisão de comandos do exército português aguardava o sinal para invadir a chafarica. Gordo como era, a velha não resistiu e empurrou-o para o alçapão da cave para lhe fazerem a folha, mas o gajo era rei por alguma razão e pediu para o deixarem tocar uma música num apito antes de ir desta para melhor.

A velha deixou-o apitar e dois minutos depois os comandos entraram deixando apenas os escombros da estalagem, esquartejaram-na e deram-na de comer aos porcos.

Bem feito, filha da p***!

Texto adaptado de “A Estalagem das Mestras”

Aldeia da Foz · Abrantes · SANTARÉM

Havia uma estalagem perto da aldeia da Foz onde, quando faltava a comida, limpavam o sebo a uns hóspedes para servir os restantes.

Uma vez, faltou tanta comida que a dona da estalagem acabou por cortar o pescoço ao marido.

Um gajo da confiança do rei Dom Luís que por ali passava, resolveu bater uma sorna no sítio e depois de se banhar, perguntou à filha da dona se havia alguma coisa para morfar, ao que ela respondeu que só havia cabeça de pai.

Enojado, o homem fugiu e foi bufar-se ao Dom Luís que, perante tamanha monstruosidade, traçou um plano para desmontar o esquema e castigar o raio da velha.

Mascarou-se de cliente mistério e foi lá jantar, enquanto a divisão de comandos do exército português aguardava o sinal para invadir a chafarica. Gordo como era, a velha não resistiu e empurrou-o para o alçapão da cave para lhe fazerem a folha, mas o gajo era rei por alguma razão e pediu para o deixarem tocar uma música num apito antes de ir desta para melhor.

A velha deixou-o apitar e dois minutos depois os comandos entraram deixando apenas os escombros da estalagem, esquartejaram-na e deram-na de comer aos porcos.

Bem feito, filha da p***!

Texto adaptado de “A Lenda de Maria Gancha”

Semelhe · BRAGA

A história passa-se numa aldeia onde havia um poço comunitário. Como toda a actividade da aldeia era feita à volta dele, era costume a canalha ir vadiar à vista dos pais. A única condição que os pais punham era a de nunca olhar para dentro do poço para não se baldarem lá p’ra dentro.

Um dia, o filho do presidente da junta, que era malcriado até à última casa, farto das brincadeiras com os amigos, mandou bugiar as recomendações e subindo a um balde, debruçou-se. Como o poço era muito fundo, começou a atirar calhaus para ver até onde iam.

No poço vivia uma besta que era uma mistura de monte de feno e monstro de filme de terror japonês. A sua farta cabeleira cobria-lhe a cara e em vez de braços, tinha tentáculos em forma de ganchos. Ah! E fedia a bafio... ó se fedia.

Bom. O estardalhaço que o cretino fez foi tanto que a dita trepou pela corda do poço acima e num ápice, puxou-o para o fundo. A ele e à caganeira que ele fez quando a viu!

Os pais procuraram-no, incansáveis, até que no dia seguinte, uma vizinha encontrou a criança afogada no fundo do poço.

Desse dia em diante, sempre que uma criança se aproximava de um poço, os pais aterrorizavam-na com esta história.

E depois queixam-se que quando crescem, se tornam sociopatas.

Texto adaptado de “A Lenda do Bicho Cidrão”

ILHA DA MADEIRA

Na ilha da Madeira, há dois picos. o Pico Ruivo e o Pico Cidrão. O último é uma serra quase inacessível, de pedra vulcânica, com várias cavernas onde dizem que mora o Bicho Cidrão.

Conta-se que, há muito tempo, vivia ali um pastor com um cão mais o seu rebanho. Um dia, quando o pastor recolhia as ovelhas, o cão caiu por uma ribanceira e esbardalhou-se todo.

O pastor, que era um bocado piégas, ao ver o cão debaixo das pedras e num acesso de fúria, culpou o pico de lhe ter retirado o seu fiel amigo e amaldiçou-o.

A pronúncia da Madeira já é difícil de perceber, se a isso se juntar o facto de ele viver isolado na companhia de ovelhas e um cão, só mesmo um ser inanimado é que, num mundo de fantasia, podia perceber o que ele disse.

Resumindo. Reza a lenda que o pico o ouviu e no dia em que o pastor morreu, soltou a maldição, criando o Bicho Cidrão. Um monstro sobrenatural que é a mistura do pastor com o seu cão.

Os uivos que ainda hoje se ouvem nas cavernas do Pico Cidrão são as lamechices da besta.

Texto adaptado de “O Menino de Barrete Vermelho”

Agrochão · Vinhais · BRAGANÇA

Era uma vez uma velha que não conseguia dormir.

Todas as noites era incomodada pelo barulho de cadeiras a arrastar e loiça a partir, entremeado por murmúrios que pareciam vir de todo o lado.

Passou em revista a casa vezes sem conta sem sucesso. Crente como era, acabou por mandar o padreco da aldeia exorcizar a casa. Depois do serviço feito e pago, o padre receitou-lhe um copo de água benta de quatro em quatro horas.

Seguiu-se uma série de visitas de bruxas reputadas na zona. Só não foram monges budistas, mestres taichi e gurus indianos porque na altura, o oriente era só uma direcção.

Cansada e doente das noites mal dormidas, mas bem hidratada da água que bebeu, resolve mudar-se. No dia da mudança, ao caminhar pela vereda que levava à nova morada, um puto de barrete vermelho, tronco nu e com uma cadeira às costas esperava por ela. — Olha lá, essa cadeira é minha! Para onde vais com ela? O sacana, com ar de gozo, retorquiu: - Então não estamos a mudar de casa?

O manhoso era uma espécie de duende endiabrado, da classe dos “homenzinhos azuis do multibanco” ou o “anão das caixas de correio”. Daqueles que nos mudam as chaves do carro de sítio.





Mais Referências